ONDE A LUZ DA LUA ME VÊ BRINCAR
ÍNDICE
LES DEMOISELLES D´AVIGNON — PICASSO (1907) 4
CRIANÇA COM POMBA — PICASSO (1901) 7
A MULHER QUE CHORA — PICASSO (1937) 10
INTERIOR DE POBRES — LASAR SEGALL (1916/21) 12
TRÊS BRUXAS À ESPREITA — MICHAEL THOMAS (2013) 15
GOLCONDA — MAGRITTE — (1953) 18
O ORATÓRIO DO DEMÔNIO ——FARNESE DE ANDRADE (1976) 22
A MULHER DA EXTREMA PRESSÃO 24
CARAVAGGIO, GOYA E FARNESE DE ANDRADE 27
A PERSISTÊNCIA DA MEMÓRIA — SALVADOR DALI (1931) 30
A NOITE CONSTELADA SOBRE O RHÔNE — VAN GOGH (1888) 32
A MULHER QUE CHORA — PICASSO (1938) 35
RODA INFANTIL — PORTINARI (1932) 39
MUDANÇA DE RESIDÊNCIA — GAUGUIM (1899) 43
FUTEBOL — PORTINARI (1935) 46
BRUNILDA, UMA DAS VALQUÍRIAS DA MITOLOGIA NÓRDICA — R. ENGELS (1919) 49
A PERSISTÊNCIA DA MEMÓRIA II — SALVADOR DALI (1931) 52
IRMÃOS — PAUL KLEE (1930) 55
O GRITO — EDVARD MUNCH (1893) 58
“TA MATETE”: NÃO IREMOS AO MERCADO HOJE — GAUGUIM (1892) 61
GATO PEGANDO UM PÁSSARO — PICASSO (1939) 64
GUERNICA LARBIRINTO — DECIO/PICASSO (2022) 67
RETRATO DE DORA MAAR — PICASSO (1937) 71
PERSISTÊNCIA DA MEMÓRIA III — SALVADOR DALI (1931) 75
“COMEDIANTE” — PAUL KLEE (1904) 78
O SÁBADO DAS BRUXAS — GOYA (1821) 81
ALICIANDO GÊMEOS, AO MODO DE MENGELE 85
A FAMÍLIA DO HOMEM CEGO — PICASSO (1903) 88
SÓRDIDAS SIMILITUDES 91
AOS HOMENS DA TERRA (VALIANT THOR) 95
CABEÇA MECÂNICA (O ESPÍRITO DE NOSSA ERA) — RAOUL HAUSMANN (1920) 98
SABÁ DAS BRUXAS — GOYA (1797/98) 101
URUTU — TARCILA DO AMARAL (1928) OU
MEU NASCIMENTO — FRIDA KAHLO (1932)
O BANQUETE SÓBRIO — PICASSO (1904)
FAMÍLIA DE ACROBATAS COM MACACO — PICASSO (1905)
SATURNO DEVORANDO SEU FILHO — RUBENS (1636/38)
SATURNO DEVORANDO SEU FILHO — GOYA (1820/23)
DUAS VELHAS QUE COMEM NUMA BACIA — GOYA (1820/23)
ESQUELETOS NUM ESCRITÓRIO — PAUL DEVAUX (1944)
CONVERGENCE — POLLOCK (1952)
“BIRTH” — POLLOCK (1941)
TRÊS DESTINOS — REMEDIOS VARO (1956)
JAQUELINE DE MÃOS CRUZADAS —PICASSO (1954)
O VELHO GUITARRISTA CEGO — PICASSO (1903)
RETRATO DE DANIEL-HENRY KAHNWEILER — PICASSO (1910)
CABEÇA (TETÊ) OU O ARTISTA E A SUA MODELO — PICASSO (1928)
ARLEQUIM —MÁRIO GRUBER (1952)
NATUREZA MORTA — DI CAVALCANTI (1971)
O QUARTO EM ARLES — VAN GOGH (1888/1889)
OS FUZILAMENTOS DE 3 DE MAIO DE 1808 — GOYA (1814)
LE VIOLON D´INGRES — MAN RAY (1924)
A FONTE — (DUCHAMP) (1917)
“A TRAIÇÃO DAS IMAGENS” OU
“OS AMANTES” — MAGRITTE (1928/9)
PLATAFORMA ESPIRAL — ROBERT SMITHISON (1970)
DESVIO PARA O VERMELHO — MEIRELES (MAM/1967)
GARRAFAS E PEIXES — BRAQUE (1910/12)
MAMAN — LOUISE BOUGEOIS (1988)
A MULHER-COLHER — GIACOMETTI (1927)
A MULHER COM CABELO EM COQUE PEQUENO — PICASSO (1904)
HARLEQUIN´S FAMILY — PICASSO (1905)
NO PRAZER HÁ MORTE — HALSMAN & DALI (1949)
BUSTO DE MULHER E AUTORETRATO — PICASSO (1929)
O CIRCO METAFÍSICO — CAMPANELLA
FIGURAS A BEIRA-MAR — PICASSO (1931)
MEUS AVÓS, MEUS PAIS E EU — FRIDA KAHALO (1936)
FUMAÇA SOBRE VALLARIS — PICASSO (1951)
UNITITLED — WARHOL & BASQUIAT (1984)
O SANTUÁRIO DA MEIA-NOITE — PLAYSTATION STORE (2018)
IRONIA DO POLICIAL NEGRO — BASQUIAT (1981)
O IMPOSSÍVEL — MARIA MARTINS (1945)
A NOITE CONSTELADA — VAN GOGH (1889)
O ANJO DA LAREIRA E DO LAR OU:
O TRIUNFO DO SURREALISMO — MAX ERNST (1937)
DE ONDE VIEMOS, O QUE SOMOS, PARA ONDE VAMOS??? —GAUGUIM (1897)
O SONO DA RAZÃO PRODUZ MONSTROS — GOYA (1799)
HOMENS LENDO, A LEITURA — GOYA (1819/1823)
O REI BRINCANDO COM A RAINHA — MAX ERNST (1944)
DOIS VELHOS COMENDO SOPA — GOYA (1819)
ABAPORU — TARCILA DO AMARAL (1928)
O SONHO DA LUA — LAILA ROUGAN (2012)
FAMÍLIA ENFERMA — LASAR SEGALL (1920)
ANTHROPOPHAGY (CANNIBALISM) — TARCILA DO AMARAL (1929)
O TIME FAMILIAR: 11 X UM — “VAI TE QATAR” (2022)
AS DUAS LUAS DE MÃEZONA
CAMPO DE TRIGO COM CORVOS — VAN GOGH (1890)
ADMIRÁVEL MUNDO NOVO — ALDOUS HUXLEY (1932)
ADMIRÁVEL MUNDO MORTO — DECIO GOODNEWS (1990)
O PRIMEIRO LIVRO DE URIZEN (PLANILHA 15) — WILLIAM BLAKE (1794)
FIRST BOOK OF URIZEN (PLANILHA 17 — WILLIAM BLAKE (1794/96) OU
MECÂNICA DO MAGNETISMO PELA GEOMETRIA SAGRADA
POGROM — LASAR SEGALL (1937)
ONDE A LUZ DA LUA ME VÊ BRINCAR
(MORCEGOS)
“Abandonai toda esperança, oh vós que entrais”
(Dante Alighieri: A Divina Comédia)
LES DEMOISELLES D´AVIGNON — PICASSO (1907)
MEU NOME É DANTE. Estou a viver no inferno consciente desta realidade.
ELA ERA APENAS UMA quase menina, mas já estava escolada nas esquinas, nos clubes, nas praças, nos locais que aconchegam a prostituição juvenil masculina e feminina. Ela comercializava o corpo em troca de grana para financiar sua vida escolar e depois as disciplinas da academia. Passara toda a puberdade fazendo programas a troco do sustento de seu sonho do diploma de Economia.
AO ACERTAR O PROGRAMA já estava inclusa a cloaca no pacote. Ela já havia transado com todo tipo de marmanjo: profissionais da política e do serviço público. Deputados, senadores, vereadores, juízes, promotores, militares, médicos, padres, pastores, atores, atrizes, modelos. Havia criado um portfólio de personas e personalidades até conseguir transar apenas com a elite das celebridades na escolha seletiva das companhias de cama.
ENQUANTO CUMPRIA O contrato verbal do programa sob o efeito de faturar seu orçamento secreto, ela agia conforme a satisfação do freguês. Enquanto o fuque-fuque rolava na intensa cidade da sodomia, ela dizia de si para consigo, repetindo o que havia lido no Livro de Dante: “a razão vos é dada para discernir o bem do mal”. Ela mesma de há muito desconhecia o significado desse discernimento. Na hora de ganhar a subsistência, ela agia como age qualquer político: o caminho do bem e da ética vem depois, se vier.
ESTAVA A SE FORMAR. Já havia obtido emprego no gabinete de um senador de boa reputação. Após diplomar-se em sacanagem com os mais diversos personagens da sociedade, e se familiarizado na ambientação da capital federal, ela agora se preparava para as “bodas de ferro” do casamento. Ela tinha plena consciência de que parte do salário de seu namorado vinha do balanço do samba canção dos compositores do troca-troca de favores e mordomias entre os poderes da República dos ditadores da democracia.
ERA ELA MULHER DE talento. Não dava ponto sem nó. Uma vez inserida nos ambientes festivos do Recife, ela aprendera como se direcionar de acordo com as tendências do momento nas quais se destacava como se fosse uma diva entre divas de famílias. Havia aprendido a interpretar a falsa eloquência vulgar das conversas de madames, de seus amantes e maridos, nos diversos dialetos das senhoras do high-Society.
A LINGUAGEM DO povo mutuamente se prodigalizava nas conversas de rua a partir das dicas dessas madames que também se influenciam de ouvido, nos dialetos populares. O país inteiro sempre viveu dessa troca de influências e vivências entre as classes que, de modo consciente ou inconsciente, sempre se mesclam em uma mesma massa mídia de mútua socialização. Apesar do distanciamento financeiro e econômico entre elas.
POR BAIXO DOS PANOS suas filhas e filhos se habituaram a mesclar de uma forma ou de outra, suas personalidades. Afinal essa aculturação vem de longe, do tempo em que as madames ainda não tinham seus cabeleireiros, manicures e pedicures. Nem faziam massagens e depilação nas academias de beleza, nos salões de Pilates onde pontificam as conversas de lavadeiras de máquinas de lavar. A Tv visão popularizou a horizontalização padronizada da cultura e da civilização massificada pela força propulsora do Inconsciente Coletivo nacional. Tv visivo.
A EDUCAÇÃO PELA TV visão é a que conta nos finalmentes do reflexo social de todos, em confronto com as misérias de uma espiritualidade que nivela a sociedade por baixo. Drogas, sexo e cancioneiros de bandas de rock e duplas sertanejas, cantores e cantoras de romances dos mais diversos e apaixonados lupanares. A cultura e a civilização dos vira-latas unidos de todas as classes sociais, dificilmente serão vencidos em sua maternal horizontalização mundializada.
EDINAH VIVIA SUA DIVINA Comédia pessoal adaptando-se ao carnaval de influências que se entrecruzavam numa barafunda de mulheres como se todas se chamassem Raimunda. Todas submissas às alegorias e simbolismos vigentes nas atitudes sociais de seus contra pares machistas. Edinah precisava ser a primeira pessoa de sua própria narrativa. Falar diretamente consigo mesma, ter independência da submissa sujeição às práticas de sodomia às quais se submetia por imposição de seu ganha pão.
ELA SE SENTIA A VIVER num mundo ao mesmo tempo mitológico, político, religioso, filosófico. Do contrário não suportaria um dia a mais de realidade. Numa selva de intencionalidades sombrias na qual tinha de aceitar conviver. As personalidades importantes da sociedade não passavam de simulações de respeitabilidade e autonomia. Os membros dos poderes se defendiam entre si em momentos nos quais eram questionados de acordo com as graves faltas de natureza político social.
OS PODEROSOS ESTAVAM sempre cercados por traidores do interesse do povo ao qual deviam responder por seus atos criminosos, mas, devido à proteção comum entre eles, sempre saíam impunes de seus crimes. Edinah infiltrara-se entre eles, bajuladores, defensores ferozes de privilégios, servis puxa-sacos de seus senhorios sociais. Ela se via perdida em meio à cobiça dessas turbas. Nesse meio tempo achou-se igual a eles.
SENTIA-SE SOZINHA, MAS protegida por sua beleza morena. O tempo chegou da aparência anciã. Com a ajuda dos cosméticos, regredia ao Narciso que fora na juventude. Seu prazer era amargo como a morte. A ele se expunha, sem sonolência, a essa sexualidade que impulsionava a própria demência. Ela comia do fruto da mesma árvore do jardim povoado das Evas dos lupanares Belle Époque da cidade.
ERA COMO SE SATANÁS se apresentasse com sua serpente disposta a penetrá-la e a submeter todos os sentidos de seu corpo, alugado para esses momentos de prazer unilateral. Ele mastigava o fruto da árvore do bem e do mal, mas sabia que dessa árvore a serpente trazia apenas os aconchegos da adversidade e da atribulação de ter os sentidos alugado por contingência das leis da necessidade de se submeter.
NÃO HAVIA NESSES momentos a presença de leis bíblicas, mas de uma sensualidade diabólica, de natureza probatória, que permitia aos seres decaídos, filhos aflitos, perdidos e abatidos pela libertinagem e lascívia das demandas de mulher. Ela nada podia, de imediato, fazer-se outra, contra as demandas da humanidade resultante da queda de Adão sugerida pela fraca inteligência e anêmica sensibilidade humana de Eva.
QUE PODERIA AQUELA mulher ancestral contra a serpente pendente do Anjo Torto que tinha acesso ao Paraíso??? Ela era produto, resultado do plano primitivo engendrado pela engenharia de colonização do planeta Terra. Ela tinha de aceitar aquele tipo de submissão. Sem ele, como poderia Ele, o Senhor dos exércitos de outro mundo, outro planeta, outra dimensão, ter a seus pés bilhões de seres conformados a essa destinação???
CRIANÇA COM POMBA — PICASSO (1901)
EDINAH FAZIA JUSTIÇA AO significado de seu nome: alegria, encanto, rejuvenescer. Se algum prazer tirava de seus programas libidinais, carnais, voluptuosos, era o de se sentir livre da companhia com quem estivera e poder encarar a possibilidade de continuar a viver a vida com as possibilidades que a ela se apresentassem. Ela não se perdia entrar na selva escura do sol negro e sem saída do animal selvagem que subscrevera em seu corpo a selvagem marca de suas taras ancestrais. Não se permitirá desfigurar-se.
A MORTE DE SEUS SENTIDOS não se permitiria conceder. Ao se lavar na água do chuveiro próximo, eis que a empatia de sua estranha e suposta dádiva escorria pelo ralo do banheiro, conduzida ao esgoto mais subterrâneo como nunca se houvesse perpetrado. Sua existência não se permitia restringir à vida mundana, ou se abrir às suas influências deletérias. Mesmo que não pudesse buscar virtudes numa cultura de submundo, tal como a cultura disseminada nas mídias sociais televisivas, ela não se deixava consumir pela metodologia erótica da Serpente.
A BARBÁRIE DA LIBIDO natural desde os idos bíblicos das cidades tomadas completamente pela escatologia bíblica de Sodoma e Gomorra, acontecia desde então como se fosse evento da história do Homo sapiens que indicou desde então a destinação final, carnal, do gênero humano. O final do mundo, do gênero, dito humano, é profetizado nas religiões a partir da compreensão da inevitabilidade desta condição de aviltamento da lascívia desse erotismo inevitável.
ELA ENCONTRAVA EM SUA subjetividade defensiva, livrar-se de suas mazelas e da crise moral que avassalava de modo imperativo as mulheres de todas as classes sociais, nivelando a percepção de si mesmas e também das demais, como se fossem personalidades robóticas da mitologia do Paraíso Perdido. Do Paraíso Perdido das mulheres, dos homens e de toda a descendência do gênero dito humano.
TODAS AS REALIDADES SE deterioram a partir dessa vivência básica, dessa escatologia dos últimos dias de Pompéia. A prática da sexualidade assimilada por todos como se fosse um conceito historicamente determinado pelo erotismo reducionista, que não pode ser conjurado pelos amantes, que se querem ativos e cativos das causas e efeitos que não podem ser exorcizados de suas tramas subjetivas na objetividade da cama.
QUEM PODERIA PENSAR-SE livre de tal prática se ela mudou toda a configuração erótica, desde os tempos idos aos dias modernos??? Agora também os homens se voltam à prática dessa modalidade de sensitividade comum, como se ela fosse absolutamente inevitável. Parece ser, nos dias de grande aflição moral dos séculos XX e XXI, uma concessão incrustrada no DNA da espécie dita humana.
COMO PODERIA EDINAH simplesmente ignorar o enunciado básico de todos os discursos eróticos praticados e disseminados também de homens para homens??? São legíveis as tendências dessa prática como se todos aceitassem-na como um sintoma verificável facilmente identificado com coisas, imagens e alegorias do fim do mundo. O fim do Homo sapiens teria nessa atividade uma característica de sua fraqueza moral e de caráter. A sociedade afirma e dissemina-a como se fosse um código de erotismo do qual não pode, de modo algum se libertar.
O SAGRADO E O PROFANO se encontram de maneira irrefutável. A máquina humana promove seu próprio sacrifício, sem que possa evitar o que se afirmou enquanto sendo inevitável. O significado desse erotismo está presente no Inconsciente Coletivo Universal, desde as mais remotas épocas. As populações cavernosas anteriores à última glaciação do planeta no Períodos Terciário Superior, há sessenta milhões de anos.
COMO UMA SIMPLES MULHER de um país subdesenvolvido, com uma educação e cultura praticamente estagnadas na Idade da Pedra Polida, poderia subtrair-se às imposições dessa civilização da Pedra Lascada, gerida por brucutus de terno e gravata borboleta, com suas práticas rituais de aberrações morais na política, na economia, nos afazeres judiciários, se nada pode escapar à Bolsa de Valores da prostituição e disseminação social da Economia das drogas e da corrupção religiosa dos pastores políticos do medo.
A OCUPAÇÃO DE SUAS REGIÕES eróticas, de seus drivers de penetração e precipitação de orgasmos dentro ou fora de camisinhas, não ultrapassava para Edinah a noção básica de necessidade financeira e econômica de sobrevivência. O aluguel de seus drivers carnais para a exploração erótica de terceiros que neles depositam os espermas no fogo do orgasmo, não dá direito à reciprocidade.
O FLUXO INTERNO DA CRIATURA que paga para nela depositar a rebeldia das trevas de seus ressentimentos, aliviando-se de suas tensões nela, através do orgasmo, como se ela fosse uma lixeira emocional, era sempre uma sensação física infernal, da qual dificilmente ela poderia livrar-se se se permitisse fazer parte dela, da satisfação sexual e da plenitude infernal do ovo e do veneno da Serpente.
CRIANÇA COM POMBA — PICASSO (1937)
A SELVA DOS VERDES orgasmos, sem saber bem como sentir quando nela chegavam, carecia de ceder à submissão. Não Sabia ao certo se um lince, uma loba, um leão ou um velho guitarrista bêbado estava a impor nela uma vontade antecipada de cicatrização. Que nome alternativo poderia conceder a quem desejava lançá-la no mundo dos espíritos aflitivos, sobejos, abundantes, que ela tinha de, por força da profissão de mãe e mulher, encarar. Uma senhora que chorava sentada à beira da cama. As motivações desse choro eu, criança, não poderia traduzir.
QUE CAMINHO ALTERNATIVO poderia ela trilhar, em sua ambição, não de bicho, mas gente humana, sem cicatrizes dolorosas e tristes??? Ela mal entrara no reino dos espíritos adultos, plangentes. Mal sabia ela o que era ser mãe. O que era estar a participar daquela arapuca??? Devia a esse reino estranho de novas assimilações, adaptar-se. Suas percepções não deveriam torná-la uma criatura a quem a própria alma se apresentaria sem alternativa de altivez no árido caminho que lhe havia imposto o mundo. Ninguém poderia viver sua vida por ela. Mas, ela tinha a frase de Madame Blavatsky a ampará-la: “aquela que faz o seu melhor, faz tudo o que se pode esperar dela". Ela haveria de fazer o melhor. O melhor para ela. Exclusivamente. O melhor dela, para mim, era ser ameaçadora.
NO MEIO DESSE CAMINHO haveria de descobrir que perdera a estrada por onde o horizonte da utopia própria cederia às vias vicinais que não desejaria seguir. Mas a trilha de cada destinação humana tinha seu próprio aferir. Quanto medo haveria de superar. Mas ela não tinha o mapa da superação de seus medos. Quantas amargas sensações de confusão e morte. Tinha de saber fazer delas uma sensação de sorte. Um estado de espírito que lhe fizesse companhia e não a abandonasse à inquietude abjeta da prostração à qual estaria sujeita na constante da voragem ofegante de cada programa, de cada amante que nela penetrasse. O marido Paizão Coisinha eram muitos. Muitas personagens.
NÃO PODERIA SUA FORÇA dominante ceder lugar ao risco não distante que poderia fazê-la afogar-se no oceano da melancolia. Talvez quisesse, mas não pudesse ser fugitiva de si mesma. Desejava honrar sua privada indignidade. Fazer do corpo lasso, após a escória do orgasmo disseminar-se nela, não se permitir sentir-se numa descida incerta, mas redescobrir-se a cada passo, leve e ligeira, a recuperar a felina redescoberta. Mas, que redescoberta, se sua intimidade estava na boca do povo, na calçada da rua???
EM CADA PRINCÍPIO SOLAR matutino, eis que o sentido do divino não pudesse abandonar sua crença de que deveria afirmar nela a estrela guia do amor sibilino, das coisas belas e sadias que fariam a alegria de seu viver. Que as feras ficassem com suas noções e discernimentos, que nela não se grudassem em estações amarelas em sua astúcia de moça mulher, não mais donzela. Ainda que fosse apenas para ela, que vencesse o leão selvagem dentro da aparência risonha e ágil da hiena. A raivosa fome que na ambição consome-se em aflições que não a constrangessem e turvassem para sempre sua vista, sua esperança, suas conquistas. Mesmo que não tivesse conquistado nadica de nada.
NÃO DESEJAVA PARA SI UMA mente na qual só lástimas e vagidos existissem. Diante de seus olhos ela saberia que não era apenas uma fenda, um buraco, onde os fracos penetrariam na intenção de anular nela sua fortaleza para, em decúbito dorsal sentirem-se fortes. Não queria ser deles uma sombra, uma agachada louvaminheira, submissa em favor de lisonjas às pessoas prósperas e influentes, mas tão pouco civilizadas. Tão pouco, tal qual ela.
SEUS SENTIMENTOS DE autoestima não eram viciosos, dissimulados nem bastardos. Precisava permanecer altiva em seus anseios. Não baixar a cabeça em vergonhosa fronte. Não teria por mestre as feras em contraponto às suas necessidades de sobrevivência. Suas carências não destruiriam o amor-próprio que se devia a si mesma. Não fariam ela tremer as pernas nas viagens selvagens que deveriam fazer. Direções e trâmites de dominação escravagista. Não a fariam morrer antecipadamente ao tornar sua natureza perversa e fria.
QUEM PODERIA AGOURAR que na terra do ter dinheiro ela não se rendesse às tábuas de galinheiro que não se saciam dos préstimos e cortejos de fêmeas, como se elas quisessem obter apenas a mortal renovada virgindade, para nela expelir a malícia tóxica e a perversidade. Nesse sítio de agonia eterna, para ela, a peçonha, não abriria as pernas para que, simplesmente, fosse fazer ficar contentes os que imperam lá, sua rebeldia de ressentimentos e leis de tormentos: os que se querem senhores de toda sociedade, irmandade e grei.
PARA QUE SE SINTAM FELIZES, semeiam o desalento nas mulheres que se vestem para os bailes virulentos, nos quais invocam a insegurança sibilante do ofídio demoníaco e manifesto no arco telúrico do luar oferecido na fresta entrepernas que a eles se oferecem. Quem poderia ir em auxílio dela, senão ela mesma e suas adentradas frestas, inseridas em hospitalares bactérias???
COMO PODERIA ELA SE RESGATAR dos homens, dos velhos insidiosos da flauta, da serpente e da guitarra física e espiritualmente devoradora da presença das leis do Senhor??? Preservar sua decência, sua dor??? A dor que fosse dela, mas ela não era mais ela. Ela, a de ontem. Como??? Se ficasse sujeita às vontades carnais e diabólicas da natureza sádica e infame do marido. Nessa sociedade a mulher já nasce no estado probatório de preparação para a sedução deles, em virtude da condição decaída descrita no princípio da Árvore do Paraíso. Nela o casal adâmico já havia dito tudo. Tudo isso. Tudo isto.
POGROM — LASAR SEGALL (1937)
OUTRO DIA INICIOU, MAS faria diferença se estivesse a terminar??? Os animais povoam a Terra com tenacidade de quem deseja apenas permanecer a viver. Viver outro dia com esforços concentrados em fazer acontecer uma guerra de inacreditável antiguidade: a guerra de todos contra todos já estava sendo escrita milênios antes de Thomas Hobbes. Batalhas que vêm de longe, muito longe. De um infinito de outras dimensões, de multiversos esses sem que nunca sejam minimamente identificados. Os poderosos que comandam os poderes da Terra.
ESSES GUERREIROS CÓSMICOS, também sob a forma de espíritos, jamais sairão vencedores uns dos outros. As criaturas existem no mundo para se oprimirem mutuamente. Tal igual aos opostos que nunca hão de parar de existir: dia/noite, sol/chuva, duro/macio, frente/verso, branco/preto, doce/salgado, alto/baixo... A guerra eterna é um caminho sem piedade. Um engenho criado por uma autoridade que não conversa com esses opostos porque sabe que foram criados para ser definitivos em seus conflitos, conflagrações, duelos, batalhas, embates.
OS HOMENS SE ABATERÃO mutuamente para sempre. São engenhos que nunca param de se hostilizar. Autoridades corruptíveis cuja virtude é o próximo passo aleatório em direção ao fim, sem outra finalidade que não seja a de continuar a confirmar a mortalidade corrompida por esperanças que nunca hão de se realizar, exceto aparentemente. O corpo do homem é adversário de si mesmo. Os ouros corpos, de outros homens, poderiam não ser adversários entre si???
O SENHORIO DOS EXÉRCITOS infinitos de espíritos não é apenas um. São muitos. Por mais guerras que façam entre si, nunca haverá um vencedor definitivo. A vitória é sempre um tempo etéreo que passa e se prepara para novas batalhas, vitórias, derrotas e continuidade sem fim de opressões que se renovam. Os que nascem oprimidos raramente conseguem reunir forças para vencer os muros que separam os que têm e os que não têm direitos. Uns lutam pelo direito de melhor oprimir os opositores que têm mais vantagens. Todos estão sempre a desejar até a última gota de sangue do inimigo vampirizado. Não há empatia com a compaixão inexistente.
EDNAH SABIA-SE DOMINADA pela violência dos opostos à sua sexualidade. Não haveria como fugir da condição de mulher que possui o tronco aberto na extremidade sul do torso. Enquanto eles, homens, possuem o instrumento de dominação externo de onde se projeta para cima quando sob excitação erótica. Dessa diferença derivam todas as agressões. O fruto da árvore está no meio do jardim: bem/mal/bem se alternam. Infinita mente de posse de todas as hostilidades.
A SERPENTE, SER SUPERIOR EM ardis e sabedoria estelar, proveniente de um multiverso ainda ignorado pelo recém-criado casal híbrido de primatas primeiros, anteriores, trazidos pelos comandos de um exército sideral, dividido pela hierarquia em luta por mais poder... Que poderia esse casal, relativamente ingênuo, fazer, senão ser usado pela poderosa secreção da Serpente??? Réptil criado antecipadamente para ser o centro da cosmologia planetária em formação. A instintiva formação, mãe de todas as demais deformações instintivas. Pulsão destrutiva sem a qual a vida inexiste.
AQUELES SERES, DITOS ANGELICAIS, vieram de distâncias incomensuráveis para semear na Terra a sensação de sensatez da proposta de povoar o planeta, fazê-lo crescer, povoar-se, crescer em quantidade: os grãos de areia nos desertos de rochas degradadas pelo tempo, senhores de todos os coveiros em universos milenares. Os filhos dela, Eva, dela Ednah, não passavam de frações, espermatozoides, sedimentos granulados arremedos quânticos, esperma com medição de 60 micrômetros (0,006 cm).
A TECNOLOGIA DE REPRODUÇÃO desses seres, assim como eles mesmos, nasceu da conjunção de um óvulo com 0,1 mm e um espermatozoide. Da conjunção dessas criações “high-tech” que povoam planetas, nasceram os filhos dos patriarcas bíblicos e se multiplicaram em geração e gerações de insensatez. Magnânimas e sombrias almas por vilezas mil acometidas. Tendo por horizonte a utopia de uma realização pessoal e social que afugentariam entre si na guerra eternas das bestas feras hominídeas das quais são criaturas híbridas. Homicidas.
ELES, ESPERMATOZOIDES, COMO se fossem partes de um exército de guerreiros supostamente disciplinados, se inseriram no corpo dela, Edinah, venceram bloqueios e objeções de prosperar no interior. De sua carne fraca. Foram entre trezentos e quinhentos milhões deles, jorrados ou arremessados em direção ao óvulo, alucinados, numa corrida olímpica em disputa da primazia pela vantagem da fecundação.
A COISA GERADA NELA, UM FETO, adaptou-se ao sítio inóspito de sua vagina tapeçada por colônias de lactobacilos que a defendiam de germes que a penetravam e nela se multiplicavam, a secretar ácido em defesa das enzimas e anticorpos. Glóbulos brancos se dispuseram a destruí-lo, tal como destroem vírus, fungos, bactérias e as próprias células dos espermatozoides.
APÓS VENCER BARREIRAS E PÂNTANOS vaginais, o esperma que conseguiu sobreviver às defesas da vagina, chegou até a parte inferior de seu útero e teve de forçar caminho no estreito canal do colo ou cérvix encontrando força no impulso para ultrapassar a tapeçaria de micro cílios que revestem as paredes do colo. Após vencer a resistência dos glóbulos brancos hostis, muitas vezes mais numerosos que os espermatozoides que chegaram até esse campo de batalha mais hostil, aquele que está mais à frente dos demais, fez desmoronar as hastes do muco e impediu, dessa forma, a infiltração dos demais espermas. “O que está embaixo é igual ao que em cima está”. O macro e o microcosmo se encontram em todos os lugares onde há convergência e divergência.
NESSE MICROCOSMO DE EVENTOS tântricos, começam as guerras no universo exterior. Elas sempre vitimizaram a humanidade. As guerras mundiais acontecem todos os dias. As principais, no século XX: 1914/18 e 1939/45. Ao reproduzir a matança de judeus em suas telas, Segall, na série Pogrom, aproximou-se da dramaticidade trágica presente nos campos de batalha e de concentração. Em Guernica a tela está coberta de cinzas após o bombardeio da cidade basca. Em Pogrom vemos o estupor, a inércia, o abandono de um povo entregue ao extermínio nos campos de matança nazistas. O terror se infiltrou em seus descendentes. As sociedades contemporâneas fabricam, todos os dias, santos ou não, os horrores nas ruas asfaltadas e enfeitadas do Natal da atual civilização.
TRÊS BRUXAS À ESPREITA — MICHAEL THOMAS (2013)
O ESPERMA “MEDALHA DE OURO” conseguiu vencer as barreiras biológicas de sexualidade Mãezona. Chegou em primeiro lugar e fertilizou Ednah. Ela queria parir uma filha mulher. Ter uma companheira do lado para tagarelar. Não um filho homem para questioná-la. Na realidade ela ainda não odiava o marido com quem se casara. Eu crescia pressionado por sua figura estranha, expressionista. Passava-me a impressão de que estava sentada na poltrona de madeira da sala, há milhares de anos. Era sua zona de conforto. Sua realidade confortável. Como se criar aquele bando cada ano maior de crianças, que ela acreditava que jamais iriam crescer.
O MARIDO ERA UM ODONTÓLOGO que exercia a profissão de dentista numa capital do interior do país. Para ele não havia mais salvação. Havia se casado com Ednah porque não se achava capaz de dar conta de uma mulher com predicados femininos. Uma mulher que fosse minimamente inteligente não lhe interessava. Seus complexos de inferioridade estavam todos à flor da pele. Um espírito simplório que não se via digno de saber tornar seu corpo e mente fortalecidos por ações de um ser humano homem, moralmente digno, do gênero masculino. A realidade do mundo em redor não lhes interessava. Nem jornal Paizão comprava para a sala de espera dos clientes.
O DOUTOR TONHO POTTER era conhecido na cidade, clinicava para o Inps. Cuidava de dentições estragadas, abcessos de gente pobre, humilde. Mas também clinicava para clientes outros que pagavam o tratamento. Costumava dá uns tapas em cigarros de maconha no consultório pegado ao quarto de dormir do casal. Despreparado para a vida conjugal, não sabia como exercer a força admirável que uma paternidade responsável poderia conceder. Os atalhos para ser um homem o fizeram fraco. Muito frágil. Atalhos por veredas vicinais de magia e drogas.
TONHO POTTER, PAIZÃO Coisinha, cheirava pó com base em cocaína, xilocaína, para adormecer a gengiva de clientes nas intervenções de tratamento de canal e extrações. Usava, ao terminar o expediente, para cheirar. Dopava-se, quando chegava a noite, sentado na escrivaninha frente à uma grande caveira que, segundo ele, pertencera a um negro de uma tribo africana. A caveira tinha todos os dentes à mostra em sadio estado de conservação. Esquelética.
EDNAH TALVEZ PUDESSE TER sido uma mulher de beleza feminil, mesmo que fosse para ela difícil mudar a aparência de madona obsessiva, o corpo ganhando corpulência, uma atitude mandona e autoritária com relação ao marido e aos filhos, que foram se amontoando todos os anos. Ela, nos finalmente de muitas barrigadas, engravidou 25 vezes. Quinze das quais abortou. As outras dez geraram seis filhos e quatro filhas. Tinha encontrado uma serventia para ela mesma: engravidar todo tempo possível. Que mais poderia ela fazer para chamar a atenção sobre si???
AQUELA UNIÃO NÃO PODERIA ter dado certo. Ele, o marido, um sujeito fracote: mente e físico. Ela, encorpando e perdendo cada vez mais feminilidade que, em realidade inexistia nela. Virou uma empregada doméstica fanática de seus deveres de café da manhã, almoço e janta. Viviam uma vida domesticada pela intolerância mútua. Os dez sobreviventes dos óvulos fecundados viviam num ambiente de progressiva instabilidade emocional. Presenciando diariamente as desavenças do casal.
NENHUM DELES TINHA A MÍNIMA noção de como seriam educados os filhos. Eles, que tiveram uma educação de grande rejeição e carências de todos os tipos, conviviam num ambiente de gradativas hostilidades, insinuações, cantorias de modinhas românticas para casais adolescentes e adultos emocionalmente sem noção. O lar doce lar era uma espécie de lupanar entre os dois aluados. Costumavam sair à noite para ir a comemorações de aniversários de pessoas conhecidas. Possivelmente traziam para dentro do quarto, na cama de casal, as personagens erotizadas dos filmes de Hollywood que assistiam nos dois cinemas frente à Praça Pedro II, principal da cidade.
AMBOS CONVIVIAM COM O MEDO que lhes crescia nas entranhas e ficava cada dia mais difícil de esconder. Medo de que a filiação crescesse e questionasse aquela educação de família das cavernas. Eram dois alguéns que descobriram, tardiamente, ser incompatíveis no convívio dentro de um mesmo espaço onde passaram a se conhecer e às suas muitas e horríveis deficiências de educação moral, de respeito próprio e mútuo. Os filhos iam empatizando toda a horrenda orgia de dissimulações que não mais se dissimulavam. Agressões que se repetiam viraram o dia a dia à moda da casa.
À SOMBRA DE UMA CONVENIÊNCIA emocional desonesta, eles iam empurrando com as barrigas as responsabilidades para com suas crias, de modo a fazê-las aceitar, a força das necessidades crescentes, o ambiente nauseabundo que criavam para os filhos, como se fosse a educação mais natural do mundo. Não era. Nem para eles.
EU, O FILHO PRIMEIRO, DANTE, nome de batismo literário neste documento em homenagem ao personagem xará. Eu, Dante, fazia por onde minha alma não fosse contaminada pelo imprudente aviltamento de minhas possibilidades de crescimento moral, físico, mental. Meu intelecto estava sendo diariamente bombardeado, fustigado pela insanidade cada vez mais descarada do casal a quem eu deveria considerar meus pais. Seus outros filhos seguiam a mesma estratégia familiar: para mim, as sobras.
FUSTIGADO PELA MODÉSTIA E pobreza espiritual do casal do qual havia sido vomitado de suas entranhas, buscava eu uma condição de adaptação, na criação de miragens que me afugentassem das bestas que me criavam para a reprodução de suas frustrações e ressentimentos. A alienação de ambos luzia em meus olhos, e nada tinha de suave ou gentil. Aquelas almas não tinham nada de cortesia. Eram ambas soberanas em covarde e perversa dominação. Como se eu fosse alguém que merecesse suas invectivas, castigos e espancamentos. Não apenas o casal: a parentela próxima e distante, de ambos os lados do larbirinto, da qual “Dulce It, A Coisa”, sua amante, Terezona Sapatão, eram apenas 1/9% do Iceberg familiar.
DESENVOLVI UM SENTIMENTO DE defecção existencial que cresceu comigo. Eu criara um mundo apenas meu, porque não podia tolerar a realidade de um mundo externo onde a soberania de uma maligna crueldade, se potencializara contra meus direitos de criança, de adolescente, de ser humano acossado por uma rejeição de pais e irmãos que não me queriam por perto, simplesmente porque qualquer investimento em mim, significava tirar o pão da boca de cada um deles. Eu tinha que vencer a intenção malévola deles em me subjugar, fosse como fosse. Eles eram os bravos covardes que existiam para liderar a família por eles gerada. Os filhos teriam nascido unicamente para servi-los. Eu não estava de acordo com isso. Eu os via em um universo paralelo que devia ser vencido.
GOLCONDA — MAGRITTE (1953)
LEGIÕES DE ÍNCUBOS tentavam inutilmente em meu cérebro se instalar. Quem sabe envolver-me em suas tramas de adamar minha masculinidade para caber na proximidade delas. Elas, as mulheres que odiavam os homens, ou a possibilidade de crianças e jovens que nasceram no sexo masculino, viessem a manter a sexualidade original. Não conseguiam. Não conseguiram. Mas elas nunca desistem de magnetizar o Inconsciente Pessoal de seus parentes masculinos, no sentido de alfenar seus corpos e mentes.
ELAS, AS QUE NASCERAM supostamente fêmeas, mas não conseguem afirmar a própria sexualidade. Precisam de companhia inteligente. São extremamente carentes de tudo e todas as coisas sensatas. Não é apenas o sexo que elas não conseguem afirmar. É também a compreensão de suas contradições, de suas vidas áridas e intempéries mentais. Elas, as que representam o personagem andrógino e desesperado de “O Grito” do pintor norueguês Edvard Munch. A profunda angústia e desespero dessas “mulheres”: elas desejam superar e nunca conseguem.
MÃEZONA ERA PARADIGMA desse tipo de desespero. Ela e “Dulce It, A Coisa”, principalmente. Um sem-número de mulheres com quem convivi na intimidade, nas quais vi crescer uma carência mórbida por companhia que lhes permitisse apresentar-se a seus grupos, familiar e social, como se fossem fêmeas, quando a feminilidade nelas praticamente inexistia. Essas “mulheres” vivem e viverão de aparência. Elas e seus namorados, amantes (se conseguirem) e seus futuros esposos e filhos. A Constituição de uma família a partir das aparências de masculinidade e feminilidade.
A FALTA DE DEFINIÇÃO de uma sexualidade que Munch tão magistralmente retratou, faz parte da existência de homens e mulheres, tal como a couraça de uma tartaruga não pode ser ignorada nela e nele. A condição de mal relacionamento entre uma mãe que não consegue empatia com um filho que ela não pode dobrar às suas exigências de querer vê-lo desmunhecar a qualquer preço, simplesmente porque não compreende que um menino pode crescer menino, se tornar um jovem mancebo e um homem, porque nunca viu um homem em sua família, ou na família do marido, crescer sem ter relações de sexualidade ambígua e de sensualidade sodomita.
TALVEZ A IMENSA ONDA tsunami que arrebatou a sexualidade de meio mundo para a condição de lascívia, libertinagem e luxúria, cantada por Bob Dylan, que se espalhou como uma se fosse um vírus de uma peste gay muito mais mortal e assertiva que o Covid-19, ainda não foi assimilada pela ciência e pelas artes de modo mais esclarecedor: “a estrada é pra você/E o jogo é a indecência/Junte tudo que você conseguiu/Por coincidência...”. Eu me senti várias vezes como se fosse o namorado que já vai saindo fora levando os cobertores... E Agora??? O casamento e a instituição família não podem superar a condição de extrema tensão, medo e ansiedade de pessoas mergulhadas num estado emocional de mútua percepção de seu descontrole clínico. Emocional.
DEPRESSÃO, ANSIEDADE, PÂNICO, transtornos psicológicos de sintomas acentuados de esgotamento físico e mental extenuantes. Crises de ansiedade, pensamentos negativos, insônia, dores de cabeça, inquietação, sensação de sufocamento, dores no peito e na coluna, batimentos cardíacos sem controle... Neuroses, psicoses: pânico. O querer libertar-se desses sintomas, muitas vezes provenientes de uma sexualidade indefinida, provoca a premonição de um feeling que vivencia a aflitiva sensação incômoda de uma perturbação que não vai ter fim. A superação dessa condição existencial, constitui a base piramidal da existência, consciência e inconsciência humana.
MEUS TIOS POR parte dela, a quem eu deveria chamar mãe, tio Nenê e a tia Acássia, eram mostra de que nem tudo estava perdido ao meu redor. Nem todos polarizavam contra minha tentativa de existência fora desse determinismo insano da espécie Homo sapiens. Eles pareciam saber que eu estava devida a pobreza de recursos do casal, e a quantidade de filhos à qual todos os anos se somava mais um, sempre pressionado à aceitação do mínimo necessário à minha educação. Minha sexualidade era também prejudicada.
EU NÃO PARAVA de reclamar a falta de recursos para minhas necessidades de crescimento. Enquanto eles, a quem eu deveria considerar pai e mãe, não paravam de me saturar de inumeráveis tentativas de idiotização. Os espancamentos eram constantes e visavam fazer com que eu me subordinasse de uma vez por todas a todas as suas inumeráveis incongruências. Faziam questão de me mostrar todos os dias que eu estava sobrando nos planos deles de “educar” o restante dos filhos.
INSISTIAM SEMPRE QUE eu tinha obrigação de me sacrificar por eles. Que qualquer migalha que jogassem sobre mim significava tirar o pão da boca dos demais. Era como se jogassem sobre mim a responsabilidade de alimentar seus demais filhos que eram deles, não meus. Não paravam de me acumular da responsabilidade de suprir as necessidades básicas deles, como se eu fosse o responsável por tê-los feito nascer.
EM VERDADE EU não passava de um menino que era visto e usado por minhas parentelas próximas, irmãos e irmãs, para as quais eu deveria ser submisso e me sacrificar por eles, demais filhos e filhas deles, como dizia sempre aquela mulher autoritária a quem eu deveria chamar de mãe: “você deve ter orgulho de se sacrificar por seus irmãos”. A loucura dela eu deveria aceitar calado, porque senão, haja tapas na boca e ameaças de “vou dizer a seu pai que você está me faltando com o respeito”. Isso significava espancamentos: murros, tapas, surras de cinturão ou corda: e o que mais estivesse à mão.
EU DEVERIA CONSIDERAR irmãos e irmãs aquelas criaturas que me cercavam de interesses que não eram meus. Inventavam malfeitos que não eram meus. Criavam uma realidade que permitisse a Paizão Coisinha me hostilizar mental e fisicamente. Realidade que dava à Mãezona motivações de me acusar de malfeitorias que justificassem minha falta de recursos, tirados de mim, de minha educação, para dá às demais deformidades da grande família, alimentação, vestimenta, e investimentos em educação que me faltavam.
PAIZÃO COISINHA NÃO poderia, de jeito nenhum, continuar fazendo o pinto subir depois de um dia estafante de trabalho árduo no consultório de dentista, pegado ao quarto dele e dela, sua mulher e mãe de seus filhos e filhas. Dormir ele mal conseguia devido a excitação emocional causada pela droga. Sua sexualidade era dia a dia mais carente e castrada pela sobrecarga de trabalho no consultório dentário. Ter mais um filho ou filha todos os anos, após um período de nove meses, era para aquela mulher, a quem eu deveria chamar de mãe, uma rotina sob a qual ela pretendia esconder sua falta de tino e esterilidade mental que lhe permitia desenvolver uma crueldade sem precedentes. Uma crueldade que certamente vinha de milhares de encarnações das quais ela se orgulhava.
A VERDADE É QUE, APESAR dos esforços dela em bater gemadas de madrugada, não surtiam elas mais nenhum efeito na sexualidade extenuada do marido que ela conseguira castrar: física, moral e mentalmente. Os filhos, sem pai nem mãe de Mãezona e Paizão eram pintos de galinheiro que ela, a grande galinha mãe, a grande e promíscua carpideira de reclamações e acusações ao marido. Mar ido que não mais podia desdobrar-se em trabalho escravo para ela pousar de mulher necessária à criação e educação dos filhos, segundo os padrões, que, segunda, ela, tinha sido educada. O pinto de Paizão nunca mais piou de galo. Mas a galinha Mãezona se tornava um modelo de atenções aos familiares.
ELA, COM CERTEZA, É A Mãezona de toda aquela chuva de homens idênticos usando chapéus cocos, vestidos de modelos escuros de vestimentas, padronizados pela cultura do consumo. Flutuando que nem balões, estacionados no ar antes de chegarem à Terra, de céu parcialmente nublado, habitantes de prédios com telhados vermelhos sobre os quais choviam como se gotas de uma tempestade interminável de pessoal de empresas, gerentes de instituições, projetistas de políticas estabelecidas para supervisionar os trabalhos de outras multidões de seres tempestuosos, trabalhadores rotineiros, certamente provenientes das nuvens. Com projetos seguramente de orçamentos secretos, de uma governança nada democrática.
REPRESENTA ELE, ESSE casal paradigma da cultura familiar nacional dos pequenos burgueses eleitores, a herança genética da etnia proveniente de três raças: branca, negra e indígena. Os costumes e a linhagem de uma civilização fadada, felizmente, à extinção.
O “ORATÓRIO DO DEMÔNIO” — FARNESE DE ANDRADE (1976)
O QUE PODERIA fazer uma criança contra adultos e familiares que a mantinham sob constante ameaça e radical manipulação??? Que mãe se prestaria ao papel de uma madrasta tão perversa e senhora de si??? Não quero falar do tipo de educação que ela dispensava ao todo familiar. Isto porque o todo familiar é quem deve se manifestar sobre a educação deles, não eu. Eu me manifesto no que me diz respeito. Por necessidade de argumentação, emito opiniões sobre o coletivo familiar.
AS CRIANÇAS ESTAVAM terminantemente proibidas de crescer intelectual e emocionalmente. Ora, se eles não cresceram a emoção original, legítima, por que haveriam de fazer crescer um intelecto que desconheciam a existência??? Amadurecer significava uma ameaça para ele, Paizão, para ela, Mãezona. Tinham de, a qualquer custo, fazer os filhos ficarem para sempre adormecidos na condição infantil. A natureza do crescimento possui suas próprias leis. Se despertassem a consciência para as barbaridades de que eram vítimas, a filiação, com certeza estaria a reivindicar direitos a um educandário familiar de verdade. E a internação deles num manicômio.
COM A MULHER DE PAIZÃO Coisinha não havia conversa possível. Diálogo era algo que ela tinha por injustificável. Ela os havia parido e dizia estar educando os filhos conforme a mãe dela a educou. Mas, que educação poderia fornecer uma velhinha que terminou seus dias fazendo cocô na cama e comendo pão seco com café??? Que dizia ela, minha avó materna, ao me ver sendo massacrado física e mentalmente por uma soberba carência de recursos??? À vista de todos, eu estava sendo desprovido do mínimo e do muito pouco. Com tão escassos recursos, como poderia eu agenciar meu crescimento físico, moral, intelectual???
A BOA VELHINHA, vó materna, na residência da qual eu convivi quando fazia o segundo ano do curso comercial, em Fortaleza, dizia a mim, em tom lamentoso, de quem estava a compreender que eu não poderia crescer tendo uma mesada que mal dava para cobrir as despesas com pagamento de mensalidade e condução de ida e volta ao colégio: “a Edinah nunca teve olhos para ver os filhos, você é o mais abandonado de todos, ela só tinha olhos para ser a puta de te teu pai. Tudo que ela queria na vida nunca foi mais do que ser a marafona do Tonholins”.
FICA CLARO QUE a mãe dela, minha avó, não aprovava o estado de carência exacerbada com que eu vivia tentando sobreviver com o mínimo dos mínimos. O hipnotismo da voz dessa criatura das trevas, desse espírito das sombras, que eu deveria considerar minha mãe, era constante, diário. Ela me impunha um estado de inconsciência deliberado. Focava minha atenção no que ela dizia, como se o que ela dissesse fosse inquestionável. E se eu ousasse objetar, replicar seus argumentos com a defesa de minha educação presente e futura, ela ficava afogueada, a face transtornada de raiva. E as ameaças saiam fáceis de sua boca em face psicótica, inquieta, aflita, estressada. Ela, máquina de produzir em série pequenos e indefesos escravos: a glória de sua perversa e milenar maternidade.
HÁ A LUTA QUE não arrefece de intensidade entre seres humanos. Luta representada pelas cenas nas quais Herodes e Pôncio Pilatos atuaram contra a valência da ética existencial de Jesus Cristo. O primeiro, ao tentar matar a criança Jesus Menino recém-nascido. O outro, Pôncio Pilatos, ao entregar o homem Jesus aos PMs do Império Romano para que o torturassem e crucificassem. Em Lucas, 8:19-21 podemos ler: “minha mãe e meus irmãos são os que ouvem as Palavras de Deus e as põem em prática”. Certamente as palavras com que ela me educava não provinham de Deus. Mas de seu opositor.
AREDITO QUE, DE alguma forma o DNA daqueles governantes romanos se fazia presente no DNA de Paizão e Mãezona. Jarros com formato ao estilo romano estavam presentes em áreas da casa onde ele plantava um jardim que se estendia pelos espaços abertos da casa. Paizão, a mim parecia estar sempre em outra dimensão do Tempo. A doença da insatisfação, da irritação, nele estava continuamente presente. Por razões bem compreensíveis: alteração hormonal, desequilíbrio orgânico e estresse mental devido às misturas de lidocaína com cocaína e outras químicas de consultório, acrescidas da estafa física à qual a mulher o submetia, sobrecarregando-o de um filho a cada nove meses.
O EXCESSO DE trabalho ao qual era submetido pela estratégia de Mãezona em fazê-lo estar sempre deprimido e voltado a afazeres repetitivos, cansativos, para alimentar, educar e investir na sobrevivência da prole. Ele havia sido escravizado sadicamente pela mulher com a qual tinha de conviver. Seu comprometimento com ela e as crias por ela paridas, não tinha retorno. Paizão nunca estava em harmonia com as pessoas ao redor. Seu plano familiar me incluía apenas como uma futuro possível Pablo Escobar nordestino. Ele e seus amigos do tráfico tramavam a estratégia de me usar. Usar minha revolta contra essas condições familiares infames, contra os espancamentos, contra as necessidades sempre crescentes de recursos para financiar minha educação.
ACREDITO QUE Paizão vivia e convivia também com personagens de outra dimensão. Outra dimensão do Tempo. Ele não tinha uma percepção adequada e realista do dia de Hoje, Aqui, Agora. Era como se uma confraria secreta de espíritos de outra época tivessem se encontrado ou reencontrado na comunidade perversa da sociedade de Theresienstadt. Espíritos que tinham convivido na época dos Césares romanos e de governantes tipo os citados Herodes e Pôncio Pilatos. Eles desejavam repetir as crueldades dos governantes romanos de há dois milênios. Eu era o Cristo deles e ao mesmo tempo o “Bode Expiatório”.
DE ALGUMA forma que a civilização atual desconhece, essa concentração de espíritos de intencionalidade supremacista. Eles se reúnem em outros espaços e tempos para continuarem a investir em seus projetos de dominação: talvez esses espíritos migrem de corpos antepassados investidos da corporificação sicária, cangaceira, que habita o universo, presente em todas as classes sociais, desde tempos muito antigos. Eles não são habitantes apenas deste planeta, são habitantes de universos e multiversos que desconhecemos. Esses mundos multiversos são interdependentes e interativos entre si. Eles produzem semelhantes tipos de cultura e história. Há quem diga que demônios não existem. Charles Baudelaire afirmou: “o truque mais astuto do diabo é convencer-nos de que ele ineiste”.
ESPÍRITOS MIGRAM de mundos em mundos. Alguns grupos deles conseguem permanecer num mesmo mundo e migrarem para outros tempos nesses mundos semelhantes. Unidos na intenção nefasta de causar aflição para os pequenos e indefesos corpos de recém-nascidos, os quais desejam exercer comando, comunicação e controle em benefício próprio e de seus comparsas e cúmplices. A tecnologia dos espíritos não está ao alcance da nossa tecnologia. Mas de interesses políticos e econômicos de dominação, comunicação e controle das gerações provenientes da máquina robótica de produzir organismos recém-nascidos em série. Mulher é linha de montagem.
ESPÍRITOS TÊM método. Mãezona e Paizão Coisinha agiam conforme uma metodologia, creio que muitas vezes milenar, de subordinação de corpos recém-nascidos e de crianças, causando neles condicionamentos associados à libido e a seus interesses. Apropriam-se do tempo infantil em que as crianças são conduzidas por seus condicionamentos lesivos, para continuarem essa dominação no futuro de suas vidas, a partir da intencionalidade antiga, pregressa. De intencionalidade solidária entre si.
ESSES ESPÍRITOS veem nas crianças que nascem, uma ameaça a seus projetos de continuidade de dominação e convivência de poder. Como eles conseguiriam esse intento nefasto, macabro, sinistro??? As gerações deles provenientes eles frustram o desenvolvimento mental no presente, para que repitam o futuro deles. Vejamos:
PAIZÃO COISINHA costumava aproximar-se do berço do recém-nascido de sexo feminino estalando a língua, balbuciando um palavreado de sons ininteligíveis, próprios de um velho gagá que ainda, cronologicamente, não era. Ao mesmo tempo ele friccionava a pequena vagina da criança do sexo feminino. Aconchegada ao berço, ela em princípio sorria. Talvez prevendo o mal que estava sendo feito, em seguida começava a berrar, como que, em desespero, pedisse socorro para se livrar dos artifícios infames e um macróbio antediluviano com a mente deteriorada pelas drogas e a infame intencionalidade que elas lhes provocavam.
A MESMA COISA se repetia quando Paizão, na rede de tucum da sala, acariciava a xaninha das filhas já crescidas, em seu colo, enquanto o pinto se ouriçava no fundilho do filho que estivesse sobre sua genitália. Paizão representava um espírito maléfico, sodomita, que era solidário a outras centenas de espíritos com propósitos semelhantes, que atuavam nas igrejas católicas e outras igrejas, fazendo valer a confraria de padres e pastores e outros demais religiosos dedicados a fazer valer suas taras de pedófilos. Esse é um dos muitos campos de batalha da guerra entre gerações: o suposto “lar doce lar”.
EU BUSCAVA UMA explicação para o comportamento dela e do marido. Poucas as vezes que o vi reclamar da disposição da mulher em piorar as condições de sobrevivência familiar, ao parir todos os anos, uma boca a mais para alimentar, vestir, promover escolaridade elementar. Ela, sempre a se fazer de mal-entendida. Defendia-se dizendo que o Papa de Roma condenava o uso de preservativos. Ela queria ter filhos e dizia sempre e raivosamente: “quantos mais melhor”.
“POR MIM, — DIZIA ela com voz alterada e enraivecida — eu não teria abortado nenhuma vez e teria tido os vinte cinco filhos dos quais fiquei grávida”. Ela era uma potência de fazer os filhos nascerem todos, se todos vivos, para serem educados por sua potência lamuriosa e materialmente miserável, concedida por seu espírito mal, que, com certeza, queria se vingar da educação que teve dos pais que não lhe deram oportunidades e conforto. Ela queria porque queria fazer o mesmo com os filhos. Quantos mais, maior a vingança por suas próprias dificuldades quando criança e adolescente. Ela amava a miséria familiar que só aumentava, porque há milênios nela era viciada. Sem a miséria da prole, como ela poderia mostrar-se uma boa e dedicada mãe???
