Feixe de saudade
“Do universo gigante da saudade
fiz um feixe amarrado de cipós.”
(Carlos Severiano Cavalcanti)
No princípio era o Verbo, era a verdade,
e eu não quis escutar, quis pôr um fim,
como fosse um transtorno ou coisa ruim
do universo gigante da saudade
o que então escutava. Sem vontade,
eu ouvia as canções dos rouxinóis,
mas de nada valia. Em meus lençóis
os amores passavam, sem me ater
que do amor que eu matei, que fiz sofrer,
fiz um feixe amarrado de cipós,
e me veio o castigo: a insanidade,
a loucura total, o não-ser-eu,
e um pedaço de mim se desprendeu
do universo gigante da saudade.
Eu vaguei como um pária na cidade
e o meu povo gritou, em tom feroz,
toda a insana verdade: estavam sós.
Isto eu vi estampado nos jornais
e não pude esconder. De tudo o mais
fiz um feixe amarrado de cipós.
A tristeza que o coração me invade
habitou no meu ser e não me sai,
a alegria acabou-se, já se esvai
do universo gigante da saudade.
Eu vivi do meu tempo só metade
e o restante a viver é meu algoz.
Não me deixem, portanto, erguer a voz,
pois procuro viver a vida em paz.
Meu passado eu matei, deixei pra trás,
fiz um feixe amarrado de cipós.
Eu cantava mas - infelicidade -
essa voz já não é tão boa assim
pois perdi o que eu arranjei pra mim
do universo gigante da saudade
e não tive nem troco. Essa verdade
eu divulgo pra mim, pra todos nós
e não posso esquecer. Com tantos prós,
eu preciso, ligeiro, de falar.
Com o que trouxe pra mim, pra variar,
fiz um feixe amarrado de cipós.
O que eu tive pra mim foi só vontade,
era grande demais o que eu vivi,
mas não pude esconder, pois já senti
do universo gigante da saudade
o melhor sentimento: amor, bondade,
e juntei tudo em mim. Prendi no cós,
pus no bolso o restante, só pra nós
e, pra não me esquecer, pra não perder
o universo inundado de prazer,
fiz um feixe amarrado de cipós.