CONTEMPLANDO A IMENSIDÃO
MOTE: "Eu não posso chamar de isolamento
Quando estou contemplando a imensidão".
GLOSAS:
Isolar-se, pra mim, não é sequela
É momento sublime de surpresa
Quando estou avistando a natureza
Apoiando meus braços na janela
A “beleza tão bela” se revela
“Tão antiga e tão nova” na visão
E os desejos daqueles que vis são
São levados num seio pelo vento
Eu não posso chamar de isolamento
Quando estou contemplando a imensidão.
Finjo quando no quarto estou trancado
Que passeio na rua, espaço aberto
Se fazendo tal coisa eu não acerto
Ninguém pode julgar que estou errado
Aproveito este tempo avantajado
Desperdiço balbúrdia e multidão
E não troco sequer, meditação
Por conversas que não tem fundamento
Eu não posso chamar de isolamento
Quando estou contemplando a imensidão.
Quando eu olho pro céu, um nevoeiro
Trasladando gotículas miúdas
Já tem outras até bem mais graúdas
Dando pulos de ponta em meu terreiro,
Um golinha cantando num coqueiro
E um cabrito fazendo arrumação
Desfazendo uma linda plantação
Sem ter dado, por ela, o pagamento
Eu não posso chamar de isolamento
Quando estou contemplando a imensidão.
Quando vejo um retrato dum parente
Mato um pouco a saudade que se estende
Como sendo a visita que mais rende
E que menos sossego traz pra gente
Tem sentido, mas pouca coisa sente
Assim mesmo se tem contemplação
Pode até parecer a solução
Quando não aparece o sofrimento
Eu não poço chamar de isolamento
Quando estou contemplando a imensidão.
Tenho a mim, por concreta companhia
E me sinto tão bem comigo mesmo
Tudo quanto acontece, não há esmo
Nem que nada entendamos algum dia
Vou relendo na minha própria via
O que não via em outra ocasião
Quem sozinho se vê na solidão
Pode ter algo errado, isso lamento
Eu não posso chamar de isolamento
Quando estou contemplando a imensidão.
Baixa Grande 25/04/2020