ELA TALVEZ SE achasse uma deusa parideira que tinha o poder de dar vida a crianças que queria, no final das contas, maltratar. Talvez só quisesse enganar e a todos que a cercavam. Era sua maneira de dizer que era mulher, quando na realidade de seu físico graúdo, encorpado, corpulento, parecia uma antiga madona raivosa, autoritária, sem nenhuma feminilidade à vista. A vida familiar, por mais desastrada ficasse, tinha de ser conforme ela queria que fosse. Afinal, quem ficava grávida e paria era ela. Ela a deusa mãe de toda a criação da ordem familiar e social das cavernas. A conexão comigo tinha por gatilho a necessidade e o sadismo maternal: mãe nunca deve ser quem causa dor, mas quem age no sentido de parar a dor.
NOITE CONSTELADA SOBRE O RHÔNE — VAN GOGH (1888)
UM ESCRITOR, PRESUMO, quando estimula a memória sabe, se for criterioso com o que fornece em termos literários a seus leitores, que precisa afirmar as verdades com as quais transmite aos leitores suas considerações literárias. Não poucas pessoas escrevem, mas poucas se fazem ler. Acredito que se precisa escrever para si mesmo. Se o autor fala honestamente consigo mesmo, pode transmitir essa veracidade aos leitores.
JOÃO CABRAL AFIRMOU: “escrever é estar no extremo de si mesmo”. — “Para mim escrever é metamorfosear minhas forças em frases”, no dizer de Joseph Conrad. Machado de Assis nos lembrou que escrever é contar a história toda: o bem e o mal. Essa história, nos afirmou ele, me vai lembrando e convivendo comigo na construção ou reconstrução de mim mesmo. Aprendi com um sem-número de escritores técnicas narrativas de pesquisar e achar minhas verdades. Por vezes a vida nos faz delas esquecer.
SE VOCÊ NÃO lembra de si mesmo, como poderia falar ou escrever sobre suas verdades??? Mil histórias nos entrelaçam nos mil caminhos que se bifurcam. Somos formatados por nossas experiências, quer tenhamos ou não consciência dessa formatação. Muitos de nós desistem do autoconhecimento. Por quê??? Porque o autoconhecimento exige que sejamos honestos consigo mesmos. E é muito difícil, exige muita coragem a uma pessoa, qualquer pessoa, ser honesta consigo mesma. Parece fácil, mas não é.
TEMOS DE LEMBRAR de nós mesmos em momentos muito distantes e difíceis. Quando saí das entranhas da mulher que me pariu, minha regressão revelou que fui expelido, vomitado de seu canal vaginal. Acredito que todo recém-nascido abre os olhinhos apavorado com a descoberta de que, agora a contagem de tempo começou realmente. “Estou, em parte, por minha conta”, talvez todo bebê perceba essa verdade primal, esse grito primal e transmita isto no vagido dele mesmo que o apavora.
NASCER NUM MUNDO inóspito e logo assustar-se com a parteira que o pega em suas mãos, o levanta até a altura dos olhos e lá está ela sorrindo. Que diabos é aquilo??? Aquela coisa sorrindo diante dos olhos e da expressão muitas vezes aterrorizada do ex-feto, segurando a criança entre as mãos. Ela me conduziu à uma bacia de água morna e me limpou dos resíduos advindos da bolha de líquido amniótico da mulher que me carregou nove meses no ventre. A mulher que seria minha mãe. Quem quer que fosse ela.
QUEM QUER QUE fosse ela, a parteira, após conduzir-me delicadamente para dentro da água na bacia, suas mãos deslizaram sobre meu pequeno corpo sujo de vérnix, verniz da substância esbranquiçada, gordurosa e melada do sangue misturado à água, aos lipídeos e proteínas que se grudaram em meu corpo desde o 3° trimestre da gestação, pelas glândulas sebáceas do feto. O útero é um local de baixa oxigenação e minha cor era arroxeada por causa disso. O sangue da placenta, aderiu ao cordão umbilical, e estava euzinho sendo limpo da cera grudenta, semelhante a um grande queijo, no qual eu me achava completamente envolvido.
PERCEBI QUE A mulher que me limpava com parcimônia não era uma ameaça, e logo parei de choramingar aos berros. A parteira conduziu-me aos braços daquela a quem eu deveria reconhecer como mãe. E logo notei a decepção em seus olhos ao ver que eu não era a menina que ela queria por filha e companhia. Euzinho, mal havia nascido e já percebia a rejeição mal disfarçada nos olhos dela. Intuí a hostilidade tácita e ao mesmo tempo furtiva no olhar frigidamente maternal dela.
EUZINHO SORRI PARA ela de volta ao sorriso dela. O ambiente que me envolvia era, de algum modo, hostil. E eu estava longe de saber explicar porquê??? Meu espírito logo buscou a quem recorrer para me salvar daquela conjuntura e me conduzir a outro lugar onde pusesse ser melhor aceito, tão patente a rejeição dela para mim. Talvez outras pessoas no quarto que assistiram ao parto tivessem também notado. A parteira eu sei que soube detectar a frustração daquela que terminava de me expelir do ventre.
PARA ME DEFENDER, eu não parava de me extasiar com as novidades do ambiente e a luz, para mim intensa, que vinha de uma lâmpada no alto e no centro do quarto, nublava meus olhinhos. Não havia nada que euzinho pudesse fazer para me livrar da pesada carga astral materna que me deu as boas vindas com um sorriso mal disfarçado de veto e repulsão.
A CONFIRMAR MEU horror e minhas primeiras apreensões, eis que surge a figura decepcionante e patética da criatura que deveria ser o pai da criança. Por mais que buscasse nele alguma empatia em profundidade, via nele uma sensação contrária às minhas expectativas e propósitos. Erra quem acredita que um recém-nascido nasce ignorante de tudo em sua volta.
HAVIA EU NASCIDO numa com figuração familiar diversa da que poderia ser uma outra configuração na qual eu me sentisse bem, ou pelo menos melhor??? Em minha defesa, que poderia eu fazer senão sorrir, sorrir, sorrir e chorar, chorar, chorar. Quanta adversidade e carência por empatia. Quem no grande oceano estelar do universo além daquele quarto, daquela casa, seria responsável por tamanho erro astral de perspectiva???
EU DEVERIA MESMO estar a me sentir bem com aquelas pessoas ao redor que não sabiam disfarçar a emissão de suas frustrações em minha direção. Eu havia nascido em meio à hostilização de pessoas que não estavam satisfeitas com elas mesmas: com o que haviam conseguido em suas vidas até aquele momento. Eu buscava alguém que me pudesse proteger delas, mas quem??? Eu poderia ser salvo do convívio daqueles hominídeos??? Daqueles primatas que mal tinham saído de suas primitivas cavernas???
A MULHER QUE CHORA — PICASSO (1938)
EUZINHO NÃO PASSAVA de um recém-nascido, mas intuitivamente me perguntava se havia ou não um jeito de ter nascido noutro lugar, que não fosse habitado por criaturas essas de antiga, passiva e troglodita compleição milenar. Futuramente me perguntaria se, em algum lugar do universo, teria acontecido um erro de avaliação, e teriam mandado a Cegonha para o lugar errado. Na família errada, no país errado, no planeta equivocado.
ESSA CONFIGURAÇÃO DE lugar de nascimento não poderia estar certa. Perguntava-me quantos espíritos encarnados nesse plano planetário teriam tido, ao nascer, essas semelhantes percepções de estar num lugar no qual a hostilidade fosse tão manifesta e contrária às possibilidades de o corpo crescer e se desenvolver em espiritualidade. Em racionalidade. A apropriação de minha pessoa por eles era intensa. Como se eu estivesse sendo ininterruptamente solicitado e absorvido pela vontade deles em me capturar, aprisionar e reter neles. Na mente deles. Sentia-me intensamente vampirizado.
HAVIA NASCIDO HÁ tão pouco tempo, e já me preocupava com estratégias que teria de criar para escapar das garras ferinas daquela turba disposta a me tornar um transgressor das leis da moralidade universal, das mais legítimas possibilidades de desenvolvimento físico, mental, intelectual. Entre um futuro escritor de textos de literatura local e nacional, aquele casal e sua filiação me queriam como um novo Pablo Escobar. O tráfico de coca e outras drogas, para a família era muito mais conveniente e lucrativo.
CERTA VEZ, ALGUM tempo muito depois, quando eu já havia chegado à idade adulta, sonhei com uma cidade muito antiga. Parecia-me uma grande necrópole com túmulos enormes, talvez egípcia. Havia cinco partições retangulares na tampa de um jazigo enorme. A cobertura da cripta havia sido deslocada e estava de pé à direita e na parte superior do mausoléu. Eu olhei em sua direção e a vi, aquela Coisa que devia ter sido minha mãe, como se fosse uma aparição na tampa da tumba.
A SENSAÇÃO DE contemplação de uma força sobrenatural. A estampa estava meia que translúcida. Mas suas feições eram identificáveis, assim como a sensação emocional que transmitia, como se fosse ela se identificando a si mesma. Ela, ao mesmo tempo uma pessoa de pé e simultaneamente uma extensão da vedação do sarcófago. A figura espantosa se desvaneceu. Ela, a tampa da tumba e o seu conteúdo. Simultaneamente.
TENHO A IMPRESSÃO de que tudo que ela queria de mim era a submissão. Como se alegasse que havia me parido, me carregado nove meses em suas entranhas, gestação e parição. Ela me cobrava esses seus cuidados. Por isso achava que eu deveria seguir todas as suas projeções sobre meu futuro e minhas vontades. Anular-me. Eu, agora desperto, memorizei-me criança, aconchegado entre suas pernas que pendiam de um assento comprido de madeira polida que ficava na sala de jantar. Salto repentino entre duas dimensões diferentes no tempo.
O DESPERTAR DO quase pesadelo me trouxe à tona a memória de uma das muitas canções que ela costumava cantar durante suas sessões de enlevo, durante as quais parecia embriagada por memórias muito ancestrais: “lagarta pintada/quem foi que te pintou/foi a velha cachimbeira/por aqui passou/no tempo de areia/fazia poeira/puxa lagarta/por essa orelha”. Ao fim da cantiga ela puxava para baixo muitas vezes o lóbulo de minhas orelhas.
EU ME LIBERTAVA dos puxões de orelhas, dos “cascudos” que haviam se tornado doídos. Se não me afastasse, talvez ela ficasse puxando ainda por algum tempo, ignorando que as “caçoletas” doíam. Eu tinha a impressão de que tudo nele, Paizão Coisinha, e nela, estava contaminado por uma vontade de dominação do meu direcionamento futuro. Como se soubessem o que era melhor para mim, independente de minha disposição de ânimo e de minha vontade.
ERA COMO SE ambos não quisessem que eu exercesse minha liberdade. Respeito próprio e mútuo não exercitavam para comigo. Nem com relação a eles mesmos. Tinham em relação a mim a consideração que um gerente de creche dedica às crianças. Eles mesmos não eram mais que crianças crescidas, na creche do “faz de conta que somos adultos” e temos todos os direitos sobre sua pessoa. Não adiantava a mim me debater. Era Como se estivessem a dizer: “
— ““É fácil, moleque, te dominar. Você não vai escapar de nosso alcance. Do alcance de nossas mãos. De nossa dominação. Você é só uma criança indefesa. Temos a faca na mão e o olho no queijo. E o queijo é você. Não adianta nem tentar escapar da fronteira que estabelecemos para você. Esse muro é muito alto e você muito “baixinho””.
TALVEZ ACREDITASSEM poderia eu ser um Golem conformado, um boneco vodu de suas intenções, as mais nefastas. Trazido ao convívio deles das entranhas de suas vontades delirantes, para a realidade da satisfação de suas expectativas sádicas de me reter para sempre na rede de intrigas que se desdobravam em minha direção, não surtiria efeito sobre minha vontade pessoal. Minha percepção era a de que queriam me usar para suprir suas necessidades materiais. E a de seus familiares.
NÃO SABIAM COMO ganhar dinheiro para o conforto familiar. Pertenciam talvez a uma sociedade secreta que, através da tortura, do impedimento de meu desenvolvimento natural, pudessem fazer com que eu extrapolasse minha revolta contra essa dominação familiar insana, num palanque político que me fizesse, através de meus manipuladores, obter poder representativo que favorecesse a todos eles. Tio Nenê costumava me dizer:
— “Para eles você é uma experiência que não deu certo”.
RESPEITO PRÓPRIO E mútuo de há muito os havia abandonado. As hostilidades eram diárias. O fato dele cheirar coca que me mandava buscar na farmácia do Tomazinho e de vez em quando dá uns tapas numa cigarrilha de maconha, quando a mulher, apreensiva, costumava borrifar desodorante ou espalhar talco na sala de espera vazia do consultório nas madrugadas insones ou no quarto de dormir contíguo, quando a filiação estava a dormir e eles poderiam, sem testemunhas, mergulhar no vício das drogas. Por veze eu despertava e me aproximava do ambiente defumado com odor de maconha. Quando descoberta minha presença próxima, Mãezona impetuosa e frenética berrava que eu deveria imediatamente voltar para a cama.
— “Vai dormir, menino, isso são horas de criança está fora da cama. Já devias estar no terceiro sono. Vai, vai logo passa”.
PAIZÃO COISINHA não tinha maturidade para lidar com os efeitos dessas drogas, mas as consumia de forma irresponsável. Entre eles não havia amadurecimento de razões e intenções familiares. Era como se não estivessem nem aí para o futuro da filiação. A trágica exacerbação, melhor dizendo, exasperação dele ao contestar verbalmente nela, a disposição de parir um filho atrás do outro, uma boca a mais para alimentar a cada nove meses, numa família já depauperada de recursos, o fazia reclamar, chamando a atenção da barriguda para o fato de que ele não poderia dar conta de mais despesas.
— “Eu estou exausto, não tenho condições de fazer outra coisa senão trabalhar mais até me exaurir. Se continuar assim, vou te abandonar. Vou exercitar minha profissão em outro lugar onde possa ter algum descanso”. Mãezona não estava nem aí. Sabia que ele não tinha coragem de agir conforme falava. Nessas ocasiões de crise mais intensa, ela chamava o tio Nenê. Depois de uma conversa ela voltava a parir umas e outras vezes.
A FAMÍLIA CRESCIA em quantidade à revelia das necessidades que se acumulavam cada dia mais e mais. Eu, sendo o primeiro de dez filhos vivos, buscava compreender os argumentos irracionais dela ao dizer que o Santo Papa não admitia que as mulheres abortassem, ou usassem esquemas artificias para não engravidar. Esse não era um argumento válido. Ela, em meu modo de ver, não tinha religião nem muito menos fé. Exceto na própria alienação. Certamente queria esconder a falta de todos e de si mesma: a falta de inteligência e feminilidade das quais era biologicamente carente.
RODA INFANTIL — PORTINARI (1932)
CRESCIMENTO MESMO, sem ser o físico, inexistia. Nem intelectual, emocional nem espiritual. A parte interna da personalidade estava estagnada. Havia a volta ao mesmo lugar no qual a possibilidade de evolução mental esbarrava numa espécie de arrecife onde todos ficavam, náufragos, sem possibilidade de analisar espaços adiante um palmo do nariz. Espaços de ganho em conhecimento, sabedoria, ciência, cultura.
DESEJAVAM TALVEZ que outros educassem seus filhos porque, eles mesmos, não se haviam educado, nem tiveram alguém que soubesse orientá-los. Nada era responsabilidade daquela mulher perdida no tempo e no espaço. Seu espírito era completamente desnorteado. Espírito é energia. Energia emocional. Energia transmitida por fótons??? O fóton é indiferente à interação eletromagnética. Viaja mais rápido do que qualquer outra partícula. O autor chama o leitor a especular: aceitemos o fato de que somos seres de luz. Quanto menos luz, menor a consciência.
A LUZ É FORMADA por fótons. Um fóton é um “fardo” de energia que transporta certa radiação eletromagnética. Paizão e Mãezona tinham perdido a consciência do que significa ser pai e mãe. Para eles valia tudo para continuar mais um dia fazendo de conta que eram pai e mãe de família. Não eram. Não sabiam gerir a economia, a cultura, a moral, a educação intelectual da prole. Se não tiveram essa educação e cultura, como poderiam transmiti-las???
PERDERAM-SE DE SI mesmos Como poderiam transmitir segurança aos filhos se não tinham confiança neles mesmos??? Restava-lhes impedir-me de crescer. Meu crescimento intelectual era um perigo para o caos gerado por eles. Não tinham força emocional para criar condições de educar. Era incompreensível para eles que eu, tendo sido gerado da bagaceira do esperma e do óvulo deles, pudesse querer algo diverso de suas limitações. Tinham raiva, e demonstravam isso, por eu querer realizar meu potencial literário, criativo. Não aceitavam eu querer ser eu, e não uma cópia de suas limitações.
SE EU PUDESSE alcançar um estágio intelectual mais adequado às possibilidades naturais de meu intelecto, eles se sentiriam rebaixados na atuação de pais. Na avaliação deles, poderiam ser humilhados por seu próprio filho diante da plateia para a qual atuavam: seus vizinhos, as empregadas domésticas, a prole que se auto-observava. Eu, ainda que muito jovem, estava sendo pressionado cavilosamente, ardilosamente, por ela que queria manter-me num estado de penúria física, uma pedra bruta na qual ela pudesse sempre praticar sua nefasta e paupérrima empatia de mulher que cursou, quando muito, o segundo ano ginasial.
ELA TINHA REALIZADO o feito de se casar com aquele sujeito, Paizão desavisado, para dele se aproveitar, por ser tão bronco quanto ela. pudesse ser tão bronco quanto ela. Ou mais. Cultura escolar não quer dizer muita coisa. Mas ela valorizava sobremaneira a própria ignorância emocional. Uma mãe que sempre se recusava ter mínima empatia com um filho, não merece essa designação. Não é mãe, é bruaca, jararaca, mariposa, megera, canhão. Tio Nenê certa vez me disse:
— O que teus pais querem é se preservar de tua proximidade. Eles não têm planos de te aceitar. Você quer ir morar em São Luís, na casa de seus primos e de seus tios??? Lá você vai sentir-se melhor, mais em casa.
MÃEZONA TINHA um tipo de energia cativante. Por mais perversa que fosse em suas intenções de me travar o desenvolvimento, seus fótons de luz brilhavam quando queria enganar e transmitir um efeito de afeição e amabilidade.
— “Quem com suas boas Marias faz, em sua casa está em paz”. Ela não queria me perder de vista. Não admitia que um filho dela pudesse se afastar de sua proximidade, com ou sem seu consentimento. A conversa que tive de ir para São Luís com tio Nenê, não teve futuro. De repente, não mais que de repente, ela estava a me acariciar, coisa que nunca fazia, e a dizer que mãe e pai, por pior que fossem (ela movia nervosamente as mãos, como se estivesse querendo amarrar os dedos) são insubstituíveis. Dizia que parente, por melhor que fosse, não substitui os pais e os irmãos com quem eu já estava habituado.
TIO NENÊ SÓ conversava comigo quando nenhum deles estava por perto. Mãezona era intensamente vigilante em seus domínios. Eu, apesar de saber que o larbirinto era e sempre seria um lugar hostil, pensei de mim para comigo que, por melhor que fosse a mudança de ambiente, eu, de alguma forma continuaria hostilizado. Um estranho no ninho dos filhos ciumentos de meus tios.
— Tio, disse eu, de algum modo relutante, eu vou ficar aqui mesmo. Constrangido por não aceitar o convite dele, agradeci e permaneci sob a chibata perversa de uma realidade familiar que eu já conhecia. Não precisaria adaptar-me a outro convívio familiar.
EU QUERIA garantir menos sofrimentos e injúrias em meu futuro, mas estava difícil de convencê-los que não se protege um filho dos perigos do mundo agindo como eles agiam para comigo. Certo dia eu me acerquei do colo dela com um farto maço de dinheiro. Abracei-lhe as coxas tentando não ser rejeitado, porque por vezes ela simplesmente me afastava com gestos de mãos e braços de quem queria distância de mim, ou repelia minha aproximação. Dessa vez não aconteceu a refutação de minha presença, porque talvez tivesse lhe causado certa curiosidade aquele maço farto de papel moeda que causou surpresa nela e ao mesmo tempo interesse. Curiosidade.
ELA LOGO SE dispôs a me azucrinar numa tonalidade simulada de repreensão perguntando com presumida reprovação:
— Como você conseguiu esse dinheiro??? O interesse dela pela grana estava evidenciado pela maneira com que ela parecia valorizar no olhar e no apertar o maço de dinheiro em mãos, que aconchegava contra o ventre.
EU TERIA DE LHE contar toda a história que até aquele momento eu mantive em silêncio. Antes de respondê-la é preciso explicar ao leitor que o Zucca, um amigo meu de cor, que morava próximo à beira do rio Parnaíba, vinha juntar-se à turma de meninos da vizinhança que nada tinham a fazer, senão explorar as redondezas. Nos finais de semana lá estávamos, a turma de garotos a brincar de esconde-esconde, quando nos infiltrávamos nas dependências do Colégio Leo XIII que nos finais de semana ficava com as salas de aula e o grande pátio de recreio, vazios.
ÉRAMOS INTRUSOS a penetrar um território inexplorado, como se fôssemos exploradores de cavernas, entrávamos nas salas de aula abandonadas, corredores, banheiros, e buscávamos penetrar também no aposento principal da secretaria que estava com portas trancadas a sete chaves. Para ter acesso ao lugar em que, na nossa imaginação seria o local mais misterioso do colégio, buscávamos uma entrada de acesso aos segredos da hermética câmara ou recinto proibido: a secretaria do colégio. Não era muito fácil a entrada em suas dependências, mas conseguíamos através de uma espécie de coreto contíguo ao Tribunal Regional Eleitoral. Após escalarmos as grades pontudas entre ele e o interior do saguão de entrada, o colégio, quando o vigia não estava, era nosso.
HAVIA UM ACESSO à secretaria, na forma de uma pequena abóbada, na qual mal passava com dificuldade, um corpo infantil que fosse bem magro. Um nicho através do qual o professor e diretor Juracir mantinha contato nos dias úteis, com seus subordinados, professores, funcionários e alunos. O acesso permitia comunicação entre a secretaria e a sala dos professores. O local era cercado de proibições de entrada. Era lá que a burocracia da escola guardava o papelório e a burocracia: as provas, os arquivos de alunos, pagamentos, recebimentos se faziam por lá.
TENTÁVAMOS PENETRAR, um e outro garotos, pela pequena arcada há um metro e meio acima do rodapé na parede. Enquanto tentávamos a proeza de passar para o salão proibido, eis que chega o vigia e, após interrogar sobre o que fazíamos ali, que era proibido, como havíamos entrado, que iria dizer aos nossos pais que certamente seríamos castigados. Usei o argumento que estávamos apenas a brincar, que nada demais havia acontecido, E que, já agora, estávamos de saída. E logo nos dirigimos a passos apressados, ao caminho de volta. De alguma forma essas incursões endereçavam-me às pinturas de Portinari que mostram crianças a brincar.
MUDANÇA DE RESIDÊNCIA — GAUGUIN (1899)
FICAVA PARA O próximo fim de semana a aventura de tentar penetrar no aposento proibido no Colégio Leo XIII do senhor professor e diretor Juracir. Isto se o vigia não estivesse por lá a impedir que tomássemos conta dos espaços internos vazios do Colégio no fim de semana, com foco na misteriosa Secretaria. Passou um tempo sem que nossas incursões tivessem continuidade. Até que aconteceu. Num desses fins de semana de traquinagem, o Zuca, exímio jogador de futebol, conseguiu vazar para dentro da misteriosa sala através do buraco arqueado na parede.
NUM PRIMEIRO momento ele não disse nada da proeza que tinha promovido lá dentro, ao sondar o interior da escrivaninha do professor Juracir. Ao voltar, apenas disse do que tinha visto por lá: ventiladores, arquivos, máquinas de escrever e calcular. Mas, eis que três dias depois o Zuca aparece em frente, na calçada da casa onde eu morava e me passa um envelope recheado com alguma coisa dentro dele, dizendo:
— É teu, fica pra você, eu não posso ficar com isso. Surpreso, abri o envelope grande de carta e vi que estava recheado de dinheiro. Pô, cara, por que você vem me dá isso??? É seu, como você conseguiu essa grana toda??? Por que não quer ficar com ela??? Ele logo respondeu aflito e apreensivo:
— Não tenho como ficar com esse dinheiro. Não posso gastar, vão pensar que eu roubei e não sei como vou dizer como consegui. Podem chamar a polícia, a maior confusão. Não quero não. Fica pra você. Estendendo a mão ele disse: pega, é seu. Abri a parte de cima da mesa do professor e vi esse envelope lá dentro de um escaninho. Vi que era dinheiro e escondi dentro do bolso da bermuda. Mas, se minha mãe me pega com esse dinheiro, vou apanhar até ficar de cama. Se for gastar, todo o dono de venda vai estranhar eu com esse dinheiro. E aí o bicho vai pegar mesmo. Fica pra você, faz alguma coisa boa com ele.
EU NÃO ME FIZ de rogado e disse:
— É como ter ganho um prêmio na loteria do Geraldão. Não sei também o que fazer com ele, mas vou encontrar um jeito de gastar essa grana. Pô, cara, obrigado mesmo. Tu não queres ficar mesmo nem com uma parte desse dinheiro??? Toma, leva uma nota pra comprar alguma coisa pra você. — Geraldão era o dono da loteria que vendia bilhetes sorteados todo fim de semana.
— Não, cara, eu não posso, nem quero ficar com isso. Só vai me causar problema. Fica pra você, eu não quero não. Deus me livre. Você pode saber o que fazer com ele. Fica pra você e seja o que Deus quiser.
ZUCA ERA UM CARA humilde, a mãe doméstica, o pai pedreiro. Eu compreendi que aquele dinheiro todo seria muito problema para ele explicar como tinha conseguido. Comecei a comprar HQs nas bancas de revistas na praça em frente aos dois cinemas da cidade. Comprava, lia, colecionava álbuns de figurinhas, comercializava elas nos fins de semana e as vendia também à molecada da escola. Gostava de ler todos: Superman, Batman, Capitão Marvel, O Fantasma, O Santo, Mickey Mouse, histórias góticas de terror, as histórias da vida dos santos, os contos de Poe, Histórias Extraordinárias, A Mulher Gato, Homem Aranha, Os Titãs, Liga da Justiça... Uma infinidade delas.
EU AS ESCONDIA nas prateleiras inferiores das estantes de livros. Mas aí a mãe me denunciou a Paizão Coisinha que disse não querer que eu lesse “essas porcarias” e não queria mais ver nenhuma delas em casa. Passei então a escondê-las nas salas subterrâneas, empoeiradas e cheias de teias de aranha do Tribunal Regional Eleitoral, na esquina da quadra onde eu morava, em meio do quarteirão.
O DINHEIRO SE acumulava e eu não sabia como guardar toda a grana que vinha da comercialização de figurinhas de álbum e revistinhas HQs. E é aqui que voltamos àquela pergunta da mãe:
— Menino, como você conseguiu todo esse dinheiro todo??? — A explicação justificava a fonte da grana sem que eu me fizesse vítima das circunstâncias. Então eu disse, meio que alegando inocência e ao mesmo tempo justificando-me:
— A senhora pode guardar para quando eu crescer??? Eu quero estudar Economia, e aqui não tem onde. Só tem uma faculdade de direito. — Estava pensando sim, em garantir meu futuro que eles, aquele casal sem nenhum compromisso comigo, esquecia que um dia eu precisaria sair daquela cidade sem possibilidades de ter uma educação de faculdade.
— Vou falar com seu pai, ver o que ele diz. Eu não tinha esperança de que aquele dinheiro voltasse um dia a ser meu. Eu estava lidando com pessoas que não tinham nenhuma empatia com meus objetivos futuros de vida. Ao contrário. Mas, vamos ver o que aconteceria com minhas economias.
UMA SEMANA SE passou. Ela então me chamou dizendo:
— Vamos depositar esse dinheiro, como você pediu, na Cooperativa aqui perto, vai render juros e você vai ter como pagar seus estudos quando tiver idade para fazer uma faculdade. A ideia era essa. Eu estava a querer sair daquela arapuca familiar onde não tinha nada para mim. Exceto agressões, rejeição, problemas. Conseguiria esse objetivo, sabendo que todos em volta estavam sempre a puxar o tapete de debaixo de meus pés??? Mãezona dizia que estávamos próximo ao dia de mudar para a nova residência. Como se isso fosse uma grande mudança de vida para melhor. Não era. Longe disso.
FUTEBOL — PORTINARI (1935)
O COLÉGIO LEO XIII funcionava em três turnos: manhã, tarde e noite. Segundo as opiniões gerais, cobrava caro, muito caro, pelas mensalidades. Eu pensava que usar aquelas sobras que o Zuca encontrara no envelope para garantir, em parte, minha educação futura, era como se fosse uma bolsa de estudos antecipada. Eu não poderia, com certeza, contar com dinheiro de Paizão Coisinha. Ele nunca se importou com minha educação. Eu não tinha a menor simpatia por aquele sujeito, meu pai. Mas, mantinha uma intensa sensação de compaixão para com sua situação existencial sem saída.
DESDE MUITO PEQUENO eu, quando no colo dele, sentado sobre sua tralha, ao sentir a genitália de Paizão Coisinha se eriçar sob meu bumbum, eu, ainda muito criança, ficava absolutamente apavorado com as inclusões de energia maléfica que se aglomeravam ao meu redor, vindas de um lugar macabro, talvez além-túmulo de seus ancestrais. A energia, os fótons eletromagnéticos, me envolvendo. Essa sensação de absoluta falta de recursos físicos de autodefesa, me fazia berrar de pavor. A coisa maléfica o usava para me alcançar, ter acesso ao meu corpo, estigmatizar minha libido ainda insulsa.
MEUS BERROS APAVORADOS por vezes atraíam a presença da Mãezona. Ela me encontrava, de vez em quando, jogado no chão em frente a rede de tucum na qual Paizão estava sentado a se balançar. A cabeça encostada no chão de cimento frio, a boca a bramar, berrava o mais alto possível em busca de algum socorro. Enquanto desfrutava de um certo desafogo devido a redução da intensidade da agressão mórbida, euzinho, já agora entre os braços aconchegantes de Mãezona a me consolar e ao mesmo tempo a acusar o marido com palavras moderadas de censura que não surtiam qualquer efeito.
EU BERRAVA DESESPERADO, silencioso, por socorro, daquela que poderia me livrar das garras satanizadas da figura absolutamente deletéria, sinistra. A sombria nuvem sobrenatural que o perpassava em minha direção, havia desaparecido, mas a sensação de ameaça continuava aterrorizando-me. O perigo que provocara, a aflição e o temor de que a ameaça viesse a voltar numa ocasião próxima. Porque Mãezona nem sempre estava em casa para servir de salvaguarda. Ela tinha plena consciência do malefício. De noite, antes de eu dormir, ela me instava a orar ao meu Anjo da Guarda por proteção. Eu orava.
PAIZÃO COISINHA APERTAVA a mão sobre minha boca quando, no mais das vezes, me impedia de chorar alto e berrar de pavor ao sentir que ele se entregava à canalização sombria da névoa que prenunciava o fenômeno de assombro e desolação. Paizão realmente tinha um compromisso com energias que não eram, nem de longe, do bem.
QUANDO CRESCI E NÃO estava mais sujeito à imobilidade no colo de Paizão, Zuca havia me dito que ele e a mulher tinham me vendido à Maçonaria. Eu perguntei a ela o que isso queria dizer. Em resposta ela me disse que eu nunca mais perguntasse isso, e me alegou que toda família numerosa tinha de ter alguém que pelos demais devia aceitar ser sacrificado para o bem de todos:
— “Nunca mais fale sobre isso. Nem comigo nem com ninguém mais, ouviu”? Eu fiquei ajuizando, calado, as consequências que sobre mim, em futuro próximo e distante, teria essa comercialização de minha pessoa para uma instituição que certamente tinha intenções de dominação sobre minha indefesa pessoa de criança, de adolescente e de homem maduro. E ela, em tom ríspido, autoritário, brusco e implacável, disse:
— “Você me ouviu, não é? Não fale mais disso com ninguém, nunca. Repita:
— “Nunca mais eu vou falar com mais ninguém sobre isso”. Eu repeti:
— “Nunca mais vou falar com mais ninguém sobre isso”. Eu não acreditava no que ela me fazia repetir. Eu falaria sim, um dia, quando tivesse liberdade para isto.
ESSA CONSTELAÇÃO DE eventos mórbidos só me fazia aumentar a certeza de que não poderia estar certo quem se submetia à atuação maléfica dessas forças. Elas chegavam até Paizão via fótons??? Vinham donde??? De que lugar, dentro ou fora do sistema solar no qual gira o planeta Terra??? Ele e a mulher tinham envolvimento com essas forças. Uma aliança que teria, com certeza, consequências sobre seus descendentes.
TALVEZ PARA AMENIZAR essas sequelas maléficas que sobre mim se amontoavam, quando eu estava um pouco mais crescido, ela me inscreveu no catecismo semanal da Igreja do Amparo, ao qual frequentava aos sábados à tarde. A influência que a longo prazo exerceu sobre minha personalidade infantil essa frequência, talvez tenha salvado minha vida futura. Ou tenha sido um fator preponderante de influência benfazeja e benevolente que me permitiu seguir acreditando na vida.
PAIZÃO COISINHA ERA sim um fanático psicótico a serviço, possivelmente do Pacto Satânico do Vaticano, com extensões em outras agremiações sociais. Seu comportamento com os filhos denotava uma espécie de fanatismo por uma sexualidade destorcida. Sua pedofilia era incontrolável. E tinha a calada conivência da mulher. Paizão não poucas vezes servia de coroinha em missas na Igreja do Amparo. Monges do convento de Capuchinhos de São Benedito costumavam visitá-lo à noite. Mas esses, com a finalidade de obterem alguns proventos de subsistência para suas carências alimentares. Pelo menos é o que eu supunha.
EU NUNCA ME SEDUZI por seu comportamento emocionalmente desajustado, incurial, sodomita. Sua pedofilia pode ter sido induzida pela vontade de submergir a filiação na infantilização das mentalidades. Ele e a mulher estivessem sob s influência de uma casta social que desejava impor a eles, devido à condição de crescente vulnerabilidade social em decorrência da condição de pobreza ou carência de recursos financeiros. É o que o governo do ex-presidente Bozo Mussolini tentou fazer com as camadas mais carentes da população em seu desgoverno.
NA REAL DAS VERDADES familiares, ele e a mulher estavam esgotados pelos esforços de criação familiar para os quais não estavam, nem de longe, minimamente preparados. Tanto ela quanto ele precisavam ter casado com cônjuges que os ajudassem a vencer suas deficiências de caráter e educacionais. Eles, dia a dia reforçavam essas suas deformações genéticas, de caráter, devido à educação ou formação escolar ultra carente.
EU ME PERGUNTO se o futebol, o carnaval, a cultura de boteco e churrascarias, a carência extrema de qualidade na educação em todo o território nacional, não possui por finalidade a manutenção desse estado de coisas que induz o Inconsciente Coletivo Familiar Nacional a aceitar passivamente a dominação por esses grupos de extrema direita, principalmente, e o nazifascismo crescente dessa formatação social.
A PERSISTÊNCIA DA MEMÓRIA — SALVADOR DALI (1931)
EU ESTAVA SEM NENHUM controle sobre minha própria vontade. Isso do ponto de vista externo. Em meu interior eu sempre soube o que querer. Não me haviam consultado sobre se eu queria ou não ter sido comercializado por eles para quem quer que seja, Maçonaria ou outra qualquer instituição, secreta ou não. Não me perguntaram se eu queria ser o “cordeiro do sacrifício” da família. Era como se eu fosse uma coisa e eles pudessem mudar-me de lugar ou de função ao bel prazer. Eu não me convenci, em nenhum momento, que deveria submeter-me a esse controle satanizado.
QUE PODERIA EU FAZER para defender meus direitos de viver segundo minhas escolhas??? A mulher a qual eu deveria chamar de mãe levou-me, até a Cooperativa próxima de onde morávamos. A Cooperativa tinha uma sequência de quadros que mostravam dois burros atados por uma corda. Eles se dirigiam em direções opostas. cada um visando uma moita de capim que não estava ao alcance de ambos. Não conseguem avançar em direção a elas para matar a fome.
OS BURROS VOLTARAM-SE um em frente ao outro e parecem compreender que precisam dirigirem-se simultaneamente, primeiro à uma, depois à outra touceira de capim, ambos numa mesma direção. O cartaz com a sequência de quadros estava encimado por um título: “Cooperação: — Até os burros compreendem”. Ou seja: quando o burro da esquerda se une ao da direita, nenhum dos dois passa fome.
ELA DEPOSITOU MINHAS economias. Passou-se um tempo sem que se falasse mais nisso. Eu estava tranquilo porque, se o dinheiro do comércio de revistinhas e figurinhas, umas que se valorizavam mais que outras, continuasse prosperando, rendendo juros, eu estaria com as mensalidades de minha futura faculdade garantidas. Eu continuei depositando as economias na caderneta de poupança da Cooperativa. Um dia Mãezona me chama para dizer:
— Meu filho, seu pai está passando por dificuldades e seus irmãos estão precisando comprar roupas e sapatos que já estão gastos. Ele mal está conseguindo no consultório, dinheiro para manter as compras no mercado. Você precisa ajudar seus irmãos com suas economias. Quando esse período passar, ele deposita seu dinheiro outra vez na cooperativa. Eu sei, você quer garantir seus futuros estudos. Mãezona, perversamente sabia de antemão que jamais esse dinheiro seria outra vez depositado em minha caderneta de poupança. Novamente ela e o marido postulavam que eu sacrificasse minhas economias em proveito de seus demais filhos. Confiavam em minha perda de memória.
MEU AMIGO ZUCA continuou a fazer incursões na sala proibida do Colégio do professor Juracir nos finais de semana em que o vigia não estava presente. Nós, os meninos travessos da rua, só sabíamos se o vigia estava ou não presente quando pulávamos as grades de ferro do Tribunal Regional Eleitoral e, após subir as escadas de um dos pátios, nos ajudávamos a descer em direção ao acesso ao interior do colégio.
O PROFESSOR JURACIR continuou a depositar o envelope com parte do dinheiro de matrículas e mensalidades, que certamente depositaria em banco na 2ª feira. Zuca continuava a me abastecer de grana que eu usava para negociar HQs, álbuns, figurinhas, e demais “artigos do dia” que se fizessem presentes. Continuei a abastecer a caderneta de poupança e a mãe continuou a me roubar o dinheiro depositado com alegações, posteriores aos depósitos, as mais diversas. Eu dizia que não estava certo, dessa forma eu não conseguiria nunca financiar meus estudos no futuro próximo. Ela, raivosa, reagia às minhas reclamações. Mandava-me, alterando a fala, calar a boca e dizia:
— “Ladrão que rouba ladrão tem cem anos de perdão”.
— Mas eu não roubei nada, disse, quem me deu o dinheiro foi o Zuca.
— Mas você aceitou, é quase a mesma coisa.
— E quem vai financiar meus estudos??? Nessa cidade só tem uma faculdade de direito.
— Depois seu pai, quando a situação melhorar, deposita outra vez seu dinheiro.
— Isso é mentira. Ainda hoje ele não depositou da outra vez.
— Cala a boca, pare de ser ruim. Com ou sem sua aprovação eu vou usar seu dinheiro.
EM PRINCÍPIO EU QUERIA estudar Astronomia. Mas, devido talvez às constantes lesões na cabeça resultado das agressões covardes de Paizão Coisinha, eu tenha decidido que dificilmente poderia concorrer com estudantes de matemática e geometria que tinham a ajuda familiar em outros centros urbanos mais desenvolvidos.
DESCONFIEI, TEMPOS DEPOIS, que as constantes remoções de minhas economias da caderneta de poupança na Cooperativa, tinham por finalidade financiar a viagem deles, pai, mãe e um casal de irmãos para o Rio de Janeiro. Eu tinha direito de ir nessa viagem, não meu segundo irmão. Mas este, contava com a simpatia de Paizão Coisinha porque era um irmão covarde, que não perdia uma ocasião de dedurar os demais irmãos para obter de Paizão a consideração que só os covardes obtêm de seus favoritos.
PAIZÃO TINHA A INTENSA determinação de me boicotar de todas as formas possíveis. Uma das razões desse boicote era o fato de eu não esconder minha desaprovação aos atos dele, um dos quais estava em sentar os filhos no colo, quando terminava o expediente no consultório, e ficar a excitar o pinto no bumbum deles, até o pijama ou a calça ficar borrado de esperma. O odor de porra se espalhava na sala, mas ele parecia ignorar que as pessoas tinham olfato e sabiam o que estava a ocorrer.
EU NÃO ACEITAVA ESSA atitude perversa de jeito algum. E conversava com eles, o segundo e o terceiro irmãos, dizendo que aquilo não podia estar certo. E que se um dia eu pudesse, diria a todo mundo o que estava acontecendo naquela família que se tornara um antro de perversões covarde dele, para com meus demais irmãos. Estes, diziam a Paizão que eu estava prometendo denunciar essas condutas pedófilas. Eu não conhecia ainda essa denominação para adultos que, de alguma forma, submetem crianças às suas taras.
PAIZÃO FAZIA POUCO de minha pretensão futura em denunciar suas atitudes comportamentais, as mais descaradas e perversas, desde que causariam sequelas futuras no desempenho emocional daquelas crianças, meus irmãos e irmãs, que estavam emocional e intelectualmente sendo sabotados de modo perversamente precoce. Ele me odiava desde a mais tenra infância, porque eu não aceitava as incursões de seu pinto em meu bumbum de menino com pouco tempo de idade. Meus gritos angustiados, desesperados, ao sentir que o membro de Paizão Coisinha se excitava ao roçar em meu bumbum, provocavam nele uma ira altiva e arrogante contra essa reação que visava defender-me de suas agressões de pederasta. Ele me jogava longe, no chão de cimento da sala. O que provocava inúmeras escoriações. As vezes Mãezona vinha em meu socorro.
IRMÃOS — PAUL KLEE (1930)
NÃO HAVIA PENETRAÇÃO anal, física, de Paizão Coisinha nos filhos. Havia um festival de subjetividade carnal, concupiscente, copulativa, erótica. Paizão tinha plena consciência de sua condição de impermanência na tutela daquelas crianças que mantinha no colo, tendo com elas orgasmos ao infestá-las com o roçar de seu instrumento carnal insipiente, em seus rabinhos infantis. A libertinagem luxuriosa de um pai de família que buscava infantilizá-las, as crias, ao máximo, para que não tivessem crescimento mental e intelectual pertinentes. Desejava prejudicá-las o mais intensamente possível num menor espaço de tempo no qual estava a poder influenciá-las.
NÃO PODERIA CONTINUAR a estragá-las emocionalmente por muito mais tempo. A oportunidade de abrir seus caminhos para uma vida proba e digna, essa ele não considerava minimamente. Filhos e filhas não teriam a oportunidade de se apropriarem de seus próprios corpos, e criar uma condição de desenvolvimento, sem que tivessem muitas dificuldades emocionais para conseguirem isto. Se essas crianças tivessem a condição afetiva, sensível e racional abduzida por ele em suas sessões de pedofilia, elas não estariam secas, vampirizadas na afetividade, na sensibilidade e na razão que não teriam para desenvolver em si mesmas essas qualidades.
O CASAL DE PAIS PEDÓFILOS, não teria gerado, pela vontade dele, nenhum filho ou filha que pudesse se destacar no mundo, além das possibilidades comuns, próprias deles. Eles eram as estrelas do cinema daquela família de indigentes do afeto, da emoção, da empatia sem sentimentos de autoestima e respeito próprio e mútuo.
NÃO PASSAVAM, OS FILHOS, de bonecos e bonequinhas do papai e da mamãe. Teriam namorados e namoradas, casar-se-iam, teriam filhos e filhas tal qual eles tiveram. Mas jamais poderiam ter pensamentos próprios e ações motivadas que não fossem pelo mecanismo de autômatos, criados e crescidos para serem reproduções físicas e mentais de seus tutores, sedutores da covarde vaidade de vidas secas, vaidosas da vontade de não estarem motivadas a implementar, cada um, seu próprio destino. Exceto o comum.
EDUCADOS PARA SER, CADA um de sua fila de gestação, a reprodução de suas impossibilidades, de seus carmas sombrios, de sua truculência emocional, da cruel judiaria de uma malignidade estrutural da qual eram fanáticos serviçais. A psicologia de Paizão Coisinha e de sua mulher grande no corpo, mas mulherzinha na alma, não tinha problema em descer às profundezas. Eles nunca saíram delas. Eles não tinham as ferramentas da evolução em si mesmos, buscavam no impedimento da evolução dos filhos, roubar deles essa intencionalidade da qual eram extremamente carentes.
ESTAVAM EMPENHADOS EM roubar a alma, o cerne, a substância anímica de cada um deles, filhos. Talvez assim pudessem lograr eles mesmos, evoluir. Não havia neles respeito ao corpo, ao intelecto e ao espírito. Como poderiam habitar, os filhos, um corpo e um espírito que tivessem uma educação capaz de suscitar a vontade de evolução??? Queriam se apropriar do biopoder natural deles, de modo que não pudessem crescer em sabedoria e conhecimento pertinentes à prosperidade, no caminho do saber colher em vida o alimento da otimização de si mesmos. Do próprio progresso. A desordem mental deles não permitiria outra influência emocional, exceto a sentida pela rejeição.
A FORÇA DA IGNORÂNCIA, de seus traumas, da bagaceira que certamente foi a educação infantilizada de cada um deles, era tudo que tinham a transmitir à própria descendência. Não estavam preparados para ser eles mesmos, muito menos poderiam ensinar à prole como seguir um caminho que fosse diferente do deles.
ESTA NARRATIVA É MUITO difícil de se organizar. Tenho 75 primaveras. Tentei escrevê-la diversas vezes. Nalgumas delas consegui boas páginas de literatura porque logrei escrever laudas de confessional veracidade. Mas, só após inúmeras tentativas, depois de décadas de ensaios e iniciativas literárias frustradas, consegui formalizar estes parágrafos insuspeitos, verídicos, transparentes, honestos, confiáveis.
ESCREVER É UMA TAREFA não das mais fáceis. A contabilidade emocional é muito diferente da escrituração mercantil. Não temos o hábito de pensar a veracidade das motivações que nos animam. Não temos o hábito de ser educados para nos conhecer a si mesmos. Não somos seres dedicados a nos reportar a nós mesmos. Não nos detivemos na constituição histórica de nossa sexualidade. Somos controlados por um poder que está, há muito tempo, a exercer dominação sobre nossas faculdades de percepção da realidade. Nossos corações e mentes não exercem sobre si mesmos autocrítica. Por isso somos um povo explorado por interesses de orçamentos e sociedades secretas.
QUANDO TENTAMOS NOS viabilizar em compreensão de nós mesmos, conseguimos, maior parte das vezes, apenas a replicação das múltiplas instâncias de atuação e repetição de diferentes subjetividades outras, nas quais somos levados a reproduzi-las em nós mesmos, em meio a nossos familiares, nas instâncias sociais para as quais somos educados e orientados a nos repetir sem nenhum espírito crítico.
VIVEMOS TODOS OS DIAS experiências limites. Elas têm a propriedade de nos tornar mais de nós mesmos. Nossa “nadificação” se multiplica todos os dias. Não nos qualificamos em nosso dia a dia, à ultrapassagem da nossa conduta limitada por condicionamentos de há muito induzidos por terceiros: pais, professores, chefes, políticos, auditores, juízes docentes de faculdades, opiniões de vizinhas conversas de padaria, clubes, bares ou discussões sobre futebol. Raramente nos qualificamos na razão, no intelecto, porque nunca fomos orientados a pensar. Fomos educados por uma galera de primatas saídos das cavernas primitivas do paleolítico neandertal. Pensar não é agir conforme esperam os outros que ajamos. Ainda pensamos com a lógica do tacape.
O PENSAMENTO SOBRE NÓS mesmos é o mais difícil de afirmar, porque nosso narcisismo não nos permite admitir que estamos a mil milhas de chegar à compreensão do que fomos, do que somos e do que poderemos chegar a ser. Somos criados em meio às pessoas que aprendemos a respeitar porque não existem outras em quem possamos nos avaliar. Pessoas que nos cercam normalmente estão enfermas da educação do corpo, do intelecto, da alma, e não sabem disso. Nem querem saber. Não há tempo senão de investir no tempo da sobrevivência, do trabalho, do salário, na condução de ida e volta para ter o que comer. E um celular para se alienar diariamente mais.
OS TRANSTORNOS DOS comportamentos repetitivos nos fazem acreditar que estamos no caminho certo porque só conhecemos esse caminho. Não temos referenciais culturais que nos permitam uma comparação de procedimentos outros que nos poderiam conduzir à visualização de outros horizontes. Senão aqueles que a propaganda e as notícias dos jornais da TV nos sugerem. Nos unimos apenas para torcer pela hostilidade entre chutadores de bola. Somos enganados e aceitamos isso todos os santos dias. Todos os dias, nem tão santos.
A PAISAGEM SOCIAL dessa realidade me faz lembrar a criança que, sozinha, contempla a paisagem no quadro de Gauguin em que um menino bretão observa em um cenário, à esquerda do qual, está uma grande e sombria figura indefinida, que mais parece uma visagem sobrenatural, horrífica e tenebrosa. A paisagem que parece, à primeira vista natural, mostra-se com uma inclusão carregada, turva, ameaçadora. A naturalidade no larbirinto de Mãezona e Paizão apresentava-se, por vezes, igualmente tenebrosa. E seus filhos, meus irmãos, perplexos, num caminho traumático. Sem volta.
O GRITO — EDVARD MUNCH (1893)
NOS SÁBADOS À TARDE, eu ficava a espiar o ambiente da sala onde Paizão Coisinha estava a bolinar o pinto no bumbum dos filhos, sentado numa rede de tucum. Mesmos os mais crescidos. Estes, cresceram sem ter uma visão crítica dele, de seus absurdos, de suas taras. Sempre que eu chegava próximo e tentava um diálogo sobre essas atitudes para com eles, eles me censuravam de cara. Ora dizendo:
— Ele não pode estar errado, ele é nosso pai, sabe o que está fazendo. Ou:
— Ele é nosso pai, devemos obediência ao que ele quer, ele sabe o que está fazendo.
— Não se deve contrariar o que nossos pais querem de nós.
EU NÃO CONSEGUIA fazer eles pensarem diferentemente do que estavam condicionados a aceitar e a fazer. Não tinham o mais remoto senso de escrúpulo questionador dessas aberrações erotizadas que faziam com que ficassem cada dia mais algemados à uma obediência paterna pervertida. Eles não questionavam nada. E Paizão Coisinha fazia-lhes a cabeça a partir da autoridade de quem os gerou e da mulher que os pariu. Eram filhos obedientes, bons meninos, boas meninas, boas crianças.
PAIZÃO TALVEZ TIVESSE uma orientação por trás desse comportamento infame, vergonhoso, deprimente. Ele certamente não estava sozinho. Talvez pertencesse a algum grupo religioso que tivesse uma justificativa para agir dessa forma. Ao receber visitas, quando essas o flagravam com a calça ou o pijama molhado de orgasmos resultantes da excitação devassa, venérea, no pinto excitado e transvazado na bundinha dos filhos, Paizão ficava momentaneamente sem defesa, sem graça, buscando, quando a visita o surpreendia na sala, usar o filho ou os filhos como escudos na frente das manchas de espermas. Mas o odor o entregava. Ia até o quarto e trocava de pijama ou calça.
ELE NÃO CONSEGUIA esconder o malfeito, desde que, mesmo que conseguisse acobertar as manchas de esperma, não conseguiria tapar o nariz da visita ou das visitas que com ele vinham, frequentemente, conversar. Uma dessas visitações mais frequentes era a do que costumávamos chamar de “tio Hercínico”. Um sujeito que costumava visitá-lo muito excitado, com olhos esbugalhados e fala alterada pelo uso, segundo diziam, de coca misturada à bebidas alcoólicas.
A VISITA DESSE SUPOSTO parente o agradava sobremaneira. Conversavam, riam, divertiam-se a valer, passavam horas e horas em conversas de bêbados. Paizão sedia sempre às solicitações de ingestão alcoólica quando estava em presença dele. Contavam piadas sobre piadas escancarando a dentição sem se importarem com as aberrações que saíam do palavrório entre eles.
POR VEZES TIO HERCÍNICO, pegava uma das crianças de Paizão que por perto passavam e a atraía para a zona da própria genitália, entre as pernas, como se estivesse a fazer festinhas ou lisonjas ao garoto ou garota que por perto passasse. Paizão sorria, o tio sorria, e ambos pareciam estar de acordo com esse tipo de paparico.
A MÃE QUANDO VIA, pegava o filho ou filha pela mão e o tirava da proximidade dele. Dizia com acanhada rispidez que quando adultos estivessem conversando, menino ou menina não deviam se aproximar deles. As visitas de modo geral costumavam demorar nos “papos de cerca Lourenço”. Expressão usada para definir conversa fiada entre pessoas que, por mais que conversem, não dizem nada que se aproveite. Como essas pessoas se divertiam enrolando-se em novelos de palavras alcoolizadas.
QUANDO TIO HERCÍNICO se aproximava, por vezes cambaleante, mal conseguindo ficar em pé, apoiando-se nas paredes do corredor de entrada da casa, todos tínhamos certeza de que estupidez e prepotência premeditada, sob a forma de piadas escabrosas, estavam por ser contadas aos montes. Esperava-se uma devastação de palavreado amoral, mas que, por certo, eles achavam que estavam mostrando a todos o que significava ser um sujeito adulto, casado, com filhos. Eu me perguntava, apesar de criança:
— Em que escola eles estudaram. Essa era a educação que, afinal, ofereciam pelo exemplo. Que país estavam semeando em seus corações e mentes: debilidade mental e inépcia na compreensão do que são crianças, a quem deveriam respeitar. A contemplação dessas sessões amistosas entre eles, hoje me lembra a expressão de desespero e de angústia que, futuramente, aqueles meus irmãos e irmãs deveriam expressar em seus rostos, quando não estivessem mais alheios às consequências dessas experiências individuais no colo de Paizão. Uma profunda atmosfera de tristeza por certo haveria de, num dia futuro, esboçar-se em seus rostos.
O CATECISMO QUE frequentava em feriados e fins de semana na Igreja do Amparo, por iniciativa dela, mulher de Paizão, me ensinava a manter contato com princípios da religião cristã. Mãezona, contraditoriamente, me incentivava a frequentá-lo. O padre ou mentor do catecismo costumava nos falar de eventos do Antigo e do Novo Testamentos. Para ilustrar a catequese do dia, o guia nos dava em mãos pequenas ilustrações coloridas que se abriam ao meio e continham a reprodução de um acontecimento bíblico paradigmático. As quatro pequenas páginas eram por mim apreciadas e lidas com a máxima atenção. Eu me concentrava com intensa atenção no significado desses ensinamentos bíblicos.
EU QUERIA EXTRAIR delas, ilustrações, a essência de instruções e conhecimentos advindos de acontecimentos que a mim pareciam vir de outra dimensão de costumes que não aqueles praticados no lar. Era uma dimensão que nos queria dizer como agir. Como fazer o que é certo, e efetivar comportamentos que me poderiam salvar do horror que eu via acontecer em meu redor, quase todos os dias. Um horror premeditado. Um horror de que as pessoas que me cercavam eram prisioneiras e me parecia que não faziam nadica de nada para dele escapar. Não havia janelas na prisão astral da qual eram prisioneiras.
AS PEQUENAS ILUSTRAÇÕES distribuídas no aprendizado semanal dos rudimentos provenientes das histórias bíblicas, para mim eram uma motivação de esperança que queriam dizer que nem tudo no mundo estava perdido. Havia alguém ocupado em ensinar que a humanidade nunca esteve sozinha. E que haveria sempre um ser supremo ocupado em nos ensinar e proteger. Apesar de todas as mil dificuldades que se encontrariam os personagens habitantes descritos na história do Paraíso Perdido.
AFINAL, EU COMPREENDIA, toda a humanidade havia saído do ventre original da mulher Eva, agente do pecado original, tentada e vencida pela Serpente do paraíso que, se fosse mesmo um paraíso, deveria ter seguranças. Anjos que impedissem Satã de passar a lábia nela e fazê-la ser a mãe de uma humanidade desumana.
NÃO IREMOS AO MERCADO HOJE — GAUGUIM (1892)
NOS DIAS DE HOJE, não apenas na política congressual, mas na política familiar e na governança das demais instituições republicanas, há a presença não de todo camuflada, das sociedades secretas: atos secretos, orçamentos secretos, conversas ao pé do ouvido, secretas, informações secretas, reuniões secretas, discursos secretos, salas secretas, rios subterrâneos de ações e intenções secretas, instalações de pesquisa científica secretas...
O QUE É SECRETO É, por definição antidemocrático. Sociedades secretas parecem estar a governar grupos sociais, instituições governamentais, a vida particular das pessoas por detrás de biombos de intenções sociais sádicas jamais reveladas. Elas governam cidades, regiões, países. Afinal, sabemos, o primeiro homem e a primeira mulher, o casal híbrido de experiências anteriores para estruturar o físico e o mental na atuação terrenal do Homo sapiens, deve ter sido resultado de experiências híbridas ultrassecretas. Experiências que agora estão começando ser compreendidas pela ciência terrenal.
AS TECNOLOGIAS ETS, das quais o mundo houve falar e usufruir (celulares, OVNIs, satélites, armas biônicas, atômicas, as técnicas de aplicação de conhecimentos, até então inéditos, na Biologia, na solução de problemas de engenharia reversa e design...) estão a funcionar, a maior parte delas, nas estruturas subterrâneas de lugares afastados das cidades povoadas por milhões, bilhões de inocentes úteis que nem desconfiam estar trabalhando e pagando impostos para ser controlados por grupos de poder bilionários, trilionários, que mandam na política, na economia, na sociedade planetária e determinam como será o futuro da humanidade após a conquista da lua e planetas mais próximos deste sistema solar de quinta grandeza.
MAS, ESSAS PESSOAS cheias de poder e riqueza, são também elas controladas por tendências, forças e poderes que estão bem acima da compreensão delas próprias. Poderes e forças que elas não estão minimamente interessadas em se aprofundar no conhecimento, mesmo porque não teriam ferramentas para fazê-lo, exceto as que lhes chegam às mãos através do ímpeto high-tech do qual são meras representações ambientais.
QUEM É ELON MUSK, bilionário dono da Space-X, da Tesla, OpenAl, Neuralink, SolarCity, Twitter??? Se você acredita que ele é mais do que um testa de ferro de poderosos acionistas de suas empresas, muitos dos quais nem desse planeta são, se você crer que “Elon Mosca” trabalhou para conseguir a fortuna que tem, que é o fundador e CEO da Neuralink e presidente da SolarCity, por méritos próprios, então você está mesmo no mundo da lua.
AS ENERGIAS QUE MOVEM essas pessoas vêm de interesses secretos que não estão na esfera de alcance das empresas e de seus supostos criadores. Ele mesmo, Elon Musk, empresário de sucesso e “homem Mosca” de forças e poderes muito além da compreensão dele mesmo, afirmou, via videoconferência no evento “FT Future Of The Car 2022” que vai seguir gerente executivo da montadora de carros elétricos “enquanto puder ser útil para a empresa”.
PORQUE O “HOMEM MOSCA” comprou o Twitter, senão para expandir a quantidade de usuários e pagar influenciadores digitais dedicados a produzir conteúdo exclusivos para a plataforma??? Semelhante ao modelo “Tik Tok” que fez a rede chinesa crescer de forma abrupta e irreversível em todos os lugares do planeta.
O “HOMEM MOSCA” VAI promover a volta de outro sujeito, que já foi presidente do mais prestigiado país desse mundo, os EUA, o famoso trambiqueiro Donald Trump. Ele foi banido da rede, do Twitter, por servir de incentivo aos fanáticos apoiadores da invasão do Congresso americano. As incitações à violência supremacista liderada pelo ex-presidente Trump poderá continuar no Twitter sob a direção do “homem Mosca” e bilionário norte americano. No que seria uma mostra incontestável de que o poder dele, Musk, está direcionado à dominação antidemocrática do planeta Terra.
A QUEM SERVEM ELES, esses bilionários da antidemocracia??? São serviçais de poderes que estão muito além da compreensão simplória de que são tão somente testas de ferro de um poder de soberania, hegemonia e superioridade extraterrestre. Há muito mais por trás dessa vontade nietzscheana de poder e dominação planetária. Há a expansão de um poderio financeiro, econômico, militar, bélico e tecnológico que vem de outros locais, além do universo atualmente conhecido pelos cientistas e técnicos da Nasa.
VIVEMOS TODOS NUM fim de mundo de ficção científica, como se vivêssemos uma simples realidade que teve começo meio e terá um fim histórico, inesperado. O fim previsível da espécie, dita humana, é uma verdade autêntica, documentada em cada dia que passa, pela imprensa e seus eventos bélicos de comunicação e informação, tipo a invasão troglodita da Ucrânia por uma ratazana autocrática liderada por um dom Ratão com enormes complexos de inferioridade, represados em um psiquismo criado no ambiente criminoso da KGB soviética.
O DOM RATÃO RUSSO, o todo poderoso chefão autocrata quer criar, a partir da dominação do território ucraniano, uma “cabeça de ponte” ocupada pelo posicionamento provisório das FFAA russas, em território que eles elegeram por inimigo, com o objetivo de possibilitar o posterior avanço das tropas do exército e comandos da marinha e da aeronáutica sobre os demais territórios europeus próximos ao território da poderosa Rosa Russa, uma flor cultivada desde há mais de cinco mil anos na Ásia. E em sua forma selvagem, há dobro de tempo.
ESSES EVENTOS MACROS de dominação da trajetória da História mundial no contexto atual, têm seus representantes como se fossem eles autores desse processo sistemático de fazer a progressão da história humana acontecer. Quando, em realidade, são apenas uma espécie de robôs orgânicos, de vezo biotecnológico, criados para povoar mundos a partir a criação mitológica de um casal tipo Adão e Eva no Paraíso Perdido de outros demais sistemas solares ainda por descobrir e explorar.
ESTE TEXTO QUE ORA denomino novela, talvez fosse melhor nominado romance, ou mesmo uma reunião de crônicas. Ele é o aspecto social Micro, dessa realidade pessoal, familiar e social que permite o desenvolvimento libertino dos aspectos sociais Macros. Estes, caminham, a passos largos, para uma política de dominação planetária supremacista por indivíduos tipo Elon Musk, “O Mosca”, o Trumpbiqueiro, o Dom Ratão russo, o Bozo, entre muitos, muitos outros.
GATO PEGANDO UM PÁSSARO — PICASSO (1939)
A FUNÇÃO MACRO NA sociedade é exercida por políticos e demais autoridades dos principais poderes. As personagens legislativas do Congresso, por exemplo: os cortesãos ladinos, malandros, corruptos e astuciosos, membros dos demais poderes republicanos. O caro leitor talvez esteja mais interessado na narrativa da unidade Micro, relativa aos “micróbios” da sociedade: as pessoas de poder aquisitivo menor, que votam nos finórios pseudocivilizados para que lhes roubem o dinheiro dos impostos em conluios que canalizam as verbas secretas em direção às suas contas pessoais bancárias.
AS SEÇÕES PROTOCOLARES da burocracia oficial, roubam, de todos os lados, a sociedade em seu escalão Micro: milhões de crianças e adolescentes jogados no lixão da manipulação das verbas secretas danosas aos investimentos em cultura: educação, dramaturgia, cinema, editoras, formação escolar e universitária deficiente, salários de professores suficientes para que se mantenham cansados, revoltados, carentes de incentivos profissionais.
NO INTERIOR DO LAR DE Paizão Coisinha e de sua mulher, reinava a educação para a subordinação de corações e mentes ao ideário do capital mercantil. Seus filhos e filhas serviriam ao poder político, econômico e social de forma ampla e inquestionável. Seriam metáforas do que foram eles próprios no cenário de uma sociedade devastada pela sodomização precoce de suas crianças e adolescentes. A descendência eles condenaram de antemão à manipulação fácil de hierarquias da ordem e do progresso de uma autocracia civil e militar dedicada à subordinação das conveniências de hierarquias do mando e do desmando de seus subordinados. Civis e militares.
A CRIATURA À QUAL EU deveria chamar de mãe, me puxava o tapete por todos os meios possíveis. Chegou um momento em que ela me chamou para me convencer a não insistir em fazer uma viagem que eles programaram para o Rio de Janeiro. Não adiantou eu reivindicar meus direitos de filho e irmão mais velho, porque ela e o marido os aboliram completamente, devido ao fato de que qualquer investimento em minha educação, ou vestiário, significava um dramático:
— “Tirar o pão da boca dos irmãos menores”.
ELES FODERAM À vontade meu futuro. Ela pariu um filho atrás do outros durante vinte e cinco anos. Lamentou insistentemente os quinze abortos que suas barrigadas não seguraram. E eu, seria a vítima principal de sua Família Trapo, por ser o primeiro de dez pequenas assombrações que para eles cresceriam em problemas que mal conseguiam ir empurrando com a barrigada. Passavam muitas vezes os sábados e domingos jogando cartas, num jogo de “buraco negro” com vizinhos e conhecidos de novenas e amizades forjadas na proximidade de conhecimentos aleatórios.
A EDUCAÇÃO DOS OUTROS noves tinha por padrão o incentivo deles em me estigmatizar como sendo uma criança e um adolescentes que não merecia nada, exceto a execração de todos, simplesmente pelo fato de que havia nascido anteriormente a todos os outros, e por isso mesmo não merecia senão a execração deles. Eu reivindicava meus direitos, mas ela sempre afirmava que eu não tinha direito algum. E que devia aceitar, sem questionamentos, ser o “cordeiro do sacrifício”.
O MARIDO DELA, ELA subordinou e amontoou de necessidades. Para ela, ele servia de prisioneiro subjugado às necessidades cada vez mais prementes da precária sobrevivência familiar. O pascácio Paizão Coisinha vivia atrelado às solicitações dela. De nada adiantava ele chegar por vezes a ela e, trêmulo de raiva contida e revolta por estar vinte e quatro horas por dia sob a tensão de atender pacientes do então Inps, reclamar dela que não era possível que ela não estivesse vendo que ele não aguentava mais uma boca a mais por ano para alimentar, vestir, calçar, promover a educação escolar com todas as despesas que daí estavam advindo e se acumulando, “tirando o couro” dele. Explorando ao máximo sua mais valia de trabalho escravo. Além do que suas energias esgotadas poderiam aguentar.
MAS A SUA CÔNJUGE havia se transformado numa carniceira fanática. Ela tirava o couro dele, como se dizia na gíria dos trabalhadores escravos explorados até o estertor. O argumento dela era sempre o mesmo e não tinha nada de refrescar suas solicitações e protestos. Todo ano lá estava ela parindo mais uma boca para o serviçal escravizado alimentar. Futuramente, quando eu já estava adulto, uma psicóloga me disse, em conversa pós sessão de terapia:
— “Ela nunca quis outra coisa que não fosse um lugar para dormir, fazer suas necessidades básicas e se alimentar”.
— Um lugar de cama, banheiro e cozinha.
— Os filhos serviam para algemá-lo, cada vez mais atrelando-o a um esquema no qual ela pudesse alegar as dificuldades que teria se fosse por ele abandonada. — Completei a avaliação dela, dizendo:
— O marido era um fraco, sem força moral e intelectual. Um demônio menor na hierarquia do inferno social. Ela aproveitava suas fraquezas ao grau máximo que poderia extrair dele. Ela o escravizava mentalmente por saber controlar sua mente, devido a algum trauma ou lesão psicológica que ela conhecia dele, e usava para manipular seu psiquismo raivoso, revoltado e amedrontado.
— Mas quem arcava com as consequências de todas essas falhas de caráter de ambos, era eu. Os demais filhos e filhas eram mais poupados. Uma maneira covarde de torná-los, a todos, incondicionais aliados deles.
O MIX DE CÃO, HIENA e gato escaldado em que Paizão se transformou, mordia cada pássaro preso entre seus maxilares, na “gaiola das loucas” de seus familiares. Cada filho ou filha cativo da intimidade de seu colo pedófilo na rede de tucum da sala de jantar.
GUERNICA LARBIRINTO
NINGUÉM NASCE HOMEM, torna-se homem. Simone de Beauvoir em seu livro O Segundo Sexo escreveu: “ninguém nasce mulher, torna-se mulher”. Neste livro Simone desafia as mulheres a contestar a soberania do macho. Mas talvez ela estivesse a ignorar que essa propalada soberania nunca existiu. Desde os tempos perdidos do Paraíso Perdido, Eva, em conluio com a Serpente, enganou Adão e contribuiu, ela, para que fossem expulsos do lugar em que viviam. Onde está a soberania do homem, desde os tempos do Gênese??? O homem Homo sapiens nasceu para ser enganado???
A VERDADE É QUE TODOS parecem não querer encarar: as mulheres foram sodomizadas desde sempre. Eva não tinha condições de formar juízos sobre si mesma e a criação. Para conseguir compreender o mundo em que estava, para o qual fora criada, fêmea paradigma da espécie primata Homo sapiens, ela precisava viver e conviver com seus pares, fazer parte da cultura da criação. E seu par era a Serpente e nunca unicamente Adão. E Adão era, tudo indica nos textos ditos sagrados, um bobão. Um mentecapto nascido para ser pai de uma descendência imensa de ludibriados. Adão: um gigante de carne com cabeça de Abaporu.
AS CRIANÇAS NÃO ERAM respeitadas na Grécia antiga, nem nas escolas romanas. Não eram respeitadas desde sempre. Exceto a filharada das “elites”. Do século XIV ao XVII, o Renascimento se expandiu nos países europeus, motivado nos valores da Antiguidade Clássica. Dele surgiu a Idade Moderna: as artes, a cultura e a ciência. Essas conquistas históricas não chegaram a ser disseminadas, nem tampouco assimiladas pela sociedade industrializada na Inglaterra do século XVIII. Sua “elite” de prediletos e favoritos, nunca se ocupou em educar as classes da sociedade trabalhadora a ela subordinadas. Pelo contrário. Ainda hoje, neste momento histórico em que vivemos, as “elites” tiram proveito da ignorância e da falta de autoconhecimento dessas classes.
AS CONQUISTAS DA Renascença ainda agora, hoje, estão muito distantes de chegar às massas mumificadas por uma educação rústica, que nem de longe privilegia a moralidade, a gnose, o conhecimento. Ao contrário: a selvageria de intenções, a violência, as armas, as drogas, a prostituição, os vícios (“use e abuse com moderação”), a corrida desenfreada pela posse de bens de consumo, criou a cultura da propaganda e da publicidade do vale-tudo pela posse do Red Magic Seven. Samsung Galaxy S22 Ultra, Apple iPhone Pro Max, Asus Zenfone 8 com Android, Motorola Edge 30 Ultra...
AMBIÇÃO, COBIÇA, egoísmo excesso de individualismo. As conquistas do Iluminismo não chegam às escolas públicas nem aos colégios particulares. Quando chegam a esses, é apenas parte de um currículo meramente passadiço, fugaz, efêmero, teórico, sem sustentação de conhecimento e prática, a médio e a longo prazos. O contato diário com a realidade do consumismo dilui qualquer possibilidade de retenção de paradigmas da moral, do saber, do autoconhecimento pertinente à um plano social de mudanças estruturais na educação, na saúde, na economia, na política.
HÁ UMA LENDA ou narrativa que afirma ter iniciado a civilização a partir do “tabu do incesto”. Ou seja: proibição de relações sexuais entre membros de uma mesma família, indivíduos consanguíneos. Podemos, devido às evidências em contrário, afirmar, sem medo de errar, que vivemos numa sociedade descivilizada. A lei e a cultura da proibição (não falo de censura) só existem no papel. Veja-se os crimes do troglodita e ex-presidente da República, Bozo Mussolini: seus muitos crimes de responsabilidade, entre muitos outros, continuam sem punição. Um candidato a ditador instrumentaliza representantes das instituições para obedecê-lo. Não às leis e à Constituição. E 58 milhões de eleitores votaram nele. Uma parte considerável de membros do exército, aderiu a esse maluco com vezo totalitário. Querendo a qualquer custo se tornar um ditador.
AS NOÇÕES CIENTÍFICAS não fazem parte do repertório cultural dos políticos, exceto quando as consideram em próprio favor. Não faziam parte do repertório familiar de Paizão Coisinha e de sua mulher, ambos saídos de uma educação escolar e de uma realidade dissente do tempo das cavernas de há dez mil anos atrás. A sociedade atual vive paradigmas comportamentais próprios do período da Pré-História, Paleolítico, de há 2,6 milhões de anos a, aproximadamente, 12 mil anos antes de Cristo.
NA CABEÇA DAQUELA ginasiana que mal havia aprendido a ler, quase que iletrada, ignara, deseducada e bronca, ela poderia, a partir de sua vontade, dirigir a vida dos filhos que paria, indiscriminadamente, para brincar com eles de casinha, num contexto familiar destrutivo emanado de sua educação, cujo objetivo era deformar, desde o berço, seus educandos, com práticas regulares de distorção da personalidade ao molde de uma orientação para a prostituição, a submissão e as drogas. Para esse casal, assim como para milhões de outros semelhantes, essa era a educação para a inclusão e a socialização de crianças, jovens e adultos numa cultura paleolítica no século XX/XXI.
HAVIA CHEGADO O dia dela e do marido viajarem para o almejado Rio de Janeiro. Paizão havia cursado uma faculdade de odontologia, mas se dizia contrariado. Na realidade de suas aspirações, queria mesmo era ter cursado medicina. Mas, segundo ele, a mãe o havia impedido. Minha avó paterna era uma velhinha de estatura quase que anã, gordinha e totalmente perdida em ruminações de uma memória caduca e enviesada. Era uma velhinha gagá, contrafeita, torta, parecia perdida em memórias que só ela mesma poderia saber ruminar. Como aquela mulher poderia ter-lhe impedido de algo???
MEU AVÔ PATERNO tinha a aparência de um homem passivamente assombrado, intimidado por fantasmas do passado. Nele se sobressaía um cacoete: punha na ponta da língua pequenas porções de algodão, e ficava como que mascando (se é que se pode mascar algodão). Era muito magro, tudo o que ambos conseguiram na vida estava naquele apartamento ou “apertamento” de um quarto, sala e cozinha minúsculos, na rua doutor Satamini, n° 20, apartamento 101, no bairro da Tijuca. Quando morreram, o apartamento foi vendido e o dinheirinho da venda distribuído entre os filhos. Estes, não consideraram a situação de penúria familiar de Paizão, mesmo estando eles, suas famílias, em situações de privilégio social financeiro e econômico. A mim me causava certa estranheza o nome da rua do apartamento deles: dr. Satã mini. Uma menção a Paizão Coisinha???
SEUS FAMILIARES NÂO tinham olhos para ver, nem ouvidos para ouvir. Seus sentidos estavam todos embotados pela supremacia narcísica de uma situação social materialmente superior. Mãezona talvez esperasse que essas irmãs de Paizão, casadas com maridos que se deram bem na vida, pudessem se compadecer da situação de penúria em que ela tinha jogado os filhos.
CERTA VEZ, AO preencher um documento escolar, escrevi o nome dela com um dos sobrenomes de Paizão. Ela ficou muito, muito aborrecida, como se eu tivesse cometido contra ela um grande agravo:
— Nunca mais escreva o sobrenome de seu pai em meu nome. Deus me livre de ter pertencido a essa família dele. Não há ninguém nela que tenha minha simpatia. São um bando de gente ordinária, uns mais, outros menos. Até parte com o cão eles têm. Um parente de teu pai... E aí começou a contar algumas estórias escabrosas de feitos da família do marido dela. Narrativas de arrepiar.
NO ENTANTO, NA FRENTE da mulher do tio Hercínico, ou de uma das irmãs do marido, Mãezona era toda amistosa. Conversavam horas trocando as mais diversas figurinhas sobre a vida pregressa de pessoas do mútuo conhecimento. Quando mantive contato próximo, ao ser hóspede da casa da tia de nome Gracinha, em Niterói, ela falou a mesma coisa da mulher de Paizão Coisinha: que a família dela não simpatizava com Mãezona, quando namorada dele, por saberem que tinham afinidades com armações do capeta. A mesma coisa dizia delas a mulher que havia casado com Paizão.
NA REAL, AS FAMÍLIAS de Paizão e Mãezona mais pareciam uma reprodução da Guernica, pintura de Picasso, que retratava a época do pós-segunda grande guerra. A realidade familiar dela, bombardeada pela política educacional de governos e sociedades secretas que dela sempre buscaram se prevalecer, direcionando seus membros para o consumo de drogas, o tráfico e a prostituição respeitosa, como escreveria Sartre em sua peça “A Prostituta Respeitosa”: Que Náusea!!!
RETRATO DE DORA MAAR — PICASSO (1937)
A CASA DO CASAL ficou aos cuidados de uma mulher magérrima que mais parecia uma pessoa mumificada que se movia e, por vezes, falava, como se fossem suas últimas palavras, entre um e outro fôlego que mais parecia um arquejo terminal: tia Raidin. Ela era mãe de duas garotas que moravam próximas ao principal puteiro da cidade: a famosa comunidade da Rua Paissandu, onde a sociedade local da pequena burguesia ia esporrar ou esguichar suas frustrações no canal retal e vaginal das mocinhas da sociedade do lupanar. Os homenzinhos da mamãe treinavam nelas para o casamento. Também os bem treinados em sacanagem de estrada: os caminhoneiros.
AS FILHAS DA TIA Raidin moravam com uma parente em frente à Loja Maçônica do Oriente. Ela também tinha um filho, então funcionário do Banco do Brasil. O rapaz tinha a bunda arrebitada, e diziam dele, à boca pequena, que era de tanto dá o fiofó. Também diziam que tanto ele como os primos, filhos do tio dele por parte de pai, que moravam ao lado da Loja Maçônica Grande Oriente, eram chegados a atos de moralidade indefinida.
A MOLECADA DA RUA, sempre curiosa por novidades, subia por reentrâncias abaixo da janela da casa do pai dos primos do filho da tia Raidin, para ver o que acontecia na sala. Contavam estórias nas quais eu não acreditava. Mas, certa vez um deles, me chamou para escalar o parapeito da janela quando o dono da casa estava de viagem. O que vi foi surpresa. O filho da tia Raidin chupava o membro de um de seus primos, enquanto um casal de marmanjos dançava ao som de um bolero. Era uma cena que mais parecia uma narração sobre personagens de Nelson Rodrigues. Dramaturgo dos costumes mórbidos da sociedade carioca e brasileira.
AS DUAS IRMÃS dele, primo filho da tia Raidin, moravam com uma tia e, não se bem se avó paterna. Minha mãe biológica, abusou de sua força de mulher adulta, ela e o marido, para me convencer (não convenceram) a ceder meu lugar de direito de primeiro filho para que ele, segundo filho e um “favorito” de Paizão na rede de tucum, embarcasse com eles para a cidade, dita maravilhosa, do Rio de Janeiro.
ELES ME NEGARAM o direito de progênie, levaram na viagem, ao invés de mim, meu segundo irmão e a irmã mais velha dentre suas filhas: mano Manso e Vanja, respectivamente. Eu não tinha a mínima simpatia do casal, meus pais. Primeiro por ter sempre me posicionado contra as sessões de pedofilia paterna. Segundo, por dizer a meus irmãos, já crescidos, que continuavam vítimas dela, pedofilia, também no período posterior à volta deles da viagem ao RJ, que um dia, se tivesse condições, eu denunciaria esses atos “que não poderiam estar certos”. A Organização Mundial de Saúde (OMS) classifica esses atos como sendo apenas “transtornos de preferência sexual de pedófilos adultos”. Não são crimes???
MEUS IRMÃOS DIZIAM a Paizão de minha disposição de, um dia, quem sabe, eu pudesse tornar público essa abjeção cometida contra eles. Eu insistia com eles: “isso não pode estar certo”. E um deles sempre me respondia a mesma coisa:
— Ele é nosso pai e está fazendo o que acha que é certo.
— Ele não pode estar errado. Ele é nosso pai, insistia ele. — Meus irmãos não tinham desconfiômetro. Não intuíam que aceitar ser vítima dessa perversão paterna, ao se sentirem sexualmente envolvidos por essa prática, ainda que não levada aos finalmentes, desde que não havia penetração anal, não poderia ser saudável sob nenhuma opinião civilizada ou crença religiosa.
A ESTIMUJLAÇÃO genital de Paizão Coisinha, dele por si só, no bumbum dos filhos, era uma aberração. Um pai fornecer esse transtorno psicológico aos filhos, transtorno esse que futuramente lhes causaria sérias sequelas.” Isso não poderia estar certo”. Tanto ele como ela sabiam que pedofilia não era crime constante no Código Penal. E segundo a Organização Mundial de Saúde, era apenas uma doença, um transtorno psicológico. Estavam, dessa forma, livres de acusações e de cadeia.
EU DESDE CEDO gostava de leituras. Havia lido “tio” Freud em livros e HQs. Era de meu conhecimento que traumas infantis causavam transtornos de comportamento perigosos em adolescentes. O que confirmei futuramente em leituras mais bem pesquisadas sobre psicologia e psicopatologia. Mas, acredito que ainda hoje as instituições psicológicas não se moveram no sentido de, no Congresso, criar leis contra ela, e criminalizar na intensidade que ela, pedofilia, merece.
O RESULTADO DESSA impunidade é este que presenciamos hoje, nos dias de agora: milhões de crianças e adolescentes sendo vitimadas por drogas e traficantes que as usam e abusam em vídeos visualizados na Internet Profunda. Uma quantidade exponencial de adolescentes de ambos os sexos e de adultos, quem sabe também de idosos, dedicados às afeições de afetividade destorcida. O país Brasil é um exportador dos mais funcionais de travecos para países europeus, árabes e para a América do Norte.
SE ADÃO E EVA foram criados e nominados no Livro do Gênese, homem e mulher, ou seja, o Deus Et os criou macho e fêmea, então, segundo o sequenciamento do DNA da Criação está tudo errado. É possível que nos dias de hoje a humanidade esteja mais dedicada ao sexo padrão da sodomia, do que ao sexo papai-mamãe, como era conhecido nos tempos muito idos do Paraíso Perdido.
PAIZÃO COISINHA e a sua mulher sabiam que me abandonar em mãos da tia Raidi, a mim e a irmãos menores, dando a ela uma certa quantia em dinheiro para fazer o mercado e alimentar a todos os que ficaram, era uma temeridade. Raidin era uma criatura que respirava com dificuldade. Cada respiração e cada transpiração eram acompanhadas de um chiado que denotava a dificuldade dela em sorver o ar para os pulmões, desde que havia sido, por um período de sua vida, tuberculosa.
MAS PAIZÃO COISINHA e cônjuge não queriam saber disso. Estavam se divertindo a valer na cidade maravilhosa. Não pagavam hospedagem nem tampouco alimentação. Tinham levado dinheiro acumulado por ele e as economias roubadas de mim. De minha caderneta de poupança na Cooperativa próxima à Casa Almendra, um armazém de venda de comestíveis, eletrodomésticos e fazendas, tecidos de todos os tipos.
HAVIA NELES UM propósito. Eu ficara à mercê das influências do veadinho filho da tia Raidin, funcionário do Banco do Brasil. O primo, quando andava, rebolava mais do que a Carmen Miranda com suas frutinhas tropicais na cabeça. Ele, após dois meses de espera que voltassem do sudeste do país para socorrer os dependentes menores que ficaram sem roupa, sem alimentação, sem recursos mínimos de sobrevivência, começou a reclamar da falta absoluta de recursos que fazia a pobre tia Raidin, sua mãe, ficar sem saber o que fazer para alimentar a filiação abandonada do casal.
O PROPÓSITO DELES era fazer com que a longa convivência com o veadinho, sobrinho deles, meu primo por parte dela, tia Raidin, irmã de Mãezona, pudesse exercer influência sobre minha sexualidade. E eu também me tornasse um sujeito tipo “florzinha”, tal como ele e seus primos por parte de pai, filhos do Toledo, e irmão do ex-marido da tia Raidin, que, segundo narrativa materna, fora assassinado por motivos que até hoje não sabiam dizer ao certo. Porque nunca me disseram, nem eu me interessei saber. Afinal, numa sociedade de flozôs, filhinhos de papai, eu poderia, se também alguém semelhante à normalidade da progenitura dessa sociedade, abrir janelas em direção à empatia familiar e social de suas crias. De sua progenitura.
MÃEZONA E PAIZÃO passaram dois ou três meses fazendo turismo no RJ, isto aconteceu há décadas, não lembro exatamente se, 45 dias, dois meses ou 90 dias. Enfim voltaram para à cidade natal e encontraram uma residência devastada pela pobreza: os filhos vestindo roupas rasgadas, magérrimos, mal alimentados, com uma refeição por dia, ingerindo café da manhã de favor, em casas de vizinhos e conhecidos próximos. Talvez, ao rememorar esses acontecimentos Paizão tenha se ajoelhado diante de mim, muito tempo depois, quando, sexagenário, eu fazia faculdade de Letras, repetindo:
— “Me perdoe, me perdoe, me perdoe”. Como perdoá-lo??? Todos os dias de minha vida infantil, adolescente e adulta foram dias de perdão. Ainda idoso eu teria de mais outra vez vir a perdoá-lo??? Setenta vezes sete, o número bíblico do perdão já havia sido ultrapassado há muito. Muito tempo. Mãezona, a mãe da zona no larbirinto, se queria mulher de Paizão e minha amante??? Afinal, vivíamos sob o mesmo teto. Eu não a considerava minha mãe. Exceto no sentido biológico.
PERSISTÊNCIA DA MEMÓRIA — SALVADOR DALI (1931)
MINHA AVÓ MATERNA lembrava, nas faces, olhos e formato da boca esgarçada, uma Coruja. Uma Coruja com nariz de bruxa. Vá Coruja, ave soberana da noite. Mistério, conhecimento, inteligência, sabedoria. Ela via além das sombras e da escuridão. Certo dia ela me disse:
— “Sua mãe nunca teve olhos na vida para mais nada. Ela nunca via você enquanto filho dela. Ela talvez nem quisesse ter parido um único filho. Era só queria ter parido filhas. Tudo que ela queria ser era ter o destino atrelado ao de seu pai. Tudo que ela queria ser era ser a puta do marido dela. Os filhos, eles eram só motivos para a amarração dele nela”.
ELA ME PEGOU DE surpresa. Não esperava dela uma fala de intensa sinceridade e verdade. Mas suas palavras me fizeram pensar e concluir que ela estava certa. Mas, essa realidade mudou radicalmente quando Paizão passou a frequentar a casa de uma professorinha primária. Mãezona experimentou um choque de veracidade. Ambos se hostilizavam mútua e abertamente todos os dias. Na frente de qualquer pessoa.
ELE NÃO ESTAVA mais na companhia de um amor acima de tudo e de todas as coisas. Ele agora era invectivado verbalmente ultrajado com palavras de profunda ira, ódio mesmo. Mostrava-se profundamente ultrajada. Não como anteriormente, nas brigas de casais. Mostraram-se odientos, implacáveis, principalmente ela. Paizão passou a alegar com frequência a situação de insolvência familiar devido ao fato dela fazer questão de ficar buchuda todos os anos. Culpava-a por não usar um dos muitos métodos anticoncepcionais à disposição das mulheres.
MÃEZONA RETRUCAVA que não fazia isso, não usava o “diu”, dispositivo intrauterino de plástico no formato de T, inserido no útero, porque o Papa, em Roma, dizia que era pecado qualquer método anticoncepcional. Ela era cristã e não ia contrariar o chefe da Igreja Romana. Estava mentindo. Mãezona não usava anticoncepcional porque tinha a expectativa de que haveria de ter uma criança que ela pudesse dominar tão completamente que pudesse sentir-se senhora de suas ações direcionadas a favorecê-la.
A NECESSIDADE DE ter alguém sempre disponível para ela, só para ela, era um sentimento que não conseguia esconder. Por vezes sentia essa impossibilidade, ficava muito irada, a face certa vez mostrou-se muito transtornada, ela olhou para mim com olhos de alguém muito estressada, psicótica mesmo, censurando-me disse, fazendo um gesto de mãos como quem estava a torcer o pescoço de alguém:
— “Se eu pudesse torcia o pescoço de cada um de vocês”. Ela estava se referindo aos filhos e a mim de modo particular. Talvez as filhas fêmeas não estivessem incluídas. Os lábios no rosto estavam contraídos e inequivocamente furiosos. Eu, que sempre mostrei uma profunda identificação com seu estado perturbado, por compreender que não era fácil, nunca havia sido fácil a vida infantil dela. A vida de indescritíveis traumas, humilhações, misérias, fone e necessidades:
TALVEZ, QUEM SABE dizer ao certo??? Ela estava querendo dizer as coisas ditas na canção “Aos Nossos Filhos”, cantada algum tempo depois com sentimento insondável, por Elis Regina:
— Perdoem a cara amarrada/Perdoem a falta de abraço/Perdoem a falta de espaço/Os dias eram assim/Perdoem por tantos perigos/Perdoem a falta de abrigo/Perdoem a falta de amigos/Os dias eram assim/Perdoem a falta de folhas/Perdoem a falta de ar/Perdoem a falta de escolha/Os dias eram assim/E quando passarem a limpo/E quando cortarem os laços/E quando soltarem os cintos/Façam a festa por mim/E quando lavarem a mágoa/E quando lavarem a alma/E quando lavarem a água/Lavem os olhos por mim/Quando brotarem as flores/Quando crescerem as matas/Quando colherem os frutos/Digam o gosto pra mim/Digam o gosto pra mim!!!
AQUELA MULHER BRAVA, que dizia, olhando para mim, no fundo de meu olhar perplexo e humilhado de criança, que ela era arauto de uma soberania sem fim. Era uma artista do inferno materno. Não soube dominar a arte de perdoar. Achava que merecia tudo de melhor por ter passado, por ter vivido, vivenciado tantos e íntimos horrores, tantas convividas misérias. Não estava nela superá-las. Não havia forças para isto.
ELA MESMA CONTRIBUÍA inconscientemente para que a situação familiar fosse insolvente. Tudo acontecia no mundo do astral, do Inconsciente Pessoal dela, reforçado pelas energias ativas e hostis do Inconsciente Familiar e Social que a devoravam por dentro com seu tsunami de ressentimentos.
ELA, NUM ÁTIMO, percebeu minha intensa empatia com seus sofrimentos anímicos indizíveis, incomunicáveis de outra forma que não fosse por esse impulso de dizer suas verdades a quem pudesse compreendê-la e, talvez, quem sabe, perdoar sua inacreditável frustração enquanto ser humano desumanizado desde a mais tenra idade. Ela então, de repente, sentiu que eu estava profundamente decepcionado com a ameaça dela para comigo e no geral de seus outros filhos. Ela sabia que aquele momento ficaria indelével em minha memória. Mas, talvez se sentisse melhor com essa explosão de raiva, de desilusão, desgosto e desencanto.
O CIRCUITO HUMANO da soberania narcísica havia nela se instalado. O poder de engravidar e parir ou abortar todos os anos, a contemplava com essa compensação: poder gestar, embuchar, sentir uma forma de vida que ela jamais poderia dominar, crescendo, desenvolvendo-se dentro dela, em suas entranhas estranhas. Talvez se perguntasse quem, ou que tipo de poder estaria usando-a para um jogo de faz de conta que é ela quem vai ter alguma influência sobre cada um deles. Ela sabia que não era assim. Por isso mesmo não podia senão colérica, irritadiça, irascível, zangada, desalmada, empedernida, inflexível.
ELA QUERIA QUE todos reconhecessem que ela era a senhora da Criação, da gestação de sua progênie, não apenas um instrumento dela. Ela talvez se avaliasse como sendo Eva, a destrambelhada mulher Serpente que só precisava do marido para infiltrar-se no óvulo da Mãe do mundo. Queria, talvez, que lhe dissessem:
— “Salve Senhora de nobre estirpe. Estais a distribuir justiça aos mortais a quem aferiste origem. Os deuses te escolheram para parir esses teus filhos. Embora angustiada estejas com eles e saibas que não serão para ti senão uma canga em teu pescoço”. A tragédia pessoal, familiar e social dela, Mãezona, foi não ter confiado na força de meu caráter, nas promessas que fiz quando criança de que haveria de conseguir, a partir do fogo prometeico que me aquecia e no qual eu acreditava, pudesse libertá-la de sua enorme pobreza material e de espírito. Ela não acreditou em mim. Em meu amor por ela, apesar de suas aberrações maternas. Investiu errado no errático caos familiar, social.
EU HOJE VEJO nela a carranca deformada da mulher em D´Hermine Pass traduzida por Picasso no estilo surrealista. Mulheres passam, dissolvem-se como se estivessem no Tempo de um relógio que marca sempre a diluição de uma condição existencial vencida. A persistência da memória diluída. Metáfora da pintura de Salvador Dali.
“COMEDIANTE” — PAUL KLEE (1904)”
NENHUM MEMBRO daquela família me via com bons olhos. Todos estavam plugados no fato de que eu era uma ameaça à sobrevivência material deles, uma ameaça de dividir um pouco da pobreza familiar comigo. Pretendiam saber, melhor do que eu mesmo, o que era bom ou mal para mim. A força do Inconsciente Coletivo Familiar era superlativa. O que eu podia contra ela??? Talvez estivessem todos com medo de que eu cumprisse minha promessa de um dia revelar toda aquela insana relação de um pai pedófilo e de uma mãe conivente com embuste familiar: denunciar seus corações e mentes infectados por aquela energia tenebrosa que os envolvia nas sessões de transtorno da preferência sexual paterna.
EU NÃO TERIA nunca um lugar em que pudesse ser ouvido e visto em minhas reivindicações de oportunidade de vida. Eu tinha em mente que tudo poderia terminar bem. Se eles não estivessem tão fanaticamente polarizados. O ódio de Paizão por mim, sua implacável concentração na negação de qualquer iniciativa minha, mesmo que ele dela se beneficiasse, não permitia que ele me visse como seu aliado. Não sei se consegui, neste romance, fazer valer a arte literária que torna visível a realidade invisível. Meus leitores é que vão dizer se esta visibilidade é real.
AO VOLTAR DO RJ, Mãezona se dedicava a fazer valer seu tempo ensinando uma turma de alunas a modificar com pinças quentes, aquecidas em pequenas lamparinas à base de álcool, abrasadas por sobre um pavio, a forma de bonequinhas tipo Barbie, transformando-as em bailarinas, príncipes, nobres, reis, rainhas, bailarinas, anões, espadachins, palhaços.
TALVEZ ELA TENHA feito esse curso no intuito de, não apenas se divertir manipulando bonecas manualmente, já que não podia manipular como queria, a direção para a qual pretendia que eu seguisse. Depois da desfiguração das pequenas manequins, era só uniformizar as bonecas, vestindo-as a contento com calcinhas, saiotes, sapatilhas, pulseiras, culotes, colares, pulseiras e enfeites, finalizando com retoques de pintura nos olhos, nos lábios, nas unhas e sobrancelhas. Após sobrepor artificialmente os supercílios, ou desenhar as sobrancelhas, tecia os cabelos com certo tipo de linha, com os fios das quais moduladas as cabeleiras: lá estavam suas criações manufaturadas. Seus bibelôs.
NESSE PERÍODO, após a volta da viagem, ela ficou outras vezes grávida, até o décimo filho nascido vivo, o Coisnha Jr. Num domingo de sol, fazendo-se exasperar com a demora do marido e filhos que saíram para se divertir na coroa de areia do rio Parnaíba que, nos meses dos “b-r-o-b-r-ó-s” (setembro, outubro, novembro, dezembro) atraía centenas de pessoas que iam se bronzear próximas aos quiosques de palha onde a cerveja gelada e a cachacinha com tira-gosto de petiscos, os fazia parecer adultos. Marmanjos embebedando-se, dando vazão às suas temeridades, seus cansaços, complexos e recalques, em papos de grupo onde a pobreza de espírito os fazia embarcar na nau dos náufragos das piadas sexistas, machistas, bem ao gosto do servilismo baixaria, estrutural, que escondia a impotência de suas ideias e a morte de qualquer ideal que não fosse habitual, ordinário, vulgar.
MÂEZONA, LÁ pelas dezesseis horas, saiu de casa acompanhada por mim e pela Zélia, uma moça do interior que era hóspede de casa e viera para estudar na capital do Estado. Ela olhava para a barriga inchada, grávida, próxima à data do parto e abanava as mãos sobre ela, injuriando com palavras ofensivas, o embrião que estava próximo à data de ser vomitado de suas entranhas que o amaldiçoavam. Sim, porque o Coisinha Jr., prestes a nascer, estava certamente empatizando todo aquele discurso de rejeição que ela fazia com relação à Paizão e ao Coisinha que estava para nascer. Ela agora, depois que o marido arranjara uma amante, mostrava-se disposta a verbalizar hostilidades contra ele, em qualquer oportunidade que aparecesse.
DÉCADAS DEPOIS de parir Coisinha Jr., esse se revelou uma criatura desmiolada, frágil, que ameaçava suicidar-se para fazer chantagem emocional com o agora casal idosos que eram seus pais. Coisinha Jr. se refugiava no apartamento de um irmão em Brasília. Depois, pediu guarita na casa de Fernão e Vanja, primos que haviam se casado e moravam em Natal. Algum tempo depois saiu brigado de lá porque queria apossar-se da parte anexa da casa que o casal havia liberado para ele morar, alegando que haviam doado a casa para ele nela instalar uma academia de musculação. O Coisinha Jr. Era mesmo muito doidão.
PAIZÃO E MÃEZONA não tinham mínima noção da responsabilidade superlativa que é planejar trazer uma criança para o mundo. Esse mundo cão. Este é um livro sobre verdades que raramente, ou quase nunca são ditas. Talvez porque tenham tudo a ver com a base frágil nas quais se erguem as palafitas da maior parte das famílias pequeno burguesas no Nordeste. O casal prosperava apenas em desditas, revés e tribulações.
PAIZÃO TARDIAMENTE se deu conta dos malefícios que processou em meu desfavor durante toda sua vida. Testemunho reiteradamente essa ocorrência do pedido de perdão ajoelhado diante de mim, com braços esticados para cima, e comparo à imagem do desenho figurativo “Comediante” obra ode Paul Klee. Ele, Paul Klee, afirmou: “A Arte Não Representa O Visível, A Arte Torna Visível”. O expressionismo tragicômico de Paizão Coisinha Comediante, ajoelhado diante de mim a repetir:
— Perdoe-me. Perdoe-me. Perdoe-me.
EU ME DETIVE A olhar surpreso, sem saber o que fazer: se me ajoelhava frente a ele e o abraçava também dizendo:
— Tudo bem. Não é preciso fazer isto. Levante-se. — Mas o amontoado de indignidades ao longo da vida que eu havia presenciado nele, não me permitiu senão me ausentar da presença patética que, de joelhos, me pedia perdão. Nesse momento surge, súbito, Mãezona. Ela quebrou a continuidade de um possível desfecho outro, que não meu simples afastamento da cena e de sua estranheza. Mãezona olhou para mim, interrogativa, enquanto o marido se levantara e se afastava rumo ao quarto. Essas personagens desse mundo familiar, que têm de moderno??? Eu testemunhava a precariedade do olhar racionalista sobre essas personagens, poder-se-ia dizer: modernas???
O SÁBADO DAS BRUXAS — GOYA (1821)
PAIZÃO HAVIA despertado para a falta de caráter de Coisinha Júnior. Este, cuidava de receber e distribuir o salário de aposentado dele. Antes, essa responsabilidade estava em mãos de Dulce It, “A Coisa”, a irmã mais intensamente perturbada da família. Ela se mantinha como que um androide, uma marionete de olhos sempre arregalados e a atenção fixa num lugar ou objetivo em seu “eu” interior. Possivelmente guiada por uma fixação intensa. Sua libido deveria num estágio inicial e primitivo de desenvolvimento. Tinha intenso apego mórbido a pessoas ou coisas, e um comportamento imaturo, neurótico. Ela e Coisinha Jr. Se davam muito bem. Identificavam-se intensamente.
PAIZÃO COISINHA OS manipulava como se estivessem ligados a uma central de controle PSI da qual tinha o controle remoto. O problema é que a recíproca era insuspeita, evidente, inconteste. Existia entre eles uma identidade intensa e, ao mesmo tempo, uma contra identidade projetiva. Inconscientemente eles assumiam sentimentos e emoções uns dos outros. Eles se assimilavam tanto que poder-se-ia afirmar que tinham a propriedade uns dos outros. E que eram o modelo ideal para eles mesmos. Todos os filhos desse casal desequilibrado, foram criados para assumirem esse tipo de identidade mútua. Intensa.
O TIPO DE ENERGIA mórbida advinda da proximidade entre eles, em decorrência das sessões, quase que diárias de pedofilia, não teria afetado Coisinha Júnior tanto quanto os demais membros da prole. Isto porque Júnior havia nascido por último. Era o mais novo da sequência de dez. E Paizão estava cercado de filhos que haviam crescido e estavam mais atentos e críticos com as coisas que ocorria em derredor. Pegava mal ele fazer com Coisinha o que fazia com os demais.
PAIZÃO NÃO GOSTAVA da proximidade de nenhum dos filhos. Mãezona e ele apenas os toleravam. Queriam, o mais urgente possível, livrar-se da cercania deles. Um por um, com a ajuda de vizinhos e conhecidos, foram sendo descartados, conforme as possibilidades aleatórias que se iam apresentando. Petrônio, político importante da família Portela, que tinha irmãs, pai e mãe morando em frente da casa e consultório de Paizão na rua Senador Teodoro Pacheco, foi efetivo para conseguir um emprego em Brasília para um deles. Outro, depois de estar num seminário, foi dirigido para um curso de formação de soldados e cabos da PM e seguiu a carreira militar nessa instituição até a patente de coronel. As mulheres foram se arranjando em namoros e casamentos.
O TEMPO PASSOU e o “Salta Moita” Paizão Coisinha, foi ficando cada vez mais exposto às suas próprias perfídias, traições, ultrajes e hipocrisias. Uma enorme farsa se formou em torno do Inconsciente Coletivo da Família. Os rapazes se tornaram nominalmente adultos. As moças, se aliciaram em seus nichos de mercado conforme a sujeição mais adequada. Dulce It, “A Coisa” se amasiou dentro de um quarto da casa de Paizão com um sujeito de cor que tinha vínculos com o crime organizado, após ser por muito tempo amante da prima Macheza Crispina, uma Maria Sapatão que dividiu com Paizão as despesas de compra de um apartamento para ela. Depois das sessões de pedofilia, parte relevante da educação infantil da família, a sexualidade dos filhos certamente pagava a conta da violência sexual sofrida na infância. Os traumas decorrentes, todos sabem, são para toda a vida. Cada um deles guardava seu segredo e a sua mão fechada. E o medo, medo, medo de admitir a realidade do que acontecia.
DE NADA ADIANTAVA guardar os segredos de liquidificador. As sessões de Psicologia ajudam, quando as vítimas admitem querer superar suas infames e dolorosas realidades de vítimas infantis, quando o agressor é o próprio pai. Com mãe conivente dentro de casa. Esconder-se debaixo do tapete do lixão emocional da família, não livra a cara do adulto que precisa de coragem para não ser novamente envolvido no processo de vitimização. Não adianta querer se esconder sob a proteção do telhado de vidro. As consequências da violência na infância geram sintomas de ansiedade, depressão, isolamento social e comprometimento cognitivo.
NAMORAR, NOIVAR, casar, ter filhos não vai isolar a pessoa adulta dos constrangimentos da violência que na inocência pueril aconteceu. Quem vai educar o adulto que, supostamente, sabe tudo, mas está a viver a mentira, a vergonha, de que nada aconteceu com ele??? Como se esconder de si mesmo e de suas realidades. Como costumava dizer Mãezona: “pancadas dadas e palavras ditas, nem Deus tira”.
O CARÁTER, A personalidade, o comportamento dessas pessoas, ficam para sempre danificados. O convívio com os filhos, amigos, vizinhos passa, por empatia da proximidade, a verdade que pretendem esconder. A contaminação é geral. Por isso vivemos numa sociedade com um Inconsciente Coletivo Social contaminado por segredos aparentes do liquidificador emocional, que não é o mesmo liquidificador de produtos das receitas de bolo e culinária de tv.
OS RESSENTIMENTOS, a ansiedade por externar e se libertar do trauma, cria uma personalidade individual permissiva, uma sociedade que confunde liberdades individuais, com agressão mútua e tolerância infinita às demandas da corrupção política, tipo promoção de emendas parlamentares de relator ou orçamento secreto, moeda de troca sem controle da sociedade e órgãos de fiscalização sobre os recursos dos impostos pagos.
TANTO NO PLANO individual, familiar, quanto no social, a traumatologia é ampla, geral e irrestrita. As feridas causadas pela violência à sexualidade das crianças emocionalmente globalizadas pelo comportamento pedófilo de pais e familiares, gera uma sociedade de pessoas que são extensões de personas facilmente enganáveis por políticos sempre cheios de boas intenções e da malignidade própria da profissão: todos não cessam de acusar a todos de uma “herança maldita”. Quando todos eles são agentes dela e de suas consequências sociais, as mais degeneradas.
ELAS SÃO MILHÕES, pessoas vítimas de pedofilia. Elas tendem a agir e reagir de maneira escusa, evasiva, astuciosa. Nos dias de hoje quase todas as pessoas estão contaminadas pelo vírus da artimanha. Dulce It, “A Coisa” roubava o dinheiro o salário da aposentadoria de Paizão. A própria Mãezona dizia que o marido havia substituído ela por Tonho Ratazana, o Coisinha Júnior. Este, continuou assaltando o velho pai que não tinha moral para reagir às incursões agressivas de “A Coisa” e de seu irmão rapace.
COISINHA JÚNIOR havia chantageado emocionalmente a ambos, pai e mãe, com a desculpa de que estava propenso a cometer suicídio, porque não sabia o que fazer da própria vida desperdiçada, sem rumo. Ele contava uma história muito estranha e cheia de furos. Havia se apaixonado por uma mulher que ele denominava “Cubana”. Mais não dizia nada sobre ela que não fosse a acusação de que ela havia acabado com a vida dele, abandonando-o de repente e o conduzido a um estado emocional deplorável. Coisinha Júnior, um fraco. Usava sua fraqueza para se fortalecer no complexo de culpa dos pais.
ANTES DISSO, havia recorrido a outro irmão que havia se estabelecido na capital federal e trabalhava de assessor legislativo de um senador da República. Morou com esse irmão e, de repente mudou para a casa dos pais onde eu estava de hóspede. Eu buscava não ter contato nenhum com ele, por saber que Coisinha Júnior tinha uma vida bastante esquisita, com amizades de um pessoal marginal do qual se dizia amigo, mas vivia a reclamar, escandalosamente, de um ou de outro evento em que fora, por algum deles, passado para trás em quantias emprestadas de pequenas montas do dinheiro que roubava de Paizão.
HAVIA UM VIZINHO, que morava no meio da quadra. Ele tinha problemas policiais: preso por furto, tráfico e porte de arma. Era amigo prezado por ele, Coisinha Júnior. A justificativa é que tinham sido colegas de infância e, portanto, na lógica de Coisinha Júnior, era uma amizade que ele não poderia evitar, desde que consagrada pelo tempo.
OUTRO CONVIZINHO, filho de uma costureira, reclamava das cenas de ciúmes que Coisinha Júnior fazia quando este mesmo amigo dele estava a conversar ou trocar ideias, ou falar ao telefone com outras pessoas. Coisinha Júnior me censurava por pagar ao vizinho a prestação de serviços quando havia falha no PC de meu uso. Ele dizia que eu sabia que ele estava brigado com o Fulano, e mesmo assim ignorava isso:
— Você sabe que eu não me dou bem com Fulano, mas chama ele para ajustar problemas no PC. Isso é provocação. Eu respondia:
— Seus problemas são seus. Não tenho nada com eles. Não sei nem quero saber se Fulano é ou não seu amigo ou inimigo. Pago por serviços prestados porque preciso trabalhar no PC, se ele não estiver funcionando bem, como vou fazer???
MÃEZONA SEMPRE alimentava as paranoias e histerismo comportamentais de Coisinha Júnior. Talvez com remorsos por ter feito discursos insultando-o e retaliando nele, ainda um feto na barriga dela, todo o ódio que vituperava contra o marido, quando esse frequentava a casa da amante. Coisinha Júnior era apenas um embrião, mas Mãezona não o poupava de censurar sua existência e gravidez, freneticamente, mesmo antes de seu nascimento. Ele já nasceu com complexo de rejeição. Um feto sabe o que acontece quando a mãe se dirige a ele.
ELA SEMPRE seria uma criatura bronca relativamente à educação filial. Quando eu, com a devida afabilidade buscava fazê-la compreender que estava dando força a quem precisava contrariar por agir de várias formas inaceitáveis e trapalhonas, em relação a várias pessoas, ela dizia:
— Seu irmão precisa de meu apoio, não de ser por mim contrariado.
— Você não vê que ele está muito doente??? Ele precisa de um psiquiatra, ou de um psicólogo. Eu conheço uma psicóloga muito competente. Irmã da Fulana, minha namorada que você conhece. Por que não o indicar para um tratamento???
— Ele jamais aceitaria. Ele se julga a pessoa mais normal do mundo, respondeu ela.
— Você sabe que ele não é. Por que não tenta convencê-lo???
— Eu não, não quero que ele se volte contra mim. Ela, réu confessa de seus medos. Réu confessa de muitas culpas.
ERA ASSIM QUE Mãezona encarava os problemas: fugindo imediatamente deles. Saindo da possibilidade de uma solução. Dialogar não era com ela. E Coisinha Júnior deitava e rolava sobre a fragilidade emocional, mental e a poltronaria dela com relação à criação, não apenas dele, mas, em minha avaliação, de qualquer outro de seus filhos. Quase todos os dias eram dias de sabá para Mãezona.
DOIS ACROBATAS — PICASSO (1901)
A DUPLA DE cônjuges a quem eu deveria chamar de pais parecia a mim, crianças, não ter a mínima ideia das responsabilidades que deveriam ter por consequência de terem casado. O casamento para eles não passava de mais uma festividade, tipo pular fogueiras de São João. Haviam certamente combinado que seria bom para eles ter filhos, fariam como todos fazem: vestido de noiva de um lado, terno e gravata do outro. Convivas a comemorar a conjunção carnal sem propósitos pertinentes, relevantes e meritórios. Apenas botar mais bocas no mundo para devorar seus recursos naturais. Por que será que será que canibais, alguns animais, devoram os próprios filhos???
SUAS VIDAS estavam mais secas de sentido moral e de responsabilidade para com seus descendentes, que as vidas secas do romance de Graciliano Ramos. Neste, a narrativa está ambientada no sertão de chuvas escassas, da indiferença e do desdém dos governos para com investimentos sociais rurais. É como se o sertão existisse para que se visse sertão. Aquele casal, nascido e criado em terras nordestinas, eram uma metáfora viva do ambiente hostil do sertanejo.
ESTAVAM ELES despidos, despreparados, carentes e privados de educação elementar. Casaram como teriam almoçado uma buchada de bode. Os filhos sairiam da barriga dela como a buchada seria excretada num vaso sanitário ou em meio a mandacarus. A família seria uma representação, uma alegoria, um símbolo da República do Bananal: a foto da estiagem da alma nacional. Seriam outro exemplo do descaso por investimentos sociais.
UMA FAMÍLIA a mais para os vícios, a marginalidade, as drogas, a sodomização sistemática de crianças sem nenhum amparo de moralidade religiosa, amparadas apenas pela existência em si. Não tinham sequer um mínimo compromisso com educação dos filhos. O contrato conjugal deles era uma formalidade, um rito irresponsável. Um ritual cartorial previsto nos padrões, costumes e liturgias cerimoniais.
ESTAVAM A cumprir apenas a pulsão natural dos infelizes que se juntam por medo de ficar sozinhos, abandonados no meio do Saara infernal e de seus fantasmas migrando de sarcófagos milenares. Retirantes de uma miséria de criação. Expandindo memórias no nosso belo quadro social, como diria o cantor baiano Raul Seixas. Depois do casamento, era pagar para ver: depois é depois. As atrocidades que daí sairiam, ninguém se importaria com elas. O importante para Mãezona era parir e parir outra vez, todo tempo que fosse possível embuchar. Para ela era um ritual de poder. Poder gerar vida de suas misérias, de suas barrigadas. Poder ter um lugar para comer, beber, dormir mijar e defecar.
SERIAM OUTRO casal Fabiano e Sinhá Vitória urbano, numa sociedade que os ignoraria superlativamente e à sua descendência de escravos. Cada membro familiar e todos eles querendo apenas e exclusivamente ser vitoriosos na sobrevivência soberana, uns sobre os outros. Sem nenhum saber valorar o que é ou não ânimo pertinente a um estado de espírito voltado ao exercício de algum valor ou moralidade. O narcisismo selvagem de uma sociedade sem princípios ou patrimônio moral.
CRIADO EM meio a essa mixórdia de chafurdo, eu só queria me sair o melhor possível e zelar por minha integridade física o quanto fosse possível preservá-la. Seria difícil. Eu estava em meio à explosão nuclear de duas bombas nucleares cheias de traumas, complexos de inferioridade, ressentimentos e ansiedades. Eu nasci em meio às alas mais devastadas de assistencialismo governamental — do país. Eu nasci em meio à miséria nordestina destinada a sambar na ala mais atrasada da escola de samba Brasil. Um país recheado de veadinhos dissimulando alegria, dançarinas de concursos televisivos, apresentadores de programas de música sertaneja que cantam as mazelas de ser corno, ou ter perdido a Juma que virava onça no Pantanal. Essa, a cultura nacional: suas verdades secretas. Seus orçamentos secretos. Seus agentes íntimos, privados de outra cultura que não seja a do narcisismo.
EU ESTAVA no epicentro da explosão nuclear de adversidades mil. O lugar familiar era um sepulcro vigiado por espíritos opressores que se oprimiam entre si e a quem por perto deles estivesse. Queriam a qualquer preço que eu aceitasse ser prisioneiro de guerra deles. Da guerra familiar por absorver a todos na esponja da própria mediocridade.
QUE PODERIA eu fazer para ficar longe daqueles anjos do inferno randomizados pelo Inconsciente Coletivo Familiar, Social, Nacional??? Eu tinha de fazer de contas que contemporizava com eles, ou não teria como subsistir entre eles. Eu precisava comer, dormir, estudar num ambiente francamente hostil às minhas necessidades, as mais vitais.
EU VIA AQUELE ambiente familiar como sendo uma arapuca de Satã. O ecossistema familiar sentia o maior prazer em me manter sob a mais-valia de suas necessidades. Minha presença significava para eles, cada um de seus filhos, uma maior escassez de possibilidades. Desde que qualquer valor canalizado para minha sobrevivência significava estar “tirando o pão da boca de seus irmãos menores”.
MEUS SENTIMENTOS, minhas emoções, meu coração e minha mente pertenciam a outro universo, a outra realidade, a diferente horizonte de eventos. Minha realidade interna não era sequer semelhante à deles. E eles sentiam um envolvente e sádico prazer de me ver nela, realidade, e me manter atrelado à opressão de suas muitas necessidades. Sem nunca, nenhuma vez, considerar as minhas privações.
A FAMÍLIA DO HOMEM CEGO — PICASSO (1903)
NINGUÉM EM quem confiar. Ninguém disposto a me ouvir. Uma criança a viver acossada pelos adultos e demais familiares. Estava a viver um aprendizado de rato num larbirinto. O bloco de construção básico de meu universo infantil sendo deteriorado justamente por quem deveria me dá a mão: Mãezona. Essa criatura infinitamente perturbada. Mais uma coisa que uma mulher, muito menos uma mãe. Em todos os níveis de organização biológica, seus átomos, moléculas, células, tecidos e órgãos eram partes de uma estrutura do mais baixo nível de conhecimento próprio e do outro.
A SINFONIA universal esotérica era para ela uma realidade totalmente fora de seu mundo. Exceto pela possibilidade de dominação pelo mal que poderia causar-me. Criava-me aflições metodicamente. Cercava-me de uma imensa rede de intrigas da qual, ela tinha certeza, ela e o marido, de que eu não poderia sair. Como aceitar todo esse amontoado de tensões, perturbações, ansiedades e desassossegos, sem que essa educação não tivesse sequelas em minha vida de adolescente e de adulto???
SERÁ QUE ela não via isso??? Via sim. E tinha um enorme prazer de me ver sofrer em suas mãos prenhes de uma intencionalidade absolutamente maquiavélica. Na perversidade deliberada ela buscava a afirmação de influências sabidamente destrutivas. Como poderia eu, futuramente, quebrar esse espelho materno que me forçava ver meu reflexo desnutrido de intenções maternas conforme minhas melhores habilidades de espírito??? Que espécie de energia vital infortunada dominava aquela criatura???
ONDE ESTAVA o lado bom de sua personalidade que nunca para mim aparecia??? Por que ela só manifestava a consciência de anseios e perturbações camufladas de uma bondade aparente, que não existia??? Eu me espelhava em suas contínuas mentiras e encenações de maternidade enganosa. Enganosa sim, mas cheia de disfarces. Dizendo uma coisa e fazendo outra oposta. Ela e o marido queriam apenas se autopreservarem e destruir em mim tudo que não se identificasse com criaturas sombrias que com eles conviviam na noite eterna de suas intencionalidades. Maléficas.
ELE, ESSE casal dantesco, não queria conviver comigo por saber, talvez, que se investissem um mínimo de recursos em minha educação formal continuada, eu saberia crescer rapidamente em direção à minha emancipação da companhia familiar nefasta de ambos. Deles e de suas extensões físicas: os “irmãos menores" pelos quais eu deveria gostar de me sacrificar e investir meus recursos mantidos numa caderneta de poupança, conseguida com trabalho próprio, sempre esvaziada em favor deles.
PAIZÃO COISINHA e a mulher tinham plena certeza de que eu não poderia jamais aliar-me a seus propósitos escusos, porque tinham em mente que eu poderia cumprir a promessa de que um dia, ao olhar as sessões de pedofilia dele no centro da sala de jantar, eu contaria essa história, dessas coisas que, claramente, não estavam nada certas:
— Um dia eu ainda vou contar essa coisa errada que vejo se repetir quase todos os dias. Essa coisa errada: Paizão tendo orgasmos na bundinha de seus filhos e filhas. Sujando a calça ou o pijama com a porra de ejaculações que ele não mais conseguia ter no convívio íntimo com a mulher que ele passou a detestar. E que o detestava com a força de uma alienação conjugada à revolta por ele ter se amasiado com uma professorinha primária, talvez baiana, que se chamava Tieta.
O BRASILEIRO é, antes de tudo um Bobo da Corte dos palácios municipais e estaduais de governanças. Elas entronizam periodicamente, políticos corruptos com data marcada para reeleição de suas turmas partidárias de assaltantes dos bens financeiros e econômicos públicos. Os ativos financeiros sociais são, enquanto duram seus mandatos, considerados privados. Cada administração municipal e estadual privativa é uma oportunidade de enriquecer os reis dos palácios de governos nos municípios e estados da federação.
NO CENTRÃO de todos os palácios periféricos, municipais e estaduais, está a reinação de um presidente da República coroado no Palácio do Planalto para se apossar, institucionalmente, de parte substancial dos recursos públicos federais. As mutretas dessas reinações, ditas democráticas, começam mesmo antes do próximo rei do Palácio do Planalto tomar posse. Ser coroado presidente. Alguns gostam tanto de suas reinações, onde a corrupção pontifica, centralizada no Congresso em conchavos com o Palácio Centrão no platô dos dinossauros de uma política que assalta as verbas públicas de todos os jeitos e jeitinhos nacionais tipo: “deus, pátria e família Bozonaro”.
TUDO FEITO na mais santa aberração da venalidade centralizada na corrupção. A grande maioria dos assalariados se contenta em fazer o supermercado com a limitação aquisitiva de seus salários. Todos tendo em vista uma corruptela oficial que os conduza a um ganho extra no final do mês ou do mandato do rei no Palácio Centrão do país. O instituto e os estatutos do poder os blindam da interferência dos outros poderes, por vezes harmonizados com a corrupção centralizada e seus efeitos sociais os mais deletérios:
MISÉRIA, FOME, uma educação formal para a prostituição futura, o vício e o tráfico de entorpecentes. Os perímetros fronteiriços da Amazônia permanecem abertos ao crime organizado. Enquanto as FFAA estão ocupadas com as urnas do Supremo Tribunal Eleitoral, as fronteiras estão entregues aos mais diversos grupos de traficantes internacionais de armas, provisões e mercancias tóxicas.
MUITOS OFICIAIS das FFAA fazem de conta que estão cumprindo seu papel constitucional. Enquanto a criminalidade corre solta, o enriquecimento ilícito desses oficiais corre também solto na buraqueira da inconstitucionalidade armada e antidemocrática, sob comando, comunicação e controle de um político ocupado apenas e exclusivamente em se reeleger para mais um mandato de rei no Palácio Centrão do Brasil.
DO BRASIL QUE lança as pessoas pobres no malabarismo da sobrevivência difícil, sem recursos materiais, espirituais e cognitivos. Que pode uma pessoa fazer quando nasce entre a cruz e a espada??? Sem renda ou ingestão de calorias diárias suficientes para manter a o coração, a cabeça e o estômago em pé de gradativa desigualdade. O pobre nunca está nos projetos governamentais, exceto enquanto vítima. Vítima a quem jogam os restos das sobras do banquete dos bandidos.
URUTU — TARCILA DO AMARAL (1928) OU:
MEU NASCIMENTO — FRIDA KAHLO (1932)
MÃEZONA NÃO poderia esconder suas mais íntimas intenções, depois deste evento que revelou nela as mais baixas configurações de sua incrível maldade materna. Ela me chamou e começou a me acariciar as cabeça, coisa que ela não fazia. Eu logo desconfiei que havia algo errado nela a se revelar.— Meu filho, disse ela, você gosta mesmo de sua mãe???
— Gosto sim, você sabe. Por que pergunta???
— Porque sua mãe quer ter certeza de que você está dizendo a verdade. E continuou:
— A mamãe vai fazer tudo por você, mas você não vai nunca querer sair de perto dela. Você ama mesmo sua mãe???
— Sim, amo.
— Nunca vai querer sair de perto de mim para toda a vida??? “Formiga quando quer se perder cria asas”, lembre-se disso. Ficar sempre em casa é a coisa mais certa que um filho que gosta da mãe precisa fazer.
A MÃO DELA continuava a me acariciar a cabeça. Mas a tonalidade de voz denotava uma afirmativa e perversa falsidade na entonação. Eu estava à mercê de suas intenções, quaisquer que fossem. Ela não se fez esperar:
— “Levante a cabeça, olhe bem dentro dos meus olhos, respire fundo”. Ao dizer isto, ela simultaneamente soprou uma vasta quantidade de pó amarelado (ou acastanhado, ou alaranjado, não lembro exatamente porque fazem seis década). Minha visão se turvou, quer pelo pó, quer pela surpresa do súbito susto.
— Tossi, passei a mão no rosto enquanto sentia a visão turvar. A voz dela ficou longe.
— Respire, respire. Respire fundo. Assim.
COMO QUE de repente fui lançado numa outra configuração perceptiva. Como se tivesse sido ejetado de um lugar para outro que desconhecia. A intensa estranheza durou alguns momentos os quais não sei definir quanto tempo. Um mundo paralelo me capturou no ciclo quântico do estranhamento. Quando tive alguma consciência de que estava a retomar a percepção do lugar em que costumava estar, a visão da casa em que vivia, esta cognição me trouxe, simultaneamente, à realidade de uma esfera familiar hostil onde havia uma exuberância de atitudes de hostilidades, as quais mantinham minha vida em risco.
A FISSURA no tempo que havia experimentado há poucos momentos, era apenas outra das muitas ameaças contra minha integridade física e psicológica. Era uma advertência de que eu devia “pisar nesse chão devagarinho”, como dizia a canção do Caetano. Ou poderia simplesmente ser exterminado subitamente pela adversidade circundante. Talvez fosse um problema para mim enfrentá-los. Mas eu deveria fazer isto do mundo interior, subterrâneo, para que não vissem que eu reagiria sempre às suas demandas contra mim.
NÃO SEI SE houve uma relação entre o fato de eu ter mostrado a ela, no dia anterior, histórias escritas por mim, com personagens influenciadas nas HQs, e o fato de ela temer que eu, futuramente, pudesse escrever sobre as sessões de pedofilia parcial do marido em seus filhos ultrajados sexualmente no colo dele, praticamente todos os dias.
AO MOSTRAR as historinhas que escrevi, ela, ao invés de me incentivar a continuar a escrevê-las, buscou logo me dissuadir da tarefa de escrever, dizendo:
— Meu filho, não queira escrever não. Artistas são pessoas com doença mental. Eles são perturbados por natureza, o compositor Wagner se vestia com tiras de panos coloridas quando estava a compor no piano, e se drogava. Ficava dias sem falar com ninguém e bebia muito. Hemingway se matou com uma espingarda de dois canos que enfiou na boca. Ele também bebia demais. Artistas não regulam bem, têm parafusos a mais ou a menos na cabeça. Não queira escrever não. Não queira ser artista não.
QUE PODERIA uma criança responder??? Eu fiquei decepcionado. Gostaria de que ela tivesse, de alguma forma, elogiado meus textos escritos com entusiasmo criativo. Eu, menino, mostrava ter talento para escrever histórias. O que nem toda criança quer. Algo em mim me distinga das demais crianças que estão nas escolas de padronização perceptiva. Algo que ela queria obstar, reprimir, dificultar.
FIQUEI CALADO, silenciosamente a divergir dela e de seus argumentos. Muito tempo depois, já adulto, fiquei a matutar sobre por que ela havia mencionado logo um compositor alemão, Wagner??? Orgulhosa de seu sobrenome, Hohmann, ela revelava a convicção fanática de pertencer à raça que se dizia soberana sobre todas as outras: a alemã. No âmbito biológico identifica-se categorias humanas socialmente definidas:
DIFERENÇAS DE cor da pele, discriminação racial, tipo de cabelo, conformação facial, cranial, ancestralidade e genética. No fundo, no fundo ela, Mãezona, se considerava de origem racial ou étnica superior, descendente do panteão divino nórdico, composto por duas famílias principais de deuses: os Aesir e os Vanir. Durante a era Viking os Aesir tornaram-se as divindades mais importantes. Suplantaram os antigos deuses Vanir que lhes originaram. Quem se julga descendente deles, está-se a afirmar a fé Viking. A fé que não tinha livros sagrados, dogmas ou sacerdotes. Eram os próprios deuses nórdicos.
ELES DAVAM importância aos rituais de devoção a seus deuses. Rituais que incluíam sacrifícios humanos. O clã dos Aesir era chefiado por Odin, criador do universo e chefe dos deuses guerreiros habitantes de Asgard, um dos nove mundos mitológicos. Os Vanir, habitavam em Vanheim e eram reféns dos deuses guerreiros imortais. Um enorme pênis era objeto de culto. Anões, duendes, mitos sem pais conhecidos, uns cegos, outros sem olhos, braço ou com rosto desfigurado, eram exímios ferreiros e artesãos. Os elfos, aristocratas abastados, gozavam dos privilégios de uma vida sem tensões.
AS VALQUÍRIAS, servas de Odin, conduziam os mortos em combate ao panteão dos heróis: Valhalla. Um grupo de gigantes remanescentes dos Vanir ameaçava os deuses Aesir que promoviam a batalha em curso, Ragnarök, o Apocalipse Viking que acabaria definitivamente com o velho mundo e daria início ao novo. Odin tinha o poder de ver o passado (dera um olho para obtê-lo). Ele previa o futuro e criara o alfabeto das runas. Elas tinham o poder de alterar o destino dos seres humanos sob sua poderosa influência. Mãezona estava sob a influência de suas conversas com uma enfermeira que havia trabalhado no campo de concentração de Auschwitz, na IIª Grande Guerra.
O BANQUETE SÓBRIO — PICASSO (1904)
NÃO É FÁCIL compreender a complexidade da simples realidade do mundo. O mundo brasileiro não é uma exceção. A cultura nacional está inserida no espaço globalizado da influência supremacista. Machista. Branca. Protestante. Rica. Do olho azul. Os supremacistas brancos foram abortados da crença na falsa ideia da superioridade natural do homem originário de países caucasianos. São empanturrados de ideias racistas e se creem um grupo privilegiado, descendente da raça de deuses nórdicos.
MÃEZONA SE orgulhava de ser deles, germânicos, descendente. Carregava um sobrenome de origem alemã. Ela realmente tinha o poder de enganar como se estivesse a afirmar verdades. Eu, filho primeiro, primogênito, estava numa sinuca de bico. Ela havia parido dez filhos que sobreviveram às gestações dos que foram abortados, segundo ela dizia, no total de vinte e cinco. Mãezona tinha realmente o poder decorrente da gestação. Ficar grávida para ela era uma oportunidade de fuga. Ela fugia da realidade e entrava no mundo paralelo, mitológico, da criatura com autoridade soberana, imperiosa, que estava criando um mundo dela no nicho ou ninho familiar.
ELA JÁ HAVIA subjugado o marido a seus propósitos: ter um lugar para engravidar, parir, alimentar-se e fazer suas necessidades básicas. Era tudo que ela precisava para exercer um reinado familial. Ao escravizar o cônjuge com trabalho escravo das necessidades de alimentar, fornecer vestimentas, escola e sobrevivência para crianças que se tornariam adolescentes exigentes de seus direitos à educação, ela fornecia lenha para queimar seu universo subjetivo. Suas fantasias supremacistas afloravam.
A CASA EM QUE habitávamos, após a mudança da região central da cidade, numa das esquinas de uma quadra do conjunto habitacional do Iapc, no bairro Ilhotas, ficava de frente para o portão de entrada da residência de um migrante refugiado do regime nazista, conhecido por doutor Franca. Casado ou amigado com uma enfermeira de campo de concentração da Alemanha nazista. A residência dele ocupava um grande quadrado que correspondia à área de dezesseis casas do mencionado conjunto.
NÃO POUCAS vezes surpreendi Mãezona a conversar, sempre furtivamente, com a doutora Rosen, no pequeno jardim de nossa casa. Quando elas pressentiam minha presença, logo a dita doutora, que era na realidade enfermeira, se ausentava em direção ao portão de entrada de sua residência. Mãezona mostrava-se irritada, porque minha presença havia cortado o papo entre elas. Uma conversação que ela por demais prezava. E que por vezes continuava além do portão da casa dela, Rozen.
A FAMÍLIA Franca/Rosen tinha um grande poder aquisitivo. Fundaram um amplo hospital/maternidade de nome “Casa Mater.” no bairro Piçarra. Os poderosos do mundo sempre se entendem. Há uma vultosa conveniência de interesses financiados pelo Estado em coligações com a iniciativa privada. Governos, políticos e empresários sempre deram um jeito de se amancebarem. Dessas associações, mais das vezes com vezo nazifascista, se criam representações de lobistas, que manipulam negociações nas instâncias dos poderes, de dentro da esfera pública.
NO PIAUÍ O quarto poder, a Imprensa, está totalmente submissa a essas poderosas Da oligarquia do dinheiro falso, que fez fortunas particulares, ou de ativos financeiros lavados e lavrados no tráfico de drogas. com tentáculos que são também internacionais. Veja-se as transferências dos Neymar das chuteiras do lavar dinheiro.
A CAPITAL do Estado, assim como o Estado todo, teme tornar conhecidas essas associações de ricaços do tráfico de drogas e da poderosa conexão entre “famiglias” europeias que se estabeleceram no nordeste brasileiro e exercem comando, comunicação e controle da sociedade em conluio com as polícias e as FFAA. Não há nesse Estado liberdade de expressão. Exceto aparente. Jornalistas que tentam denunciar os conchavos entre os poderes vigentes, e seus crimes de homicídio, são simplesmente eliminados.
OS RESPONSÁVEIS pela educação e a cultura local, mantêm em rédea curta os que ainda permanecem na tentativa de estabelecerem alguma forma de crítica à necessitada cultura local. A sociedade vive o compromisso de estar sob a comunicação, comando e controle dos poderes armados de ameaças àqueles que ousem atuar fora dos limites estabelecidos pela cruel dominação social, que estabelece as fronteiras da intolerância à qualquer mínima manifestação da quase inexistente inteligência local.
EU AINDA HOJE me pergunto por que Mãezona, quando entrava no portão da casa da família Franca/Rosen se ocupava em dissimular sua saída em direção à mansão da doutora Rosen para conversar com ela no amplo jardim da residência. Era como se estivessem a tratar de coisas de domínio particular, que deveriam permanecer acobertadas.
MÃEZONA, EM momentos raros de verdade, se permitia dizer que a doutora havia sido enfermeira em determinado campo de concentração nazi durante a IIª Grande Guerra. E afirmava que o marido dela havia enriquecido na produção e distribuição de dinheiro falso, com a conivência das autoridades locais dos três poderes que são quatro: incluindo-se a imprensa marrom local. Uma imprensa que apenas simula ser livre.
É POSSÍVEL que ela haja mencionado o compositor alemão Wagner, autor de obras musicais de excelência incontestável — (A Cavalgada das Valquírias, Tristão e Isolda, O Anel do Nibelungo, Parsifal, Crepúsculo dos Deuses, Abertura Fausto, entre outras) — por ele ser alemão ela o tinha como referência principal no seu discurso ante literário que fazia a mim, quando lhe mostrava meus manuscritos animados pela influência das histórias em quadrinhos (HQs).
ELA QUERIA asseverar-se de que eu não teria, no futuro, como desenvolver alguma habilidade literária que pudesse constranger a memória dela, seu gosto pela dominação familiar a partir da crença de que ela pertencia à descendência de uma raça supremacista, os descendentes da raça supremacista de Odin, alemães, aos quais ela, orgulhosa, supostamente pertencia:
A IDEOLOGIA da supremacia branca, da suposta superioridade natural do homem branco. Ideologia que alimenta ideias racistas contra os mais diversos grupos étnicos que hoje são sistematicamente combativos: negros, homossexuais, indígenas, pobres, professores, artistas... Supremacistas em grupos que depredam a Amazônia, os recursos naturais do planeta, tipo a governança do Bozo na presidência desastrada dos recursos naturais no Brasil.
— A menção a essa gravura em placa de zinco anteriormente usada por Joan Gonzalez, se deve ao teor melancólico dela. Este trabalho registra o final de seu "Período Azul". "Os Dois Acrobatas" se tonam o núcleo central de seu "Período Rosa", após o pintor ter presenciado uma performance deles na "Esplanade des Invalides" em 1903. Picasso presenteou a gravura ao poeta italiano Ricciotto Canudo que havia visitado Paris em 1904.
FAMÍLIA DE ACROBATAS COM MACACO — PICASSO (1905)
PLATÃO AFIRMOU: “não se deve honrar um homem acima da verdade”!!! — “A verdade está em outro lugar”, não no exibicionismo expressionista de políticos malandros, arrivistas. Alguém também já disse e repito: “a verdade está em outro lugar” que não esse. Sim, a verdade afirma-se à distância de nossas pretensões em sabê-la. Atualmente, um político brasileiro trambiqueiro e vigarista usou e abusou da frase bíblica: “Conhecei A Verdade E A Verdade Vos Libertará” (João 8:32). Tentou a reeleição e se deu mal. — A verdade, por vezes, possui um modo insólito e inesperado de vir à luz.
ESSE POLÍTICO velhaco e espertalhão, negacionista das vacinas, das urnas, das instituições democráticas, quis, a todo custo, se reeleger presidente da República. Usou e abusou dos recursos do Estado brasileiro, como se fossem dele. Não foi eleito!!! Adotou a estratégia de ficar nas mídias às custas de ataques psicóticos às instituições democráticas. Ataques ou surtos verbais orientados principalmente a seus milicianos apoiadores de ocasião. Milicianos e militares com cultura equivalente à de caminhoneiros de postos de gasolina.
O BRASIL parece estar a borbulhar num caldo primitivo, social e político esquizofrênico. Esquizofrênico no sentido de uma pessoa pensar, sentir e se comportar sem sabedoria e transparência. Como se estivesse a delirar. Apenas pessoas delirantes poderiam votar (foram 58 milhões) em um candidato tão definitivamente desprovido de cultura que não fosse a antidemocrática, dos generais de pijama das casernas de 1964, saudosistas do AI-5. O país dessa política pode ser comparado a um pneu velho que nem mais recauchutado pode ser.
O ESTADO do Piauí, no qual nasci, representa, nesta narrativa, um Recife no meio do caminho. Uma pedra, um obstáculo, um abrolho, um tormento. Esse espinho espiritual, essa pedra no meio do caminho, esse amontoado de necessidades básicas, que me atormenta desde que tenho consciência de mim mesmo, de minha existência. Cresci no meio de um povo estrumado na miséria de uma exploração colonial da mais horrível das consequências: a pobreza e a miséria da alma, do espírito. Um povo que tudo aceita, sem opinião. O povo dos outros estados me parece que está em semelhante condição de desprovimento material, depauperado, explorado nos corações e mentes física e espiritualmente fracos, por seus supostos representantes nas tribunas do Congresso dos atos e orçamentos secretos.
O ESTADO limite da decadência discursiva chegou ao ápice com esse presidente: o Bozo. Um nazifascista convicto. O Brasil precisa, em caráter de urgência urgentíssima, reaver a própria dignidade eleitoral de seus cidadãos eleitores. Bozo desarmoniza a tudo e a todos todo tempo: as instituições padecem ataques esquizofrênicos dele quase todos os dias. Não mais é possível raciocinar, pessoal e coletivamente, sem que os raciocínios estejam contaminados pela baba fétida do discurso odioso do Bozo. Hoje, 4/6/2022, Bozo desafiou publicamente os ministros do STF e do STE, dizendo: "quero ver se eles têm coragem de cassar meu mandato".
O CHEFETE nazifascista que se instalou no Palácio do Planalto trouxe de seus ancestrais italianos a bota da farda do exército mussoliniano para se fazer valer no Brasil. Bozo deseja, de maneira inequívoca, fazer valer a volta dos exércitos supremacistas do Eixo, contra a defesa institucional dos regimes democráticos. Ele é ou não é louco, segundo sua avaliação sensata de eleitor democrata??? Ele quer ser a reencarnação do ditador maluco da Itália na valência da IIª Grande Guerra: Mussolini. Ele se acha um soberano hegemônico quando não passa de um maluco delirando para seus milicianos.
ELE, BOZO, já fez elogios rasgados ao torturador mor da ditadura militar: o coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, elevado ao posto de marechal. Estas verdades precisam ser repetidas. Expostas verdades sobre a persona tirânica do Bozo que se quis reeleger. Não é possível que os eleitores brasileiros não estejam vendo e ouvindo essas discursivas manifestações de esquizofrenia política. Foram 58 milhões de votos nele, harrrrgh.
A ESQUIZOFRENIA é caracterizada por experiências e pensamentos que parecem ter perdido o contato com a realidade. Seus discursos e motociatas saudosistas no nazifascismo sistêmico atualizado pelos “Hell´s-Angels” americanos, grupo com fins lucrativos a partir da comercialização de drogas e demais atividades ilícitas. As motociatas metafóricas do Bozo, desrespeitam as instituições democráticas. Quem duvida da realidade exposta por sua personalidade desagregada, algemada aos delírios de seu caráter doentio, demente, basta vê-lo em suas próximas edições discursivas.
O PLANETA Terra está sob a influência de mentalidades supremacistas tipo a Lagartixa caucasiana que invadiu um país, desrespeitando todas as normas jurisdicionais dos organismos internacionais que monitoram a espécie humana e tentam estabelecer limites institucionais a esses abusos. No Brasil representado por esse Recruta Zero, que virou capitão expulso do exército brasileiro.
OUTRO MALUCO supremacista, o Trumpqueiro, proporcionou a invasão do Capitólio por ter sido derrotado fragorosamente nas urnas na eleição presidencial dos EUA que elegeu o atual presidente Biden. O Dia Seguinte a essas tentativas nazifascistas, de fazer valer o populismo personalista dessas lideranças, estabelece uma esquizofrenia social em seus respectivos países, conduzidos, em parte, pala propaganda personalista desses títeres metafóricos de Hitler, Stálin e Mussolini que se elegem às custas de "fake-news".
FALER VALER O Narciso enfermiço, mórbido, patológico que neles se instalou, talvez por inserção genética em seus DNAs, seja o objetivo passional presente em cada um deles. A alma ordinária de cada um e todos, deseja, a tudo custo, se fazer prevalecer sobre a ingenuidade acrítica da base votante de seus respectivos eleitorados. A falta de uma orientação moral, política, educacional desses eleitorados, os faz crer que terão, de algum modo, sucesso em suas programações de agenda política nazifascista. A democracia é uma conquista dos Aliados, desde a IIª Guerra Mundial. Eles querem aboli-la.
SABÁ DAS BRUXAS — GOYA (1797/98)
A VONTADE de criar deficiências físicas, que poderiam ser crônicas, ficou evidente quando Paizão esfregava os dedos nas manchas de esperma do pijama ou da calça e, ato contínuo, forçava as crianças no colo a abrir a boca e introduzia os dedos embebidos de sêmen e os esfregava do lado direito e esquerdo da dentição gengival delas. Para garantir a absorção da porra na gengiva, Paizão friccionava os dedos por tempo suficiente para que a absorção estivesse garantida.
SÍFILIS ERA uma infecção bacteriana transmitida por contato sexual. Paizão era sifilítico e transmitia a sífilis molhando os dedos na secreção produzida pelos espermatozoides nas manchas do pijama onde seu pinto, após roçar no bumbum dos filhos, expelia o sêmen nos orgasmos. A esfregação gengival dos dedos permitia a absorção das bactérias através dos dedos untados no líquido seminal, após a ejaculação.
ELE USOU dessa prática comigo uma vez em que, após o horário de atendimento dos clientes, me chamou para verificar a condição de meus dentes:
— Venha, sente-se na cadeira que vou examinar seus dentes, fazer uma profilaxia. — Ele, pouco antes, havia estado com uma irmãzinha sentada em seu colo na poltrona interna da sala principal do consultório. As manchas de esperma se faziam visíveis, o odor de sêmen flutuava no ar próximo subindo de sua calça que ele não havia trocado. Eu tinha idade suficiente para saber que não podia confiar nele. Mas, uma criança é uma criança. A força de convencimento de um adulto se faz preponderante. Principalmente quando esse adulto é o próprio pai.
APÓS A inserção de uma ampola de analgésico na seringa, introduziu a agulha na gengiva, segundo ele para tratar de um dente infeccionado, melou os dedos numa mancha de esperma, manuseou com a mão direita o próprio pênis, após ter se virado em direção à estante na qual manuseava pó, tufos de algodão, mercúrio odontológico e demais joças medicamentosas da profissão.
O ODOR de porra subiu nítido em minhas narinas quando ele aproximou a mão e inseriu os dedos fedidos em minha boca e começou a friccionar as gengivas ao redor da dentição superior e na inferior, até o tecido epitelial vascularizado da gengiva, a mucosa bucal ao redor dos dentes, ter absorvido a impureza de sua micção malcheirosa, fedorenta.
QUE PODIA fazer eu, senão chorar??? Lágrimas de revolta desceram nas faces. O ritual sádico continuou até ele me liberar da dita "profilaxia". Tanto ele como a mulher tinham esses surtos de sadismo cotidiano. Certamente obtinham prazer em fazer sofrer a filiação sob a influência de sua tendência à desordem mental e à insânia medonha, obscurantista.
O ATO DE soprar sobre meu rosto uma excessiva quantidade de “pó do zumbi”, bafejado pela ventosidade bucal saída das entranhas da bocarra de Mãezona, vi que ela praticou o mesmo ato abominável com outros de meus irmãos e irmãs. Não sei onde ela conseguiu comprar o “pó do zumbi”. Acredito que encomendou com pessoas chegadas a rituais de magia negra que frequentavam o “mercado velho” e vendiam iguarias as mais diversas em suas bancas de ervas, verduras, legumes, grãos e porções chegadas às pajelanças e catimbós. Afinal, vivíamos numa sociedade que mal acabara de sair das cavernas.
EM VERDADE Mãezona não queria que eu saísse de sua influência nefasta. Se ela havia me parido, não estava disposta a me ceder para ninguém, dizia:
— “Eu não vou parir meus pintos pra dá cria pra ninguém”. Ou então: “quem carregou cada um de vocês na barriga por nove meses, tem direito de saber o que é bom e o que não é pra cada um de vocês”.
ELA NÃO via a maternidade enquanto sendo um dom sugerido pela natureza de um ser criador dos seres dito humanos. Não. Ela via a maternidade como se a maternidade fosse um dom da natureza dela. Como se ela fosse uma deusa com poderes sobrenaturais sobre mim e a família. Ela odiava minha não submissão às suas ingerências sobre minha vontade de viver segundo minhas percepções.
— “Tu és besta, moleque, vai ser o que eu quiser que você seja. Desde quando criança tem vontade própria??? Eu não te criei para deixar você ganhar mundo”. Ela tinha uma coleção de ditos, sempre na ponta da língua para afirmar sua preponderante vontade de me imobilizar próximo a ela.
— “Quem os pariu que os crie, quem cria tem todo direito”.
— “Eu não vou criar galinha pra dá pinto pra ninguém”.
— “Papagaio que acompanha João-de-barro vira ajudante de pedreiro”.
— “Escreveu não leu, pau comeu”.
— “Pra baixo todo santo ajuda”.
— “Mãe é como bruxa, mágica poderosa do universo”.
— “Quem com suas boas marias faz em sua casa está em paz”.
EU VIA O quanto seria difícil convencê-la a me permitir sair do rabo de sua saia. Eu sabia que minha vida futura seria muito, muito difícil. Ela sempre dava um jeitinho de gastar minhas economias, somadas com a comercialização vitoriosa de minhas HQs e álbuns de figurinhas. Toda vez que eu consegui agregar um dinheiro visando economizar e bancar meus estudos, ela dava um jeitinho de puxar o tapete debaixo dos meus pés. Vencer aquela criatura e suas convicções infaustas, caiporas, não seria fácil. Ela gostaria de fazer comigo o que a mãe dela, minha avó fez com o tio Fred: idiotizou e acorrentou-o no pé de sua cama até que morreu. O tio Fred sobreviveu, uma espécie de criação teratológica dela.
ACREDITO QUE essa tenha sido uma prática herdada da mãe dela, que herdou da mãe dela e da avó, e da bisavó, e recebeu de herança trisavó: a prática da idiotização da hereditariedade para que o medo de ficar sozinhas na pobreza, sem ninguém para socorrê-las, fosse mais forte do que investir na educação, na cultura, no intelecto dos filhos. Eu dizia de mim para comigo: “santo de casa não faz milagre”. Eu preciso sair de perto dela ou vou virar outro tio Fred.
A MISÉRIA moral, a miséria de filosofia, a miséria material, a miséria de cultura, a falta de formação educacional, escolar e familiar, estavam impregnadas na alma daquelas pessoas para sempre. Na alma coletiva daquela sociedade. Para sempre enquanto vida tiverem, elas serão uma espécie de clã conivente com seus carrascos. Verdugos e tiranos, por detrás dos panos, manipulam as pessoas de seus confortáveis nichos secretos.
SATURNO DEVORANDO SEU FILHO — RUBENS (1636/38)
SATURNO DEVORANDO SEU FILHO — GOYA (1820/23)
A NATURALIDADE da vida sabe como se defender. Mas, por vezes, não possui os recursos para tanto. Que poderia eu fazer para me defender dessas inumeráveis condições desfavoráveis dispostas contra mim??? Paizão, Mãezona, irmãos e irmãs, uma parte da sociedade que sabia parcialmente o que estava a acontecer no interior do circuito familiar, e nada fzia. Em frente ao portão de entrada da casa onde morávamos na rua senador Teodoro Pacheco, habitavam parentes de uma família de políticos importantes, parte de grupos de poder que controlava o Piauí, há pelo menos quatro décadas.
OS PORTELAS, lá estavam elas e eles reunidos, sentados em cadeiras na calçada. Entre bate-papos, e conversas jogadas fora, observavam a família de Paizão e Mãezona que, por vezes, também ficavam sentados na calçada em frente. A situação de penúria familiar da família em frente chamava, de algum modo, a atenção deles.
PAIZÃO E MÃEZONA iam articulando, com seus conhecimentos, a colocação profissional e social de seus filhos e filhas em arranjos de empregos, de modo a se livrarem da presença deles, mas os mantendo na coleira emocional da dependência maior, condicionada às sessões de pedofilia. Eu, buscava cobrar a saída da familiaridade deles. Nem eles me queriam por perto e eu, menos ainda, queria estar perto deles. A quantidade de rejeição que vinha deles era simplesmente uma enormidade. Nenhum familiar nunca me via no contexto enquanto partícipe de seu conjunto de interesses.
CONSIDEREI A possibilidade de ela escrever uma carta para a irmã de Paizão que morava em Niterói, sugerindo que eu ficasse hóspede deles enquanto fazia o 3° ano do curso de contabilidade. O filho mais velho dessa minha tia, irmã de Paizão, era um playboyzinho viciado em drogas, com um complexo de inferioridade que o fazia compensar-se em estar sempre se gabando de feitos, maioria dos quais criação de sua mente incrementada pela coca, barbitúricos e marijuana. Em frente à casa deles morava um médico cujos filhos eram amigos desse filho mais velho deles.
O MARIDO da irmã de Paizão era um funcionário do Banco do Brasil que já havia sido um próspero comerciante de leite em Campos dos Goytacazes, município do estado do Rio. Proporcionava às três filhas e dois irmãos uma boa qualidade de vida. Eu tentava me adaptar ao novo ambiente sem criar conflitos. Concentrei-me nos estudos. Formei-me com facilidade e, como não criei afinidades com os demais membros da família, fui solicitado a sair fora do convívio familiar deles.
O TIO ME chamou para uma conversa. Eu estava a notar a demora na definição de minha situação de estranhamento em sua casa. Não havia afinidades a considerar:
— “Meu sobrinho”, — disse ele —, “sua tia chamou minha atenção para dizer que não temos nenhum compromisso contigo. Chegou o momento de você buscar seu rumo noutro lugar. Ela aceitou sua vinda para nossa casa porque o Fulano (primogênito deles) tinha problemas com drogas. Você poderia influenciá-lo a gostar dos estudos. Mas isso não aconteceu. Você viveu sua vida, ele não viu em você uma influência para mudar. Eu queria poder ajudá-lo e pagar um curso pré-vestibular para você. Mas ela me disse que você não é nosso filho, por isso ela não achava certo investir num cursinho para você. Eu não concordei com ela, mas ela é quem é sua parenta, irmã de seu pai. Não eu. Você pode ficar aqui o tempo que for preciso para achar um outro lugar para ficar. Uma semana, duas, um mês ou mais se preciso”.
— Claro, tio. Você está certo. Eu estou mesmo deslocado, não soube como me inserir melhor na intimidade de vocês.
— Por mim, você ficaria morando aqui o tempo que quisesse, mas seu parentesco é com ela, sua tia. E ela acha que já te ajudamos o suficiente.
— Tudo certo, tio. Estou de acordo e agradeço a estadia aqui. Ela contribuiu para minha formação no curso de contabilidade. A tia está certa. Eu preciso achar meu rumo.
NA REAL, eu havia sido aceito não apenas para que tentassem solucionar o problema do filho primogênito deles, o Fulano doidão. Doidão e não era só de batida de limão. A própria tia já havia me dito que a razão de eu estar na casa dela, era porque eles achavam que eu poderia ser uma boa influência para o filho mais velho deles. Mas o problema de meus primos não era apenas as drogas. Meu outro primo, certa vez me disse:
— “Você não curte parceria com gente do mesmo sexo. Mas isso é só porque a sociedade acha que é errado. Quem não gostaria de sentir um pau duro dentro do cu, não fosse a censura alheia”???
— Eu não gostaria, pode ter certeza, respondi. Essa nunca vai ser a minha praia. — O problema do safismo estava muito bem delineado pela fala do segundo filho. A tia, quem sabe ao certo, estaria querendo uma companhia que justificasse as escolhas sexuais de seu segundo filho.
NESSA ÉPOCA eu frequentava um curso de extensão aberto para pessoas que desejavam preparo para fazer teatro. O curso, num anexo da Universidade Federal Fluminense em Niterói, incluía autoconhecimento, desenvolvimento da comunicação pessoal, interatividade, aprendizado de Yoga, técnica de respiração, expressão corporal, leitura de peças, comentário sobre autores e personagens...
ERA MINISTRADO por um mentor chamado Silésio Nascimento. O curso incluía incursões de final de semana em praias nos arredores da cidade, nas quais incluíam exercícios físicos. Essa interação me aproximou de Anne Marie, uma jovem mulher que habitava próxima à residência do tio e que também frequentava o curso. Descendente de alemães ela tinha cabelos louros, design nórdico, apesar de também não ter graduação, frequentava o ambiente da UFF, aberto a não-dissentes. Aprendi muitas coisas luxuriosas com essa amizade. Apesar de até então, meu relacionamento sexual se limitara às garotas do baixo meretrício da cidade natal e arrebol e confinas, onde proliferavam os lupanares dos mais diversos modelos. Oferecidas, cheias das mais variadas doenças venéreas.
EU NÃO ESTAVA mais próximo a Paizão Coisinha e à sua mulher troglodita Mandona. Mas eu podia sentir nitidamente as enormes privações de oportunidades de que me dotaram ambos. Eu não tinha nenhum recurso financeiro e econômico. Minha formação educacional era precária. Nenhum incentivo à minha afeição literária por parte deles. Meu avô paterno que habitava um ap. na rua Dr. Satamini no bairro Tijuca, havia conseguido que eu falasse com seu amigo Alberto Torres, que me encaminhou a falar com seu genro, Efrem Wellington de Barros Amora, diretor do jornal O Fluminense, em Niterói. O objetivo: conseguir um emprego.
AGRADEÇO MEU avô pelo contato que me abriu as portas do jornal O Fluminense. Trabalhei de repórter e crítico de cinema neste prestigiado jornal fluminense que revelou nomes de expressão nacional na literatura brasileira: Irineu Marinho, Rubem Braga, Olavo Bilac, Oliveira Vianna, Euclides da Cunha... Trabalhei também no Departamento de Circulação do jornal.
EU ESTAVA sobrecarregado do entulho da adversidade do que vi e vivi entre aqueles meus familiares na infância e parte da juventude. Minha revolta represada pela repressão política e policial que as ditaduras dos países americanos promoviam, nos corações e mentes de toda uma geração congestionada de influências conflitantes: de um lado a descoberta do país da ditadura, da propaganda massiva do “american way of life” que dizia às pessoas, via jornais, revistas e tv visão, que elas poderiam ter uma boa vida com carro do ano, apartamento, casa na praia e muitas bundinhas de mocinhas que apareciam de minissaias nas fantasias, nos filmes e comerciais de sedução em massa hollywoodiana.
DO OUTRO LADO da cena social, política e econômica, estavam os livros de Karl Marx, Engels, e demais teóricos em favor da extinta União Soviética. Eles prometiam o mundo socialista da distopia do capital, e a afirmação da liberdade, igualdade e fraternidade para todos, numa Terra onde o leite e o mel jorrariam. Se você estivesse na América, bastaria estender o braço, e lá estaria um atendente do McDonald a socializar hambúrgueres, cheeseburguers e Coca-Cola. A corrida espacial havia começado. Os comunas estavam chegando primeiro, a abrindo caminho em direção ao espaço sideral. Enquanto o “Cavaleiro Negro”, satélite Et, há milênios circulava em volta da Terra.
DUAS VELHAS QUE COMEM DE NUMA BACIA — GOYA ( 1820/23)
DA ESCÓCIA do século XI para o Brasil do século XXI, a tragédia de Macbeth e de Lady Macbeth, cruel, mordaz, traiçoeira, charlatã e ardilosa, se repete em lares de famílias das mais diversas classes sociais. Dos barracos nos buracos negros das favelas, aos edifícios cinco estrelas da especulação imobiliária. Os reis Macbeth e suas rainhas da Escócia — Inglaterra — França — Itália — EUA — Rússia — Brasil — Argentina...
AS BRUXAS da propaganda profetizaram a sociedade de mercado. O senhor Mercado está no comando das ações. A ambição de Elon Musk, “O Mosca” às Madonas empoderadas pela ganância, desperta nos corações e mentes investidas de autoridade financeira, econômica e de autonomia: a sociedade da mais franca anarquia. A profecia das bruxas que motivou a ambição desmedida de Macbeth, ganhou os corações e as mentalidades das multidões Bozonaristas em seus respectivos países onde medram Trumpqueiros e afeiçoados da Lagartixa caucasiana. Vide invasão de caminhoneiros no Brasil, do Congresso americano, e a sádica destruição de ativos na Ucrânia.
A FAMÍLIA, movida pela vontade de ver os seus se tornarem pessoas com recursos, os mais próximos possíveis da realeza financeira e econômica da sociedade consumista, é movida pela ambição de alcançar os altos salários de jogadores de times de futebol. Para as Ladies da realeza favelada, seus meninos se tornarão futuros Neymar nos mares revoltos da lavagem internacional de dinheiro do tráfico cosmopolita de drogas, por detrás das transferências de jogadores para outros times, outros países. Suas filhas logo aprendem a profissão de Marias Chuteiras que navegam nos mares revoltos da libido sadomasoquista da selvageria nacional. 58 milhões de canibais pastorados pelo Bozo MacBeth. Político tropicalista.
QUE IMPORTA para essas Ladies das classes sociais das mais baixas às mais altas??? Atingir um padrão nacional aceitável de cultura tal qual seja para a prostituição e o tráfico, as rachadinhas, a lavagem de dinheiro. Todos estão a beber e a comer o caldo macabro cozinhado na caçarola das cozinhas televisivas, com seus pratos requintados, bonitos, deliciosos, decorativos, criativos, cheios de convites aos mestres cucas de restaurantes famosos, para o banquete de refeições saborosas, no ambiente agradável das Ladies Macbeth das classes mais altas. Às mais baixas.
TODOS ESTÃO ocupados em se repetir e copiar as deliciosas receitas que, no final das compras e preparo dos ingredientes no caldeirão das bruxas das cozinhas que se copiam em delícias dos “chefes” famosos, que reinam em ofertas atrativas de como usar os melhores temperos, nas carnes do apetite carnal de consumidores de calorias, as mais atrativas para a degustação e a fermentação alimentar no dia a dia, no carrinho do supermercado. No outro dia, a digestão do dia seguinte os aguarda. Levante a tampa do sanitário. Um pouco de bom ar, por favor.
O MAIS TENEBROSO dos dramas shakespearianos, segundo o crítico literário Harold Bloom, Macbeth é a mais viçosa oportunidade para se refletir os aspectos mais sombrios e punctiformes do comportamento humano: da traição, do vício pelo poder, da ganância e da culpa. No final dos dizeres e prazeres degustativos, para onde vão os alimentos em sua viagem após o “trono de sangue” dos sanitários???
O INTESTINO delgado e o intestino grosso são as próximas paradas das delícias ingeridas e recomendadas pelos chefes nacionais e internacionais das cozinhas de reis e rainhas Macbeth, onde os capilares pegam os nutrientes e os distribuem para todo o corpo desses nobres desfrutadores da gula. A essas alturas do basquete, os restos sólidos dos alimentos já são esperados pelo ânus. É possível que não tenha havido nenhuma consideração Ética para toda essa travessia. Ela abasteceu o intelecto, a espiritualidade???
A SUBMISSÃO familiar era ampla, total e irrestrita na família de Lady Macbeth Mãezona. Seus demais filhos estavam cada dia mais encolhidos pelo medo de que Paizão os começasse a tratar do mesmo modo que me dispensava espancamentos quase diários. Mãezona, após essas sessões de nítida covardia e superlativa vontade de me dominar, enquanto forma de me alijar dos meus direitos à melhor educação, e vestimentas. Nos dias posteriores aos espancamentos, ela dizia em voz baixa, aproximando a boca de um de meus ouvidos:
— “Você não vai ao colégio, até se recuperar desses ferimentos”. Alterando a voz que se tornava mais nítida e autoritária, complementava:
— “Quando perguntarem como isso aconteceu, diga que estava a colher mangas no quintal vizinho, quando despencou lá de cima”. Ela me ensinava a faltar com a verdade e a falsear a realidade, em proveito de encobrir e disfarçar as atrocidades familiares, quase que diárias, de Paizão.
“ESQUELETOS NUM ESCRITÓRIO” — PAUL DELVAUX (1944)
APÓS UMA enfermeira vizinha vir aplicar durante algum tempo injeções de Benzeatcil na filharada de Mãezona, para nela combater o surto familiar de sífilis, ela, como sempre, parecia não saber de onde vinha o flagelo, a pestilência caracterizada por lesões na pele e mucosas. Seus filhos viviam com a pele cheia de perebas que ela, uma curandeira proveniente da época das receitas de cura medievais, aplicava esparadrapo quente nas feridas dos filhotes menores e maiores. Dizia ela que era:
— Cura na certa.
— Mas dói, mãe, dói muito.
— Deixem de bancar os molengas, não querem ficar curados???
— Mas, quem disse que isso cura??? Essa pergunta era respondida com tapas na boca.
— Tu és besta, moleque, duvidando do trabalho de tua mãe??? Eu teria todo esse trabalho se não tivesse certeza??? Minha vó Carmó, minha mãe, curavam feridas desse tipo desse jeito. Eu aprendi a educar você com elas.
EU CALAVA para não ser espancado na boca por contestar esse método avoengo de curar feridas na pele provocadas pela sífilis e pelo contato com ratos e baratas que faziam a festa no esgoto que perpassava o corredor da casa. Ela fingia ignorar a sífilis que Paizão Coisinha esfregava na gengiva dos filhos durante o período que as mantinha no regaço enquanto se balançava na rede de tucum na sala de jantar.
A COISA DA pedofilia de Paizão ficava tão escancarada, que não poucas pessoas vizinhas adentravam a sala pelo corredor aberto, e ficavam, furtivamente, cochichando entre si, olhando Paizão cantando canções do cancioneiro chorão da MPB da época, enquanto mantinha crianças no centro de sua intimidade. O odor de esperma se espalhava pela sala. Por vezes, quando descobertas, essas pessoas curiosas, inventavam uma desculpa esfarrapada, tipo:
— Dona Mãezona está??? Queremos falar com ela.
HOJE, PENSO que aquele casal de criaturas bizarras, que me usavam enquanto “bode expiatório” de seus desvios, lapsos, falhas, atos falhos, faltas, erros, crimes, culpas, que, para se livrarem de suas responsabilidades familiares para comigo, estavam, eles também, sendo vitimados por famílias que, em seu entorno social, os estavam usando, enquanto núcleo familiar de observação de suas próprias culpas, crimes de intimidade, lapsos e desvios: uma sociedade satanizada pela concupiscência, pelo desprezo às suas crianças, que brincavam de injúria, calúnia e difamação com terceiros. Certamente sentiam-se mais confortáveis ao ver em Paizão uma justificativa para não se sentirem sós em seus erros.
AFINAL, EM frente à porta da rua de sua casa estavam a habitar muitos familiares da família Portela que tinham contato visual com as encenações familiares todos os dias. Certa vez uma de suas irmãs me chamou e me disse:
— Eu posso adotar você. Você não prefere vir morar aqui em nossa casa??? Você terá mais condições de se educar, e não vai levar surras de seu pai com frequência. — Eu pensava por rápidos segundos na possibilidade. Mas aí vinha a força dominante de Mãezona que parecia me abarcar e conter com dizeres tais como:
— “Com quem com suas boas Marias faz, em sua casa está em paz”. Eu pensava: essas também são Marias. Maria Teresa, Maria das Dores, Maria Luíza..., mas daí vinha um arrependimento antecipado. A onipresença de Mãezona também dizia:
— “Não há ninguém no mundo que saiba zelar e proteger um filho do que a própria mãe”. — “Nem toda mãe usa coroa, mas toda mãe é do lar a rainha”. — “A mãe tudo dá, sem esperar nada em troca”.
— “Tudo sou eu nessa casa”.
— “Quem tem mãe não precisa de mais nada na vida”.
UM AMONTOADO de culpa foi se juntando quando eu pensava que não estaria mais, todo dia, ao lado dela. Sem participar da vida de mal tratos à qual eu estava já afeiçoado. Não tinha plena consciência de estar sendo boicotado profundamente por ela. Que a cada dia me roubava a oportunidade de investir em meus próprios recursos, em minhas próprias estratégias de vida. Minha resposta, nos finalmentes da abordagem da vizinha Portela era sempre a mesma:
— “Não quero não. Obrigado, não quero deixar minha mãe”. Eu estava sendo criado para ser o tio Fred bobão da família. Talvez ela soubesse que minha resposta sempre seria essa. E por isso fizesse a oferta de adoção. Como vou saber ao certo até onde era sincera o mimo de amparo e acolhida dela??? Dizia também que uma outra irmã dela já adotara outra criança. Eu não estaria sozinho com outro irmão para brincar. Mas como a presença de Mãezona, seus filhos com quem eu convivera até então, não seria uma força de gravidade a me puxar até a antiga moradia???
A FAMÍLIA enquanto uma totalidade de seres me aprisionava subjetivamente. Criados que foram por protótipos de uma instabilidade emocional vivendo para afirmar a si mesma. Influenciados, os descendentes, por aqueles psiquismos que se hostilizariam sempre. Mesmo que o óbito do que viesse primeiramente a morrer, provocasse no sobrevivente, lágrimas. Lágrimas de crocodilo. Lágrimas de esqueletos.
CONVERGENCE — POLLOCK (1952)
OS EXÉRCITOS de androides passeiam entre os girassóis nos jardins, ruas, avenidas, praças e parques nacionais. Os exércitos de androides plugados em seus celulares a visualizarem os entretenimentos do dia na política, na economia, nos esportes. Onde será que será o próximo show no fim de semana???
— “Já comprou seu ingresso para Rock in Rio”???
— “Vou garantir meu ingresso no Rock In Rio”.
— “Vai rolar a festa, vai rolar, pode vir, pode chegar”.
— "Misturando o mundo inteiro, vamo vê no que é que dá”.
— “Tem gente de toda cor, tem raça de toda fé”.
— “Guitarras de rock´n roll. Batuque de candomblé”.
— “O povo do gueto mandou avisar, a tribo vai balançar”.
— “Vai rolar a festa, vai rolar”.
AS MULTIDÕES são mais previsíveis do que as notícias nos jornais.
MAL SABEM eles e elas que há mais aflição e dor nesse mundo do que cada um deles pode suportar. Há festa no gueto, porque não podem a própria dor encarar. O autoconhecer-se não dá pra encarar. Estão cheios de medo e desejam proteção por debaixo dos cobertores. Enquanto acontecem os encontros de multidões de pessoas que se refugiam de seus medos na proximidade mútua, aos bandos, às turbas. A exuberância festiva do mundaréu. Por que não traduzem a letra de Dylan, e a sensibilidade de Gal ao cantar: “It´s all over now, baby blue”??? A estrada é para quem sabe jogar, melhor usar seu bom senso. O exército de renas de Papai-Noel voltou para casa.
TALVEZ MAMA acreditasse que seria eu a criança sobre a qual ela exerceria um poder tão completo, que minha vida emocional seria transferida para ela. Seu corpanzil, relativamente ao meu, franzino e magérrimo, poderia absorver de mim, de minhas sinapses, neurônios e neurotransmissores, todos os conteúdos possíveis de que fossem portador meu cérebro. Ela talvez acreditasse que lhe fosse possível sugar o cristal em meu crânio, a partir do qual ela pudesse apoderar-se do tempo passado, presente e futuro. Apossando-se de meu tempo. Futuro. Passado. Presente. Ela estava enganada.
MINHA VIDA seria transferida para ela e/ou o marido, por alguma magia negra que extrairia de mim, através da tortura mental à qual me submergiam sem mínimo resquício de compaixão, sem piedade, pelo sofrimento indizível que me causavam. Que defesas poderia eu ter contra essa infiltração de malignidade em minhas percepções de criança???
MÃEZONA ERA uma grande avestruz com a cabeça enterrada na sepultura de suas terras de cemitérios ancestrais. Quem poderia socorrer-me??? Quem se importava comigo??? A quem poderia recorrer e pedir ajuda??? Com que palavras eu me expressaria para me fazer compreender pela linguagem obcecada de adultos que não estavam nem aí para minhas reivindicações por uma oportunidade de sair da proximidade desse indescritível inferno de flagelos e bloqueios emocionais???
QUEM PODERIA descomplicar-me senão eu??? Mas como??? De que jeitinho brasileiro??? A mim não interessava ser mais outro travesti emocional da grande família de avestruzes brasileiros e brasileiras. Eu não queria, de jeito nenhum, ser mais um perdedor que vence o medo deles, seus motivos, suas perversões antepassadas. Não desejava ceder às contingências e eventualidades do Horizonte de eventos de suas infaustas e infortunadas ancestralidades. Seus parentes próximos eram os hominídeos muito, muito ancestrais.
EU VIA COM nitidez indescritível que estava sozinho. Não havia ninguém a quem eu pudesse pedir ajuda. Com que palavras eu poderia dizer que estava sendo trucidado por um casal de uma espécie em extinção, que via em mim alguém que não poderia servi-los para nada, exceto para potencializar seus problemas, pelo simples fato de ter nascido. Tio Nenê, nas raras vezes que nos visitava, dava umas dicas:
— Se você quiser sair dessa situação, eu e a tua tia vamos de acolher.
QUAL O PAPEL familiar de uma mãe??? O papel fundamental dela enquanto mãe, era, primeiramente, me anular completamente. Fazer com que eu não tivesse de defender nenhum direito e me orgulhasse em ser, desde criança, o irmão mais velho que se sacrifica pelos demais. Manter-me na coleira curta de necessidades básicas de sobrevivência. É como se ela estivesse sempre a afirmar:
— “O que eu quero de você é que você goste que eu lhe faça sofrer. Sou sua mãe. Abasteci você nove meses em meu ventre. Eu sei o que é melhor para você. E o que é melhor para você é que esteja sempre disposto a se sacrificar por seus irmãos. Ser o cordeiro do sacrifício, o Bode Expiatório. Você devia se orgulhar disso”.
EU NÃO SABIA como defender-me. Uma criança em mãos de uma mentalidade de mandingas, feitiços, sortilégios e necromancia. Ela havia me escolhido para a prática de rituais de sofrimentos diários com a convicção psicótica de que esse era o caminho mais certo para ela se livrar das responsabilidades com minha educação formal. Como dizer que precisava de algum apoio emocional, de uma orientação interior que me proporcionasse incentivo a meus interesses de desenvolvimento intelectual??? Como dizer que eu precisava da compreensão dela, da empatia dela, se ela me via apenas enquanto vítima??? “Amor só de mãe”. Onde estava a verdade dessa frase??? Por que nunca me disse a palavra mágica:
— Eu te amo. Há pessoas que não nasceram para dizer “eu te amo”.
“BIRTH” — POLLOCK (1941)
NINGUÉM EM quem confiar. Até o tapete sem você voou. Esquecer os mortos: eles não se levantam mais. A estrada, o jogo e a indecência. Juntar tudo que consegui por ter ido à luta. Coincidência. Ninguém disposto a me ouvir. Uma criança a viver acossada pela ossada direcionada dos familiares. Aprendizado de rato num larbirinto. O bloco de construção básico de meu universo infantil sendo deteriorado justamente por quem deveria me dá a mão:
MÃEZONA, ESSA criatura infinitamente perturbada. Uma coisa, um esquema, uma linha de montagem de produção em massa. Filhotes padronizados, mão-de-obra para serviços e compromissos com os barões do mercado consumidor da produção industrializada. Trabalhadores de políticas planetárias. Crianças para crescer até virarem rapazotes modelos “Ford de Bigode”. Um processo que revolucionou a colonização planetária em orbes tipo sistemas solares de 5ª Grandeza.
A SINFONIA universal esotérica era para ela uma realidade totalmente fora da compreensão de mundo de suas misérias mil. Ela era apenas uma máquina de produção de bebês, crianças, jovens e adultos que de nada serviriam para ela depois de crescer. Não seriam mais as bonequinhas e bonequinhos da mamãe. Não eram mais engraçadinhos. Não estariam sujeitos às suas fantasias de principados deteriorados por sua vontade de fazê-los permanecer pequeninos anões para seu lazer. Não seriam mais seus brinquedos.
ELA ERA UMA máquina orgânica aprisionada à sua própria rotina. Prisioneira dentro de casa. Subordinada ao marido que para mais nada servia, exceto botar comida na mesa da sala de jantar. As gemadas não surtiam mais efeito. A impotência sexual se estabelecera definitivamente. Talvez se houvesse escolhido ser uma marafona de programas na esquina próxima a motéis, tivesse sido uma escolha mais divertida de vida. Esses filhos que não obedeciam ás suas fantasias, à sua imaginação doentia, não fariam parte de seus projetos fantasiosos imersos em insanidade.
ELA FAZIA parte do país caricato e burlesco. De qualquer jeito não era o país dela, de seus projetos, instintos e desejos. A grande comédia de sua vida seguia um roteiro que não era o dela. Como não??? Então não foi ela que os pariu??? Que os carregou nove meses, após as noites simuladas de prazeres??? Ela, na real, não passava de uma piada para a plateia de vizinhos e amizades de fachada. Ela não poderia fazer de conta que sua vida fazia algum sentido. Tudo que aprendera durante toda sua ineficaz inexistência, foi parir. E isso é coisa que nem escola nem faculdade ensinam.
OS FILHOS cresceram, mas sua mente embotada por milhares de anos vivendo em cavernas, convivendo com seus pares trogloditas, essa sim, continuava sendo sua sociedade, seu país de verdade. Ela não mais podia fingir que era algo mais do que uma máquina na linha de montagem: mulheres elaboradas por uma engenharia de produção para fabricar ou parir robôs para trabalhar o progresso que não era dela, a ordem política e econômica que a jogara no lixão da história das mariposas casadas.
ELA, MÃEZONA, não se somaria às quase um milhão de pessoas que tiram as próprias vidas todos os anos. Uma morte a cada 20 segundos??? Ela teria de suportar o peso de ser quem foi, quem é. Quem será ela sabe: não será nada. Trocou a quantidade pela qualidade. Nenhum de seus rebentos não mais serviria para diverti-la. Eles cresceram. Agora tinha por filho que a divertia aquele Coisinha Júnior, o Tonho Ratazana, que desenvolveu o instinto de roubar tudo e todas as coisas que estivessem próximas a ele. Ela se identificava com ele por quê??? Porque ele plantou nela e no marido a certeza de que ia suicidar-se.
A IDENTIFICAÇÃO com esse plano de vida fora imediata. Que mais ela mesma ou o marido tinham a fazer na vida, após perder o respeito e a compaixão dos filhos??? Era, o casal, nada mais do que máquinas orgânicas aprisionadas a própria vergonha de suas rotinas agora envelhecidas e envilecidas. Não poderiam esconder dos filhos o passado que os envergonhava a todos. Como aceitar esse amontoado de tensões, perturbações, ansiedades e desassossegos???
BEM AO LADO da janela do quarto deles, Paizão havia plantado um pé de sapoti. Árvore nativa do sul do México e da América Central. Ela atrai morcegos, presença importante no ecossistema. Eles são noctívagos. E polinizadores, tal como as abelhas. Vê melhor que os humanos ao entardecer e quando amanhece, quando a luz do sol ainda não surgiu no horizonte. Simbolicamente eles são vampiros. Chupam sangue. São considerados símbolos de longevidade e ancestralidade: existem há mais de cinquenta milhões de anos. Os humanos estão na Terra há 2,8 milhões de anos. Na China são considerados símbolos de sabedoria e ancianidade.
NÃO SEI SE consciente ou inconscientemente, a lição que Paizão quis passar tendo essa árvore, o sapotizeiro, por símbolo, plantada em seu quintal, é que morcegos se aglomeram, se empoleiram uns próximos aos outros, para se sentirem protegidos. A mais evidente de suas habilidades é a mestria em manobrar, como se quisesse afirmar:
— Se o que vem em frente não é adequado e pode ser nefasto e contraproducente, manobre e siga em frente noutra direção. Crie distintos resultados em seu voo. Evite a proximidade com intencionalidades maquiavélicas.
NO GÊNERO ficção científica, há histórias que afirmam: a humanidade teria sido dominada na antiguidade por uma espécie Et de vampiros. Essa espécie teria, alimentando-se de sangue hominídeo por muito tempo, contaminado os primeiros primatas com seu DNA. Iniciou-se a partir de então, há mais de dois e meio milhões de anos, a descoberta do planeta Terra por outras espécies Ets igualmente interessadas em experiências de DNA híbrido.
A PARTIR DE então, espécies hominídeas conviveram simultaneamente umas ao lado de outras num ambiente de promiscuidade sexual. Por meio da seleção natural, os organismos melhor adaptados ao ambiente canibal selvagem, criaram as chances de sobrevivência supremacista uma sobre as demais. Estas, entraram em processo gradativo de extinção. Essa espécie antiga de supremacismo ainda vigora hoje, no século XXI, representada por primatas tipo o Trumpqueiro nos EUA, a Lagartixa caucasiana na Rússia e o nazifascista Bozo Mussolini no Brasil.
SEGUNDO DARWIN, a seleção natural afirma a sobrevivência da espécie mais selvagem, antropofágica, posteriormente mais moderada, sobre as demais. As ciências biológicas confirmam as ideias centrais da “Origem das Espécies”: a evolução e a seleção natural. Na série “Alienígenas do Passado” cientistas defendem a tese da “Lei do Contágio”, segundo a qual os organismos mais bem adaptados ao ambiente indócil, feroz, vândalo, indômito e descontrolado, têm mais chance de sobrevivência.
A NATUREZA É sábia ou implacável??? Nos jogos de convivência no processo de evolução e sobrevivência, o espaço de subsistência dos mais fracos é reduzido. As pessoas que foram vitimadas, pela convivência social, com outras mais privilegiadas no aspecto financeiro e econômico, foram direcionadas à submissão da libido, por serem mais frágeis. A longo prazo essas pessoas serão removidas do tabuleiro evolutivo???
DO MUNDO dito natural se afirma uma notícia hórrida, medonha: um fungo que afeta cigarras, coage e sujeita seus hospedeiros a acasalar depois de suas genitálias se desfazerem, após se fragmentarem e desagregarem-se. Seus corpos se tornam simulacros para uma moléstia ou patologia que se espalha e extermina todos na toca. O fungo, Massapora cicadina, compele os insetos a se procriarem em ritmo de cólera, grande excitação e ansiedade, movidos por compostos químicos psicoativos.
OS COMPOSTOS químicos causam mutações enfáticas de comportamento. As cigarras contaminadas produzem esporos em seus próprios corpos, contaminando outros membros da espécie. Os espécimes contaminados produzem bolsas tumorosas salientes, sobrecarregadas de esporos. Elas dobram o peso dos insetos. Os esporos multiplicam a transmissão que, em pouco tempo, afetam toda a população.
TRÊS DESTINOS — REMEDIOS VARO (1956)
A LUTA ENTRE espécies está, em parte, substituída pela oposição e a hostilidade na guerra-fria interminável entre gerações. Cada geração que se sucede a outra atua em competências diversas, de acordo com a cultura em vigência. A hierarquia entre seus membros declinou em rigidez, mas a oposição que seus membros provocam entre si, essa não tem fim. O salto de qualificações promovido pela tecnologia, faz grande diferença e aumentou sobremaneira as diferenças e divergências entre elas, gerações.
GUERNICA MOSTROU angústia, desespero, pesar, agonia, aflição, pânico e o pasmo do povo espanhol após ser bombardeado, quando da vigência da guerra civil espanhola. Arte e política se encontraram no Pavilhão Espanhol na Exposição Internacional de Paris em 1937. O massacre de Guernica se pode ver nas veias abertas da América Latina: pobreza, crueldade, terror político, horror econômico. A obra do artista continua atual.
O COLORIDO inexiste na pintura de 7,7 metros de comprimento por 3,4 de altura. A realidade monocromática é a realidade provocada pela covardia das armas nazifascistas em apoio à ditadura de Franco. O punho levantado, símbolo universal da resistência contra a opressão, foi substituído pelo triângulo de luz no centro. 1700 pessoas morreram na cidade que havia abrigado tropas contra o ditador espanhol. A geometria cubista expõe as trágicas consequências: um militar morto ao lado da mulher com perna ferida a sangrar. Outra mulher surta a chorar a morte do filho bebê. Outra, queima em chamas.
OS SÍMBOLOS da cultura espanhola queimavam, assim como neste século XXI, um ditador no Brasil fazia de tudo para queimar os símbolos da nacionalidade, instrumentalizando-os em sua campanha para a reeleição que não houve: bandeira nacional, comemorações do bicentenário da República. As atrocidades do nazifascismo foram revividas nos bastidores no desgoverno do presidente Bozo, em sua suja governança. O apetite do projeto de ditador não colou, apesar de ele unir as forças da instrumentalização das instituições PGR, PF, ministérios, presidência da Câmara.
A PEQUENA chama de esperança, representada na vela acesa no centro da pintura, simbolizava a crença em dias melhores. No Brasil, na Guernica nacional, traduzia a esperança de que o presidente Bozo Mussolini não seria reeleito. O grito de desespero dos animais queimados na floresta Amazônica, a própria floresta, nunca dantes tão carbonizada, pareciam, suas árvores, querer desprender-se de suas raízes e ir depositar votos nas urnas que o fanatismo miliciano do Bozo, de seus ministros militares e pastores apoiadores evangélicos, queria atribuir supostas irregularidades.
AS FEIÇÕES disformes das mulheres habitantes nas tendas de rua, carregam o sofrimento e a dor materna de saber seus filhos ao relento, buscando alimentos nos lixões em frente a restaurantes e padarias. Enquanto o Bozo negava as vacinas nos braços desamparados das milhares de pessoas infectadas pela Covid-19 que morriam nos hospitais, empanturradas da medicação indicada pelo capitão Cloroquina e o seu ministro militar nazista, que reproduzia o lema da Wehrmacht de Hitler: “nossa honra é obedecer”:
— “Um manda, o outro obedece”.
OS POBRES, os indígenas, os quilombolas, os sem-teto, os sem emprego, os que morriam por falta de oxigênio nos hospitais, urravam de aflição, enquanto os milicianos do ruralismo do presidente Bozo incendiavam a Amazônia para o plantio ou o pasto de seus animais de rebanho. Que fazia o presidente Bozo Mussolini??? Fazia gracinhas frente às câmeras de Tv visão, imitando a agonia dos que não podiam respirar e morriam perturbados pela falta de respiradores nos hospitais na Amazônia.
O MINISTRO da saúde do Bozo, o general (“um manda, o outro obedece”), soube do brusco crescimento da demanda por aspiradores no Amazonas quase um mês antes do colapso na rede hospitalar do estado. Mas o general de coleira do presidente era também um negacionista da Covid-19, que recrudesce, nesse momento, novembro de 2022, em quantidade de vítimas nos hospitais.
O GOVERNO federal sob comando, comunicação e descontrole do nazifascista Bozo Mussolini, provocava as instituições, os ministros do STF, ameaçando a Constituição e fazendo pouco da Comissão Parlamentar de Inquérito no Senado Federal, contra as evidências de que ele, Bozo e seus asseclas, ignoravam os sucessivos alertas no sentido de que deviam enfrentar o problema, e não fazer de conta que ele inexistia. Os insumos hospitalares básicos não chegavam aos hospitais. Pessoas morriam sem acesso a oxigênio.
ENQUANTO A Guernica nacional acontecia, os filhinhos do Bozo Mussolini presidente, superlotavam as redes sociais de fake-news e propaganda política pró-reeleição da plataforma populista do nacionalismo brega de seu papai presidente Cloroquina. Devem estar lamentando, ainda hoje, que seu “Papa Doc” (“o Haiti é aqui”) não ter sido reeleito.
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JAQUELINE DE MÃOS CRUZADAS — PICASSO (1954)
UMA VEZ cordialmente expulso da casa do tio em Niterói, passei a, num primeiro momento, sob a influência da amizade de meu avô paterno, com o advogado e administrador do jornal O Fluminense, Alberto Torres, que me sugeriu falar com seu genro e superintendente da empresa, Ephrem Amora. Consegui que me autorizasse a escrever uma coluna de cinema de uma lauda e meia, diariamente. Nos finais de semana, página inteira.
NA ÉPOCA o país fervilhava de inovações em todos os setores e instâncias populares da sociedade. Tudo tinha a alcunha e o slogan “Novo”. Novo isso, Novo aquilo, Novo talco, Novo batom, Nova calcinha, Nova sandália, Novas drogas, Nova pizzaria, Novos jornais nanicos, Novos instrumentos de tortura da ditadura, Cinema Novo, Novo Cinema Marginal, Novo cigarro, Novas bandas de rock: A sociedade se disfarçava por trás de novas novidades, mais velhas que as velharias de museus nas penitenciárias.
NOVOS CANTORES, novas práticas sexuais mais antigas do que os Hititas. A juventude buscava desafogar-se do fundo do mar das iniquidades familiares. A mocidade buscava uma independência até então reprimida e estimulada por pais que não sabia de mais nada, exceto que deveriam fazer de tudo para manter seus filhos sob a batuta de uma orquestra de fantasmas que, em vida, estavam sendo precocemente jogados nas covas de um tempo no qual não mais poderiam agenciar suas influências deletérias. Havia, na real, um mundo novo a surgir por detrás dos fantasmas das velharias: a cultura e a tecnologia multiplicavam as antigas imagens da civilização e sociedades, as mais antigas, nos novíssimos padrões de reprodução de antiguidades nos celulares novíssimos.
NÃO QUE AS novas influências também não fossem doentias e mórbidas. Eram sim. A tampa da panela de pressão dos instintos represados a tanto tempo, abriu-se com um espetacular e fantástico redemoinhar de estranhos jovens no ninho de uma sociedade da propaganda consumista de Novos carros, Novos eletrodomésticos, Novas motocicletas, Nova gasolina aditivada, Nova banda de rock. Novos postos antigos de gasolina.
OS BEATLES faziam a cabeça da juventude. Os Beatles e as bandas que se seguiram nas paradas de sucesso do rádio e na TV, em busca de qualquer motivação musical que pudesse ajudá-la, à Novidade, a se desapegar de seus carcereiros da família tradicional, conservadora, maquiavélica, mórbida. Sem mais tanto poder de influência. Exceto nas sinecuras familiares da tradição mais suburbana no interior do país de interior: Brasil.
OS CONCURSOS públicos pululavam, os cursinhos pré-vestibulares se materializavam em todos os cantos e recantos dos bairros centrais e periféricos. Os Beatles e o macaqueado dos Rolling Stones, eram vistos e ouvidos, divulgados em todas as emissoras de rádio cantando, principalmente, “Hey Jude”. Gal Costa a Janis Joplin brasileira, cantava numa intensidade de arrepiar:
— “Vá, se mande, junte tudo que você puder levar/Tudo que parece seu/É bom que agarre já/Seu filho feito louco/Ficou só/Chorando feito fogo/À luz do sol/Os alquimistas já estão no corredor/E não tem mais nada negro amor. — A estrada é pra você/O jogo e a indecência/Junto tudo que você conseguiu/Por coincidência. — E o pintor de rua que anda só/Desenha maluquice em seu lençol/Sob seus pés o céu também rachou/E não tem mais nada negro amor. — Seus marinheiros mareados abandonam o mar/Seus guerreiros desarmados/não vão mais lutar. — Seu namorado já vai dando o fora/Levando os cobertores, e agora/Até o tapete sem você voou/E não tem mais nada negro amor.
QUEM VIVEU aqueles dias de opressão, sabe mais que o normal das pessoas, o que significam estes versos de Bob Dylan traduzidos na voz da Janis Joplin nacional: Gal Sensacional: — As pedras do caminho/Deixe para trás/Esqueça os mortos/Eles não levantam mais/O vagabundo esmola pelas ruas/Vestindo a mesma roupa que foi sua. — Risque outro fósforo, outra vida/Outra luz outra cor/E não tem mais nada negro amor.
ENQUANTO TUDO isso acontecia simultaneamente ao sadismo de perseguidores e torturadores das FFAA, seus subordinados acossavam brasileiros presos, supliciados pelos oficiais armados da ditadura militar. Torturadores sádicos que ainda hoje são lisonjeados por personagens psicóticos, tipo o Bozo na presidência da República, a elogiar, incansável, o sadismo elementar de Carlos Alberto Brilhante Ustra, vulgo “doutor Tibiriçá”. Na linguagem dos indígenas guaianás que habitavam o Planalto Paulista quando da chegada dos portugueses, Tibiriçá queria dizer “Vigilante da Terra” ou “Sentinela da Serra”. Ele vigiava a dor dos torturados. Dor que alimentava seus orgasmos de psicopata do totalitarismo.
ERA NESSA incrível confluência de influências as mais diversas que eu, vindo do interior do país, estava em busca de me sociabilizar em pleno Hades urbano da cidade maravilhosa do Rio de Janeiro. Aprendia, por iniciativa própria, na universidade da cultura popular em livros de Máximo Gorki, Anton Tchekhov, Dostoievski, George Orwell. Eu vivia a realidade da “revolução dos bichos e bichas”.
EU NÃO ME achava na obrigação de estar nem de um lado nem do outro. Eu estava a navegar sobre o Estige, sobre as águas do rio da invulnerabilidade, em meu barco. No barco não tão trôpego de meu Inconsciente Pessoal. Os rios do Tártaro são muitos. Mas, sabemos, nem mesmo os deuses podem quebrar uma promessa feita por um navegante do rio Estige. Tal promessa é o voto mais sagrado que pode ser realizado por um humano.
DENTRE OS livros que li na época, mais me sensibilizou “O Macaco E A Essência”, editado dezesseis anos depois do “Admirável Mundo Novo”: ele disserta sobre o papel social da maternidade num mundo pós-conflito nuclear, no cotidiano de uma sociedade devastada. As mulheres são apropriadamente definidas no que diz respeito à maternidade. A mim parece que nunca houve uma definição mais congruente do papel da mulher na sociedade da procriação ou geração de filhos. O mito da “Mãe” nele, “O Macaco E A Essência”, é perfeitamente desconstruído.
O VELHO GUITARRISTA CEGO — PICASSO (1903)
MÃEZONA TINHA absoluta e absurda certeza de que conhecia os mais esconsos segredos e desejos da vida dos filhos que havia parido. Ela havia cismado que a coisa mais certa de todas as coisas para mim, seria ficar encoleirado, perto dela a render homenagens à sua “genial” capacidade de parir, e me ter parido. Eu, na avaliação dela, tinha sido criado não por um ser superior dotado de poderio criador. Criador de todos os seres humanos, após a terraplanagem do planeta Terra. Ser esse que havia colonizado também este sistema solar.
NÃO, PARA ELA, a criação de seus filhos era dela. Ela teria plena dominação de seus direitos à vida e à liberdade deles. Seriam todos, relativamente, o que ela achava que deveriam ser. Eu, de mim para comigo, tudo que mais queria da vida era sair da proximidade dela e de suas fixações psicóticas. Suas certezas para mim eram delírios dos quais eu tinha de achar um jeito de me afastar, mais cedo ou mais tarde. Não seria nada fácil. Eu tinha certeza de que, de alguma forma, conseguiria vencer o muro da vergonha que ela havia erguido entre mim e meus objetivos de vida.
SONHAR NÃO é tarefa à qual se pague dividendos. Eu sonhava também pela razão de não ter de pagar a ninguém por meus sonhos. Não pagar a ninguém pelo direito de usar minha imaginação, meus pensamentos. Mãezona queria porque queria ser madona e dona de meu imaginar e pensar. Cogitava deles se apropriar. Usava de todos os golpes baixos que conhecia, sem considerar as consequências de usar os meios mais baixos do vodu, do pó dos mortos-vivos que soprara em meu rosto de modo covarde e súbito.
AMPARADO POR minha vontade pessoal de liberdade, eu confiava que poderia ser livre. Livre. Relativamente. Um ser humano não pode ser livre amplamente. Desejava com veemência expressar-me segundo a avaliação do mundo do conhecimento, da experiência, da afirmação de meus pensamentos.
EU HAVIA lido sobre o livre-arbítrio nas considerações filosóficas de Nietzsche no livro “O Crepúsculo dos Deuses”. Este, afirmava que os teólogos inventaram a ideia do livre-arbítrio, para tornar a sociedade responsável por seus próprios atos e, em consequência, dependente dos deles, teólogos. Para se estabelecer a inocência do devir, a ideia de Deus deve ser negada. Não existindo Deus, a responsabilidade inexiste: para Nietzsche o mundo então estaria a salvo. Nietzsche morreu pirado. E é o filósofo mais lido da atualidade. O Salmo 49:13, nos diz:
— “O Caminho Deles É A Sua Loucura. Contudo Sua Posteridade Aprova Suas Palavras”. — Santo Agostinho introduziu o livre-arbítrio no pensamento ocidental. Essa foi a maneira de exercer o controle da livre-escolha por temor de se responsabilizar por ela futuramente. Eu pensava que, em meu coração e em minha mente, eu teria de me responsabilizar por minhas livres-escolhas. O que não era nada fácil. Porque, na prática, não havia liberdade no que quer que fossem minhas escolhas. Exceto relativamente.
PARA A CORRENTE do pensar sociopolítico do marxismo, a práxis é atividade característica do homem. É objetiva e simultaneamente subjetiva. Em minha compreensão isto quer dizer que o ser humano pensante pode transformar a natureza das coisas e, e somente se, ousar saber transformar a si mesmo.
EU ESTAVA, após sair do jornal “O Fluminense” por pressão do superintendente e do chefe de redação que me deu o ultimatum: ou eu escreveria meus artigos e críticas a partir dos filmes exibidos pela empresa fundada em Fortaleza, por Luiz Severiano Ribeiro, agora com sede no Rio de Janeiro, ou não teria mais direito a continuar escrevendo minha crítica cinematográfica diária no jornal.
EM OUTROS termos: ou eu me dobrava às exigências da distribuidora de filmes da Metro-Goldwyn-Mayer, ou eu não teria mais o espaço no jornal. Ou eu cederia aos interesses da fundadora do Cine Majestic, hoje grupo Kinoplex (RJ), ou não mais teria espaço no jornal para escrever sobre cinema Novo, Expressionismo alemão, Nouvelle Vague, New Wave japonesa, ou cineastas da cinematografia do Leste europeu.
NA ÉPOCA EU estava influenciado pelas ideias do esquerdismo vigente na imprensa nanica, na MPB, nos livros do marxismo editado pela editora Brasiliense. Eu estava sendo conduzido pelo inenarrável tsunami de ideias e ideais de um humanismo cristão lançado no lixão da necessidade de sobrevivência que não fosse exclusivamente para satisfação do Todo Poderoso Chefão Mercado. Como alimentar meu estômago, minha insaciável sede de viver, em sendo uma vítima da cultura familiar e social, que havia sido devastada na correnteza do rio subterrâneo de um universo que acabava de morrer???
COMO NASCER a partir de um caos existencial sartreano, de uma Náusea universal que não fornecia a menor possibilidade de viver segundo um mínimo de possibilidade de liberdade de escolha??? Viver a juventude, viver a paisagem das praias, montanhas e delícias na práxis do tira-bota nas vaginas das garotas, mocinhas e mulheres que não paravam de se oferecer???
AS MINHAS universidades estavam nas ruas e praias. Eu tinha de encarar uma realidade para a qual ninguém estava preparado. Eu tinha de sobreviver em meio às mais ingentes precariedades nas quais, não apenas eu, mas toda uma juventude mundial estava a se debater, a se queimar, a se molhar na chuva tempestuosa de não ter nenhuma orientação formal de como proceder para simplesmente sobreviver às mudanças de paradigma da sociedade consumista.
SOBREVIVER SEM perder o direito de manter viva minha sexualidade. A atração pelo sexo oposto me dominava totalmente. Eu gostava dessa dominação. Mas, eu parecia mais um rapaz perdido numa ilha, tipo Lost, tropicália. Cercado por pessoas que estavam caindo aos milhares no colo de relacionamentos com outras do mesmo sexo. Os trans, os bissexuais, os tris sexuais, os desmunhecados, os adamados personagens mais desgastados pela velocidade do impulso libidinal que não sabiam nem podiam conter. Eu via nos corações, nas mentes e nas faces, o desespero significativo de “O Grito”.
TODOS FAZIAM qualquer coisa para estar vivos no dia seguinte. A urgência de ter de se alimentar, de conseguir um emprego, de se manter estudando num curso profissional, numa faculdade mantida a partir da prostituição do corpo físico, sem a qual não poderia comer um sanduíche com Coca-Cola no “Dia Seguinte”. Era um deus nos acuda sem possibilidade de ser acudido por nenhum deus.
COMO EU poderia preservar-me??? Comecei a pressionar entrada em agências de publicidade e propaganda que me permitissem a sobrevivência sem que precisasse entregar os pontos e voltar para o campo de concentração da cidade natal: Theresienstadt.
O DIRETOR DE Criação da Agência SGB, Marcelo Silva, no Largo da Glória, me aceitou enquanto estagiário desse departamento que ele gerenciava. Ganhei experiência. Eu ganhava o suficiente para alugar um quarto numa pensão próxima, fazer minhas refeições diárias e, principalmente, frequentar museus, cinematecas, teatros e ter
à minha disposição algum tempo disponível para leitura.
RETRATO DE DANIEL-HENRY KAHNWEILER — PICASSO (1910)
NINGUÉM, NINGUÉM tem poder para proteger ou alforriar o Brasil da hipocrisia. De seus apresentadores de Tv cheios de bondades para com alguns poucos miseráveis e suas famílias. Como se dar uma casa ou certa quantia em dinheiro para eles, fosse melhorar a situação social miserável de quarenta milhões de pessoas a viver em condições sociais as mais sórdidas, no país. Os programas governamentais que doam esmolas irrisórias que mal compram uma cesta básica, são promovidos não por razões humanistas, mas pelos interesses eleitorais.
“NO MUNDO tereis aflições, mas tende bom ânimo. Eu venci o mundo” (João, 16:33). As frases bíblicas dos profetas ou de Jesus mostram que estamos todos sob a influência de forças místicas e ocultas que nos dirigem à crença de que ter esperança em viver sob condições físicas melhores, ajuda o cristão a suportar melhor seus desconsolos e desassossegos. Ora, a pessoa comum não possui nenhum privilégio de deuses, nem um profeta ou parente próximo de um Deus Et.
SUAS AFLIÇÕES só tendem a aumentar neles. Neles, os que nem mais clamam por justiça social porque sabem que não vão tê-la. Mas, se você que é parte da população do sofá da sala de jantar, ligar a Tv na CNN, vai ver um ex empresário milionário, que virou apresentador de programa de entrevista, com aquele discurso sem vergonha dos que têm, ele e seus convivas, na manga da camisa, a solução para os problemas sociais e econômicos do país. Estão ali apenas e exclusivamente para se exibir em suas supostas condições de empresários que venceram no mundo da competição mercado lógica.
NESSE GOVERNO do Mussolini Bozo, os pobres, miseráveis e os pequenos burgueses perderam renda e caíram no poço da pobreza, onde na mesa de suas cafuas, antros e esconderijos, falta comida e sobra enganação. Eles somam mais de quarenta milhões. Estudos sérios de organizações sociais internacionais sem compromisso com a demagogia recente, revelaram que aproximados 60% da população nacional convive com alguma condição de insegurança alimentar amena, moderada ou grave. Isto quer dizer: mais de 125 milhões de brasileiros estão nessa condição social que aumentou em 7,2% em relação a 2020, quando iniciou a pandemia da Covid-19.
EU VEJO O terror nos olhos supostamente alegres dos que participam da farsa coletiva nas paradas gays. Eu vejo o horror em meu próprio olhar ao ver milhões de vítimas da cultura familiar de pais, parentes, filhos e filhas, a comemorar a demência coletiva resultante de uma cultura e de uma civilização que festeja a própria extinção. Eles e elas se fantasiam de si mesmos, do que eles representam: a alegoria que comemora a vitória dos demônios e do inferno.
COMEMORAM A vitória nas urnas de seus políticos no Congresso. Comemoram a atitude dos pastores satanizados, ditos evangélicos, do ex-presidente Bozo Rachadinhas. Bozo negacionista das vacinas, Bozo debochando dos que morreram sem fôlego na aflição terminal da falta de oxigênio. Os festivos gays carnavalescos, metáforas caricatas dos foliões nas escolas de samba na Marquês de Sapucaí, a comemorar o que as senzalas fizeram com seus ancestrais.
OS CARNAVAIS no país são muitos: o de sete semanas antes da Páscoa, as fogueiras de São João e São Pedro, os campeonatos de futebol, a parada de Sete de Setembro, a parada do orgulho LGBT em junho, Bumba meu boi, Folia de Reis, Congada, Festa do divino, Círio de Nazaré, Oktoberfest... A divisão entre os poderosos e seus governados está presente nelas todas. Festas de carnavais. É como se a exclusão social, por ilusórios momentos, inexistisse.
OS CARNAVAIS e outras festas gays, comemoram a vitória da Serpente sobre Eva. A supremacia dos demônios a celebrar a derrota e a ruína das conquistas da civilização e da cultura (“elas que se danem ou não”). Festejam o que há de hominídeo primata em cada ser dito humano, celebram a extinção em curso do Homo sapiens sapiens. As paradas gays dançam a ilusão perdida de uma cultura e civilização impedida de afirmar a própria condição natural de gênero: masculino/feminino.
OS ALEGRES foliões no caldo primal das aflições, antecipam o carnaval principal daqueles que aqui chegaram, na terra do pau-Brasil nos mutirões de sobreviventes dos navios negreiros. Eles comemoram alegremente o fim do gênero masculino e feminino. Nada mais de Adão e Eva, o barato agora é Adão e Evo. A Casa Grande e a Senzala se encontram, dão-se as mãos no grande campo de concentração festivo do tropicalismo vigente da Terceira Grande Guerra.
OS RATOS da “elite” colocaram o guizo no pescoço antidemocrático de 58 milhões de hienas. O que país dos gays comemora é a vitória da Oposição ao criminoso supremacista Bozo Mussolini. Ele assassinou trezentos mil brasileiros por lhes faltar vacinas nos braços. O que os gays do tropicalismo nacional comemoram é a volta do candidato menos ruim ao Planalto Centrão do Brasil.
CABEÇA (TETÊ) OU:
O ARTISTA E A SUA MODELO
— PICASSO (1928)
ESTA NOVELA que você agora lê, mais que uma novela, é um mix de vários estilos literários. As verdades que se expõem a partir da realidade em que vivemos por vezes não cabem numa única definição literária. A produção libertária não é, necessariamente, um mix anárquico: romance, poesia, dramaturgia, conto, tragédia, comédia, crônica, artigos... Mais importante são as revelações sobre a alma do autor e suas percepções: o âmago, os sentimentos e emoções dos seres humanos. A exposição nas letras do que até então havia sido jogado para debaixo do tapete. As descobertas se fazem ao se descobrir. E descobrir-se.
REVELA AÇÕES acontecem quando um Deus Et faz contato com humanos. A Bíblia é uma revelação do conhecimento divino sobre os seres da Criação. Eu me perguntava se meu Anjo da Guarda estaria a me proteger do assédio sexual dos membros degenerados da geração de pedófilos ao estilo de Paizão. Ele, Paizão, por sua vez, tentava escapar do assédio de uranistas e pederastas do meio ambiente em que sobrevivia.
EU NÃO ERA mais que uma criança, mas já me perguntava sobre essas coisas, talvez devido à frequência no catecismo na Igreja do Amparo aos sábados, e à influência que as ilustrações distribuídas pelo padre ou instrutor causava sobre mim. Algum tempo depois, décadas se passaram até que ficou bem inteligível em minha mente, com uma clareza incontestável, que todas as coisas que acontecem com as pessoas em todos os lugares, não passam de uma retroalimentação da literatura bíblica exposta desde o Livro do Gênese. A Bíblia é uma excelente sala dos espelhos de ensinamentos existenciais.
AO VER TODOS os dias a quantidade de pessoas que parecem querer mudar o texto que fundamenta a ideia de gênero masculino/feminino no evento da criação de Adão e Eva, fico a matutar porque uma quantidade cada vez mais significativa de gentes, em todos os lugares do mundo, parece preferir uma mudança no texto bíblico. Ao invés de “homem e mulher os criou” milhões, bilhões de sujeitos, famílias, parentelas parecem que têm preferência por outro texto: Adão e Adam os criou. Ou: Adão e Evo os criou. Se os tivesse criado gays, como poderiam multiplicar-se e subjugar a Terra???
A HUMANIDADE parece querer substituir os pares da amorosidade homem/mulher, pela companhia marmanjo/jacaré. É certo que a convivência entre machos e fêmeas se tornou mais e mais problemática devido, principalmente, à uma educação voltada às tarefas do consumismo. A civilização operou mudanças drásticas de comportamento quando a industrialização transformou a todos em mercadorias que consomem outras mercadorias. Compras pagas para a produção que agrega serviços, formais e informais, prestados nos demais setores de atividades. O Ministério da Economia indica: 70% do PIB são gerados pelo terceiro setor.
A SOCIEDADE civil está em busca de seus direitos sociais. Constitucionais. A lógica do mercado nem sempre está na defesa desses direitos, no cumprimento das atribuições de natureza pública. Não há distribuição de dividendos ou resultados financeiros, mesmo quando há vínculos com o Estado devido às parcerias. O Terceiro Setor privilegia o estímulo à iniciativa individual ou coletiva: a solidariedade, a filantropia, o voluntariado sem interesse na produção do lucro.
CONSIDEREMOS todas essas afirmações dos parágrafos anteriores: a reunião de instituições que possuem natureza jurídica, com eficácia e know-how de autogestão, constituem uma força econômica superior ao que normalmente se imagina: associação de moradores, trabalhadores rurais, educação, formadores de cidadania, ambientalismo, direitos humanos, recreação, cultura e demais áreas emergentes. Onde se situam os trabalhadores da Literatura, os autores sempre explorados por contratos canibais com editoras e aproveitadores do talento de escritores que não têm apoio financeiro e econômico de nenhuma entidade beneficente, instituto, fundação ou organizações não-governamentais??? Por que a Literatura no país Brasil está em vias de extinção??? Não há simpatia, crédito ou amabilidade por seu papel social.
POR QUE A Literatura não é considerada uma das artes visuais??? Juntamente com pintura, desenho, gravura, fotografia e cinema??? O cinema sem Literatura existiria??? A exposição de sentidos e valores dos movimentos estéticos que caracterizaram as Artes na virada do século XX para o XXI teriam alcance público não fosse as obras literárias, as teorias distribuídas em livrarias sobre eles??? O roteiro cinematográfico, obra literária obrigatória para a realização de um filme, não é Literatura???
A ARTE produz a interação emocional entre as demais formas de engenhos criativos de realidades paralelas que desvendam os significados subjacentes nos subterrâneos da realidade mesma. A Arte Literária é interação básica, imprescindível, fundamental entre as demais formas de criação artística. Por que não merece das instituições governamentais e não-governamentais, das editoras, a atenção que culturalmente deveria merecer??? A sociedade sem literatura é uma malformação temerária de seres hostis. Seres que não se compreendem, nem interagem criticamente entre si.
A ARTE Literária é crucial, necessária, na retroalimentação dos costumes. Na renovação deste. Na crítica deles na família, na política, na economia, nas instituições da sociedade. As tendências e singularidades comportamentais, os sentidos, sentimentos e emoções não têm melhor espelhamento crítico do que na Literatura. Por que então ela não é valorizada na dimensão em que os barões e poderosos chefões do crime organizado, nacional e internacional, valorizam outras formas de Arte??? Talvez porque, com Literatura, aqueles barões tenham mais dificuldades em lavar o dinheiro da contravenção.
EXATAMENTE POR isso: a criminalidade institucional se desnuda. Aparece. Revela-se. E os centrões da criminalidade institucional, política, econômica, social, não querem que essa realidade se torne publicamente disseminada. Não há interesse político, econômico e social na valorização da Literatura nacional. Por isso o povo brasileiro está em franca extinção da sensibilidade, da inteligência, da compreensão de si mesmo e de seus pares empanturrados de baboseiras Tv visivas: papos de segunda, conversas de boteco, verdades secretas, vai que cola, drogas, narcisismos e futebol.
ARLEQUIM — MÁRIO GRUBER (1952)
SE A LEI FOSSE igual para todos, “todos são iguais perante a lei”, que faz um criminoso de guerra da periculosidade genocida de um Putin, fora da prisão??? Talvez ele nem precise fazer nada para se manter fora do lado restritivo das grades. Afinal, os que conseguem uma posição de poder, são tratados como deuses. Os outros poderes hesitam em fazer cumprir as leis. E a Lei constitucional. O criminoso de guerra Putim está a pagar por seus assassinatos??? Pela invasão de um país ignorando a autodeterminação do povo ucraniano??? Os milhões de pessoas humilhadas, sendo forçadas a migrar de seu próprio país para se abrigarem em países outros. Putim está preso???
— NÃO.
O EX PRESIDENTE dos EUA, conhecido por Trumpqueiro, após liderar a invasão do Capitólio, está a pagar pelas dezenas de crimes dos quais é acusado pela liderança de seus arruaceiros supremacistas que desejavam ver Trump, o Trambiqueiro, no lugar do atual presidente dos Estados Unidos, eleito pelo voto nas urnas da maior democracia do mundo??? Trump, o Trambiqueiro, está preso???
— NÃO.
O PRESIDENTE Bozo, presidente tropicália, é o principal ator do tropicalismo na política atual do país Brasil. Ele comanda o movimento tropicalista brasileiro do bananal no Planalto Central, sendo o Centrão das atenções do jornalismo nacional e internacional na América do Sul, por estar a preparar com muita antecipação, a invasão do Congresso nacional, imitando seu ídolo e ex-presidente dos Estados Unidos. O exercício desastroso da presidência do Bozo, em todos o território nacional, seus incontáveis crimes de responsabilidade os conduziram à prisão??? Até hoje não.
— NÃO.
TODOS OS 8 000.000.000.000 (oito bilhões) de habitantes do planeta Terra estão vendo e sabendo que estão sendo feitos de rufiões do medo globalizado??? Sabem que estão sendo usados e abusados como se fossem meros autômatos orgânicos, marionetes, fantoches, bonecos, bobos, bufões, androides, polichinelos, por essas lideranças nazi-supremacistas que exercem comando, comunicação e controle sobre eles???
— SIM. Eles todos sabem. Mas, que podem eles fazer nessa situação???
E O QUE É pior: desconhecem que o poder está com ele, povo da Terra, e não com os Putim, Bozos e Trump trambiqueiros. Essas lideranças antidemocráticas fazem e desfazem, cantam de galos. E os oito bilhões de terráqueos aceitam que eles esfreguem em suas caras o pênis sujo da merda nazi e antidemocrática.
QUE FAZER??? Dizem as pessoas: — É assim que funciona.
É ASSIM QUE funciona, mas até quando??? Até quando a sociedade planetária vai aceitar que dois, três ou cinco centenas de poderosos se unam contra o caráter que deveria ser humanitário, das instituições??? Quando as instituições vão prevalecer por sobre o poder discricionário arbítrio desses projetos de ditadores e seus objetivos totalitaristas??? Se a voz do Povo é a voz do Deus Et, por que não se afirmar essa voz contra o totalitarismo nazi dessa franco massa que se alia empoderada por si mesma???
CRIMINOSOS NÃO são apenas os que cometem crimes, são também aqueles que aceitam a impunidade dos Putim, dos Trump trambiqueiros, dos Bozos arruaceiros. Onde estão as demais instituições que deveriam puni-los??? Nos Estados Unidos parece que essas instituições estão funcionando na defesa do regime democrático mais consistente do planeta Terra. Trump, o Trambiqueiro, vai para a cadeia???
— DEVERIA IR, SIM.
MAS, O PARDIDO Republicano tem poder para mantê-lo fora das grades pelos meandros infaustos e irresgatáveis do poder político. Afinal, um ex-presidente dos EUA deveria, já que está fora da proteção ou cobertura institucional do cargo, ser tratado enquanto cidadão comum em seu país. Não como um rei do qual tiraram a coroa, mas continua com todas as mordomias e blindagens do cargo que ocupou. É o poder, não o direito constitucional, não a Carta Magna, quem governa.
OS ANJOS DA morte do nazismo estão querendo voltar a governar o mundo com toda a força de seu poderio político narcísico. Afinal, eles se julgam os descendentes dos deuses Ets que dominam a Terra desde as mais remotas épocas. Eles aqui chegaram quando o planeta Terra ainda estava sendo bombardeado por meteoros, meteoritos, e outros corpos celestes que entram na atmosfera terrestre e se incendeia ao atrito com a atmosfera.
VEJAM O BOZO e suas motociadas, próprias de um sujeito que não tem o que fazer, e por isso não faz nada mais que se divertir na presidência da República como se ela fosse um playground para o sustento das mordomias familiares de sua “famíglia”.
ENQUANTO A precariedade de milhões de lares sem teto no país, sem garantias constitucionais, sem educação pertinente à defesa de suas cidadanias aviltadas, com seus ministros de apoio aos crimes de responsabilidade de um presidente irresponsável, motoqueiro, arruaceiro, que governa para sua bolha de apoiadores de armas, de crimes, de generais fabricantes de cloroquina. Que apoiam a antidemocracia e seus discursos contra as urnas, contra os ministros do STF, STE. O presidente Bozo Mussolini tropicália continua solto na buraqueira. Vai ser preso quando não mais se esconder sob o tapete da imunidade do cargo que hoje, 22/11/2022 ainda ocupa???
— ATÉ QUANDO esse corrupto de caráter fraco, despreparado até para exercer a função de síndico administrador de condomínio na periferia na Baixada Fluminense, esse Bozo, que se acha engraçado... Até quando esse motoqueiro, ex capitão do exército sem disciplina, vai continuar a sujar a imagem do Brasil diante dos demais países do mundo???
NATUREZA MORTA — DI CAVALCATI (1971)
O TEMPO enquanto humana experiência. A criança nasce em todas as estações. Sai do ventre suja de sangue, depois de ficar meses dentro dele, desenvolvendo-se no líquido amniótico, amarelado. Uma vez expulso pela vagina, é jogado no mundo dos adultos e suas patologias. Lá está a criança depois do parto, melada do sangue dos vasos sanguíneos da mulher. Vasos que se rompem e pouco tempo depois são cicatrizados. Eu fazia parte dessa natureza que já nasce morta para suas próprias percepções, ainda inexistentes.
A CRIANÇA nasce numa realidade que desconhece, exceto pelo que já vem com ela devido à memória genética que, na psicologia de Jung, traz consigo o Inconsciente Pessoal da mãe, a partir do qual os seres, ditos humanos, herdam ideias, sentimentos e emoções de seus ancestrais. A memória oculta ou subliminar consiste nos processos PSI inconscientes da memória ancestral. O estilo de pintura “natureza morta” surgiu no século XVI: representada objetos inanimados: livros, instrumentos musicais, frutas, flores, porcelanas, jarros de cristal. Meu nascimento representava-me: eu era uma dessas coisas. Eu precisava, futuramente, encontrar um caminho para a vida. Viver.
A HUMANA idade da criança vem com toda essa mala pesada da carga genética. E a biologia estuda os processos de transmissão das características da hereditariedade: o tempo passado, o tempo presente e o futuro estão impregnados nele, no conhecimento inconsciente da existência subliminar. Esses conteúdos nem sempre se revelam na gnose consciente da pessoa que vai crescer ocupada em sobreviver. A pessoa atormentada por fantasmas ancestrais, vai ter de seguir em frente com seus
DE UMA para outra geração, que se pode transmitir??? Você só pode compreender o sentido de uma ação, se levar em conta sua intencionalidade, ou finalidade. As pessoas nascem, crescem e se tornam adultas negando, de alguma forma, aqueles que as antecederam. Mas, a negação de minha pessoa e de meus direitos por Mãezona e Paizão Coisinha ultrapassa as fronteiras da racionalidade. Acredito que seja uma manifestação do espírito de perversidade inata contido neles.
ESSE CASAL nascido do Inferno de suas necessidades, rancores, sentimentos e pressentimentos de animosidade e malquerença, queria-me reproduzir a vida miserável que viveram e viveriam sempre. Vingavam-se nos filhos, principalmente em mim, todas as faltas que lhes foram inseridas em todas as fases de suas malditas vidas.
NÃO É demais repetir: esta novela quer juntar os pedaços dispersos de minha memória para que não se percam na falta de compromisso em revelar para mim mesmo, antes que para o caro leitor, minha visão da verdade pessoal, familiar e social. Eu quero uma explicação lógica para a vivência de tanto horror.
JUNTAR OS pedaços em busca da compreensão desse labirinto pessoal, familiar e social do qual fui vomitado da barrigada insana de Mãezona. Ela para mim é um paradigma de todas as mães do mundo. Elas parem suas crianças em meio às forças pessoal, familiar e sociais destrutivas. A suprema covardia é que todas essas forças juntas, formam um enorme muro da vergonha que separa a vida frágil de uma criança das influências mórbidas e imensas do mundo.
MEU TRABALHO no jornal se resumia a escrever minha avaliação do filme do dia exibido num cinema de Niterói ou no Rio de Janeiro. Datilografava pela manhã, na redação do jornal, numa máquina de escrever comum, não havia teclado de computador. Estava na década de setenta. Depois ficava com tempo livre até que, de noite, ia trabalhar no departamento de distribuição do jornal para os municípios da baixada fluminense. Nos fins de semana fazia a cobertura fotográfica dos jogos de futebol nos torneios entre times de peladas na praia do Icaraí, Niterói, situada na Baía de Guanabara.
NA REAL, O que eu queria mesmo era estar vigilante de como meu eu biológico funcionava: as células, o metabolismo, a evolução. Eu lutava por criar interações neurais outras em meu cérebro. Sair da comunidade perceptiva familiar, da empatia entre meus familiares. Encontrar um portal PSI a partir do qual eu pudesse configurar-me, sem a interferência dos membros daquela família leviana, imprudente, maluqueira. Não apenas daquela família: sair das fronteiras PSI daquela sociedade vulgar.
AS INFLUÊNCIAS triviais, frívolas, insignificantes: eu queria, com todas as forças de minha juventude, delas alienar-me. Expulsar de mim, a parte de mim mesmo que à alienação genética, familiar e social eu pertencia. Mergulhar de cabeça num outro tipo de tensões. Criadas por mim. Eu não acreditava que os paradigmas dele, mundo, pudessem ser substituídos, como num passe de mágica. Eu jamais poderia mudar o mundo. Mas, eu poderia mudar minha maneira de me alienar.
ESTE CONHECIMENTO me instruía. A partir dele, de saber que aquele mundo do qual eu começava a me distanciar, não tinha nada para mim. Eu nunca poderia crescer intelectual, mental, emocionalmente em meio àquelas criaturas do Inferno familiar e social. Aquelas criaturas não queriam nem saberiam usar suas vidas para compreendê-las. Muito menos para compreender-me. Nada nem ninguém poderia salvá-los deles mesmos. nem a religião, nem aquele tipo neandertal de educação, nem suas responsabilidades com emprego, com noivado, casamento, responsabilidades familiares de uma sociedade kamikaze, suicida. De uma sociedade carnavalesca, baiana, carioca, paulista, fulana, sicrana, beltrana.
O QUARTO EM ARLES — VAN GOGH (1888/1889)
QUANDO SAÍ do jornal "O Fluminense", onde exercia os cargos de repórter de setor, crítico de cinema e funcionário do departamento de distribuição do jornal, comecei a viver uma vida semimarginal, outsider. Afinal, eu estava na chuva e tinha mesmo de me molhar. Para enfrentar o mundo Cão não precisei castrar-me ou desistir de minha sexualidade. Não, pelo contrário. Todo dia era dia de sobreviver e matar um leão na arena do imperador Mercado. Eu não contribuía para ele. Meu trabalho agora consistia em ganhar o mais preciso ouro que existe. A mais preciosa de todas as pedras preciosas: o Tempo.
MEU PSIQUISMO estava sempre fazendo e respondendo às mais diferentes interrogações. A vida começava a fazer sentido porque eu estava a vivenciá-la em minhas observações. Tudo em minha realidade começava a fazer sentido porque eu estava a duvidar de tudo. A recriar todo o mundo de incongruências do qual eu fazia parte. Compreendê-lo era também uma parte da tarefa de compreender a mim mesmo.
EU HAVIA LIDO Descartes e duvidava de tudo. “Enquanto duvido de tudo não posso duvidar que esteja duvidando. Sou alguém que duvida. Que pensa a dúvida. Sou alguém que existe a pensar. Se penso, existo”. Não palavras de Descartes inexistem métodos fáceis para solucionar problemas difíceis. Eu queria solucionar o problema difícil de minha própria existência. Eu queria ser mais que uma fruta na bandeja familiar de naturezas mortas. Há verdades que se escondiam de mim, do mundo, em todos os lugares. Eu queria saber onde estavam.
EU HAVIA ME mandado, saído fora, não juntei tudo que pudesse levar, porque não havia nada para juntar. Exceto privações, reveses, estorvos. Nada naquela família de onde saí era meu, nem parecia meu. Eu era o filho singular que ficou só. Fugindo das maluquices em meu redor. Não houve tempo para chorar sob a luz do sol. O fogo solar me motivava a ir em frente, migrar de praia em praia, explorando o universo estelar de minha mente. Dona marijuana me motivou. Eu era um Alquimista que estava no corredor, sem mais nada que não fosse o cadinho que me trazia as revelações do dia a dia: minha mente.
SOB MEUS PÉS o solo não rachou. A única certeza era o chão firme de areia, cimento ou asfalto que eu pisava. A Estrada para mim era o cassino no qual eu jogava todas as minhas fichas. As garotas perdidas no espaço tempo ao sabor do vento eram a certeza da bendita indecência: um tesouro que consegui por coincidência. Eu cruzava com o pintor de rua que caminhava só, que desenhava Ipês a cores em seu lençol. Eu era um marinheiro mareado que tão cedo não abandonaria o mar.
EU ERA UM guerreiro armado da esperança de que a luta contra os milhares de fantasmas do Castelo de Otranto da atualidade, eu venceria. Eu havia mesmo de vencer. Eu existia para vencê-la. Não sabia exatamente como. Mas a certeza de que a obrigação moral, biológica, minha razão e intelecto, a força de minha juventude não poderia ser desperdiçada sendo mais outro robô do exército coisificado de androides e autômatos da sociedade submissa à ditadura militar. Eu até usei muitas vezes o restaurante do então Ministério da Guerra no centro do Rio de Janeiro, para matar minha fome. O bandejão era barato.
A AMIZADE que me acompanhava na empreitada de filar uma refeição no Ministério da Guerra, na vigência da repressão militar, meu amigo de aventura urbana, Luís Carlos Alves, um malandro cobra criada nas areias psicodélicas de Copacabana. Quando não ele, meu amigo Daniel, o músico amigo do Belchior. Eu não queria nem saber. Ia adentrando da Guerra em busca de uma refeição. Os recrutas que ficavam na porta do edifício do Ministério da Guerra, quando tentavam me parar, meu amigo intervinha dizendo:
— “Ele é sobrinho do general Geisel”. Os recrutas da portaria do Ministério, na dúvida, permitiam que entrássemos e fôssemos pegar a bandejão para nos servir da refeição muito em conta no restaurante ministerial da Guerra. Eu, um cara com cabelos ouriçados, enormes, um hippie na vigência do tropicalismo brasileiro, não poucas vezes filei um rango nas dependências do inimigo de farda. Até que um dia nos informaram que o restaurante tinha fechado. É bem possível que eu tenha contribuído para isso. Era um escândalo: dois cabeludos em meio àquelas pessoas muito bem ajuizadas, que trabalhavam na burocracia do Ministério da Guerra, na vigência dos Anos de Chumbo da ditadura do coronelismo militar.
NA ÉPOCA vivíamos de expedientes, artifícios, engenhos e improvisações. Habitávamos em apartamentos alugados os quais pagávamos apenas o primeiro aluguel, quando não alugávamos para pagamento posterior em trinta dias. Ficávamos a habitar esses imóveis até vir o oficial de justiça dizer que tínhamos um prazo para sair do apartamento ou seríamos expulsos à força policial.
DO LARGO do Machado, Copacabana, Ipanema, meu caro amigo Luís Carlos partiu em direção à mineração de ouro na Amazônia. O Daniel deve ter entrado numa banda de rock. Os apartamentos que “alugávamos” serviam para acolher as garotas sem teto que vagavam no Aterro do Flamengo, nas areias das praias, onde o pôr do sol era visto com um cigarro de marijuana nos lábios. As garotas vinham de tudo que é lugar: Petrópolis, Teresópolis, Friburgo, e da vasta área de cidades do vasto litoral fluminense.
AS AMIZADES se faziam valer no conhecimento aleatório nos bares, no areal, no famoso “Beco da Fome”, onde o macarrão à bolonhesa custava uma ninharia e socorria dezenas de efebos e garotas de programa no teatro urbano brasileiro na hora imperativa da larica. A rapaziada “cabeça feita” costumava frequentar as sessões de meia noite do Cine Ritz na Avenida Atlântida, onde não poucas vezes o Nelson Motta, ao adentrar uma fila de cadeiras com suas vestimentas espalhafatosas, era muito vaiado.
UMA MINORIA dentro de uma minoria desses jovens, costumava frequentar também as exposições e as cinematecas do MAM e do MIS onde iam buscar acolhimento nas salas de exibição de filmes clássicos e ditos “de Arte”. Essas salas serviam também de acolhimento da paranoia acentuada pelo uso de drogas, que o mercado de distribuição alimentado, dizia-se, pelo pessoal da CIA, em caráter de experimental de controle mental coletivo MK-Ultra. A estrada da liberdade sempre soma perigos. O LSD de vez em quando aparecia em oferta. Vinha da USP ou dos Estados Unidos???
A AGÊNCIA Central de Inteligência dos EUA ampliava nos países latino-americanos suas experiências de controle mental da mocidade, com drogas alucinógenas tipo LSD. Essa juventude, se controlada, não estaria pondo em risco a hegemonia americana na liderança de comando, comunicação e controle de seu mercado consumidor de mercadorias em confronto com a disputa desses mercados na Guerra-Fria com a poderosa e temida: a ex-União Soviética.
OS FUZILAMENTOS DE 3 DE MAIO DE 1808 — GOYA (1814)
A MOÇADA das décadas de sessenta/setenta, que estava nas ruas, praças, avenidas e praias das cidades litorâneas e urbanizadas, estava tão perdida como seus pais e antecedentes estavam. Mas estava bem mais sozinha e desamparada. As velhas gerações tinham seus parentes com quem contar. Podiam apoiar-se em suas memórias caducas, nas parentelas de uma cultura que não se encontrava na fronteira de mundos completamente diferentes em seus paradigmas. Aceitavam tudo. O espírito crítico os desabitara.
A GERAÇÃO de estrada dos anos sessenta/setenta estava a sobreviver no interior do Horizonte de eventos nas bordas do Buraco Negro do Futuro. De um futuro que deseja romper implacavelmente com os padrões, arquétipos e referências do passado. A juventude queria o impossível. Primeiramente afastar-se daquelas naturezas mortas a quem chamavam pais. Aquelas frutas e legumes nas bandejas da sala e da cozinha. O ferro-velho no lixão ancestral. Nas ruas praças e avenidas das cidades, a ditadura armada matava impunemente. As forças de repressão fuzilavam aqueles membros idealistas das organizações que se diziam ser terroristas na luta por liberdade de expressão.
QUANDO OUVI Janis Joplin cantar “C´mon God, and by me a Mercedes Benz” (Oh Lord, Won´t You By Me A Mercedes Benz” (Oh Senhor, Você Não Vai Me Comprar Um Mercedes Benz???) baseada na letra original do poeta beat Michel MccLure, eu estava a vivenciar o auge de minhas contradições: trabalhava no departamento de criação de uma de maiores agências de publicidade e propaganda do Rio de Janeiro. O Anuário de Propaganda me registrou enquanto “auxiliar do departamento de criação”, ignorando que meu dedão estava em quase todas as campanhas da agência.
MAS, MEU cabelão ouriçado, meu desprezo incondicional pela aparência comportada do pessoal do departamento de contatos e do próprio departamento de criação, não me permitia senão ser olhado com desconfiança pelos olheiros do presidente da agência atuando em seus departamentos. Eu solucionava boa parte dos problemas do setor de criação, mas fazia questão de mostrar meu desprezo pela colonização do país pelos interesses canibais de Wall Street.
AS AGÊNCIAS de PP&RP criavam riquezas amontoando-as em grupos de privilégios. Enquanto a miséria campeava nas ruas, nos lares, nos bares, nas praias. Não apenas a miséria material. E as polícias armadas da ditadura farejavam em todos os cantos, a possibilidade de acusar alguém de ser comunista. No coração e mentes dos jovens na Estrada, não havia nada dessa cultura dos barões armados da ditadura, que garantisse uma mudança de paradigmas numa sociedade entregue à sede insaciável de ter. Ter. Ter. A palavra “novo” era uma espécie de chamamento e remédio para todos os males. A palavra novo era a panaceia do momento. Tudo era novo, inclusive a maneira de encarar o ferro-velho das gerações passadas.
TODOS NA Agência ignoravam-se mutuamente, exceto pelos interesses corporativos que uniam a todos. Mas a agência vivia como se fosse um time de futebol, tentando equilibrar as hostilidades entre membros do departamento que tinham excelentes salários, e os demais funcionários que consideravam uma ameaça a seus postos privilegiados de salários. Oh Senhor, não há socorro possível para mim, nessa conjuração de interesses dos que apenas querem comprar um apartamento na praia e um Mercedes Benz??? Não tão blue como o da Janis!!! Nem tão legal como o da Janis Joplin nacional: Gol Costa.
JANIS JOPLIN havia incluído, a título de gracejo, o chiste, na gravação de seu álbum no Estúdio Sunset Sound, pouco antes de sua morte: “vou cantar uma música de grande importância social e política”. Gracejando ou não, ela estava afirmando uma verdade incontestável sobre pessoas que acreditam mesmo em que, ao comprar um apartamento num bairro chique e um carro do ano, isso as faz melhores que as demais.
NESSA ÉPOCA eu estava a ocupar um apartamento próximo à praia do Arpoador. Ocupação essa com o aval de um proprietário que se engraçou pelo músico Daniel, amigo do cantor de blues brasileiros, o Belchior, que habitava num apartamento próximo ao Largo do Machado. A proximidade entre duplas de jovens nada tinha a ver com homossexualidade: era uma garantia de apoio à sobrevivência precária.
NA MORADIA próxima à praia do Arpoador, não faltavam garotas, “perdidas na noite” da zona sul do Rio de Janeiro. Em troca de um abrigo, elas, novinhas e bonitinhas, abriam suas perninhas enquanto ficavam na expectativa de ser abrigadas por uma cafetina ou cafetão, e passassem a ocupar o expediente de programas num lupanar apartamento frequentado por políticos que pagavam uma grana por programas de sacanagem com garotas menores de idade que precisavam se manter vivas às custas desses programas. A prostituição masculina de garotos de programa entre jovens "perdidos na noite", também era arregimentada nos lupanares dos apartamentos da zona sul. Sobrevivência vale-tudo.
NUMA MANHÃ, eis que chegam agentes da repressão alegando ser da polícia federal, dizendo que receberam denúncias de que no ap. funcionava uma célula terrorista do Movimento Revolucionário 8 de Outubro (MR8) que participava da luta armada contra a ditadura militar. Eu era acusado de pertencer a esse grupo por ter frequentado o ambiente universitário (UFF) na década de sessenta, em Niterói e fazer discursos antirrevolucionários. Eles apelidavam de “revolução” o golpe militar.
FOMOS LEVADOS ao QG do DOI-CODI na Lapa. No primeiro dia, haja porrada: socos na cara, provocações verbais, cotoveladas no tórax. Eu tinha de confessar que era terrorista porque em meu saco de roupas e livros acharam textos sobre o marxismo: o conflito de classes enquanto paradigma vetorial da mudança social e econômica da sociedade capitalista. O consumismo pelo consumismo, as mercadorias enquanto valor máximo e principal do trabalho pelo trabalho e do capital a explorar a mais-valia dos salários.
A LUTA DE CLASSES enquanto instrumento da mudança de um agrupamento ideológico por outro. A mesma coisa da posse pela posse do poder por ambas as facções. O poder da esquerda e o da direita corrompem do mesmo jeito. O poder corrompe, e o poder absoluto que ambos querem, corrompe absolutamente. Ambos os lados são semelhantes em tudo, principalmente no que parecem divergir. A Revolução para estabelecer os direitos dos trabalhadores à uma participação no bolo da riqueza social, gerada pelo movimento da natureza de suas ficções. Cada facção simula o discurso mau caráter de que visa o bem-estar dos eleitores, quanto tudo o que querem é levar vantagem. Governo é concentração de dinheiro.
LIBERDADE PESSOAL e autodeterminação dos povos são lorotas, drogas verbais, enunciados articulados que entram na mente ingênua das pessoas que não podem raciocinar em proveito próprio, porque não têm formação intelectual mínima que lhes permita saber que o Tempo em que são enganados pelos poderosos, com vômitos orgásticos de palanque discursivo, é o mesmo Tempo em que seus filhos são jogados aos porcos como se fossem ração para a engorda dos barões do Centrão da corrupção. Quem é direita, quem é esquerda??? Ambos os lados são a mesmo coisa ruim.
NÃO HÁ branco nem preto. Não há esquerda nem direita. Inexistem forças que se hostilizam no promover a República democrática. Os poderes complementares aos interesses republicanos. O poder Legislativo do Senado é o cavalo do Pau do Pai de Santo, dos Bodes e Cabritos do Planalto.
BOZO MOSTROU ao país como dobrar os joelhos do Senado e fazer 99% dos senadores ficarem, literalmente, de quatro: um único senador, José Serra, votou em favor da Carta Constituição. A Proposta de Emenda à Constituição que ampliava benefícios sociais vis-à-vis com o dia próximo às eleições, abortou sumariamente o estado de emergência. Um poder não se harmonizou com outro: canibalizou-o. E o presidente da Câmara, o Garoto propaganda do Bozo com sua camisetinha escrita Bozonaro. Nenhum poder vai fazer nada para afirmar a República Democrática do Brasil??? Bozo já está preso???
LE VIOLON D´INGRES — MAN RAY (1924)
A AFIRMAÇÃO da liberdade pessoal precisa de motivação interior, emocional. Eu estava, quando na Estrada, sem a cobertura da simulada proteção familiar, ao mesmo tempo conhecendo meus limites e, simultaneamente, fazendo de minhas precariedades, força. Eu necessitava criar-me. Meu Inconsciente Pessoal estava se configurando fora do Inconsciente Coletivo Familiar Desfigurado. Eu vivia a convicção de que minha mente se ampliava. As experiências vivenciadas estabeleciam novas compreensões do mundo. Quânticas reconfigurações do espaço metafísico, das figuras geométricas das quais nascem o sentimento, a emoção: a consistência excêntrica, voluntariosa, nos corações e mentes até então desprovidas de vida própria.
EU NÃO queria continuar sendo o rapaz traumatizado por uma dupla de pessoas rudimentares, sem princípios, sem coração, sem empatia com as próprias necessidades e as dos filhos. Ignorantes da própria ignorância. Pior: orgulhosos dela. — Eu estava preparado para conhecer, na intimidade, como fazer sonorizar “Le Violon d´Ingres”, obra fotográfica que anunciou o surrealismo.
EU ESTAVA em estado de suspensão da consciência anterior à minha experiência fora do quadradinho viscoso, xarope gelatinoso, do Inconsciente Coletivo Familiar. Eu estava fora do larbirinto, finalmente. Todo o conteúdo anterior de meu psiquismo estava sendo questionado por minhas novas vivências. Vivências não apenas objetivas. Minha subjetividade estava a questionar o Templo da perversidade, que se fazia revelar a partir das verdades secretas familiares.
NO PERÍODO que habitei o apartamento próximo ao Arpoador, conheci Maria Helena. Sua moradia não era em Troia, mas na Barão da Torre, uma rua em Ipanema. Fui atraído até seu apartamento por um casal do qual me aproximei num papo de bar da esquina em Ipanema. O que aproximava as pessoas era uma certa energia PSI de afinidade entre seres que se conheciam e se aproximavam por atração de ideias, ou por estarem numa mesma condição de espontaneidade, havia uma intimidade súbita e sincera.
ADENTREI SEU festivo apartamento, conduzido pela simpatia do casal. Senti que o ambiente era propício à minha carência de um fuque-fuque que logo havia se tornado presente, devido à identificação súbita de nossas carências. Helena era só sorriso. E eu entregue às suas solicitações eróticas. O pessoal do sarau foi saindo ao passar do tempo. Ficamos sozinhos sobre sua cama. Eu, atingido pela seta de Eros.
A DELÍCIA de ter seu corpo amoroso. Eu fazendo de conta que podia resistir por mais tempo com o membro sem penetração. Ela logo me desafiou:
— “Mete logo essa porra aí, cara”. Eu não me fiz de rogado.
FIQUEI AO mesmo tempo ativando o vai e vem e usufruindo da nitidez enfática de sua pele e da flagrância suave e perfumada do incenso que perpassava o ar no quarto:
— Vai, caramba, tudo é teu, disse ela — é assim que funciona.
SUAS PALAVRAS não continham mais que um desafio de intensidade afetiva: uma fêmea com carência de mulher que sabe o que quer. Na ocasião me lembrou Jean Seberg no movie “Os Pássaros Vão Morrer No Peru”. A lembrança dela ativou o tesão que se fez isso mesmo: Helena pareceu-me a encarnação de uma cortesã da Corte egípcia de um Faraó que dedicou a ela um sarcófago. Um jazigo que conservou há milênios sua carne. E a trouxe até o século XX, renovada, a sensualidade e a concupiscência de seu espírito nela reencarnado. Ela, a estrutura básica da realidade.
EU GOSTARIA de que nossa amizade tivesse durado mais, muito mais. Mas a bizarra intervenção dos agentes do DOI-CODI no apartamento que ocupava sem pagar o aluguel, precipitou os finalmentes de nossa promissora relação. As formações subjetivas se multiplicavam no tempo real que estimulava a “padma”, ou lótus do simbolismo budista de um estado primevo de pureza do corpo e da mente: uma espécie de força estética e espiritual que atinge o âmago do ser e faz acontecer a suspensão das influências de atribuição emotiva anterior. A Guerra de Troia e as demais guerras, tiveram e têm, certamente, uma motivação de violino d´Ingres.
O DESEQUILÍBRIO que gera estresse e descontrole não estava presente nesses momentos. Pelo contrário. Tais mudanças constantes de humor criavam em mim uma aura de grande confiança em que essas experiências me distanciavam da morbidez emocional daquelas pessoas que me infligiam desesperança, pessimismo e a sensação de incômodo, por minha proximidade não lhes causar qualquer sensação de empatia e solidariedade. Mas, ao contrário, rejeição e desamor.
NO CORPO carnal e aveludado, instrumento musical de Maria Helena, eu, de repente, não mais que de repente, despertei o Paganini que em mim havia. Eu, ao certo, ainda não sabia. Minhas mãos se aproximaram das aberturas acústicas em efe em ambos os lados das 33 cordas de sua espinha dorsal. O arco penetrava contido e ao mesmo tempo ansioso, a sedução e desejos dela retesavam meu arco na cidadela curva de suas entranhas íntimas, formidáveis. Abissais.
EU AFINAVA seu instrumento na extremidade física da zona sul do corpo, com dedos de mestre sala adentrados em ações friccionais. Ouvi o timbre agudo, brilhante e estridente, a pulsação e a melodia sedosa, lisa, macia que saía ao mesmo tempo de seus gemidos e sussurros. Os ruídos do entrassai no arco vaginal se mixavam ao suave e sedoso movimento circular do polegar no círculo anal. A abertura raiada oferecida se fez abrigo à ânsia de integração da Serpente em seu genuíno e cavernoso vão de prazer.
“A FONTE” — DUCHAMP (1917)
EU NÃO mais me reconhecia pelo nome original de nascimento. Usava nomes literários para escrever meus textos, os livros que eu comercializava em feiras de livros, bienais, bares, filas de pessoas que se amontoavam para comprar ingressos em cinemas e teatros. Eu pagava o preço de uma sobrevivência difícil. Não me sentia filho de um lugar ou pertencendo à uma família. Semeei meu espírito nutrido fora do tempo do consumismo. Eu não queria ser apenas mais uma mercadoria que compra outras.
A EXPERIÊNCIA fora do Templo do consumo, das Sinagogas de hambúrgueres, me criou, e ainda cria, opositores gratuitos que hostilizam contra mim sem mais nem menos. Não posso dizer, eu tenho irmãos de sangue, porque esses irmãos nunca agiram como se fossem meus próximos. Nunca houve neles disposição para a troca de ideias e ideais. Era como se eles esperassem de mim uma atitude subalterna, a partir da qual eu poderia fazer parte da confraria de suas mordomias familiares e sociais. Mas, eu aprendi alguma coisa essencial com Marcel Duchamp, ao frequentar museus e salas de cinema nas cinematecas do Rio de Janeiro.
ACREDITO QUE o ser humano, se não lutar para se humanizar torna-se nada mais do que um serviçal do poder terrenal dos supremacistas, dos globalistas, dos que usam as pessoas para delas tirar proveito próprio: explorando suas necessidades, suas misérias, suas privações, suas falhas, em proveito da ordem e do progresso das ilicitudes institucionais. No Brasil, fizeram de tudo para legitimar o Centrão dos pastores satanistas do Bozo, numa fanfarra pública de utilidades e PECs pecaminosas. O país todo sabe: Bozo é louco, governa para si e os fanáticos de sua bolha. Por isso prepara um evento antidemocrático tipo aquele da invasão do Capitólio pelo Trump trambiqueiro ao perder a reeleição. Bozo é desequilibrado, insano. Um maluco que se aproveita da situação de ter sido eleito presidente, porque o país queria ser vê livre de seu opositor.
SER LIVRE, não há ninguém livre nesse planeta. Os seres, ditos humanos são monitorados por várias civilizações Ets que criaram as condições de sobrevivência dessa espécie na Terra. As evidências de que este planeta é monitorado, estão em todos os lugares: na engenharia dos mais antigos, nas pirâmides do Egito, nos exoplanetas detectados pelo telescópio Kepler. Dentre estes, um muito semelhante à Terra, a orbitar um sol similar ao nosso, com igual temperatura. Esse planeta permaneceu, segundo Jon Jenkins, analista de dados coletados pelo telescópio Kepler, seis bilhões de anos na zona habitável de sua estrela, mais tempo que a própria Terra orbitando o sol.
OS OBSERVATÓRIOS a serviço da Nasa sabem da existência de megas estruturas que estão em órbita na atmosfera de planetas longínquos, estruturas essas que se destinam a absorver a energia de sua estrela para alimentar a civilização “high-tech” na qual esses planetas existem. OVNIs observaram a permanência dos astronautas americanos, quando de suas estadias na lua. Os depoimentos deles mesmos comprovam isto. O “Cavaleiro Negro” (Black Knight) satélite Et em órbita da Terra há milênios, é uma evidência Alien que a Nasa, como sempre, está disposta a esconder, devido sua política de acobertamento de manifestações de vida extraterrestre.
NÃO NASCEMOS apenas para a carne. Penso, logo sou também espírito. O nome que a mim foi dado no registro de nascimento para mim não mais serve. Escrevi livros, os revisei, subscrevi contratos de edição, os editei, distribuí e vendi mano a mano. Porque se fosse esperar por uma editora se interessar por eles, eu ainda estaria sem nenhum exemplar editado. Esse é um país que elegeu para presidente um sujeito sem nenhuma competência moral, intelectual ou humanista. Um sujeito que não vê o Brasil, mas apenas e exclusivamente a reeleição. Mesmo abusando do uso da máquina pública, esse sujeito sem mínima noção de moralidade, não foi eleito.
MEUS SOBRENOMES e nomes os despi como se fossem roupas sujas e velharias que não mais mereciam de mim, senão o lixo. Meu Inconsciente Pessoal, Familiar e Social tive de me excluir deles para poder ter a chance de me promover enquanto consciência de mim mesmo no que diz respeito à compreensão de onde vim, para que estou aqui. O que é ser um ser humano??? Não há escola ou universidade que responda por você a criação de suas competências neste sentido. E você não pode descobrir-se se está atrelado, acorrentado às solicitações da educação familiar e normativa nas escolas e universidades.
SE VOCÊ serve a um senhor, desserve outro. Se desserve um, serve ao outro. E quem vai servi-lo a si mesmo, se passar a vida ocupado entre servir ou desservir um e outro??? Os cristãos, os judeus, os muçulmanos, os Hopi, os Tembé, os Maias, os Hixkaryanas, os Bororos, os índios do sudeste americano, os Cherokees, os Iroqueses, os Algonquianos, os Comanches, os Apaches, os Esquimós, os Sioux, Guaranis, Ticunas, Caingangues, Macuxis, Terenas, Guajajaras, Ianomamis, Xantes: todos têm associações com divindades Ets. O Senhor ao qual tenho o dever de servir, está em mim mesmo: em meu coração e em minha mente, alma, espírito.
TODA A TRIBO Aldeia Global, habitat do Homo sapiens, está sob a supervisão de um poder soberano que não possui suas fontes nessa Terra. Os supostos deuses, todos poderosos, dos germanos, dos povos bálticos, descendentes das tribos indo-europeias, a nordeste da Europa (Suécia, Finlândia, Rússia, Estônia, Letônia, Lituânia, Polônia, nordeste da Alemanha, Leste da Dinamarca e suas ilhas), não são mais poderosos do que os demais deuses dos demais povos da Terra.
NÃO VAMOS nos dispersar, como diria aquele político da redemocratização: eu não tinha ilusões de posse sobre a Helena da Barão da Torre. Ela se afirmava muita areia para meu caminhãozinho. Uma burguesa rica com tudo em cima, e eu, um hippie, habitante de uma realidade de jovens ignorados pelo resto do Brasil. Ela me queria funcionário de uma grande loja de varejo da qual era gerente e sócio um de seus amigos. Eu não tinha condições de concorrer com ele pela posse dela. Talvez nem fosse isso. Não sei ao certo.
O CONTATO com ela me fez nascer para a carne e seus prazeres num grau de competência sexual que ainda não havia experimentado. Helena Barão da Torre era minha Helena de Troia. Eu não era nenhum príncipe Paris, mas compreendi por que o príncipe troiano por ela, Helena de Troia, havia começado a guerra mais sangrenta da Antiguidade. A carne, manifestação humana mais evidente, alimenta o espírito de uma energia que incita à uma espécie de transcendência às avessas.
A FÊMEA possui a fresta, a fenda que capta o homem em direção a essa dimensão que imaniza e polariza a atenção do desejo por uma satisfação maior: real e ilusória. A Helena Barão da Torre, minha querida, meu “Violino de Ingres”, sabia que, por mais desejada e bela fosse, não poderia manter por tempo indeterminado aquela intensidade voluptuosa de motivações da carne. Por quanto tempo poderíamos ter continuado nossa aventura carnal, não fosse a intervenção policial dos esbirros da ditadura, no ap. por mim ocupado em Ipanema.
MARIA HELENA tinha uma bela “Fonte de Duchamp”. Os contornos do mictório de porcelana exposto pelo artista dadaísta configuravam a bela matriz de seu ventre na qual vidas poderiam ser geradas. O objeto de Duchamp em seu tronco se encaixava com perfeição. Nela eu via a fonte da estética da vida, que ao mesmo tempo significava um urinol a suscitar o odor de ureia malcheirosa, amônia. Seu valor artístico está em que um simples objeto de uso cotidiano representa a matriz xexelenta da vida. A matriz da Arte. A ciência do urologista e do ginecologista na definição de sintomas.
“A TRAIÇÃO DAS IMAGENS” OU:
“OS AMANTES” — MAGRITTE (1928/29)
TODOS OS seres, dito humanos, pertencem à mesma espécie Homo sapiens. A cultura e a civilização sapiens, o modo americano de vida latina ceifou, com a foice da vergonha, da submissão, do vexame, da desonra existencial, da morte do decoro, da autoestima, do decoro, da integridade, as melhores possibilidades de desenvolver a educação e a cultura nacional. Criou no país enfermo, no inferno da impossibilidade. Os filhos e filhas dessa civilização e cultura não passam, muitos deles, de robôs biológicos em busca de uma tábua de salvação. Quem duvida??? Você contesta??? Então explique 58 milhões de eleitores no votar em Bozonaro.
OS EUROPEUS não invadiram o Brasil apenas com Cabral. Eles invadiram o país com a aura europeia da suposta superioridade de criminosos convocados no século XVI, para suprir a falta de marujos nas atividades de navegação nas caravelas: os navios tumbeiros. Do primeiro embarque de africanos, em 1525, ao último oficialmente registrado, 1866, segundo o autor de “Escravidão”, Laurentino Gomes, morreram no trajeto 1,8 milhão de negros no tráfico de escravos, vítimas de doenças, depressão (banzo), abusos, cárcere, castigos e violência indiscriminada. Nos anais oficiais o Brasil tinha abolido o tráfico em 1850. Uma abolição “para inglês ver”.
OS CAMPOS de morte nazistas tiveram nos navios negreiros/tumbeiros, assim como na Inquisição, suas fontes de inspiração. O odor de excrementos, doenças, suor e morte dessas embarcações, afastava delas outros navios que consideravam essa atividade incompatível com as noções, as mais elementares, até então vigentes, de respeito à humanidade dos povos escravizados. Alguma influência do humanismo da Renascença ainda estava a viger.
A TRIPULAÇÃO de trinta nautas lidava com a possibilidade de motim de centenas de afrodescendentes cativos. A pestilência e o futum do medo grassavam entre os servidores da chusma tripulação. A ideia de que o Brasil era habitação de supremacistas a dominar uma imensa população de indivíduos inferiores, uma população tipo sub-raça, afirmava-se cada vez mais enquanto evidência histórica. Os europeus escravagistas nunca questionaram a afirmação de que os latinos, os nativos, eram inferiores a eles. Não eram. Mas eles nunca disseram isto.
NADA NO BRASIL foi, é ou será o que parece ser. Nem no Brasil nem no resto do Mundo Cão. A colonização dos nativos por padres, freis, freiras e demais religiosos, políticos e “nobres” passageiros da realeza portuguesa e espanhola, das Caravelas de Cabral, das Caravelhas de Orellana, Pizarro, entre outros de uma brutalidade bestial, só comparável aos futuros regimes do nazifascismo europeu vigentes nos dois primeiros quarteis do século XX e demais países europeus ocupados pela Wehrmacht de Hitler.
NA DÉCADA de setenta no século passado, houve um movimento de Estrada no Brasil, um movimento de “hippies” não tão ripongas como aqueles “hippies” do filme “Hollywood” de Tarantino. Esse movimento a História do Brasil vai sempre ignorar. As conversas e diálogos de Estrada, nos acampamentos improvisados na areia das praias, não eram tão ineficazes ou desprovidos de sentido direcionado à uma ação de costumes sem compromisso de caráter pessoal, ou de afirmação das gerações que lhes deram origem. Havia sim, a consciência pulsante e falante de que nos sentíamos filhos de uma família constituída a partir de um embalo de sábado à noite. Uma família se nenhum compromisso com a cultura e a educação de seus filhos.
HAVIA UMA certa constância nos papos a admitir a realidade de que a família da qual tinham se ausentado, não poucos jovens, era, na real, uma somatória de misérias de toda natureza: moral, intelectual, filosófica, econômica, financeira e social. A sociedade estava estruturada para mentir sempre e de modo fluente, devotado e maníaco, com relação a qualquer membro subordinado à educação “para inglês ver”, aos discursos políticos de palanque, à uma respeitabilidade apenas de fachada. Na realidade, não poucos desses jovens admitiam ser provenientes de uma descendência que ainda não havia se distanciado dos procedimentos, usos e costumes das cavernas paleolíticas.
A CORRERIA em direção ao consumismo, às singularidades dos costumes disponíveis, às tendências e estilos de vida em oferta no Todo Poderoso Chefão, o Senhor Mercado, não tinha por escopo dotar aqueles fugitivos de suas malocas familiares, de seus clubes, larbirintos, botequins e baiucas em oferta na sociedade de costumes culturais civilizados pela sede insaciável de consumo. Muito pelo contrário. Era um vale-tudo para conseguir emprego, lugar numa faculdade, frequentar inferninhos para a troca de impressões sobre a realidade. E a prostituição era ecumênica, pública, generalizada e irrestrita.
PARA MANTER a frequência na faculdade, os dissentes mergulhavam em convescotes de fins de semana que incluíam rock, prostituição, drogas. Não poucos jovens que estavam “perdidos na noite” nos acampamentos distantes de seus lares, reivindicavam um lugar para sobreviver e morrer. Se alguém não topasse envolvimento com prostituição e drogas era acusado de ser:
— “Está fazendo charminho”.
— “Pessoa luxenta”.
— “Cu doce”.
— “Careta”.
— “Intrujão”.
— “Escamoso”.
— “Mascarado”.
— “Visagem”.
— “Cuzão”.
— “Quadrado”.
EM QUALQUER contexto ambiental, alguém que desejava preservar-se de toda essa orgia de costumes alternativos numa sociedade mesquinha, sórdida, obscena, desprezível, ordinária, dedicada ao fanatismo da improvisação por sobrevida, por alguma forma de inclusão social. A atividade mais promissora nesta sociedade era a de garoto ou garota de programa. Exatamente com a letra da canção de Dylan, cantada pela Janis Joplin tropicalista, Gal Costa:
— “A Estrada é pra você/E o jogo é a indecência...”.
“A TRAIÇÃO DAS Imagens”, quadro e Magritte, contradiz a realidade ao nomear algo que não precisa ser nomeado: um cachimbo não é um cachimbo, um objeto tangível e real. Um cachimbo possui dezenas de conexões que dependem de eventos passados, presentes, que transcendem a simples nomeação. Ele questiona conceitos e definições que não estão presentes na simples representação do objeto em pauta: um cachimbo. Ele desafia o espectador a mudar a maneira aceita de ver, traduzir o que está sendo visto, e os pensamentos consequentes a essa nova maneira de avaliação da realidade. Suposta. As pintoras surrealistas quase sempre evocam mistérios. Você precisa saber decifrá-los.
PLATAFORMA ESPIRAL — ROBERT SMITHISON (1970)
NÃO É FÁCIL uma pessoa aprender a ler a si mesma. Ao voltar àquela casa no bairro Ilhotas, onde Mãezona e Paizão dividiam suas aldravas e trancafiavam a prole em desdobramentos de suas próprias inadequações à função de pai e mãe, Vi claramente o quanto aquelas criaturas viviam dedicadas a se mover no interior do corpo familiar como se vermes fossem dentro do intestino social do que restava da parentela próxima a eles. Eles não conseguiam esconder a bagaceira em que se tornaram e à prole. Mãezona, rainha da zona, escondia-se nos pequenos laços que dava nos fiapos de pano, nos quais se concentrava, cada vez mais, como se estivesse em outra dimensão do existir. Que queria ela tão recolhida, ensimesmada, absorta em dá aqueles nós nas tiras de pano???
QUANTO MAIS miserável fosse a situação dos membros no corpo familiar, mais ela se julgava apta a dar conselhos. Não tenho avaliação precisa de quantas vezes tentei dialogar com ela. Foram muitas. E a reação dela sempre a mesma: a força soberba de sua alienação continuava a alimentar aquela tonalidade de voz firme, pétrea, sólida, de quem ainda alimentava a certeza inabalável de que algum prodígio sobrenatural pudesse acontecer, e eu me dobrasse às suas habilidades de manipulação materna. Que de terna nunca teve nada. Nada mesmo.
OS CONTATOS pessoais de Mãezona com a enfermeira nazista, “doutora” Rozen, mulher do doutor Franca, que moravam na mansão em frente à casa de conjunto (Inps) de Paizão, talvez ainda acontecessem. Talvez ela, ou elas, acreditassem na interferência dos deuses nórdicos para fazer valer meu ingresso no mundo que, talvez, reservassem para mim. O então coronel pêeme, filho dileto de Mãezona, dedicara-se, quando criança, a tomar a iniciativa de se sentar, com frequência, no colo de Paizão e, consequentemente, promover orgasmos no pinto dele pelo contato do bumbum bulindo. Era o predileto de Paizão na rede de tucum da sala de estar. Mãezona não mais provocava nele o prazer da intimidade. Mas, aquela criança devotada a se sentar em seu colo, sim.
CONFIGURAVA-SE contra mim, cada vez mais intensamente, o complô de interesses familiares. O que um daqueles membros sentia, os outros acompanhavam por empatia. O que os unia era a vontade familiar de que eu canalizasse toda minha ira, toda minha fúria em saber-me sendo usado e abusado pela falta de recursos dirigidos sempre aos demais irmãos e irmãs direcionados, enquanto o tempo, meu precioso e insubstituível tempo, o tempo de minha educação, da satisfação de minhas necessidades, eram jogado no lixão dos conchavos de interesses unidos da parentela.
A EMPATIA positiva, seu componente afetivo, só existia de mim para com eles. Eu compartilhava a compreensão de seus estados emocionais de intensa ansiedade. Eles queriam alguém, eu, em quem pudessem descarregar todas as suas frustrações, pessoal e familial, e lhes fornecesse a esperança de que saberia o caminho de ganhar dinheiro e fornecesse a eles a respeitabilidade social de que tão desesperadamente precisavam. Conectava-se com eles a partir da compreensão de seus estados mentais deploráveis, carentes de qualidade de percepção, de humanidade. A percepção de que eles queriam alguém que os livrasse de suas misérias materiais, e lhes concedesse a prerrogativa do amor-próprio e da autoestima com relação à condição social, era compreensível.
EU SABIA COMO fazer isso acontecer: destacando-me na atividade de escritor, ou trabalhador do cinema, ou dramaturgo. Eu tentava fazer Mãezona compreender que eu poderia me destacar nessas atividades. Mas Mãezona era uma troglodita do tempo da pedra lascada, e não compreendia que bastava ela ter uma atitude emocional de apoio, minimamente positiva, e eu estaria apto a fazer acontecer o prestígio financeiro, econômico e social de que tanto careciam. Paizão havia detonado suas sinapses, neurônios e neurotransmissores cafungando os medicamentos que deveriam ser usados enquanto anestésicos de seus clientes. Assim como a cocaína fornecida, com frequência, pela farmácia do Tomazinho.
MÃEZONA TINHA uma mentalidade de mulher da zona. Da zona das boates do baixo meretrício da rua Paissandu e adjacências. Dessa zona que sua irmã frequentava, segundo ela mesma dizia, com programas com gentinha de ambos os sexos que se aproximavam da mesa onde ela ficava sentada à espera de clientes, bebendo cerveja. Suas duas filhas, Terezona e Coralina, e o filho único, não mais tinham vínculo familiar de respeito para com ela. Segundo Mãezona, sua prole tinha vergonha dela.
ELA, MÃEZONA, e o marido, não compreendiam que alguém saído de seu DNA pudesse ter força física, mental e de caráter para enfrentar as adversidades que haviam preparado para mim, e sair do fosso de privações e impasses em que haviam me lançado, e dele soubesse ou lograsse sair. O casal e seus filhos não saberiam avaliar a valorização do intelecto e da cultura de alguém que estivesse disposto a investir no autoconhecimento, na aquisição de cultura pertinente ao saber ser. E não apenas ter. Eles não sabiam que eu precisava da confiança e do respeito deles. Mas, como poderiam ter confiança e respeito por mim se não confiavam em si mesmos, e tampouco praticavam respeito entre si???
MAS, ENTÃO, como queriam que eu conseguisse tirar sua prole da companhia de suas misérias pessoal, familiar e social??? A estratégia familiar com relação a mim estava nítida: o coronel pêeme, que na infância se dedicava ao colo de Paizão, costumava me chamar de “Baixinho”. “Baixinho” era o apelido do famoso traficante de drogas mexicano “El Chapo”, que em gíria mexicana quer dizer “O Baixinho”.
O CORONEL pêeme, era aquele mesmo que havia se sensibilizado ao extremo de chorar emocionado, ao ver entrar na sala da Companhia de Guarda do Palácio do Governo, o também notório criminoso associado às chefias do crime organizado no Piauí: o coronel Correia Lima. Há muitos QGs do crime organizado no Piauí. QGs esses liderados por políticos, juízes, militares, médicos, empresários. Eles usufruem de quase total imunidade. A justiça nunca os alcança em seus redutos particulares cheios de mordomias. A quase totalidade da sociedade piauiense os teme e se omitem de criticá-los até na reserva de conversas à boca pequena.
O JORNALISMO piauiense é por esses criminosos financiado. Mas, não poucos jornalistas foram assassinados por adentrarem mais objetivamente nos meandros das investigações que sempre costumam ficar na superfície. As polícias, civil e militar estão de há muito, muito tempo, cooptadas pelos recursos financeiros que a elas são liberados para a compra de suas respectivas cooptações. A assembleias dos políticos são eleitas a partir de recursos advindos dele, crime organizado. E as secretarias de governo, municipais e estaduais, não se interessam minimamente por destacar pessoas do mundo das artes, da cultura, e nelas investir, porque a arte, a arte literária, principalmente, é por eles considerada de pouco ou nenhum interesse social. Os artistas inconformados, dizem:
— É assim que o mundo gira.
— É assim que a banda toca.
— Assim engatinha a humanidade.
— É assim que funciona.
— É assim que o mundo muda.
— É assim que tudo acaba.
— Assim o mundo foi criado.
— Esse é o mundo real.
— Assim marcha o sol diário.
— Essa é a cultura oficial.
— Assim manda o general.
— Esse é o ritmo da parada.
— Arte, só a do canto do pássaro na gaiola d loucas.
— Arte só a do Vai Que Cola com Coca-Cola.
— A arte caminha para bem longe dos arabescos, das esculturas meramente documentais. Lá, para bem longe de onde a cultura da preguiça e da mediocridade se esconde. A cultura de leitura de um ou dois livros por ano. Longe da toca da mandioca que alimentava Macunaíma e a sua bruaca de Pantanal.
DESVIO PARA O VERMELHO — MEIRELES (MAM/1967)
MÃEZONA COSTUMAVA falar que estamos na vivência da era Kaly Yuga. A Era de Ferro. Sua duração é de 432 mil anos, tendo passado 5 mil anos, segundo a Sidanta Surya. Quer dizer, ela teria ainda de reinar, com sua ignorância, com sua incoerência, com sua mundividência e crueldade, ainda mais de quatrocentos e vinte e cinco mil anos. Mãezona se sentia realmente muito à vontade com esse tipo de visão do mundo.
A PERCEPÇÃO da fenomenologia universal a justificava por mais quatrocentos e vinte e cinco milênios mais. O fenômeno humano submerso nos subterrâneos de suas misérias, as mais amargas e antigas, ainda teria de se ver renascer no Inferno de sua maternidade, por muito, muito longo prazo. Ela gostava de ser o que era: a rainha empoderada de um núcleo familiar dedicado à manutenção de uma cultura e de uma civilização onde imperavam a ignorância e a morbidez existencial. Sem ignorância e morbidez, poderia ela reinar sobre as mentalidades crédulas, ingênuas, pacóvias de seus filhos??? Ela citava frequentemente Madame Blavatsky cofundadora da Sociedade Teosófica, principalmente quando vinha de encontros furtivos com a enfermeira, “doutora Rozen”, que ela dizia, com orgulho, ter trabalhado no campo de concentração de Auschwitz.
NÃO ESTOU aqui a censurar a autora dos livros “O Homem Visível e Invisível” e “A Visão Teosófica das Origens do Homem”. A Teosofia (sabedoria divina) procede do neoplatonismo. Este, nutria-se das obras de Platão. Caracterizava-se pelo “Monismo”: os seres dito humanos, representam a multiplicidade do princípio material. No neoplatonismo há a prevalência da concepção espiritualista unificada com o princípio material. Para eles, neoplatônicos, inexiste o mal, apenas graus de imperfeição relativamente ao afastamento humano do princípio uno.
QUANTO MAIS próximo do Deus Et, mais perfeito o ser humano. Essa aproximação pode ser conseguida com meditação (reflexão, pensamento). Há oposição entre o mundo das ideias e o universo dos sentidos. Para se conseguir essa junção, três são os estágios, primeiro: o contato ou aproximação com a “emanação do uno” (Logos, Razão ou Inteligência (Natural/Artificial) suprema (Deus Et). Segundo: através dessa aproximação do humano/Deus Et, há a inserção da individualidade do sujeito mundano, terreno, com a “Alma do Mundo”: a Verdade se torna menos secreta e obscura através na mediação (meditação) entre as duas instâncias, espaços ou domínios (Ideias & Sentidos).
TERCEIRO estágio: com o afastamento do envolvimento carnal da matéria, a luz se torna canal ou veículo decisivo na compreensão e aproximação do mundo material com o universo do Logos: espiritualidade e meditação.
ORA, MÃEZONA, nunca foi chegada ao diálogo, à racionalidade e à inteligência. Qualquer argumento que não estivesse plenamente de acordo com suas “intuições”, as mais patéticas, ela logo se irritava, ficava transtornada, irada e saía da proximidade de quem a estivesse questionando. Tudo nela era pulsão. Era uma espécie de “Dona Bronca” por convicção. Ela e o marido desejavam que suas crenças e convicções, que julgavam ser as mais certas e melhores, poderiam ser repassadas para mim, como se por osmose. Desejavam que a mente deles se transferisse para a minha por uma passagem inexistente na configuração dos componentes do plasma sanguíneo. Mas, sabemos, não existe uma membrana que, no processo de osmose, possa fazer essa transferência.
ELA E O marido queriam obter conexões de conhecimentos sem estudá-las. Queriam angariar conteúdos que estavam em outras mentes, na minha psique, por exemplo, simplesmente porque acreditavam que, em sendo eles pai e mãe, tinham o direito de saber tudo o que eu, armazenara, naturalmente, via a ciência dos genes, em meu Inconsciente Pessoal. Eles queriam ter acesso à minha consciência e aos conteúdos de meu espírito, sem que essas ideias e pensamentos fossem acessíveis a eles. Eram vulgares, xucros, incultos, toscos, beócios, e acreditavam que poderiam fazer a transferência de minhas ideias e pensamentos, para a mentalidade ordinária deles.
SEMPRE ME hostilizavam na convivência familiar, com requintes cada dia mais intensos de truculência peçonhenta, porque achavam que essa transferência de conhecimentos, de mim para eles, não era efetivada, porque eu não queria e estava a impedir que se realizasse. Seu filho mais novo, o Coisinha Júnior ou Tonho Ratazana, assim como Dulce It, “A Coisa” e o coronel Pêeme, achavam que eu devia fazer essa transmissão de informações, erudição e saberes, para a mente xucra deles. Acreditavam que eu não fazia isto porque não queria. Essas pessoas eram francamente dominadas por uma crença errada de que podiam suscitar de mim, a transferência de meus conteúdos mentais e emocionais.
CERTA VEZ o tio Nenê me disse: “há pessoas que já nascem prontas para compreender a máquina do mundo. Outras, não sabem como conseguir obter esse conhecimento que desconhecem. Criam elas uma crosta de inveja que, ao final das contas, pode destruí-las”. Tio Nenê, tinha esses lances filosóficos que faziam com que eu admirasse sua cultura erudita, sem que ele tivesse cursado faculdade. Lendo o poeta Drummond de Andrade, lembrei-me da menção do tio Nenê à “máquina do mundo”.
A ALEGORIA poética da “Máquina do Mundo” (poesia de Drummond) surgiu, em Camões, enquanto símbolo dos feitos marítimos gloriosos dos portugueses. Representa, na epopeia camoniana, as façanhas lusitanas de conquistas marítimas. A ideia de que esse mundo em que vivemos é uma máquina, vem da Antiguidade, afirmou-se na Renascença. Essa máquina no tempo de Camões era, talvez, aterradora. Os mares estavam ainda habitados por monstros remanescentes da cultura literária de antigamente. Naus eram atacadas por lulas gigantes que imergiam embarcações inteiras no mar revolto.
A “MÁQUINA DO Mundo” está cheia de monstruosidades, reais e imaginárias. A literatura delas têm-se ocupado. O real e o ficcional se irmanam no “Canto das Sereias” na Odisseia de Homero, nas lendas do “Bode do Mar” também conhecido por Capricórnio (nada a ver com o signo), o Umibuzu, “o Monge do Mar do Japão”, a Serpente de Midgard (Jörmungandr), O Leviatã (peixe-remo), o Kraken ou lula-gigante na Noruega e Groenlândia, o humanoide gigante e tentacular com face e asas de dragão, o Cthulhu da ficção de Lovecraft.
O MUNDO DAS Máquinas, naturais e artificiais, noticiado pela tradição oral desde a Antiguidade, abriu-se às possibilidades de monstruosidades que agora são encontradas no espaço sideral. A exemplo dos seres ameaçadores tipo “Alien, O Oitavo Passageiro”, “A Experiência”, “Enigma de Outro Mundo”, Matrix, “Looper, Assassinos do Futuro”, Os 12 Macacos, Minority Report, “Ela”, Distrito Nove... Da imensa Máquina do Mundo você e eu somos partes acessórias. Precisamos ser parte fundamental. Ou talvez já seja muito tarde para reivindicarmos soberania. Se não somos soberanos, sonos escravos.
GARRAFA E PEIXES — BRAQUE (1910/12)
A REALIDADE supera em muitas vezes a inventividade da ficção. Cidades são dominadas por forças criminosas dedicadas a fazer valer a produção de eventos associados ao crime organizado. Eventos esses comemorados pela imprensa escrita, falada Tv visiva. Os grupos de poder supremacistas em todo o mundo incivilizado, dominam. Infiltram-se nos países todos, a investir o capital financeiro e econômico em comércio, indústria, comodities, produção “high-tech” de entretenimentos, jogos que reforçam a violência social e o fanatismo das galeras ignaras. O tráfico de crianças, adolescentes, mulheres, trabalho escravo, aumenta.
AS FAMÍLIAS sem educação normativa pertinente à geração moral e à instrução de seus descendentes, foram responsáveis pela formação básica preliminar da descendência. Esta, teve uma mãe TV sem instrução por matriz. E na sala do sofá, uma mulher que antes do fuque-fuque que implantou filhos em suas células reprodutivas, não tinha outro objetivo na vida que não fosse o de laçar na rede de seus atributos narcísicos, potencializados por cosméticos de lojas de shoppings, usar a garrafa de bar para pegar o peixe e, quem sabe, com ele “viver feliz para sempre”.
PODEMOS, ATRAVÉS desta narrativa autobiográfica, deduzir a grande influência que teve sobre Mãezona, a “doutora” Rozen, ex enfermeira em Auschwitz, que havia migrado para o Brasil, assim como centenas de oficiais fugitivos das FFAA nazistas migraram para os países da América Latina e do Sul na temporada pós-guerra. Toda a Alemanha no decurso do II° Grande Conflito estava sob o comando, comunicação e controle do IIIº Reich alemão (╬). “Sou eu quem mando”, dizia Hitler. Nem precisava dizer.
A FALTA DE liberdade do povo alemão era ampla total, irrestrita. Seu imitador no Brasil, o ex-presidente Bozo Mussolini, também costumava dizer: “sou eu quem mando”. A principal liberdade humana é a escolha do próprio caminho. Numa democracia, significa não ser mandado por ninguém que não seja à vontade, pessoal e coletiva do povo eleitor. Bozo Mussolini fez de tudo para enfraquecer a arte e a ciência nas instituições nacionais. Cortou verbas, foi absurdamente negacionista dos valores e princípios democráticos. Mesmo assim, 58 milhões de desavisados nele votaram.
NA MATRIZ ou genealogia da criatividade de um povo, está o reconhecimento de seu sofrimento e de sua expressividade nas Artes. As leituras criativas de sua própria realidade e seus significados físicos e psicológicos. Os artistas que merecem este nome, se desafiam na criação de novas formas de interpretação dessa realidade. Eles transgredem a hierarquia da subordinação aos cânones de antigamente. Registram a percepção dos acontecimentos em novos ordenamentos plásticos, literários: ajudam o nascimento de uma nova percepção, na busca de uma saída ou alternativa à morbidez do positivismo conservador, do qual Bozo é um representante. Ele e seus cúmplices.
“NA ORIGEM da criatividade está o sofrimento próprio e alheio:
— “A Arte É Uma Ferida Feita De Luz”.
AS PESSOAS de todo o mundo, em todos os países, precisam desta luz. Sem ela a vida se tornou insuportável. Sem ela, a realidade do mundo em que habitamos está cada dia mais aflitiva e insustentável. A frase entre aspas é do artista plástico francês George Braque. Com Picasso, Braque conectou as cores e as formas da geometria plástica antiacadêmica, pela fragmentação das cenas em modelos alegóricos de abstração.
— ““O Cubismo afirmou a tentativa mais radical de eliminar a ambiguidade do academismo nas artes plásticas, através da fragmentação da imagem em linhas retas modeladas por cubos e cilindros. Técnica destituída da perspectiva e do “claro-escuro””, no dizer de Braque. Destacaram-se na escultura Duchamp-Villon e Pablo Gargallo. Na música, Igor Stravinsky.
“OS MENINOS do Brasil”, romance publicado em 1976 por Ira Levin: filmado em 1978. O romance foi uma das primeiras obras que abordaram, sob a óptica da ficção científica a clonagem humana. Mengele estaria a comandar o assassinato de 94 pessoas no Brasil, com a intenção de substitui-las por clones de Adolfo Hitler, garantindo dessa forma a continuidade do III° Reich, com o recrudescer do IV° Reich nas Américas.
DETERMINADO A conseguir seu objetivo, Mengele, a partir do Paraguai, planejou utilizar mães de aluguel em clínicas brasileiras, visando viabilizar 94 clones do ditador alemão no Brasil. Fundado em 1919, durante a República de Weimar, o partido nazista objetivava afirmar os anseios nacionalistas do povo alemão, supostamente herdeiro da raça ariana que havia habitado o continente perdido da Atlântida.
MENGELE ACREDITAVA, ou fazia de conta crer, que a mitologia germânica dos deuses que fundamentaram a suposta super raça ariana, tinham escolhido os alemães, descendentes diretos deles, para reger as demais nações e países da Terra. Mengele estava nas Américas para garantir, nela, que o “Reich dos Mil Anos, teria sua nova afirmação garantida a partir dos países americanos. Seu Führer, era também Chanceler do Reich e ao mesmo tempo presidente: Hitler.
OS MENINOS nascidos dessa experiência genética seriam criados por famílias simpatizantes do nazismo, nos mais variados países do mundo. Eichmann e Mengele escaparam do Julgamento de Nuremberg. Estavam refugiados e protegidos em terras americanas. Ocupados em fazer valer a suposta superioridade da raça ariana, agrupados, seus milicianos, em “bunkers” construídos em todo o território americano. E infiltrados no Capitólio, nas Câmaras e Senados desses países.
O DOUTOR Franca e a sua mulher e enfermeira, advinda do campo de concentração de Auschwitz, conhecida por doutora Rosen, havia migrado de países derrotados do III° Reich e moravam numa mansão em Teresina, estado do Piauí. Construíram no bairro Piçarra o Hospital Aliança/Casamater em Teresina. Casamater, sabemos, é sinônimo de bunker. Em São Paulo há, pelo menos sessenta bunkers, concentrados, a maioria deles, em bairros ricos, tipo Morumbi, Alto de Pinheiros e Jardins.
PODEMOS VER que o IV° Reich está restabelecendo-se no Brasil. Seus fundamentos estão sempre próximos à evidência de poder político e riqueza financeira e econômica. Independente de que seus membros sejam ou não de origem judaica, alemã ou de países outros do leste europeu. A palavra de ordem dos supremacistas e globalistas é poder. Poder político, militar, econômico, social. Poder entrar nas mentes de bilhões de pessoas sob a dominação dos conglomerados de televisão que exercem poder hipnótico frente a bilhões de seres, dito humanos, que estão com o rabo preso no sofá da sala de jantar. E os olhos fixos nos programas da Tv visão, tipo “Vai Que Cola”.
PODEMOS VER, caro leitor: o IV° Reich está ganhando terreno nas FFAA. Mas, as gloriosas FFAA sabem quem é o Bozo. Em relatório secreto do Ministério do Exército, datado de 27 de julho de 1990, a conclusão dos oficiais investigadores foi esta: “mentiroso, corno, muambeiro e contrabandista...”. A sociedade brasileira e a democracia estão sendo ameaçadas diariamente por esse capitão das milícias Brancaleone.
MAMAN — LOUISE BOURGEOIS (1988)
A VIDA É uma manifestação artística da ciência da Criação. Esta novela, uma manifestação literária, visa colaborar na visão que o leitor possui da realidade. Expandindo-a: a visão da realidade. O “Véu de Maia” é realidade invisível que esconde a si mesma, levando as pessoas à crença de que o que veem é suficiente para a compreensão do que estão vivendo. O que vemos é uma distração sensorial que esconde muito mais do que revela.
MÃEZONA E seu marido teciam uma teia de aranha no Inconsciente Coletivo familiar, na qual visavam prender os frutos de sua obscenidade ao gerá-los. Eram seres ignorantes e vulgares numa sociedade ignorante e vulgar. Uma sociedade que visava aproveitar-se dessa ignorância e vulgaridade em proveito próprio. Eu estava sendo criado como sendo um projeto de Hitler. Alguém a quem negavam os direitos mais básicos e fundamentais de existir, de modo que pensavam criar em mim um ser tão superlativamente revoltado, que fosse utilizado na política local, quem sabe na nacional, como um líder político possesso. Sedento de posses e poder. Igual a qualquer político comum.
PAIZÃO COISINHA, repito, costumava permitir-se usar o bigode do ditador alemão e fazer discursos elogiosos dele, enquanto atendia seus clientes. Por vezes essas arengas discursivas duravam dias inteiros. Para ouvir e reforçar suas falas, por vezes contava com companhias velhas de guerra, fascistas elogiosos da política, amigos tipo Leonildo Marinho e Tonho Rodriguez, entre outros. Ficavam horas e horas se emulando verbalmente, atiçando-se em seus falares de suposta erudição de pau de galinheiro.
SUAS FALAS auto emulativas, saíam de seus falares como se fossem produtos de estudos sociais, quando não eram mais do que o equivalente às penas eriçadas dos rabos de pavões pseudo intelectuais, dissimulando uma erudição que não tinham. Paizão excitava-se sobremaneira, assim como seus rebatedores de bolinhas verbais de pingue-pongue trivial, desprezível, ordinário. Praticado em seu consultório dentário.
AFINAL, FAZIAM parte de uma sociedade que mal havia saído do interior cavernoso das furnas subterrâneas de Platão. Seus filhos e netos reproduzem a alegoria da Caverna de Platão, nos dias de hoje em dia. Os jovens estão plugados nos celulares mantendo com eles uma relação de hominídeos neandertais que chegaram a primatas Homo sapiens e aprenderam os rudimentos de como manipular os avanços da tecnologia. São ignorantes do que significa estar a visualizar as informações veiculadas nas redes sociais e aplicativos. São como digitadores pulsionais que acessam redes sociais.
A RAZÃO neles não é reivindicada. O pensamento analítico inexiste. O espírito crítico jamais é invocado ou instruído. São simples atores a ignorar que estão sendo usados como massa de manobras de interesses políticos, econômicos e sociais que em nada contribuem para a evolução de uma educação pessoal e social em busca de melhores e mais afirmativos dias. As informações estão embutidas em camadas “gnosiológicas” de comunicação e entretenimento que se repetem em digressões que não revelam a intenção de fazer ver, abrir os olhos, pensar a própria realidade em perspectivas construtivas.
CENTENAS DE novos jogos são lançados ao mercado com visualizações de situações em que personagens de combatem com violência cada vez mais extraordinária. Eles estão lá, plugados nas telinhas como se estivessem a fazer parte de uma comunidade que se prepara para um futuro em que só haverá conflitos, hostilidades, malignidade e virulência. A indústria de jogos está a faturar horrores. O que esses jovens aprendem, Realmente??? Estão sendo condicionados a aceitação do terror e de horrores futuros. Terror e horror que já estão presentes nos dias inconsequentes de hoje.
ELES APRENDEM a se entregar aos condicionamentos impostos pela tecnologia da distração, da desafeição a outros seres humanos, jovens ou não. Eles aprendem a cultura da hostilização mútua, da agressão gratuita. Eles aprendem a ver os outros como se fossem seres potencialmente hostis, aos quais estão preparados para reagir a provocações que certamente surgirão da proximidade entre eles.
A “FILOSOFIA” desses jogos é a das séries investigativas de Tv e do romance policial, em que as personagens são cada vez mais difíceis de identificar: quem é mocinho quem é bandido??? O incentivo à violência é incentivado por personagens vestidos à moda das fardas militares, armados do argumento dialogal da pólvora contra a pólvora.
A PRESENÇA do imaginário cristão inexiste. É como se estivessem a afirmar, nas palavras do genial Machado de Assis, em A Igreja do Diabo:
— “Sim sou o Diabo, repetia ele. Não o Diabo das noites sulfúreas, dos contos soníferos, terror das crianças, mas o Diabo verdadeiro e único, o próprio gênio da natureza, a que se deu aquele nome para arredá-lo do coração dos homens. Vede-me gentil e airoso. Sou o vosso verdadeiro pai. Vamos lá: tomai daquele nome, inventado para meu desdouro, fazei dele um troféu e um lábaro, e eu vos darei tudo, tudo, tudo, tudo, tudo, tudo...”. E essa juventude acredita que imitando o capeta terá tudo. Tudo. Tudo de que precisa.
UMA REALIDADE de entretenimentos baianos, banais. Vejam os programas de auditório das redes de Tv. Os chamativos culturais das atrações e lazeres da música pop no rádio. Notem, os leitores, a preferência editorial por personagens que participam do Bigbrother ou de programas tipo “No Limite do Bigbrother”. Se algum desses personagens quiser lançar um livro, os editores logo vão começar a balançar o rabo, como cães babões em busca de audiência editorial nas livrarias. Vão querer editá-los e investir neles. Disputá-los.
MAS SE VOCÊ é autor e quiser contribuir com uma participação social realmente literária, nenhum deles se valerá da leitura avaliativa de seus originais. Nenhuma editora, que eu saiba, possui leitores com aptidão para avaliar textos literários. É como se dissessem, os editores, que a literatura que merece esta qualificação, inexistisse. Que o país não precisa de novos autores simplesmente porque não há educação pertinente para criá-los. É como se os autores realmente literários fossem vácuos dentro de vácuos, como diria Fernando Pessoa em “A Hora do Autor” nesta condição de intertextualidade:
— “A verdade, porém é que não existo. Nem eu nem outro autor qualquer. Todo esse universo literário, e todos os outros universos literários, com seus diversos criadores e seus diversos autores — mais ou menos perfeitos e adestrados — são vácuos dentro do vácuo. Nadas. Nadas que giram entre editoras. Satélites em órbita editorial inútil de coisa nenhuma: nadicas de nada”.
MEU CARO E raro leitor: permita-me nova intertextualidade. Desta vez a dialogar com aquele mineiro minerador de inventividades, João Guimarães Rosa, em texto lucrado de “Grande Sertão: Veredas”:
— “Digo ao senhor: o diabo do autor não existe. Ele não há. A ele eu vendi a alma. Cê me dê licença de dizer. Meu medo é esse. A quem vendi??? Medo meu é esse meu senhor leitor: a alma a gente que escreve vende só e sem comprador”.
MÃEZONA NÃO está presente apenas dentro do ambiente familiar. Ela está muito efetiva na contemporaneidade das editoras. As nacionais, principalmente. Elas, as que nos interessariam se para nós existissem.
A MULHER-COLHER — GIACOMETTI (1927)
AS ENXAQUECAS eram uma tortura que me fazia desesperar de intensa dor. O casal as provocava, mas era como se não o fizesse. Eram uma oportunidade de ambos se deliciarem por saber que, uma criança ao sofrer tamanha intensidade de incômodos, teria certamente dificuldades de harmonizar ideias, pensamentos, memórias. A sensação de que meu crânio estava a explodir, os vômitos insistentes que não paravam de exigir mais contrações involuntárias dos músculos estomacais, a impelir o conteúdo para fora, não apenas do estômago, mas da bílis que subia até ele, do fígado intoxicado, talvez, pelas bolinhas prateadas de mercúrio odontológico que Paizão, com a conivência da mulher, jogava em minha xícara matinal de café com leite.
NÃO SEI SE o leitor notou que esta não, não é uma novela de ficção. Todos os fatos narrados, com exceção de nomes trocados no início da narrativa, “Les demoiselles d´Avignon”, em que menciono a cidade Recife, metáfora de rocha, e não da capital de Pernambuco, com mulheres se influenciando mutuamente e se dissolvendo na influência mútua, absorvidas pela vida pregressa no Inconsciente Coletivo da Sociedade da cidade, tudo o mais é realidade factual. Exceto também a introdução que apresenta o autor nesta frase entre aspas:
“MEU NOME É DANTE. Estou a viver no inferno consciente desta realidade”.
DULCE IT, “A Coisa”, assim como os demais personagens, os mencionados e os ainda não trazidos ao conhecimento de quem me ler, são literalmente reais. Imagine o leitor que me traduz e ajuda a me decodificar, um membro familiar, o primogênito, jogando num campo familiar minado, jogando contra onze adversários vestindo a camisa do time cujo técnico é Paizão Coisinha Pedófilo, e o preparador físico é Mãezona Vodu. O amigo leitor pode perguntar:
— Qual a formação dos times para o jogo??? A resposta só pode ser uma:
— Onze jogadores que jogam contra um.
— Mas assim fica muito previsível o resultado, dirá você.
— Querendo ou não, o singular jogador sem par, terá de aceitar condição. Aceita porque precisa manter-se vivo, não obstante a incrível formação dos times. Onze contra um é um tanto quanto desigual. Qualquer criança vê isto.
MAS ERA ESTE o jogo que eu tinha obrigação de jogar. Aguentar as crises de enxaqueca, a quantidade enorme de sacanagens que os nove jogadores aprontavam para estar bem com o técnico e o preparador físico. Considere que esse jogo não era disputado com duas equipes com o mesmo número de antagonistas. Eram onze contra um. Uma partida normal de futebol tem, em média, noventa minutos. Eu teria de jogar esse jogo até quando resistiria??? Jogar esse jogo a vida toda não é nada fácil. Mas eu estava a jogar. Afinal, que escolha eu tinha??? O técnico do time, Paizão Coisinha Pedófilo, sabia que minhas possibilidades de ganhar eram muito raras, nesse jogo muito atípico. Onze contra um: que chance tinha de sair vencedor???
MINHA CHANCE era simplesmente manter-me vivo. Eu não poderia nunca contar com Mãezona e o cônjuge. Toda vez que eu solicitava alguma ajuda para ir resistindo, lá vinha ela com a mesma lengalenga:
— Meu filho, isso, meu filho aquilo. Seu pai isso, seu pai aquilo outro. Eles nunca estavam com disponibilidade financeira para me ajudar. Mas, aos demais filhos, eles contribuiriam com mesadas e financiamentos robustos. Até compraram um apartamento para Dulce It, “A Coisa”. Pagaram metade do valor do imóvel, a outra metade a Terezona Sapato, sua prima e amante, filha da irmã de Mãezona que a detestava do fundo do coração, não sem razão. E por ela era também detestada. Mãezona era uma mulher dedicada a comer. Comer, sua mais vital atividade. Quem a via no almoço, ou saboreando uma fruta, tinha a impressão de que ela, há muito tempo não via um prato de comida.
AS HOSTILIDADES familiares eram muitas. A tia, mãe de Terezona, não cansava de ser escrachada por Mãezona. E vice-versa. Ambas mantinham um relacionamento, por vezes calado, mas de mútua hostilidade silenciosa. Mãezona já havia dito que ela, sua irmã e rival, frequentava os bares do baixo meretrício da rua Paissandu. Sentava-se em mesas dentro dos puteiros e esperava alguém lhe pagar uma cerveja com birita, e, na sequência, aceitava ir para um quarto, transar. Fosse com mulher ou marmanjo. Isto acontecia após ela ter ficado viúva. Passando as filhas e o filho a serem criados por dona Cora, parente próxima do marido assassinado.
TALVEZ POR isso, por uma natividade tão precária, o filho dela, forçado a sobreviver em empregos, sem condições de frequentar uma faculdade, mostrava uma circunstância existencial condizente com suas dificuldades: seu caminhar era afetado. A bunda saracoteava e se mantinha empinada, voltada para cima, como se estivesse preparada para uma situação de penetração. Existem muitas histórias que a gurizada contava que via, quando os donos da casa não estavam, e eles olhavam o que acontecia dentro da casa, após obtido acesso visual à sala, quando se penduravam no parapeito da janela que dava para a rua, e olhavam para dentro dela.
MEU AMIGO de cor, o Zuca, me falou que os primos eram flagrados chupando-se mutuamente. O que me foi confirmado por outro moleque com que eu conversava quando ia jogar no “campo do Horácio”. A sociedade local não tinha uma orientação moral que os impedisse dessas práticas, talvez herança de seus ancestrais. Mãezona certa vez me disse, de chofre, num súbito e raro arroubo de franqueza:
— Em minha família isso é normal. Como se dissesse que homem macho entre seus familiares, eram raros. E ela, talvez, não conhecia nenhum. Aquela confissão me causou pasmo e me propiciou uma contínua reflexão, um não pouco ruminar sobre minha própria condição de homem, da qual eu me orgulhava. Desde que a Aldenora, uma doméstica da casa, me propiciava seu bumbum mais que moreno, oferecido, nas horas de descanso dos afazeres domésticos, quando o casal não estava em casa. Principalmente quando estavam em viagem turística à Cidade Maravilhosa.
EU DESFRUTEI, felizmente, de uma sucessão de aulas de catecismo. Influenciado por um forte componente de caráter religioso, eu costumava matutar longamente sobre as situações mostradas e comentadas em pequenos impressos de quatro pequenas páginas, que eram distribuídos em cada seção de instrução na catequese do sábado. Mãezona fez uma coisa boa com relação a mim. Incentivava-me a frequentar as aulas de catecismo. E eu gostava demais de ir e ouvir o padre na Igreja do Amparo, nos finais de semana, dissertar sobre o “quadro sagrado” do dia, distribuído em mãos dos meninos que frequentavam a homilia do dia; na parte da tarde de sábado.
ESSA INFLUÊNCIA adquirida na prática de princípios de culto, fé e doutrina, me salvou da respiração do ar contaminado apenas pelo clima de sacanagem que dominava as influências de rua, na plataforma das canoas de pescadores onde se podia encontrar garotas, quase meninas, nas escadas e passarelas de banho de rio.
A EDUCAÇÃO neandertal que instigava e induzia comportamentos padronizados nas salas de aula, nas diversões do recreio nas escolas, as conversas de coreto na praça Pedro II, as fanfarras das noites convividas nas praias de areia do rio Parnaíba, a frequência de amizades do Clube dos Diários, ou no Jóquei Clube: todas essas experiências passavam pelo crivo da condição de comparação, paridade e analogia com os ensinamentos contidos nas quatro pequenas páginas dos ensinamentos do Antigo e do Novo Testamentos. As aulas de catecismo foram para mim a prancha que me proporcionou deslizar por sobre as ondas do tsunami de influências bastardas e espúrias da molecada das ruas. Mas nem por isso menos prestigiadas pelo guardador de memórias de influências passadas.
MULHER COM CABELO EM COQUE PEQUENO — PICASSO (1904)
A VERDADE não é o veneno, é a cura. Mas ele, o time de futebol de Mãezona, foi criado para fugir dela, como o diabo foge da cruz. A verdade para Mãezona estava, talvez, nas preleções que a doutora Rosen, ex enfermeira de Auschwich, agora sua vizinha, fazia às escondidas para ela. Elas se preparavam antecipadamente para esses encontros. Mãezona dispensava a proximidade de todos na casa, garantia que tinham saído, que Paizão estava, como sempre, prostrado em uma rede, no quarto ou na área de serviço da casa.
NO PEQUENO jardim da casa, falando aos cochichos, ou na parte interior do portão da mansão do doutor Franca, que diziam ser seu marido, elas conversavam, ou melhor, a doutora dizia coisas e ela, Mãezona, ouvia atentamente. Por vezes intervinha com monossílabos, como que perguntando algo e ouvindo a resposta. Digo isso porque ambas não gostavam que ninguém se aproximasse delas. Se pressentiam alguém se aproximando, afastavam-se. Debandavam uma para cada lado. Por vezes ficavam um tempo longo na calçada, desde que raramente havia pessoas na rua daquele subúrbio do bairro Ilhotas. Digo isso porque as via de longe.
A ÚNICA VEZ em que vi a enfermeira de perto, tive a impressão de que não era humana. Havia algo de peçonhento e ameaçador em sua aparência alongada. Havia algo nela de profundamente hostil, perigoso. Mãezona talvez estivesse aprendendo os rudimentos da doutrina ou cânon da ideologia nazista. Seu sobrenome alemão era, com certeza, a base dessa atração. Sua casa dividida não conseguia mais ficar de pé. Mas ela queria que fosse assim, não conhecia talvez outra forma de fazê-la desabar mais depressa. Seus traumas de infância e de infâmia e juventude, intensificavam sua postura familiar autoritária.
HAVIA DESTRUÍDO o marido exaurindo-o no trabalho do consultório, para alimentar e educar os filhos que paria todos os anos. Sua estratégia era clara, cristalina: eu não teria dela nenhum incentivo, exceto as exigências que, tardiamente, ela cumpria à força de minhas pertinazes solicitações, das quais não podia fugir pela proximidade das promessas de compensação. Eu não desistia de mim, por mais força que ela tivesse no sentido de me fazer um escravo subalterno, como fizera de Paizão Coisinha.
NÃO FOI FÁCIL, mas consegui que me mandassem para a casa daquele tio em Niterói, Rio de Janeiro. Quando de lá saí, dediquei-me a trabalhos de jornalismo e em agências de publicidade e propaganda, que tinham a ver com solicitações de minha razão, para garantir a sobrevivência mínima do tempo dedicado aos livros, filmes, teatro, museus. Minha cabeça processava com ansiedade o conhecimento e os ensinamentos que vinham deles. Eu não me garantia em termos de sobrevivência futura. Se fizesse isto, não teria tempo para mais nada: exceto bater cartão de ponto e repetir todo dia falas tipo “sim senhor, por favor, muito obrigado”.
EU NÃO QUERIA suicidar-me moralmente. Eu não queria adaptar-me às rotinas diárias do pessoal da sala de jantar e do salário em fins de mês. O autoconhecimento exige muito tempo de preparação. “O estar preparado é tudo”, afirmação daquele personagem shakespeariano. Ou eu venceria o mundo, ou me cristianizaria às avessas: seria mais outro prisioneiro das mentiras rituais que atraem as pessoas como se fossem ímãs, para suas redes de opressão sistemática, de pagamento de impostos. A principal delas, central de mentiras, até onde eu sabia, era a família. A família, usada e abusada pelos sistemas de empobrecimento mental, empobrecimento material da população. Pelos sistemas de dominação que combinam o conhecimento das várias disciplinas, para criar sociedades secretas da corrupção política, econômica, social.
EU TERIA SIM, se o time da Família Trapo houvesse investido em minha educação, seguido uma profissão tipo astrologia, medicina, informática, biologia ou outra. Mas nunca haviam me fornecido as condições de desenvolvimento intelectual ou educacional. Tinham me atado, como se eu fosse um cão, à intencionalidade que gostavam de exercitar sobre minha mente juvenil: Paizão certamente pertencia a grupos católicos de dominação mental e subordinação das novas gerações que lhe davam apoio à situação de insolvência e carência familiar. Mãezona paria os filhos. Os filhos que ele tinha de se matar para sustentar. Seu sistema nervoso estava um trapo. Quando se irritava começava a tremer incontrolavelmente dos pés à cabeça. Certamente por fraqueza mental e muscular.
PAIZÃO COISINHA com certeza pertencia à Opus Dei, a Maçonaria da Igreja Católica. O controle mental Monarca das gerações nascidas no pós-guerra, era e é sistematicamente exercido a partir de pais e familiares adultos sobre seus filhos. As novas gerações estavam e estão em mãos de uma família leiga escrava dos poderosos (ignorante, insipiente, perversa, desinformada) e de um Estado laico igualmente interessado apenas em dominação dos habitantes que pagam impostos em seu território.
ORA, ORA, todos sabemos que o funcionalismo público, assim como todos os políticos, toda a força da sociedade militar e civil, toda a cultura social, vem da raiz familiar. Da raiz familiar ignorante, submissa, desinformada, natural e inconscientemente perversa, interessada apenas e exclusivamente em sobreviver melhor que outros, seus vizinhos, seus conhecidos, semelhantes mais próximos.
A FAMÍLIA está interessada em sobreviver aos conflitos, à corrupção sistêmica gerida pelos poderosos mentirosos, políticos corruptos, e ao conflito de gerações. As novas gerações estão em mãos de seus carrascos, com seus valores antigos, conservadores, que estimulam a interação emocional entre eles, a empatia entre os indivíduos e suas hostilidades conflituosas regressivas.
AS CRIANÇAS nas famílias, os adolescentes, estão atrelados a conflitos que eles mesmos desconhecem a origem. Têm dificuldades de expressar o que sentem por medo de magoar aqueles que não querem ouvir suas verdades. “conhecereis a verdade e a verdade vos libertará”. A verdade vos libertará de quê??? De quem???
AS PESSOAS, as crianças, vivem sob a ameaça de castigos, sob a ameaça das tensões dos adultos que as cercam, de suas perturbações, fingimentos, angústias, tristezas, sofrimentos, aflições e ansiedades. Como podem seus filhos pensar com suas próprias cabeças, se a cabeça deles está sempre sob a influência do cativeiro, pesares e padecimentos dos adultos que lhes cercam???
O ESTADO de tensões provocado no interior do ambiente familiar, do ambiente de trabalho, do ambiente interno da psicologia das pessoas, das influências advindas do Inconsciente Coletivo Globalizado pelos mesmos jogos mentais, pelas mesmas e tradicionais fases do ciclo familiar, a começar pelo estágio infantil da aquisição de conhecimentos. Conhecimentos daqueles que não têm a compreensão consciente das mudanças pelas quais o mundo externo, que não para de os influenciar, passa??? Passou. A família não tem acesso às mudanças rápidas que se sucedem nos vários setores dessas influências, nos mais variados conceitos e técnicas que se renovam no saber e no ensino das disciplinas.
QUEM POSSUI conhecimento pertinente ao aprendizado??? Ao ensino das estratégias metodológicas, das ferramentas e recursos que poderiam auxiliar os adolescentes a compreenderem-se e à assimilação dos esquemas que poderiam salvar suas vidas da corrupção disseminada pelos sistemas de comando, comunicação e controle do mundo em que vivem a sobreviver.
QUANDO SE torna adulto, o jovem ou a jovem, começa a perceber que o mundo é uma imensa e oceânica farsa. Encontram algumas respostas. Uma delas pode ser a descoberta de que está num palco de sua família, de sua cidade, interpretando um papel escrito para ele, ou ela, sem saber quem realmente o escreveu. Ele, adulto foi e continuará sendo um ator. Mas, quem é o autor da peça que interpreta??? Mas, que jeitinho pode haver se ele quiser mudar sua atuação no drama escrito, ele, ou ela, não sabe por quem???
CATIVO DE sua interpretação na peça do Teatro Universal que o autor, ou Et misterioso, escreveu em seu DNA para que ele interpretasse, ele e ela, afinal, se descobrem na última e melhor idade. Com todas as deficiências que, talvez, a senectude lhes reservou para interpretar em seus últimos dias. Seus filhos e netos sequer sabem como mostrar alguma solidariedade àquele ser dito humano, que, também eles não sabem, porque está a interpretar o papel de avô ou avó. Talvez achem um pedaço da resposta nos livros do Erich von Daniken e seus Alienígenas do Passado.
HARLEQUIN´S FAMILY — PICASSO (1905)
SE NÃO VIVEMOS de acordo com nossas intuições e decisões, não passamos de macaquinhos amestrados. Se as pessoas são educadas para caírem no molde padrão do consumismo, emprego, salário, supermercado, shopping, então o mundo oceânico em seu redor passa a inexistir, deletado por suas ocupações rotineiras. O mundo no qual estamos dormindo, mesmo depois do relógio despertador ressoar e partirmos em direção ao lavatório para os dentes escovar, esse mundo, no qual vamos trabalhar, é muito mais amplo do que a vidinha no cômodo remanso da zona de conforto.
TODOS E CADA um de nós estamos dormindo o sono da conveniência e da sujeição à uma ordem e a um progresso que nunca será seu, de seus familiares. Exceto na aparência. Pensamos estar a viver uma vida singular, correta, quando estamos apenas seguindo a procissão dos acomodados que fazem o jogo dos supremacistas, nazifascistas globalizados. Suas crianças estão sendo tencionadas por uma educação que não educa. Exceto para um mundo que não mais existe.
ERA NESSE MODELO de educação que Paizão Coisinha e Mãezona estavam engavetando, familiar e socialmente, a filharada. Ninguém naquele “lar amargo lar” questionava nada. Exceto eu. Eu, o estigmatizado. Eu o bode expiatório. Eu, o espancado. Eu o que estava sempre e em todas as ocasiões, errado. Eu, o que estava sendo literalmente sacrificado no altar de uma mulher possuída pelos demônios da credulidade, da ignorância, da boçalidade, do obscurantismo paterno e materno, contra o qual os filhos não podem lutar porque submissos ao respeito que lhes é devido. Não podem lutar porque são instados a todo momento à obediência impositiva, afirmação de uma cultura milenar de autoritarismo caseiro, dos costumes domésticos, da vida privada.
QUANDO EU SUGERIA que um de seus filhos frequentasse um psicólogo ou um psiquiatra, devido a um comportamento tresloucado, Mãezona vinha com sete pedras na palma da mão:
— Essa coisa de psicologia, psiquiatria, é uma bobagem. Existe pra tirar dinheiro das bestas. Existe só para fazer as pessoas abestadas. É ocupação para retardados mentais. — Mãezona entrava, literalmente, em surto verbal. Não parava de atacar e articular argumentos contra a Psicanálise.
TALVEZ PORQUE a Psicanálise tenha sido criada por um médico judeu, Sigmund Freud. E judeu, para quem era supostamente de origem ariana, supostamente superior, com sobrenome alemão, não poderia nunca ter criado algo de bom e de útil para a sociedade. Judeu era anátema. Opróbio. Ela havia chegado a um grau de hostilidade limite, contra tudo e contra todos que mostrassem alguma opinião contra as barbaridades nazistas da IIª Grande Guerra. Paizão era fã do Terceiro Reich e Mãezona sua suposta mulher ariana, não escondia suas simpatias pelo Führer alemão. Mesmo que não costumasse mencioná-lo.
EU HAVIA ESCRITO um livro sobre a descoberta de uma enigmática passagem para uma cidade subterrânea na Amazônia. O livro, escrevi em 2004, dois anos antes de concluir a graduação em Letras Incluía pesquisa sobre os pelotões da Wehrmacht enviados à Amazônia pelo regime do Führer alemão, antes mesmo de iniciar a Segunda Guerra Mundial. Chama-se “A Cultura De Abim”, sobre a deusa-mãe no período pré-histórico, seus vínculos e afinidades com a cultura pagã do nazismo. Uma cópia xerox do livro ficou sobre a mesa de estudos utilizada por mim, na sala de entrada da casa. Mãezona levou o livro para ler em sua alcova. Depois de uns vinte e cinco dias, ela, irritada, devolveu o livro ao lugar de origem, a mesa de estudos. Perguntei:
— Você gostou da leitura, mãe, divertiu-se???
— Não foi o que eu queria ler dos alemães na guerra. Não era bem isso que esperava ler. Não posso dizer gostei não.
— O livro não é contra nem a favor do Führer. Apenas documenta o interesse deles, nazistas, na Amazônia, mesmo antes de começar a guerra.
— Me pareceu sem simpatia por eles...
MINHA EXPECTATIVA era que ela emitisse alguma opinião a propósito de meu fazer literário. Isto não aconteceu. Ela não perdia uma única oportunidade de mostrar indiferença, frieza ou desdém ao que eu escrevia. Isto acontecia desde quando criança. Quando eu lhe mostrava narrativas escritas imitando ações de personagens das historinhas em quadrinhos e do cancioneiro dos cantadores de cordel que eu gostava ouvir e visualizar suas cantorias no Mercado Velho.
ACREDITO QUE A influência da enfermeira de Auschwich, a vizinha doutora Rosen sobre ela, vinha tornando-a quase que uma fanática da mitologia nazi e da consequente crença na dominação dos demais povos do mundo pela cultura do deus Thor da mitologia nórdica. Mãezona estava cada dia fisicamente mais parecida com a “Vênus de Willendorf”, estatueta esculpida há aproximadamente trinta mil anos antes de Cristo, descoberta no sítio arqueológico homônimo, na Áustria. O ventre enorme, carnes adiposas, saliente dos lados. Uma criatura de há 25 A 30 mil anos atrás.
NESSA ÉPOCA houve a extinção dos Neandertais, tendo o Homo sapiens expressivo papel de ator primata nesse processo. Filho de Odin e Frigga, Thor era deus do trovão, das forças da natureza, da tempestade e da agricultura Vikings, nórdicos habitantes da Escandinávia entre 793 e 1066 depois de Cristo. Atacaram e conquistaram a Inglaterra liderados por Guilherme, o conquistador.
NÃO ERA APENAS Mãezona que tinha aversão à cultura literária. Os políticos e empresários de Teresina sempre mostraram a mesma disposição de aversão à cultura e, principalmente, à alta cultura. Acredito que o nome do campo de concentração nazi Terezin (Theresienstadt) foi uma homenagem à cidade de Teresina no Piauí.
EU REDIGIA PROJETOS de escrever, ter uma meia página que fosse num dos jornais da cidade. Participei de reuniões com chefes de redação. Mostrei evidências de minha participação enquanto repórter e comentarista de filmes quando no Rio de Janeiro. Juntavam-se vários fulanos para me dizer que uma meia página custa dinheiro:
— Mas, não é tarefa de vocês vender o espaço do jornal para empresas interessadas em promover-se??? Estou a ofertar um jornalismo de qualidade, promover o jornalismo local. Isto não seria valorizar seus leitores e investir na qualidade de informação e comunicação para seus leitores???
— Você não está entendendo, é preciso convencer uma empresa, um investidor na compra de uma página, de meia página no jornal...
— Desculpa, não compreendo por que vocês não fazem isso. É minha tarefa também vender o espaço em que poderia escrever, a um comerciante??? Vocês não têm profissionais para fazer esses contatos comerciais???
NA REALIDADE não havia, nunca houve nem haverá interesse de donos de jornais em Terezin (Theresienstadt) ou Teresina, em ofertar um jornalismo de qualidade a seus leitores. O que os jornais no Piauí ofertam é um amontoado de fake-news em favor da politicagem a serviço de criminosos do colarinho branco. Veja a atuação do ministro da Casa Civil do Bozo, o político piauiense Ciro Nogueira.
INEXISTE A apuração real dos fatos que envolvam os figurões locais e nacionais do crime organizado, e a devida denúncia deles. A cultura jornalística no Piauí está a serviço da informação que conduz os leitores à aceitação da saia-justa nas redações do jornalismo marrom, sensacionalista de evento policiais e políticos sem o devido zelo aos fatos. Jornalistas que fazem seu trabalho são simplesmente assassinados. O povo piauiense vive e sobrevive sob a gerência de administradores zelosos que fazem valer os interesses dos oligarcas do crime organizado.
NO PRAZER HÁ MORTE — HALSMAN & DALI (1949)
EM 1995 EU ainda usava o nome literário Decio One. Nome este que substituía em outros sites e livros por Decio Goodnews e Sereno Hopefaith. Dentre os livros que escrevi, digitei, revisei, subscrevi contratos de edição com gráficas e coedições, distribuí as edições em livrarias, bancas de revista e comercializei em feiras de livros em São Paulo, Rio de Janeiro, Teresina, Santos, bares e restaurantes em Pinheiros, Vila Madalena, Bar Riviera, Bar Brasil, filas de cinema e teatros, na Bienal do Livro em São Paulo:
— Mama Nordeste (Infanticídio).
— Os Degraus do Bandeirantes (Às Vésperas do 4° Reich).
— Sone Sonar Serenar (Admirável Mundo Morto)
— A Incrível História Política Do Rei Bozo E De Seus Congressistas Da Távola Redonda Do Centrão.
— O Presidente Jedy Versus Satã Darth Wader.
— A Mochileira (Thundra).
— Horizonte Solar (Poesias).
— A Educação Do Presente (Estudo Crítico Sobre Dois Livros De Edgar Morin).
— Adão E Erva do Éden Neo-Pós-Moderno (PsiCity).
— Chacina Chique (Contos).
DESTES ALGUNS receberam prêmios de instituições literárias, menções honrosas, primeiros lugares em concursos literários promovidos pela Secretaria de Cultura do Governo do Estado do Piauí (uma merreca). Nunca nenhum deles mereceu a atenção de uma editora ou de uma instituição literária. Os prêmios não passaram de afagos momentâneos, sem consequências posteriores que mostrassem algum mínimo interesse em promover o autor e suas investidas culturais. A Secretaria de Cultura me informou que eu não havia ganho o primeiro prêmio no concurso de poesias, porque eu já havia ganho no concurso de romance e contos. Os prêmios somados totalizaram mil e quinhentos reais. A edição em papel dos premiados foi simplesmente uma caca iditorial.
RESSALVAS: destes dez livros, “A Incrível História Política Do Rei Arthur E Seus Congressistas Da Távola Redonda” esteve na condição mais de panfleto crítico e informativo do que propriamente de livro. Sua edição de apenas mil exemplares, foi comercializada, tal como os demais, até o penúltimo exemplar. O último ficou comigo. Garantia de que a aceitação de minha literatura é acessível e popular. O romance “Adão e Eva... (PSICity)” ganhou nova digitação e novo nome: “A Cultura de Abim” (A Educação Emocional De Wanda). Este também não foi editado.
A MIM ME PARECE que meus esforços de me multiplicar milhares de vezes nessas edições, a maioria com dois mil exemplares, não resultaram em chamar a atenção de nenhum editor interessado em investir no autor. Por quê??? A resposta se faz presente: nenhum editor ou editora está interessado em cultura literária de um autor latino-americano, sem dinheiro no bolso sem parentes importantes e, sobretudo, não gay. No Brasil quem não é gay está ferrado e mal pago. Quem é gay, nem se fala, perdeu até o direito de manter a própria sexualidade original de nascimento. Boiolas no Brasil são altamente prestigiados. Por razões e motivações culturais.
É COMO AFIRMOU o criador da frase: “se correr o bicho pega, se ficar o bicho come”. Se você é um autor literário e não um jogador de futebol, não há uma estrutura social de proteção e promoção cultural para sua produção literária, mesmo que você a exteriorize milhares e milhares de vezes. Agora, se você corre num campo atrás de uma bola, logo vira atração para um sem-número de “Marias Chuteiras”: diretores de clubes, treinadores, olheiros, comentadores da bola, preparadores físicos, locutores esportivos, e lavadores de dinheiro do tráfico nacional e internacional de drogas.
ESTÁ CLARO que a sociedade atual não valoriza a cultura literária. Se você não é simpatizante de boiolas, nem se envolve com notórios autores de novelas pra boi dormir, ou não se apega a um militante “LGBTQIA+”, se você não é rico para investir em edições, distribuição e propaganda de seus livros, desista. Desista de ser escritor. Sua própria família, é bem possível, não vai compreender e incentivar suas qualificações de sensibilidade na Arte de Escrever. É bem possível que sua família não queira que você reflita em seus textos, sobre suas debilidades e as de seu país. A mentalidade familiar vigente num país sem educação formal de mínima qualificação, ao pensar e ao racionalizar, é também a mentalidade de toda a sociedade.
SOCIEDADE DAS “Marias Chuteiras” que torcem pelo Corinthians, das “Marias Chuteiras” que torcem pelo Palmeiras das “Marias Chuteiras” nas galeras berrando e comemorando a bola no fundo. No fundo das redes. O que, na realidade, essa sociedade de “Marias Chuteiras” valoriza??? O campeonato brasileiro, o campeonato sul-americano, a Taça Libertadores da América, os torneios regionais de futebol, os torneios internacionais dos chutadores de bola. Não importa para essas autoridades, se a inteligência nacional está agonizando por falta de incentivos à cultura literária, dramatúrgica, poética. A sensibilidade e a inteligência emocional não contam.
UMA SOCIEDADE globalizada por essas qualificações pode ou deve ter futuro??? Uma galera nacional e internacional que nasceu para aplaudir chutadores de pelota que as mantêm excitadas para outro dia de trabalho escravo, de correr atrás do leite dos filhos, de correr atrás das galinhas e do milho... Que tipo de sociedades pode sair daí e garantir que tipo de futuro para si mesma e para seus “hijos”??? É possível a construção de uma realidade outra que não seja a da criminalidade, a da prostituição e do fanatismo???
UMA SOCIEDADE com essas características não pode fazer outra coisa senão a médio e longo prazos, jogar ainda mais no lixão de seus apartamentos, casas e sítios, os princípios e valores sobre os quais fora construída a cultura e a civilização. Essa é uma sociedade global afirmativa do uso e abuso de drogas e da institucionalização em seus respectivos Congressos ou Capitólios, da violência, do abuso de consumo de drogas, da prostituição generalizada de seus membros.
É PARA ISSO que os deuses, Ets criadores do mundo Cão, escreveram seus livros sagrados??? Suas epopeias heroicas, seu Gilgamexe sumeriano, seus Reis Davi, seus Golias, seus sábios Salomão??? Seus Salmos de Louvação??? Seus heróis supostamente arianos??? É para isso que os deuses de antigamente e seus remanescentes povoaram suas ruínas espetaculares e seus subterrâneos secretos que guardam os segredos da engenharia e da colonização da Terra por navegantes de naves espaciais??? É para isso que existem as culturas da bactéria estafilococos da Nova Era e seus vírus difíceis de combater???
ONDE ESTÃO OS incentivos oficiais à pedagogia literária da razão e da sensibilidade??? Nas faculdades de Letras é que não. Nos estádios de espetáculos para as galeras de “Marias Chuteiras”, também não. Onde então??? Nas salas de aula das escolas e universidades??? Responda você, caro leitor. Eu não os vejo em lugar nenhum dessa cultura para a multiplicação de trogloditas armados.
A CULTURA DO prazer sexual, dos prazeres da excitação mental via drogas naturais e artificiais, as competições esportivas regadas ao narcisismo lucrativo de mafiosos por detrás dos bastidores de transferências bilionárias de chutadores de “bola”, esta encontra nos meios ditos eruditos um grande desenvolvimento em campeonatos nacionais e mundiais dos chutadores de “bola”. Onde se escondem os incentivos à cultura que não seja a da “bola”???
BUSTO DE MULHER E AUTORETRATO — PICASSO (1929)
QUEM PODERIA salvar a alma do jovem futuro, se seu corpo físico não parava de se degenerar em mãos paternas??? Quem poderia salvar o futuro daquelas crianças, a adolescência das crias paridas pelo centrão carnal fundido e fodido de Paizão Coisinha e Mãezona??? Quem ousaria desativar a bomba do abuso sexual adaptada aos fundilhos, em seus rabos infantis, sobre o carrapato pânico e debilitante da formação traumática de um casal de ânimo apodrecido moralmente, animado unicamente por seus medos???
MÃEZONA COMEÇAVA a surtar quando ouvia falar em Psicologia ou Psicanálise: Sigmund Freud para ela era anátema. Se o sujeito era judeu, para ela não podia prestar. Olhar para aquela mulher já era infeccionar-se com seu capital de bagatelas. Lembro-me dela tecendo nó e nós nos fios de pequenos pedaços de pano. A concentração dela era tão formidável ao manipular cada nó, um atrás do outro, que ela nem se dava conta que poderia estar sendo observada.
ERA COMO SE ela estivesse juntando o tutano, a substância, o cerne pensante e sensitivo de uma pessoa e se garantindo de que essa pessoa estivesse para sempre acorrentada naqueles nós-nós. Era eu, meus irmãos e irmãs, que ela estava algemando??? Excessivamente concentrada e ao mesmo tempo emocionalmente dedicada a atá-los em tal estado de abstração exagerado, que eu diria que ela estava mesmo em outra dimensão. Fazia parte de sua mágica sobrepor-se à dimensão, para ela incompreensível e irredimível, da própria realidade que criara para ela, o marido, a filiação.
COMO AQUELA mulher, que eu deveria chamar de mãe, era desesperadamente covarde, medrosa, receosa, molenga. Ordinária mesmo. Por que se proibia de ler a literatura enquanto possibilidade de desenvolvimento mental??? De ampliação de sua percepção demasiadamente embotada??? Minha psicóloga dizia que, pelo perfil traçado dela, tudo que ela queria ao se casar, tinha sido obter um lugar para comer, dormir e fazer suas necessidades básicas. Ela não sabia fazer outra coisa. Que não fosse sobreviver.
QUANDO NOS sentávamos à mesa atendendo o chamado do almoço, lá estava ela, comendo furiosamente, como se estivesse sem comer há muito tempo. Sua ansiedade por comida não era nada boa de se ver. Tudo nela estava intrinsicamente veiculado às carências e à dor. A dor da vergonha de não poder compreender-se. De não poder se olhar no espelho de suas verdades, dos abusos sofridos e nunca verbalizados. O medo de ser ela mesma para depois de se ver no espelho de suas aflições, poder compreender-se e se renovar enquanto pessoa: tornar-se um ser humano.
EU GOSTARIA de me comover e chorar ao escrever estas linhas. Mas ela não se permitiria jamais que alguém, quem quer que fosse, permitisse vê-la e com ela se comovesse. Seria humilhação para ela. Ela, que se queria uma deusa empoderada a dirigir e digerir a vida dos filhos. Ela se desprezava com tamanha intensidade (sem saber disso) que não poderia contemplar-se no espelho de uma reflexão sobre si mesma. Ao se refugiar no universo paralelo de sua subjetividade vodu, da manufatura de seus bonecos e bonecas, das representações de como ela queria que coubessem nas mãos, seus filhos...
SEUS FILHOS crescidos, que ela não compreendia o que faziam próximos a ela. Ela os queria pequenos, do tamanho de suas bonecas e bonecos. Se deles se entediasse, poderia pô-los no bolso ou na bolsa e esquecer que existiam, tamanha era a incompreensão que tinha de cada um deles. De mim, sobretudo, notadamente. Ela fazia questão fechada em nem sequer tentar me compreender, me respeitar, me dá um abraço. O Sertão rosiano dentro dela era algo aterrador. O horror de se penetrar e conhecer, era algo palpável. Dava para ver seu interior se recusando a se reconhecer.
SEUIS TRAUMAS intensificavam de tal modo suas memórias, que ela preferia nem de longe considerar-se alguém que desse o fora deles. Era uma criatura esmagada por sua própria terra interior devastada por eventos que, na infância, com certeza, haviam marcado profundamente seus critérios de avaliação dela, dos outros, do mundo exterior.
ELA SE ESFORÇAVA sempre por me desacreditar perante a ralé familiar, com apoio incondicional de seus outros filhos, filhas e de Paizão Coisinha. Um deles se destacava no se aproximar e se sentar no colo de Paizão em meio à rede de tucum armada na sala de estar. Era o quarto ou quinto filho por ordem de nascimento. Primeiro enviado para um seminário no Ceará. Depois para a formação aquartelada numa academia de polícia. Queria-se privilegiado pelos orgasmos de Paizão no fundilho.
EU ERA UMA criança sobrevivendo num clima familiar de extrema hostilidade. Hostilidade quando não de ameaças e espancamentos, a hostilidade calada, silenciosa de uma família na qual eu estava sobrando porque Mãezona e seu marido, faziam questão de mostrar a todos que eu não era normal. Ainda hoje (estou com 74 primaveras) a sociedade gayzista faz questão de mostrar hostilidade à minha condição existencial de não pertencer a essa grei. O rebanho gay hostiliza quem não faz parte dele. Eles reconhecem, vai saber, uma pessoa pelo odor, talvez, pela expressão corporal, pelos maneirismos nos gestos, nas falas, pelo olhar que não condiz com suas expectativas.
A SOCIEDADE brasileira hostiliza, em todos os cantos e recantos, quem não pertença a essa confraria, a esse rebanho, a essa agremiação, a essa irmandade, a essa sociedade secreta. Por outro lado, o machismo é um sintoma de que o indivíduo está a viver e a suportar a síndrome, como diria o Fernando Gabeira, do “Crepúsculo do Macho”. Eu testemunho essa verdade em todos os lugares:
NO CAIXA DO banco, seja masculino ou feminino na aparência, seja aonde for, há a presença calada, insuspeita, do preconceito contra quem não se mostrar pertencente à grei adamada. Um exemplo dentre centenas??? Vejamos: depois de três anos usando uma prótese dentária que foi paga em mais de 33 mil reais, somando-se a extração dos dentes remanescentes, dirigi-me ao consultório dentário da Agami odontologia, na Praça Oswaldo Cruz, 5° andar.
ANTERIORMENTE, durante as sessões de extração e preparo bucal para a instalação da prótese, o dentista, um sujeito robusto que, inicialmente me atendeu, não parava de me contar suas histórias (assédio) enquanto atendia às solicitações do procedimento bucal terapêutico. Dizia isso e aquilo, falava sem parar, parecia excitado. Por vezes chamava um assistente e ficavam ambos conversando, enquanto dava continuidade aos procedimentos odontológicos.
EU SUPORTAVA calado o assédio ininterrupto do sujeito. Estava na condição de seu paciente. Antes desse atendimento do odontólogo, não sabia quem me atenderia em um dos consultórios dentários do lugar, na Paulista com 13 de maio. Não conhecia anteriormente ninguém. Minha mulher me indicou o lugar onde também ela havia frequentado em tratamento dentário anteriormente.
O DENTISTA contava de seus interesses particulares, de sua insistente frequência num tal clube de Jazz na Angélica. Eu, sem saber como proceder, de que maneira, com educação, mandá-lo tomar no cu ou ir à puta que pariu, antes de uma sessão dentária posterior, comprei um CD de famosa cantora americana, não lembro ao certo se Sarah Vaughan, Nina Simone, Ella Fitzgerald ou Billie Holiday. Pedi a mulher que me atendeu na loja de discos, que embrulhasse para presente.
NO DIA SEGUINTE falei com a atendente na sala de espera do consultório, que entregasse ao sujeito o presente, desde que ele não parava de me assediar dizendo que gostava de Jazz. A mulher passou ao gayzão o Cd. Passado um tempo o obcecado assediador, sem graça, mas sempre parecendo agitado, me agradeceu o brinde. Desde aquele dia, substituiu o atendimento que ele fazia por outra dentista. Desta vez mulher.
RESUMINDO: TRÊS anos depois me dirigi ao lugar para promover a limpeza das próteses superior e inferior. O dentista, um veadinho (não digo isto com preconceito, apenas atesto o que vi) que me atendeu, também exageradamente agitado, parecia mesmo drogado, talvez de cocaína, desatarraxou os pequenos parafusos da prótese superior, e saiu com ela da sala. Ao voltar e concluir o procedimento de limpeza, ele se mostrou preocupado com o pagamento dizendo-me:
— “SÃO SEISCENTOS reais, você paga à secretária atendente na sala de espera”. Após efetuar o pagamento, em seguida saí. Poucos dias depois o dente do lado superior direito correspondente ao canino, caiu. Evidenciou-se a pirataria do dentista. Em minha avaliação, ele propositalmente criou condições de o dente cair. Durante três anos ele permaneceu no lugar, antes que eu fosse providenciar uma suposta limpeza da prótese. Eu havia pagado para ele danificar uma prótese dentária equivalente a mais de 33 mil reais (a superior, a inferior e as extrações). Se eu voltasse ao consultório, não seria para fazer reclamação, mas para promover um barraco, uma via de fatos que poderia terminar mal. Muito mal: um evento policial, talvez com vítima fatal.
O BRASIL É UM país com leis por vezes aparentes. É um país moralmente infeccioso. A pandemia da viadagem não tem vacina nem cura. Está presente nos restaurantes, nos shoppings, nos bares, nos hospitais, nas programações televisivas, nas polícias, lojas e boutiques, nas editoras, nas FFAA, nos consultórios médicos, lupanares odontológicos, nas salas de aula de escolas e faculdades, no interior das comunidades e agremiações esportivas, nas galeras dos estádios, no Congresso, no Palácio do Planalto aqui, ali e em todos os lugares. Em baiucas familiares: nas ruas, igrejas e templos particulares.
O CIRCO METAFISICO — VITO CAMPANELLA
“THE DREAMTIME”, a visão visionária dos aborígenes australianos. A denominação foi criada por antropólogos influenciados pela teoria da evolução de Charles Darwin (século XIX). O “Tempo dos Sonhos” é uma designação dos tempos mais primevos nos quais foram criadas as sociedades ademais antigas. Nele foram criados os paradigmas da sociedade mais primitiva, a partir de projeções holográficas tridimensionais, há nada menos de sessenta mil anos.
OS ETS HABITAVAM a Terra, povoaram-na de seres semelhantes a eles, equivalentes ao que fomos enquanto projeto inicial da Criação. Desde aqueles idos de há sessenta mil anos, pessoas assemelhadas ao arquétipo que deu origem à Mãezona e a seu marido Paizão Coisinha, assim como a seus familiares, persistem até os dias de hoje. São seres sob comando, comunicação e controle de forças, energias quânticas que impulsionam os modelos culturais de comportamento.
NÃO É POSSÍVEL que no século XX/XXI comportamentos pessoal e coletivo, intensamente destrutivos ainda continuem a prevalecer entre os familiares depositados na terra, a partir do interior do ventre de suas mães, vomitados de dentro de seus abdomes. Esses seres primatas, muito tempo depois, selecionados por seus criadores, foram inseridos na etnologia da espécie sapiens, via figuras representativas de todos os seus descendentes através dos séculos e milênios.
O DNA DESSES seres não mudou: eles continuam destruindo seus semelhantes, assim como Caim destruiu Abel. Assim como as tribos de Israel se hostilizaram entre si. Assim como grupos ditos de arianos desejam extinguir da face da Terra seus inimigos vitalícios: os judeus e as demais raças que não estão codificadas em sua cosmogonia. O “Tempo do Sonho” continua vigente nas cabeças e na realidade astral interna de suas camadas PSI: inconsciente, subconsciente, consciência.;
PESSOAS TAIS quais Paizão Coisinha e Mãezona, continuam a exercer grande influência na zona multifacetada da realidade multidimensional. Seus filhos prosseguem sendo projeções holográficas da mente deles. Seus filhos continuam sendo nada mais do que extensões da força quântica do Inconsciente pessoal e tradicional deles: seus ancestrais. O mundo é uma tragédia global que começa na família.
A FAMÍLIA mantém o grude entre seus membros que necessitam de alguém do lado para fazer companhia às suas inquietações, a seus multifacetados medos. O mundo não pode ser mudado em suas pulsões autodestrutivas e socialmente agressivas, vorazes, deletérias. Vejam as ameaças de guerra entre países europeus. Estão vendo a invasão de um país pelos autocratas russos??? Na Ucrânia, milhões de pessoas fogem de suas residências originais, humilhadas em busca de um novo lugar para habitar. Seus lares foram destruídos por bombardeios de assassinos autocratas descendentes diretos de Caim.
CADA MÃEZONA, Paizão Coisinha e 99 % de seus descendentes são produtos do “eterno incriado”. O Eterno Incriado é criação para não se autodeterminar nunca. Essa criação está sempre sob comando quântico de seus criadores Ets que estão a monitorar a espécie Homo sapiens desde tempos antiquíssimos, que se perdem na memória de uma história inicial que jamais será recuperada por mentalidades primatas que não têm acesso aos registros mais antigos do “Tempo dos Sonhos”.
ESSAS PESSOAS todas vivem no mundo astral de eventos, palavras, registros akáshicos, pensamentos, emoções e intenções as mais variadas. Líderes irresponsáveis e psicóticos governam países, influenciam milhões de pessoas, por vezes bilhões, todas codificadas no plano etérico do DNA da espécie. Não têm pensamentos e vontade próprios. São condicionadas pelo “eterno incriado” de suas personas sempre em intercâmbio PSI. A confusão mental que esses líderes mundiais exercem sobre elas, fazem delas pessoas produtos de condicionamentos automatizados que geram o mundo tal qual você vê.
SUAS VIDAS passadas continuam a condicionar a existência presente que, por sua vez, condiciona a vida pessoal, familiar, social e planetária futura. São produto em série da memória vivenciada por incontáveis existências dos registros primeiros do DNA e do RNA, ácidos nucleicos de diferentes suportes e funções diversas. A humanidade, presumo, deveria ser orientada (educada) no sentido de Saber como acessar esses registros, de modo a vivenciar suas existências passadas e aprender com seus muitos erros. As questões estão todas lá. Nesses registros.
MAS O MEDO exponencial, e a intensidade descomunal de culpa que vem ao subconsciente do Peregrino, provenientes das vivências passadas, das fobias, da ansiedade, multiplica no navegante desavisado, a inquietação, onde prepondera a violência e a hostilidade. O ser humano então, motivado pelo horror e o terror, não se permite continuar a jornada do autoconhecimento. 90% deles desistem pressionados pelos temores da sombria jornada.
ESTE MUNDO não pode ser mudado por pessoas que não têm a coragem de prosseguir a viagem em direção ao autoconhecimento. A investigação até o âmago de si mesmo cobra o preço de uma coragem existencial que quase a totalidade dessas pessoas não possui. Que fazer então???
ENTÃO, COMO pode o mundo ser mudado se seus habitantes não têm ânimo pertinente a prosseguir a viagem??? Como pode o Peregrino ganhar coragem para destronar personagens totalitárias e perversas??? Criminosos como Trump, o Trambiqueiro, Putin, um criminoso de guerra ou Bozo, o psicótico Quixote atacador do moinho de vento das urnas eleitorais. Eles têm medo de enfrentar com coragem o caudaloso rio Tártaro, do submundo PSI de si mesmos.
FIGURAS À BEIRA-MAR — PICASSO (1931)
A ACEITAÇÃO de tudo como se tudo fosse certo, é certo??? Com você não há nenhum problema de adaptação às sociedades secretas das drogas, às práticas de sodomia, à aceitação da corrupção institucionalizada na família, no Congresso, nas FFAA??? Todas as misérias pessoal, familiar e social devem ser bem-vindas??? Essa aceitação incondicional de tudo que não presta, como se fosse a coisa mais natural do mundo do direito, do irrepreensível... Toda miséria é louvável???
TODA ESSA falta de pudor e vergonha na cara, nos corações e mentes, não está conduzindo rapidamente a espécie Homo sapiens à extinção??? Que memória juvenil e adulta aquelas crianças sodomizadas pela educação de Paizão e de sua mulher na zona familiar de acontecimentos perversos os mais deploráveis, está de acordo com os códigos de ética??? Estão ajustados os códigos jurídicos a esse modelo familiar e social educacional??? Já é hora de respostas a essas perguntas!!!
É PRECISO ESTAR atento e forte a esse estrupício educativo como se fosse ele o modelo nacional educacional irrepreensível. Como construir uma identidade de superação de uma cultura e de uma civilização entregues à própria desordem mental, social, familiar conjuntural??? Veja você, caro leitor, a quantidade demencial de artefatos nucleares à disposição da autodestruição da espécie. De sua espécie. Esses países detentores desse poder destrutivo não estavam sabendo seus cientistas, políticos, juristas, seus lojistas escondidinhos, que basta uma quantidade mínima dessas ferramentas de destruição própria e mútua, para sepultar toda a vida animal no planeta???
MAS A BOLSA de valores da desgraça planetária da espécie era, é, sempre será prioridade nesse convento de convenções deletérias??? Nesses Congressos e seminários de discutir o sexo dos anjos com justificativas de sobrecarga destrutiva e alienação pessoal, familiar, social, nacional, universal??? Que raios que o parta, caro leitor, está a acontecer com você, comigo, conosco, que não temos nenhum direito á posse de cada um de nós mesmos??? Não temos direito à vida conforme ela deveria ser???
DE QUE SERVEM todas essas cosmogonias que indicam termos sido criados por seres que não são deste sistema solar??? De que nos vale saber dos Alienígenas do Passado, se nosso presente está presentificado com essas realidades que sabemos??? De que nos valem os livros sagrados nos mostrando “A Gênese”, os pais primordiais da família mais antiga, Adão, Eva, Cain, modelo e arquétipo que nos confirma as ferramentas de autodestruição ou a extinção gradativa e moderada da espécie Homo, Homo sapiens???
NOSSOS CRIADORES nos criaram para sermos esses loucos que somos??? Já não é hora dos seres, dito humanos, se libertarem das correntes genéticas e começarem a fazer seu próprio torniquete, sua própria devastação??? A criação de valores e princípios segundo a intuição de que cada ser deve ser direcionado para uma conduta de humanização da espécie???
POR QUE BOTAR a culpa em Deus Et que nos criou??? É tempo de nos libertarmos dele enquanto tutor de nossas degeneradas e essenciais dependências. Não podemos nem devemos aceitar a continuidade de nossas taras. A verdade é que não podemos viver sem elas. Elas estão agregadas ao DNA, ao RNA da espécie zumbi e suas precariedades estruturais que nos condenam a ser e a viver num mundo descendente de assassinos primordiais, numa situação insuportável, cabulosa e prejudicial ao crescimento de uma mentalidade livre de tutores dedicados ao niilismo, e à devastação de valores e princípios sem os quais não somos nada mais que a ralé de um universo condenável.
AÍ´ESTÃO OS supremacistas querendo nos dizer que somos seus escravos e que eles nasceram para ser os donos do mundo. Os mentores fractais de um universo dominado por eles, os sujeitos, sicranos, sicários dos colonizadores Ets que nos criaram à sua imagem e semelhança. Somos uma espécie que não pode curar a si mesma a partir de uma condição submissa de mendicância natural desnaturada.
QUE TIPO OU modelo de energia quântica nos aciona, nos faz dormir e acordar de sonos os quais não sabemos que sonhos teríamos sonhado??? Quem nos controla de dentro dos espaços vazios de nossas células nervosas??? A aceitação de um sujeito da mais baixa qualificação de caráter... E o elegemos e aceitamos enquanto presidente da República. Seus muitos crimes de responsabilidade são automaticamente anistiados pelo PGR de coleira e o Qual ira, presidente da Câmara.
E NÃO PODEMOS fazer nada, apenas apreciar de dentro de nossos apartamentos e de nossas casas, a miséria de filosofia política e de ideologia, tomar conta de nosso mundo fantasmal. Onde está a janela que nos permita ter e gerir um lugar consensual, pacífico e organizado por cada uma vontade eleitoral livre desse tagarela rústico e bucólico, criado na cultura da caserna subdesenvolvida, que lhe deu guarita e da qual foi expulso. E ora ocupa o Planalto Central do Centrão. Até quando teremos resiliência para aturá-lo???
OS POLÍTICOS são oportunistas que se refletem no espelho das mais caquéticas personagens no mundo do poder. São metáforas encanecidas, por vezes de juventude aparente, perdidas na velhice de adereços e joias e roupas e ternos e gravatas em coquetéis oficiais. O efeito social é aterrador. É a grotesca aparência externa de uma respeitabilidade suposta, como se estivessem querendo esconderem-se de si mesmos em seus corpos de velhas sombrias e monocromáticas. Como se pudessem esconder suas intenções.
MEUS AVÓS, MEUS PAIS E EU — FRIDA KAHALO (1936)
TODOS ESTAMOS dentro de uma realidade astral. Impossível que alguém possa estar fora dela. O DNA e RNA estão nos motivando a levantar da cama ou do sofá da rede de intrigas, todos os dias. Todos os dias somos espectadores do besteirol dos programas de auditórios, os ditos de humor, dos noticiários trágicos que o melhor da imprensa televisiva nos fornece.
TODOS SOMOS leigos no conhecimento de nós mesmos. Somos pouco familiarizados com nossa essência. Talvez nem ainda saibamos mesmo se ela fundamenta o significado de nosso espírito. O que é nosso espírito, de onde vem, para onde vai quando a vida física se esgota??? Existe mesmo, de que é feito??? Inexperientes somos também sobre o significado do que é, realmente, sagrado, em todas as culturas, etnias e religiões.
COISAS SAGRADAS são dignas de respeito e veneração. O mundo não possui respeito nem veneração. Exceto pelas rotinas customizadas, adaptadas às nossas práticas, preferências, costumes e padrões. Os deuses Ets que nos deram origem interferem em proveito da melhoria de nossas vidas??? Mas há a crença de que “faz por ti e te ajudarei”. Nossas dificuldades são nossas. Tudo o que podemos fazer para nos comunicar com eles, ou com Ele, depende da fé que temos em nossas possibilidades.
A FILHA MAIS velha de Mãezona, a mana Wanja, escreveu certo dia uma carta em que dizia de sua descrença na vida, que se achava num fosso de falta de confiança em si, vivendo de inseguranças e incertezas. Resumindo: ela estava na fossa. O que é natural. Qualquer pessoa passa por um período, por vezes longo, de tristeza, abatimento, depressão. Casada com um primo de segundo grau, filho de um professor da faculdade de direito, ela mudou-se para outro estado, na extremidade nordeste do país.
ERA MÃE DE duas filhas. Na última vez que estive frente a ela, partícipe de uma comemoração onde me apresentava a amigos dela e do marido, fiz uma brincadeira, ao perguntar como era ser mãe. Ela que acabara parir uma menina. Se estava gostando de limpar o bumbum da criança e demais tarefas de amamentação e dona de casa. Ela levou o gracejo muito a sério. Revidou com um ataque histérico. Furiosa, começou a me agredir verbalmente. A acusar-me disso e daquilo. Aproximando-se de mim cara-a-cara.
EU JÁ ESTAVA farto de receber todo tipo de agressão familiar. De ser explorado pelos que eu deveria considerar irmãos, mas que realmente eram instrumentos da opressão que Mãezona e Paizão exerciam sobre mim. Sempre diminuído, preterido, excluído e esnobado por ser um estorvo, uma contrariedade no sentido que a pobreza familiar, as carências que eu ajudara a suavizar com as retiradas de minhas economias da caderneta de poupança que, por várias vezes fui instado a zerar em benefício deles. Sem nenhuma mínima retribuição ou agradecimento.
QUANDO A VI partir para cima de mim com a fúria da mulher ofendida, que havia superestimado uma recreação verbal, talvez de mal gosto de minha parte, encostando a cara em meu rosto, berrando insultos e provocações em altos tons, eu não vi outro modo de reagir, e reagi impensadamente com um soco na parte inferior de tórax do lado direito.
ELA, DE REPENTE, caiu em si. E logo mudou a cantilena ofensiva por um choro acusador entremeado por soluços cheios de “ai-ai-ais”. Minha reação, intensa tanto quanto tinha sido exagerada a reação dela a um motejo que eu queria que não tivesse tido essa consequência. Mas, como dizia um vizinho, eu, naquela casa estava num campo minado. Tudo que eu fazia, e o que não fazia, era imediatamente censurado. Quer por palavras, quer por silêncios acusadores.
ERA UM MOTE para Mãezona e Paizão Coisinha jogarem sobre mim, toda a sua costumeira baboseira de acusações, censurando minha atuação no evento. Se, no costumeiro e natural dos costumes caseiros eu já estava mais que estigmatizado, quando surgia uma oportunidade dessa, para eles era uma festança de acusações caladas, de admoestações e repreensões que, mesmo se não verbalizadas, era altamente ofensivas.
A FAMÍLIA TODA unida para fazer sentir-me mal, A pressão sobre mim tornava-se dia a dia cada vez mais insuportável. Nessas ocasiões eu não tinha uma alternativa senão me ausentar da proximidade deles, tamanha era a pressão da rejeição familiar unida para me excluir do convívio deles, até que eu me sentisse tão rejeitado, que tivesse de sair, fosse como fosse, da proximidade deles. O caro leitor já sabe das adversidades que teria de enfrentar na metrópole Rio de Janeiro. Em esquemas precários de sobrevivência.
O MOTIVO PRINCIPAL da rejeição familiar geral à minha pessoa, meu caro e raro leitor já sabe. Todos queriam me ver pelas costas. O que eu presenciara de absurdos moral, eles, por inteiro, tinham medo de que eu cumprisse minha promessa de um dia vir a revelar. O que estou a fazer agora. Eles acreditavam mesmo que a opressão sofrida por mim fosse tão devastadora, que eu jamais conseguiria me soerguer ou sublevar.
EU PRECISAVA sair de perto deles pela intensa e insuportável pressão psicológica. Não há ser humano que suporte uma agressão PSI coletiva, familiar, tão senhora de si, por muito tempo. Ela desnorteia, gera opressão mental, baixa autoestima, sensação intensa de isolamento dos mais próximos, todos esses sintomas agravados por saber que eu não poderia falar a minha versão da história. Eles nem pensavam em querer me ouvir. Estavam sempre prontos, meus julgadores implacáveis, a serem os juízes e, no tribunal familiar, jurados algozes e ferrenhos, inflexíveis.
PARA MIM, A zona familiar era realmente um lugar infernal. Eles nada mais admitiam de mim, senão completa submissão aos ditames da Mãe da Zona e de seu marido, um sujeito que já havia se transformado num cão sem dono, chutado e desprezado por todos, todo tempo. E que não tinha mínima moral para reagir ao desdém circundante. A hipocrisia reinava. Faziam de conta que não estavam a oprimi-lo. Faziam de conta que o respeitavam, quando a própria tonalidade de voz deles os traía. Paizão sabia a intensidade com que era desprezado como se não fosse. Mas ele, Paizão Coisinha, não passava de uma montanha de culpas.
MÃEZONA ERA uma espécie de cafetina sibilina. Ela sempre olhava para o outro lado, quando seus filhos, outrora, na velha casa, estavam sentados no colo de Paizão excitado sexualmente com o pinto duro no traseiro deles. Não havia penetração, mas o grau de excitação dele promovia orgasmos que infestavam a sala não apenas pelo odor, mas pelas marcas nas vestimentas, na calça de uso comum, ou na calça do pijama. Ela, nessas ocasiões frequentes, não estava a mais de um metro e meio da cena, silenciosa, sentada em frente à sua máquina de costura. Como se fosse uma esfinge semovente.
FUMAÇA SOBRE VALLAURIS — PICASSO (1951)
PASSADO O TEMPO passado, longe da agressiva demonstração de rejeição por parte da família de Mãezona, após voltar outra vez à Via Crúcis das agressões familiares no interior do larbirinto, após correr atrás da sobrevivência precária em empregos temporários no Rio de Janeiro, me chegaram às mãos uma carta de Wanja na qual ela dizia de sua intensa depressão. Não sabia mais o que fazer para se sentir melhor das ideias. Estava num período “down” de baixa autoestima. Estava a pedir atenção, afeição, socorro, pronto acolhimento.
EU HAVIA LIDO o livro do padre jesuíta Teilhard de Chardin, “O Fenômeno Humano”. Escrevi em resposta à carta dela que “não somos seres humanos passando por uma experiência espiritual. Somos seres espirituais passando por uma experiência humana”. Que estamos a cada dia mais nos aproximando da compreensão da complexa consciência que nos permite uma aproximação maior com nossa evolução: o “Ponto Ômega”, assim denominado por Chardin.
CHARDIN NESTE livro sobre a “História do Universo”, fornece uma visão desde o vazio ou Nada no passado mais remoto, até o despertar da consciência humana, ou “Ponto Ômega” no futuro. O poder de reflexão do ser humano que sabe harmonizar a Ciência, o conhecimento do mundo material, o pensamento cognitivo, racional, à interferência do divino, das forças sagradas e sobrenaturais citadas e consistentes na Teologia.
EU A CONFORTEI da melhor forma possível ao meu alcance. Ela em resposta ao feedback de minhas cartas, deu a impressão de que se recuperava de sua estadia no fundo do poço da fossa. Mas suas cartas eram entremeadas de outras que eu não compreendia, estavam cheias de coléricas insinuações que não estavam nítidas na intenção do que queria realmente dizer. Ela apenas sugeria, como se não quisesse ou não soubesse articular suas razões e apenas aludia a elas. Uma dessas cartas estava acompanhada de um livro: “O Príncipe das Marés”.
ESSE LIVRO conta a história da casa de uma família invadida por três fugitivos de uma prisão de segurança máxima. Os criminosos estupraram Lila, Tom e Savannah. Eles foram mortos porque Luke, o irmão mais velho, atirou neles com a espingarda do pai, matando-os. Enterraram os corpos e a mãe fez todos jurarem que não contariam a ninguém. Tom, o garoto estuprado, acreditava que os traumas subsequentes e conflitos familiares se deveram a essa ocorrência.
LILA, A MÃE, a menos afetada por ser adulta e ter o psiquismo mais bem preparado para reagir à situação de conflito, utilizou-se mais facilmente do mecanismo de negação e supressão do trauma no subconsciente, sem nunca aceitar falar sobre a nefasta ocorrência, visando a evasão da carga afetiva pesasse mais em seus descendentes.
SUSAN LOWENSTEIN, a psiquiatra interpretada por Barbra Streisand, também diretora do filme, ouve de Tom, agora casado com três filhos, o traumático episódio de sua infância. Objetiva com isso livrar-se e livrar Savannah dos demônios reprimidos em seu interior, por suas memórias sufocadas restritas a apenas eles, as vítimas do estupro. Ambos se tornam aliados, visando também libertarem-se de suas vidas frias e da indiferença em que estavam sendo sufocados. Afinal, Tom Wingo era um sujeito transtornado, ególatra, cínico, intolerante e ao mesmo tempo simpático, atrativo, amável.
ESTAVAM AMBOS empenhados em mudar a própria vida. O antagonismo entre eles virou amor. E desejam desbloquear a atormentada irmã de Tom do trauma que a atormenta na calada das noites mal dormidas. Falar da ocorrência era pior do que o acontecimento em si. Ter sido estuprado na presença do irmão mais velho era uma situação de humilhação e vergonha.
EU COMEÇAVA a compreender o porquê de Wanja ter escrito cartas em que me cobrava envolvimento com os traumas e personagens dessa história. Ela talvez estivesse querendo que eu admitisse ter sido estuprado pelo filho adamado da tia, irmã de minha mãe. Aquele rapaz que segundo a própria mãe, havia sido um garoto cheio de traumas e recalques por ter perdido o pai cedo, e ficado à mercê de uma mãe prostituta e doente, física e mentalmente. Forçado a trabalhar desde muito cedo, ele passou a mocidade submetendo-se às exigências e taras de seus superiores e chefes nos lugares onde trabalhou.
ELA, WANJA, estava comprando a história que Mãezona queria que todos acreditassem: que eu seria uma vítima de estupro e passaria a vida inteira pagando pelas adversidades do trauma recorrente. Ela, Mãezona e Paizão Coisinha, tinham a esperança de me ver desmunhecar como muitos colegas de escola faziam. Desejavam que eu me tornasse outro dos milhares de “homossexuais de boa família” que, uma vez cúmplices e camaradas, se tornassem uma ponte para a infiltração de seus outros filhos na sociedade Sodoma das influentes famílias da capital do Piauí.
TODOS OS MEMBROS da família estavam subliminarmente orientados a acreditar que eu seria, em futuro próximo, o passaporte deles para a entrada no circuito da sodomia familiar mais ampla, geral e irrestrita, característica da sociedade nordestina e brasileira dos desmunhecados com virilidade comprometida e salvo-conduto para brilhar nas colunas sociais, ou em algum grupo ou banda de músicos e cantores da música popular brasileira. Quem sabe eu facilmente teria meu lugar garantido entre o “cast” de atores da Globo, ou nos elencos das novelas na programação do “tio” Sílvio.
MÃEZONA E PAIZÃO Coisinha condenavam não apenas minha infância, mas as consequências dela em minha juventude. A memória traumática de todos os horrores presenciados e terrores vividos, ainda permanecem vívidos em minha memória. Não foi fácil sair em direção às praias de sol do litoral sudeste e nordeste, como se fosse membro da família “hippie” nacional. Minha família foram os amigos de Estrada. Aqueci-me com as garotas também malbaratadas por suas famílias. As famílias que o Bozo e seus sátrapas milicianos defendem.
MINHA IRMÃ WANJA com certeza queria que eu me declarasse mais outro membro castrado da conspiração adamada familiar da qual era parte. Como diria Wilhelm Reich: a falsidade, a mentira, o medo, a trama maldita de uma sociedade familiar que torce a espinha dorsal moral de suas crianças, mesmo antes que elas aprendam a caminhar...
TALVEZ ELA pensasse e agisse culpabilizando-se e me estigmatizando ao mesmo tempo, com o insulto de suas insinuações, como se eu fosse outra vítima da pedofilia paterna. Outra vítima desse genocídio infanto-juvenil de uma geração de homens e mulheres castrados em suas sexualidades de gênero. Cara irmã, se você me estiver lendo saiba: não é fácil para ninguém sair da gaiola das loucas em que fomos criados. Creia. Tenha fé. É quase impossível. Mas, quem sabe você chega lá.
UNTITLED — WARHOL & BASQUIAT (1984)
O GRANDE PROBLEMA dessas crianças traídas, das pessoas da família de Mãezona e de seu marido pedófilo, que “educaram” Wanja e seus outros irmãos, é que todos eles, talvez haja outra exceção, queriam um conforto verbal que me integrasse à aceitação passiva da política familiar de necessidades materiais escancaradas, por isso mesma chegada às sessões de pedofilia paterna. Eles faziam parte de uma comoção familiar que testemunhava um massacre e dele fazia parte. E dele se ufaneava. As supostas mulheres de Theresienstadt são fanáticas por conseguir empoderamento sexual.
PERCEBI O QUE significavam as cartas de Wanja, de agressões entremeadas de argumentos confusos que exigiam de mim que eu desse conta de uma conduta de orientação afetiva por pessoas do mesmo sexo. Conduta que sua prima sapatão, a Terezona, já havia cooptado sua irmã Dulce IT, “A Coisa”, para sua companheira de folguedos nas camas dos motéis nas periferias da cidade verde.
CIDADE VERDE em tudo. Principalmente na compreensão de si mesma: suas taras, suas caras, sua pobreza radical, sua ignorância fundamentada em tradições familiares de há muito suprimidas de qualquer código ético ou moral. Erguidas sobre um conservadorismo de fachada. Hipócrita em todos os sentidos. Explorada por uma política genocida que educa suas gerações para as drogas e a prostituição. Para a adaptação dos corpos de crianças e adolescentes, às exigências dos barões do dinheiro do crime organizado.
WANJA ACREDITAVA mesmo, ou fingia acreditar que eu havia sido sodomizado pelo irmão da prima Terezona, a sapatão chegada à Dulce IT, “A Coisa”, quando da estadia de Mãezona e Paizão Coisinha no turismo precário que fizeram no Rio de Janeiro. Suas cartas, para mim inexplicavelmente agressivas, desde que eu a estava contribuindo para que ela saísse de sua crise, de uma fossa que parecia não ter fundo de poço. Mas, ela simplesmente queria me cooptar à participar da “teoria da conspiração” familiar e social, que me estigmatizava como sendo outra vítima do Inconsciente Coletivo da Cidade.
DESEJAVA ELA QUE eu admitisse fazer parte do gueto Theresienstadt, ou campo de concentração estabelecido na cidade de Teresina. Campo de concentração onde vivia a família sodomizada. A cultura política, social e econômica da sodomização generalizada. Dos corações das mentes sodomizados desde a mais antiga antiguidade. Wanja me queria admitindo ter sido vítima, tal qual o menino que um dos três assassinos fugitivos do presídio do livro “O Príncipe das Marés”, havia abusado sexualmente.
ESSE SUFOCO emocional, essa adversidade que as pessoas sodomizadas passam para todas as outras pessoas de seu convívio, é a necessidade de não estarem a se sentir sozinhas em sua confusão mental, em seu estado de padecimento psicológico, anímico. Elas não têm coragem de se revelarem vítimas de sodomia. É no lar, com irmãos, parentes, primos, tios, pais, vizinhos, adultos frequentadores do ambiente familiar. É a síndrome da imaturidade emocional crônica decorrente de ter passado por momentos de sujeição às taras do abusador. A vergonha é tamanha que o abusado não quer recorrer nem ao socorro de um psicólogo ou psiquiatra. Comportamento este que só confirma que ser abusado sexualmente é uma coisa muito aflitiva e molesta.
A SÍNDROME DA imaturidade emocional crônica pode se estender em direção ao transtorno de despersonalização. Nela a pessoa vitimada se sente, constantemente desconectada: quer do corpo quer dos pensamentos. A pessoa sodomizada, presumo, está sempre a temer a rejeição das demais, ou, ao contrário, desenvolver sintomas evidentes de estar sempre a querer cuidar de outros. E até mesmo sentir simpatia por seu agressor.
QUE WANJA SOFRIA em decorrência da pedofilia do pai, isto eu sabia. Mas, não tinha ainda a certeza de que ela fazia parte do Inconsciente Coletivo Familiar e Social de uma cidade e de uma sociedade sodomizada que não admite que nenhum de seus membros possam estar livres da síndrome de imaturidade emocional crônica (sodomia).
A LÓGICA É A seguinte: se os barões da sociedade e seus grupos de dominação financeira e econômica, seus grupos de dirigentes políticos que detêm em suas posses a maior parte da riqueza social, os demais membros dessa sociedade, subordinados às necessidades da sobrevivência e de emprego, tendem a ceder às exigências deles. Ora, se os filhos destes já se entregaram a essas práticas, e muitas vezes, eles mesmos, por que então aceitariam que pessoas outras não se envolvessem nelas???
LEMBREMOS QUE OS sodomitas mencionados no Antigo Testamento não livravam a cara de ninguém que entrasse nas cidades de Sodoma e Gomorra ou nelas habitasse. As cidades de Sodoma e Gomorra situados próximas ao Mar Morto, foram destruídas pelo fogo devido a seus habitantes desejarem prender pelo rabo ou sodomizar os anjos Gabriel e Miguel indicados pelo Deus Et para conduzir a família de Ló para o mais distante possível da região, de modo a não serem carbonizados pelo fogo que cairia do céu.
OS SODOMITAS do século XXI não livram a cara nem dos próprios filhos. Tal como acontecia na narração bíblica: Gênesis 19. Dezenove: para o bom entendedor...!!! Se seus pais não as protegem, nem as instituições religiosas, nem as leis brandas contra seus criminosos podofilos, quem mais as protegerá???
O SANTUÁRIO DA MEIA-NOITE — PLAYSTATION STORE (2018)
O TRAUMA NÃO apenas paralisa a vida mental e emocional de uma pessoa. Sua própria realidade perde a motivação de ser. A vítima de opressor sexual pode perder o interesse por si mesma, pelo conhecimento, pelas artes, pela criação de hábitos de sociabilidade, por se relacionar com a complexidade do mundo. Pode passar a vida a transferir para outros, a morbidez com que passou a se ver.
O PENSAR SEU próprio tempo passado, presente, futuro, perde-se no desinteresse. Não poucos traumatizados por pedofilia ou violência sexual quando criança, ao atingirem a mocidade, mantêm por muito tempo um sentimento de derrota, apreensão, culpa, irritabilidade, orfandade. A cognição fica nublada, alterada, fraca. O medo da não definição da própria sexualidade gera alterações generalizadas: distúrbios digestivos, melancolia, pesadelos, insônia.
UM PAI PEDÓFILO é, inicialmente, um criminoso perverso. Uma mãe conivente é, principalmente, uma aberração, teratologia sobrenatural da natureza desumana. Por que filhos aceitam tanto tempo a subordinação mórbida familiar??? Porque filhos têm medo. Filhos são seres pequenos em tamanho. Não têm forças para reagir ao assédio e ao abuso sexual de adultos. Um déspota familiar adulto faz de conta a que não sabe estar agindo adverso e contrário às leis da religião, da natureza, da mais superficial intuição.
QUEM, EM SÃ consciência poderia dizer que esse casal de pedófilos não sabia o que estava a fazer??? Os crimes que estava a cometer??? Os pedófilos mais cínicos, tartufos debochados e petulantes, dizem que amam todas as crianças, sentem-se como se ainda fossem crianças. O “pacto satânico de Roma” congregou religiosos e orientou famílias à prática da pedofilia materna, paterna, da parentela criminosa.
DESCONFIA-SE QUE instituições tais como a “Opus Dei” tenham fechado os olhos da alta hierarquia vaticana, abrindo janelas para que o tsunami de padres, sacerdotes, presbíteros, eclesiásticos, bispos, arcebispos, clérigos, párocos, vigários vigaristas e priores, pudessem estar à vontade em suas atividades pedófilas. Traindo os princípios da moral, piedade e compaixão cristã. Em Mateus 18:6 lemos: “Mas, qualquer um que escandalizar um destes pequeninos que creem em mim, melhor lhe fora que se pendurasse no pescoço uma mó de azenha, e se submergisse na profundeza do mar”.
10. — “Vede: não desprezeis algum destes pequeninos, porque eu vos digo que os seus anjos nos céus sempre veem a face de meu Pai”.
11. — “Porque o Filho do Homem veio salvar o que se tinha perdido”.
12. — “Que vos parece??? Se algum homem tiver cem ovelhas e uma delas se desgarrar, não irá pelos montes após abandonar as noventa e nove, em busca da que se desgarrou”???
13. — “Se porventura achá-la, em verdade vos digo que maior dedicação terá por aquela, que pelas noventa e nove que não se desgarraram”.
14. — “Assim também não é vontade de vosso Pai que está nos céus, que um destes pequeninos se perca”.
15. — “Ora, se teu irmão pecar contra ti, vai e repreende-o entre ti e ele só. Se te ouvir, ganhaste o teu irmão”.
16. — “Mas, se não te ouvir, leva ainda contigo um ou dois, para que, pela boca de duas ou três testemunhas toda tua palavra seja confirmada”.
17. — “E, se não escutar, dize-o à Igreja. E, se também não escutar a Igreja, considera-o gentio e publicano”.
18. — “Em verdade vos digo que tudo que ligardes na Terra será ligado no Céu. E tudo o que desligares na Terra será desligado no Céu”.
19. — “Também vos digo que, se dois de vós concordarem na terra acerca de qualquer coisa que pedirem, isso lhes será feito por meu Pai, que está nos céus”.
20. “Porque, onde estiverem dois ou três reunidos em meu nome, estou eu no meio deles. — (Mateus 18:10-20).
IRONIA DO POLICIAL NEGRO — BASQUIAT (1981)
EU ESTAVA FRENTE ao noticiário vespertino da Globo quando o garotinho, filho do então tenente PM, o Fulano que mais gostava, quando criança, do colo de Paizão, aproximou-se de mim e ficou a repetir:
— “Deslaçado, desglasxado, desgraxado...”. Eu logo compreendi. A criança estava a repetir o que o pai, coronel PM Fulano, ordenou que me dissesse. A mãe do garoto ouviu a lenga-lenga do filho e chegou até a sala repreendendo-o:
— Menino, pare com isso. Ela reprimia o filho com voz alterada, e estava prestes, talvez, a dá-lhe uns tapas. Eu intervi, dizendo.
— Não é nada, não é nada, é só uma criança, não precisa bater nele. Ela respondeu:
— Foi com certeza o pai dele que o levou ele a fazer isso. Virando-se para mim disse:
— Desculpe, essa criança não teria tomado essa iniciativa se não fosse de mando do pai. Desculpe. E pegando o garotinho pela mão conduziu-o até a cozinha. Mãezona tinha ouvido tudo. Ela estava em companhia da mãe do garoto, mas fez-se de ouvido mouco. Mãezona nunca reprimia ninguém que tomasse a iniciativa de, de alguma forma, dirigir-me agressões.
MÃEZONA CHEGOU do meu lado, como se não tivesse acompanhado o palavreado do neto, dizendo, como se surpresa:
— O que foi, que aconteceu??? Respondi, mesmo sabendo que ela tinha ouvido tudo. Afinal, dela não escapava nada do que acontecia na casa, mesmo que não estivesse presente. Respondi, para não encompridar a conversa:
— Não foi nada não, coisa de criança.
O FEDELHO NEM sabia articular direito as palavras. Ele queria dizer “desgraçado”. Tal como seu pai havia dito que ele dissesse. O tenente PM, que, quando criança tinha, talvez, promovido mais orgasmos em seu bumbum do que a própria mulher de paizão nela, estava fazendo o jogo das agressões rituais à minha pessoa. A mim, o “bode expiatório” da família. O filho primeiro que deveria contentar-se em “se sacrificar pelos irmãos menores”. Era dessa forma que ela direcionava cada um e todos os irmãos em meu desfavor. Afinal, eles eram pessoas, filhos e filhas facilmente influenciáveis.
A MÃE DA ZONA familiar pouco se importava o quando doía em mim estar sistematicamente sendo boicotado por ela. Seu tinha em mente que ela me polarizava contra meus irmãos e irmãs porque tinha necessidade de manter a autoridade familiar dela e do marido. Que eu era, por minha simples existência, o fator desagregador familiar. A ela e ao marido não importava minimamente o quanto essa estratégia familiar mórbida me humilhava e oprimia.
A FARDA DO TENENTE exercia grande influência sobre ela. Ela tinha medo da autoridade que o traje militar representava. Ela tinha o soldadinho na palma da mão, mas o uniforme era para ela um fator de respeito e temor. Afinal, não tinha sido o ditador alemão da década de 30/40, o militar responsável pela liderança da Alemanha nazista??? O déspota que representava os grandes heróis do passado ariano da super raça à qual ela também acreditava que pertencia??? Seu sobrenome alemão lhe dizia que sim.
O TENENTE CUMPRIA obrigação diária na unidade militar conhecida por força de segurança do Palácio do Governo. Ele tinha excessivo respeito, eu diria mesmo, excessiva admiração por um governador que estava enredado por muitos deslizes de conduta nos esquemas denunciados de corrupção governamental. Mas, o tenente não poupava argumentos em favor do governante. Afinal, ele estava a cumprir o papel dele. Fazia parte da casa militar do Palácio de Karnak.
ESSE MEU IRMÃO, nesses parágrafos chamado Fulano, estava vivendo as sequelas do período de submissão às relações doentias de Paizão com seus filhos menores de idade. Acredito: ainda hoje, décadas e décadas após esses eventos mórbidos, todos os seus filhos, conscientes ou inconscientemente, estão sob a guarita enfermiça, patológica, sequelas das investidas de Paizão Coisinha em seus bumbuns infantis.
EU ME DIRECIONEI, certa vez, quando geria uma agência de publicidade e propaganda que mantinha com um sócio, até a casa militar do Palácio do Governo, para solicitar dele que facilitasse meu acesso ao Gabinete do Governador. O objetivo estava em mostrar uma campanha de publicidade envolvendo várias mídias de propaganda, campanha essa que promoveria para todos os demais estados brasileiros, o Parque Nacional Serra da Capivara, unidade de conservação da natureza que ocupa sítios nos municípios de São Raimundo Nonato, Brejo do Piauí, João Costa e Coronel José Dias.
O PARQUE NACIONAL da Serra da Capivara é a maior e mais antiga concentração de sítios pré-históricos da América. Mas, havia um empecilho: no Piauí tudo e todas as coisas são por demais controlados pelos filhinhos de papai. Os filhos e filhas de políticos que roubam as ideias de quem quer que seja que as apresente à uma das muitas secretarias de governo. Eu nunca vi com simpatia uma aproximação com essas pessoas e seus interesses pessoais que extrapolavam de dentro delas em seus olhares, em suas falas, em seus gestos. Faltava nelas certa simpatia pelas ideias. Talvez porque nunca tivessem nenhuma.
SEMPRE TIVE dificuldade em lidar com essa gente fina que trabalha nas burocracias governamentais, protegida pelo nepotismo. Os filhos de pais, parentes e outros conhecidos políticos. Essa gente fina, a começar das pernas, que não possui cultura, exceto aquela, da disposição de roubar covardemente a quem quer que seja que não se afine com suas afinidades eletivas. Nepotismo que explora a atração e a fusão de corpos por quem se afirma disposto a se envolver com suas carências e interesses financeiros, emocionais e econômicos. Eu nunca tive nem nunca terei tal disposição.
O IMPOSSÍVEL — MARIA MARTINS (1945)
AS PROVAÇÕES E obstáculos logo-logo e de há muito se apresentavam. A cultura política selvagem, sem educação formal ou informal pertinente à avaliação da realidade dos menos favorecidos, limitada pelos muros erguidos na mente pessoal, familiar e social pela ignorância intelectual deliberada, pelos privilégios do capitalismo suburbano dos caipiras armados das sociedades secretas que dominam os destinos da cidade, que se querem detentores únicos das capitais do país e de seus governantes insensíveis a qualquer “estranho” que não seja um indivíduo disposto a jogar o jogo sujo deles... Somados todos essas correlações, a resultante é a sociedade mefistofélica em que todos vivemos. Ou sobrevivemos. Sociedade hipócrita, sem nenhum interesse em cultura literária, e em educação formal ou informal, de modo geral.
ESCOLAS E UNIVERSIDADES não têm como ensinar o autoconhecimento direcionado para a superação das limitações impostas a seus membros. Minha memória familiar não é fácil de lembrar. As manifestações familiares de rejeição, confirmadas todos os dias, as projeções silenciosas de suas neuroses e traumas dirigidas à minha mente, doíam. Para fugir desse hospício que era o Inconsciente Coletivo Familiar, eu escrevia, versificava historinhas, narrativas que logo eram esnobadas por Mãezona. Sempre me dissuadindo a não as escrever. Quando deveria incentivar-me.
EU ESTAVA NUM “beco da fome sem saída”. A rejeição familiar possui um efeito mais devastador que o ruído ameaçador de meteoros caindo sobre a Terra. Ou de grandes ondas de um tsunami a devastar as construções próximas às praias. Inútil todo meu esforço para me estabelecer com minha Agência de Publicidade. A inadaptação às conveniências das exigências burocráticas. A não aceitação de minha formação pessoal, de meu intelecto, de minha visão de mundo, de minha cultura abrangente nas artes da leitura literária, da dramaturgia, dos movimentos artísticos da virada do século, XIX/XX:
NADA DISSO aquela sociedade dedicada unicamente a trabalhar a sobrevivência e a valorização do salário e do dinheiro ganho em atividades associadas ao crime organizado..., que tinha eu a dividir com eles, seus membros??? Que tinham eles a dividir comigo??? Se eu aderisse às suas solicitações, quaisquer que fossem, eu estaria a cometer suicídio moral. A imensa rede da aranha negra, a invisível teia secreta de suas afetividades e demais interesses de rotina, não me interessavam. Exceto ganhar minha sobrevivência.
SOBRE VIVER: mas, os membros dessa sociedade querem sobreviver em meio às exigências familiares do capital de consumo, do supermercado, das diversões do sofá, em meio a uma realidade familiar e social direcionadas exclusivamente à satisfação da gula, da luxúria, da ira, do entretenimento que alimenta a cultura da banalidade.
TODOS OS MEMBROS dessa enorme confraria se julgam mais realistas do que o Rei dos Reis. Aquele, que ensinou o caminho do gólgota enquanto rito de passagem para o aprendizado do saber-se e do saber exercitar a compaixão pelas realidades divergentes dos outros membros da família, dita humana. Eles querem seguir o caminho da lei do menor esforço. Pulam na jaula do zoológico em que nasceram e cresceram prisioneiros. E continuam a pular de um lado para outro, de um emprego para outro, de uma relação íntima para outra, de uma conta bancária para outra, de um celular para outro. Dentro da jaula existencial a conjuntura formal não muda, é sempre a mesma.
PARECEM NÃO saber que de um galho da mesma árvore para outro, não há mudança de expectativas. A paisagem interior, a paisagem emocional vai ser sempre a mesma. Parecem desconhecer a realidade primária de que a mente é como um paraquedas: só funciona quando aberta. E jamais poderão abrir a própria mente às demais janelas do conhecimento e do autoconhecer-se, se estão associados à realidade única da Idade das Cavernas: caçar emprego, obter salário, ir ao supermercado, cozinhar ou solicitar entrega delivery de refeições, plugar-se na telinha da Tv ou do celular. Fazer o que chamam de amor, divertir -se com a programação demencial na sala de jantar.
QUE PODE esperar uma sociedade de membros educados no colo do Paizão???? Sob o comando, comunicação e controle emocional próximo e à distância de Mãezona??? Certa vez me dirigi até a Companhia de Guarda do Palácio de Karnak. Lá estava meu irmão sentado, todo orgulhoso de sua farda e de seu salário.
A CONSTRUÇÃO DE um futuro numa sociedade de interesses comerciais, financeiros e econômicos, sempre em dinâmicos conflitos??? Ao dela participar, eu teria de me envolver com esses interesses que não eram os meus. Se eu fizesse o jogo rotineiro do relógio despertador e suas exigências de fazer do outro dia, outro dia sempre igual, com o café da manhã sempre pontual, com beijinhos sabor hortelã, e um “bom dia” não mais nem um pouco natural, sabendo-se que o mais que poderá conseguir é um engarrafamento de fim de semana no asfalto a caminho da praia de compra cabana???
“QUEM ESTÁ NA chuva é pra se molhar”. Eu não tinha como sair da precária situação de dependência emocional de uma mulher empoderada por uma natureza fanática, que se fortalecia a cada parto com outro filho usado para aumentar seu empoderamento, seu conhecimento de como se desenvolvia um ser, dito humano, em seu ventre, de como era gestado por nove meses, até que ela parisse outro que, possivelmente, ela saberia dominar completamente como se fosse um boneco ou uma boneca de feira familiar.
NINGUÉM NUNCA questionava os absurdos que eram impostos a todos por uma educação sem a intenção de educar, mas de adaptar a todos às suas deficiências: as dele, Paizão Coisinha, e as dela, Mãezona, fanática por dominação emocional totalitária dos filhos. Ela não admitia a menor crítica a seus absurdos. Ela, para ela mesma, era o ser perfeito, que havia parido descendentes para serem seus sonâmbulos dormentes. Até que adquirissem a idade adulta, em que ela não mais se responsabilizasse por nada do que lhes aconteceria. Até lá, a maioridade deles, ela teria se safado da responsabilidade de deseducá-los. Que então, eles vivenciassem o horror de sua deseducação.
A NOITE CONSTELADA — VAN GOGH (1889)
EU ESTAVA A conversar com o agora major PM na Companhia de Guarda do Palácio do Governo. Visava obter a entrevista com alguém do Gabinete do Governador para expor as ideias e o alcance delas na promoção do turismo arqueológico. Eu estava querendo entrar na luta pela preservação do Parque Nacional da Serra da Capivara. Incentivar o turismo local através da propaganda, o estudo das normas estruturais da vida social primitiva. Suas diferenças simbólicas: linguagem, relações econômicas: arte ciência, religião. O irmão PM da Companhia de Guarda seria o contato que me permitiria acesso à burocracia do Secretaria competente, talvez com o aval do governador.
NIÈDE GUIDON, arqueóloga franco-brasileira com especialização em culturas pré-históricas, estudiosa da arqueologia no interior do Piauí a partir da década de setenta, tinha contribuído para a criação do Parque Nacional da Serra da Capivara. Não era benquista pelos políticos da cultura conservadora e reacionária piauiense porque havia se formado na USP, considerada uma universidade de esquerda. Sua tia tinha um amigo que era general naqueles dias de chumbo da ditadura militar. Ele a havia alertado para que Niède desse o fora do Brasil logo, urgente. Ela estava prestes a ser presa.
POR QUÊ??? A maré não estava para peixe. Na década de sessenta na USP, professores deduravam alunos. Discentes deduravam docentes para obterem vantagens, as mais diversas. Niède tinha passado num concurso para docente na Universidade de São Paulo. Alunas que ficaram colocadas aquém dela para provimento de cargo de Professor de Magistério Superior em caráter efetivo, a acusaram de subversão, visando ficar em seu lugar, uma vez que ela fosse detida pela repressão em tempos de chumbo da ditadura. A “Noite Estrelada” de um tempo pessoal, familiar e histórico sombrio. As trevas dominavam o país no qual pontificava o totalitarismo. Agora eu sabia também o que sentira o pintor holandês Van Gogh quando pintou o quadro “A Noite Estrelada”.
A CAMPANHA de publicidade que eu criara estava, à priori, supostamente minada, porque Niède Guidon havia sido acusada de subversão por pessoas interessadas em tomar seu lugar preferencial no concurso para o corpo docente da USP. Meu sócio na Agência de PP&RP havia me alertado para esse evento. Resumindo: não houve simpatia da secretaria de governo que poderia conceder aval para promover o turismo, em caráter nacional, divulgando o roteiro de viagem pelo Piauí, para pessoas que se interessassem em decifrar, discernir e estudar os sítios arqueológicos do Estado do Piauí.
ANTES QUE ME roubassem a ideia da campanha e seus desdobramentos, recolhi o portfólio dos trabalhos de criação exibidos às pessoas que se mostravam interessadas apenas em ficar com as peças publicitárias, sem sequer passar recibo das mesmas. Quando cobrei dessas pessoas que no protocolo de recebimento fossem enumeradas as peças publicitárias, elas logo me disseram, revezando-se em argumentações tipo:
— “O protocolo menciona o recebimento da campanha. Isso deve bastar”.
— “Somos uma secretaria de governo, não vamos nos apropriar indevidamente dela”.
— “Se você quiser que o secretário avalie, o recibo é esse. É assim que funciona”.
É MUITO, MUITO desgastante trabalhar com pessoas de uma burocracia tão “honesta”. Na verdade, minha Agência investiu capital em anúncios assinados pelo Governo do Estado que ainda hoje, décadas e décadas depois, ainda não me foram pagos. A exemplo de anúncios de página inteira, publicados em jornais de Teresina, sobre a entrega das obras de restauração da Igreja de São Benedito, na Praça da Liberdade, s/n, centro da capital, próxima ao Palácio de Karnak.
AS SECRETARIAS de governo no Piauí, acredito que em todo o Brasil, funcionam à base de aparências. Não há transparência mínima em seus argumentos e relacionamentos com pessoas que não fazem parte, diretamente, do nepotismo nelas vigente. Se você não é parente próximo do governador ou de um de seus sicários políticos, nem tente trabalhar para eles. É prejuízo na certa.
POSTERIORMENTE a esses eventos, que, somados os problemas de comunicação difícil, terminariam por inviabilizar minha empresa, estava eu a solicitar ao irmão oficial PM da Companhia de Guarda do Karnak, uma bolsa de estudos para a filha de uma mulher de meu conhecimento. Ele também era sócio-diretor de um colégio de nome Sapiens, nome esse roubado de um livro de minha autoria chamado Mama Nordeste (Infanticídio). O então major falou que se havia esgotado o período de cessão de bolsas de estudo. Mesmo aquelas parciais, em que o aluno paga uma parte da mensalidade.
A MÁ VONTADE dele para comigo, fosse em quaisquer circunstâncias, era óbvia. Certa vez meu carro estava ameaçado de ser rebocado por PMs do serviço de trânsito local. Solicitei que esperassem enquanto eu telefonava para o então coronel PM. Eles depois me disseram que, ao contrário de minha solicitação que resolvesse o problema, ele, coronel disse que levassem de reboque o carro:
— “Para que ele aprenda a lição e esteja em dia com a documentação do carro”.
ESSE COMPORTMENTO se repetiu em outras ocasiões semelhantes. Era uma conduta familiar cristalizada: nenhum daqueles que eram meus irmãos de sangue, eram meus irmãos na compreensão e no companheirismo. De repente adentrou a sala em que estávamos o famoso criminoso PM, o coronel José Viriato Correia Lima, que por mais de duas décadas chefiou o crime organizado no Piauí com mão de ferro e de sinistra memória coletiva. Todos tinham medo dessa aberração de farda.
EMPRESÁRIOS, POLÍTICOS, juízes, eram vítimas de chantagens, extorsão, sequestros e assassinatos. Todos em seu entorno mais próximo eram policiais militares. Por cumplicidade e medo, o coronel Correia Lima tinha apoiadores em todos os poderes: Executivo, Legislativo, Judiciário e na imprensa marrom. O promotor Afonso Gil, o Ministério Público Federal, o juiz federal Rui Costa Gonçalves, assim como a pressão da sociedade, agiram no sentido de que fosse preso e terminasse a onda macabra de seus muitos crimes. O governador Mão Santa decretou sua prisão administrativa.
OS OFICIAIS PM que estavam na sala, rapidamente levantaram-se afetadamente, de supetão, fazendo continência numa atitude exagerada de medo e respeito, retesaram-se rígidos na presença do coronel Correia Lima que tinha adentrado a sala. Meu irmão era um dos mais afetados. A emoção dele foi tão grande, que as lágrimas saíam dos olhos a escorrer nas faces. Ele olhou para mim e falou que eu me levantasse. Depois pediu para que eu batesse continência. Ora, eu não era militar, tinha passado muito tempo fora do Piauí, e do coronel criminoso eu conhecia apenas pelos comentários e as notícias de seus covardes e hediondos crimes.
LEVANTEI-ME A SORRIR das atitudes afetadas, tanto de meu irmão quanto dos demais oficiais PM presentes na sala naquele momento. O coronel Correia Lima apenas olhou a todos detidamente, como se prescrutasse as atitudes deles, a buscar, talvez, uma motivação para quem sabe ao certo, monitorar o ambiente. Após trocar algumas poucas palavras com um dos oficiais PM, ele saiu rapidamente, tal como entrou.
PESSOAS VÍTIMAS de assédio sexual e/ou pedofilia têm, na minha compreensão dos fatos, uma espécie de subordinação emocional intensa. Uma vontade de obedecer e de ser subalterno às autoridades, civis ou militares, de modo geral essas pessoas parecem ser mais vulneráveis do que as demais. Não exercitam o espírito crítico, a atenção aos preceitos de moralidade. “Minha honra é obedecer”: pareciam dizer aqueles PM na sala na Companhia de Guarda do Palácio do Governo. “Minha honra é obedecer” era lema/slogan das SS nazistas.
AS PESSOAS, OS brasileiros, estão envolvidos numa nuvem bio-químio-cibernética de memorização astral. Todos nascemos no mundo físico e ao mesmo tempo sutil do astral. Nele vivenciamos os sentimentos, emoções e a sensibilidade direcionada, da qual é parte integrante o ambiente planetário em sua totalidade. Não é preciso estar fora do corpo físico para estar no astral. A mente consciente faz parte dele, astral. Isto é ciência: conhecimento prático sistematizado. Nosso conhecimento está estruturado através do corpus organizado de pesquisas.
O ANJO DA LAREIRA E DO LAR OU: TRIUNFO
DO SURREALISMO — MAX ERNST (1937)
NO CONTEXTO acadêmico “corpus” significa o conjunto de documentos e experimentos sobre certo enunciado, proposição ou argumento. A ciência traduz-se em conhecimento e prática sistemáticos. A bioquímica = química aplicada à biologia, é uma área interdisciplinar que pode ser aliada ao estudo da cibernética em ambientes e contextos de compartilhamento celular, viral e psi-fisiológico. Envolve o estudo de moléculas de diversas dimensões: as de proteínas, enzimas, carboidratos, lipídios, ácidos nucleicos, vitaminas, alcaloides, terpenos e íons inorgânicos.
A CIBERNÉTICA foi definida por Norbert Wiener em 1948, como sendo “o estudo científico do controle comunicação no animal e na máquina”. Ela cibernética, nasceu em 1942, estimulada por Wiener e Arturo Rosenblueth, tendo por objetivo “desenvolver uma linguagem e técnica que permitam afirmar o comando, o controle e a comunicação de homens e máquinas em geral, ou os fenômenos internos e externos nos sistemas mecânicos, máquinas, autômatos e seres vivos”.
ESTE LIVRO É uma tentativa de estudo da máquina humana no contexto de uma sociedade gerida por primatas e suas limitações moral e intelectual. De como o atraso mental emocional em seres nascidos de mulher, pode criar condições de degradação pessoal e coletiva que resultaram na viabilização do Homo sapiens sapiens enquanto espécie em franca extinção. As crianças devolvem, quando adultas, a linguagem com que foram instigadas na infância. Por isso não poucas dessas crianças estão precipitadas numa redoma adulta insana que, talvez, não as permita crescer jamais.
O CORONEL PM, aqui denominado Fulano, sempre me chamava de “Baixinho”. A mim com meus 1,87 de altura. Por quê??? “Baixinho” na gíria mexicana quer dizer “El Chapo”. Famoso traficante de drogas mexicano. Ele, grande admirador de outro coronel PM, o preso recentemente beneficiado com a saída temporária do Dia dos Pais, apesar de condenado a 129 anos de prisão. Está soltinho da silva.
O MINISTÉRIO Público e a administração penitenciária do governo federal do presidente Bozo Bolsonaro e do governo estadual do PT promoveram, direta ou indiretamente, a soltura dessa teratologia militar. Em 2020 resolveram “ressocializar” o criminoso preso em 1999, após ter cumprido 21 anos, sete meses e dez dias de encarceramento. O coronel solto é um desatinado que não pode ser ressocializado, simplesmente porque nunca foi socializável. O coronel Correia Lima chefiava, aos 27 anos, o crime organizado que, por décadas de barbaridades apavoraram a população militar e civil no Piauí.
POLÍTICOS, POLICIAIS, empresários, juízes e promotores públicos, estavam, em grande parte, sob o comando, comunicação e controle do terror por ele promovido no Estado. Mesmo depois de reformado continuou a comandar a PM do Piauí, mantendo estreitas relações de interesses com dois ex-governadores do Estado do Piauí. O envolvimento destes, não foi tipificado enquanto cúmplices de Correia Lima. Mas, tal como diz o ditado: quem cala consente. “Quem me dá as mãos e me abraça, me sente”.
A QUADRILHA do coronel desviou mais de cem milhões de reais das secretarias da Saúde e Educação, após a municipalização das despesas federais com esses serviços que não eram mais prestados, senão em parte: saúde e educação. As verbas públicas eram desviadas quando canalizadas para os municípios piauienses. Valiam-se, os quadrilheiros do coronel, de empresas de faixada que emitiam notas frias de fornecimento de serviços que não eram prestados. A merenda escolar e os serviços comunitários não tinham mais serventia. O dinheiro ia todo para o bolso dos políticos em conexão ativa com os quadrilheiros do coronel PM.
COM A CONIVÊNCIA de empresários, juízes, promotores públicos, políticos, policiais e demais funcionários públicos, o chefe dos chefes do crime organizado no Piauí implantou o terror na sociedade. A corrupção não tinha como ser combatida pelas instituições dominadas pelo estarrecimento e o pânico por ele chefiado. A merenda escolar e os serviços comunitários de quarenta prefeituras do Piauí pararam de existir. Todo o dinheiro destinado à prestação daqueles serviços públicos era direcionado para uma das empresas de cobrança do criminoso Correia Lima. Ele desejava, segundo opinião de jornalistas, ser o Pablo Escobar do crime organizado no país.
A QUADRILHA DO coronel tinha ramificações no Maranhão e no Ceará. Os prefeitos que se negavam à participação no esquema criminoso, após serem pressionados e não cederem, eram logo assassinados. Nove desses prefeitos foram executados pelos sectários do coronel. Foi criada uma Associação de Viúvas de Prefeitos Assassinados. O poder judiciário piauiense, por um longo tempo, fazia que não via os desmandos sob o comando do coronel PM do crime organizado.
EM 1997, O PROMOTOR Afonso Gil Castelo Branco denunciou a máfia de policiais civis e militares que assombrava as instituições e a sociedade piauiense. Crimes de abuso de autoridade, espancamentos, perseguições, lesão corporal e homicídios foram por ele denunciados. Nos interrogatórios Afonso Gil descobriu que 90% dos acusados trabalhavam para o escritório do crime organizado pelo coronel Correia Lima. Ele denunciou 25 policiais à justiça. Apenas um foi condenado. Ameaçado de morte, Afonso Gil vivia recluso e andava armado.
EU O CONHECIA, o promotor Afonso Gil, de frequentar uma mesa de amigos de escola no velho Clube dos Diários. Após as denúncias ele parecia apavorado. Em 1999, devido ao trabalho investigativo de Afonso Gil, uma Comissão Parlamentar de Inquérito do Congresso Nacional foi instaurada. As investigações, chefiadas pela Polícia Federal grampeou telefones de suspeitos. Após setecentas horas de gravação, logo a seguir ao registro de duas mil e quinhentas conversas, a PF reuniu provas de dezenas de assassinatos cometidos pela quadrilha do poderoso chefão do crime organizado no Piauí.
O CORONEL PM Correia Lima costumava fazer seguros de vida em nome de vítimas que, após assassinadas, pessoas de seu convívio familiar eram beneficiadas pelo pagamento dos seguros. Amigos, familiares e soldados da PM envolvidos com ele foram, posteriormente, presos. Presos também prefeitos que fraudavam licitações para se beneficiar das verbas públicas destinadas às secretarias de Saúde e Educação. Uma vez preso, o coronel recebia visitas íntimas e dispunha de celulares para a continuidade da comunicação com seus sectários de quadrilha.
DA PRISÃO, ELE ordenava o espancamento e morte de jornalistas que continuavam a denunciá-lo e a investigar seus muito crimes ainda ocultos. Dentre seus amigos da família de crimes, estava o pistoleiro acusado de mais de cem homicídios nas décadas de setenta e oitenta, José Enílson Couras, o “Courinhas”. Em nove de setembro de 2020 a juíza Maria do Socorro Ivanir de Vasconcelos, da 1ª Vara Criminal da Comarca de Parnaíba, concedeu a progressão do regime fechado para o semiaberto, ao coronel. Decisão tomada após ele ter se submetido a exame criminológico de avaliação de comportamento e estado mental do preso.
CHANTAGENS, EXTORSÃO, sequestros e assassinatos: a sinistra personagem do coronel PM tinha conexões em todos os poderes, segundo o promotor Afonso Gil Castelo Branco e o juiz federal Rui Costa Gonçalves: isso acontecia não porque tinham medo dele, mas porque eram seus cúmplices. Esse criminoso psicopata de periculosidade extrema, foi recentemente colocado em liberdade por determinação judicial. Ele agora, uma vez em liberdade, continuará seu portfólio de crimes??? A possibilidade de reabilitação é simplesmente impossível. Há anjos no inferno que dele não querem sair. Nem sair nem safarem-se de si mesmos.
DE ONDE VIEMOS??? O QUE SOMOS??? PARA ONDE VAMOS??? — GAUGUIM (1897)
ESTAMOS LENDO, estamos vendo que militares de farda, abusam da autoridade que suas vestimentas impõem, para cometer crimes contra uma sociedade que financia seus salários e aposentadorias. Traem a confiança da corporação que passa a respeitá-los pelo medo e a violência com que defendem a própria criminalidade. Isto aconteceu no tempo da ditadura militar, quando criminosos de farda cometiam as mais bárbaras violências contra a população civil do país, sob o disfarce covarde de combate ao comunismo.
ESTAMOS VENDO, estamos lendo um presidente da República cometer todas as infâmias possíveis e continuar em seu cargo defendido por autoridades políticas e jurídicas que não cumprem seus deveres: o tocador de Lira, presidente da Câmara não está nem aí para os crimes de responsabilidade cometidos pelo presidente Bozo Bozonagro. O PGR e a sua “Lindôra de Coleira” estão ocupados em blindar aquele que os mantém nos cargos com altos salários e mordomias.
O CENTRÃO está a se bronzear num mar de brigadeiro, manipulando verbas bilionárias por debaixo do tapete. Ele, Centrão, manipula verbas do orçamento secreto para se manterem, seus membros, calados e na expectativa silenciosa de que o presidente Bozo Bolsonaro se reeleja porque, dessa forma, feitas as contas institucionais, garantiriam a continuidade da corrupção que afronta os princípios da Constituição e a legislação tributária, ou normas fiscais do país.
AS EMENDAS de relator, iniciadas em 2020, canalizam as verbas do orçamento público em direção a projetos definidos por parlamentares sem que esses se identifiquem. Ou seja: a grana preta corre esperta para os bolsões milionários dos políticos que fornecem apoio às espertas patifarias do governo do presidente Bozo Bolsonaro. Aquele que comprou 51 apartamentos à vista, em dinheiro vivo, porque parte dessa grana vem dos conchavos por baixo dos panos de seu desgoverno insano.
AQUELE OFICIAL PM Fulano, que se emocionou até as lágrimas ao ver adentrar a sala da Companhia de Guarda do Palácio do Governo (Karnak) o coronel chefe do crime organizado no Piauí, certa vez me chamou para, nas entrelinhas de uma conversa sempre cheia de hiatos, me dizer:
— “Você não quer mesmo, não é”??? Eu, a princípio não compreendi o que ele e a sua expressão corporal afetada, com a vozinha típica de quem fala para dentro de si mesmo como se com outro falasse, queria dizer o quê??? Ele continuou:
— “Ela é uma boa cabeleireira, ganha dinheiro com o salão...”. Então compreendi: ele queria que eu ocupasse, ao lado de sua ex-mulher, o lugar vago que ele, ex-marido dela, havia largado. Ela estava em vias de se amasiar com um garotão da idade do filho mais velho dela e, de resto, com o mesmo nome dele, filho.
O “COISNHA JÚNIOR”, ao lado de dois dos filhos do coronel Fulano, tinha chegado até a mim e dito que ela, ex-mulher do oficial PM tinha posto na casa deles um amante mais ou menos da idade do filho mais velho dela. Eles estavam falando a mando dele, coronel Fulano, como se eu tivesse alguma responsabilidade para com esse evento familiar deles. Queriam certamente que eu solucionasse a questão e substituísse, ao lado dela, o garotão que se tinha chegado como seu amante. Na avaliação deles e do coronel Fulano, eu tinha a obrigação de intervir no conchavo familiar e rearranjar o arranjo. Era como se o coronel Fulano estivesse me dizendo:
— “Por que você hesita, estou te dando uma mulher, filhos, uma família, uma casa para morar, por que você não vai lá e toma o lugar do jovem amante dela??? — Ele não tinha nenhuma mínima consideração por minha individualidade. Pensava saber o que era melhor ou pior para mim. No fundo, queria que eu seguisse a carreira de traficante de coca. Que usasse minha violência e revolta reprimidas, e me transformasse, num novo e violento traficante de coca. Quem sabe, talvez, um Pablo Escobar nordestino.
ERA DESSA forma que todos os membros daquela família desajustada agiam para comigo: eu tinha de estar disponível para o que desse e viesse deles. Nenhum deles considerava, ou me via enquanto um indivíduo que tinha meus planos de vida, liberdade de fazer minhas escolhas. Não. Eu tinha de estar à disposição de cada um deles para fazer o que eles queriam que eu fizesse. Não respeitavam minimamente o fato de que eu não estava a desistir de meu livre-arbítrio. Relativo.
ELES TINHAM absoluta certeza de que o hipnotismo de Mãezona e de Paizão Coisinha, as pressões exercitas sobre mim pela mala de necessidades com que me dotavam de herança, haveria de fazer com que eu me rendesse às suas necessidades e vontades. Para eles eu não existia, exceto para a satisfação de suas expectativas.
ELES TODOS tinham certeza de que eu estaria sempre à disposição de suas deficiências, de suas carências. Esperavam que eu estivesse sempre sendo entorpecido e vigiado. E aceitasse estar sendo boicotado em meus direitos de filho primogênito. Aceitando ser enganado por suas ambições pessoais e contingências covardes, familiares.
MAS, EU ESTAVA interessado em fazer valer o que restava de meus recursos de defesa de minha vida. Independentemente do que eles haviam reservado para mim em suas mais intensas manipulações de interesses que visavam administrar minha depressão por estar sendo boicotado de todas as formas possíveis pela estratégia de sobrevivência familiar. Sempre todos eles, na expectativa de que eu aceitasse sempre ser vítima.
COMO AFIRMA o dito popular: “Deus Et escreve certo por linhas tortas”. Eu tinha em meu favor unicamente o fato de saber que toda aquela encenação familiar, a partir de tudo o que eu presenciara neles, não poderia estar certo. Não poderia ser considerado um comportamento de integridade de costumes. Eles me jogavam no lixo das premências familiares, certos de que eu não teria forças para superar tamanhas adversidades.
ELES ESTAVAM enganados, mas jamais admitiriam isso. Que eu teria forças para superar a depressão e a ansiedade que me causavam todos os dias. Eles tinham plena consciência de que eu não teria forças para me levantar, após a queda, rasteiras, e o puxar de tapete sob meus pés que buscavam, a todo custo um ponto de equilíbrio em meio das incansáveis pressões vindas de todos os lados. De todos os lados vinham as cobranças de que eu deveria sentir-me assolado pela culpa de simplesmente estar vivo. E não fazer tudo que eles esperavam que eu fizesse.
FAZIA-ME A pergunta a qual nomina o quadro de Gauguim que fornece nome a essa crônica. Perguntava-me, não apenas a mim, fazia a pergunta silenciosa a eles, demais ))membros dessa família, que sempre se me apresentava comportamentos distantes e incompatíveis com minha cultura pessoal e visão do mundo. Eu estava no epicentro, no olho do furacão, que me incluía em seus vórtices de atividade putrefata (Inconsciente Coletivo Familiar). Eu não me permitia levar pela voragem desse tufão.
O GRUPO familiar era governado, eu via isso claramente, pela alma primitiva de Mãezona e de sua principal vítima: Paizão Coisinha. Ela se fortalecia em dominar suas crias com a sobrenatural magia advinda do mito da mãe. A ideia inata de que a maternidade não é um instrumento da natureza, mas está em parceria com ela e deve a ela completa submissão.
MÃEZONA NUNCA se reinventava. Estava sempre completamente convicta de era ela uma criatura teratológica sim, hedionda sim, mas empoderada, dissimulada por natureza. Ela não cedia um mínimo de seu fanatismo supostamente maternal. Era inflexível e nunca aparentava ser, mas era extremamente violenta em seu empoderamento empoeirado sobre os membros todos da família “que era dela, que ela parira”. Por isso poderia fazer de suas crias o que quisesse. Tudo que fizesse seria válido e inserido no contexto de sua insensível, irredutível e surda alienação primitiva.
COPNSIDERAVA-SE ela, Mãezona, filha dileta da “Era de Kali Yuga”. Sua maternidade não era planejada. Era um vômito querido de suas tripas primatas. De seu DNA, desde os primeiros hominídeos. Acreditava ter mais 432 mil anos para continuar sua dominação maternal enganosa, dissimulada. Maternidade fatal ao desenvolvimento mental de suas crias. Suas leituras de Madame Elena Petrovna Blavátskaya estavam muito equivocadas. Mas eram reforçadas pela influência deletéria da ex-enfermeira do campo de concentração Auschwitz, sua vizinha: doutora Rozen.
O SONO DA RAZÃO PRODUZ MONSTROS — GOYA (1799)
VOCÊ PODE imaginar o que é passar a infância a viver sob influências deletérias. E na juventude, viver a garimpar o Inconsciente Coletivo Familiar e Social em busca de respostas para essas ansiedades e tensões alimentadas por aqueles que deveriam proteger os filhos delas, e não os lançar perversamente nelas.
A SEXUALIDADE tóxica daquele casal de pessoas espiritualmente negativas, empobrecidas em suas infâncias por comportamentos de terceiros que certamente lançaram-nas no ambiente sexualmente mórbido, característico das peças dramatúrgicas do jornalista e escritor Nélson Rodrigues.
GRANDE PARTE das pessoas jovens que foram criadas em situação de subdesenvolvimento mental, emocional e intelectual, ficaram impregnadas de insanidade dos pais, ignorando por toda a infância que eram vítimas dessas influências. Eu, não poucas vezes me surpreendia na situação shakespeareana de me ver em frente a um pai que não me ensinava nem me educava, ao contrário: Me incentivava a seguir o caminho da marginalidade. Caminho esse que, suponho, o dramaturgo inglês assim definia:
— “Quando um pai ensina ou educa seu filho, ambos riem. Quando um filho ensina ou educa seu pai, ambos choram”.
SE NÃO VIVÊSSEMOS num país atormentado pela corrupção, a pobreza, a fome, por políticos fabricantes de fantoches miseráveis, materiais, emocionais e intelectuais, não teríamos de estar sob a influência deletéria de um presidente que exalta o discurso antidemocrático, as estratégias de campanha mentirosas e arbitrárias...
... UM PRESIDENTE que chegou ao excesso de falta de honra e vergonha, que para ele não é um vexame, muito pelo contrário (ele se achou muito esperto) ao sequestrar as comemorações de rua do Bicentenário da Independência e canalizou as festividades desse dia para fazer discursos de campanha política da própria reeleição.
O BRASIL VIVE sob a influência da cidade fantasma de Brasília. Da Brasília que se quer uma dinastia de políticos com suas almas corruptas penadas, com representantes que investem nos portais de um Estado de submundo criado por eles, enquanto se locupletam das verbas bilionários do orçamento secreto, também conhecido por “emenda de relator”. Um político que há quatro anos não faz outra coisa exceto investir em reeleição.
NESSE SUBMUNDO de miséria material, moral, intelectual e fome que eles criaram, sem se ocupar em minorar o sofrimento de praticamente quarenta milhões de seres desumanizados pelo esquecimento de seus representantes congressuais em que votaram, eles se comparam achando-se, certamente, superiores em esperteza, em condições de sobrevivência, em condições materiais privilegiadas pelas mordomias do poder, enquanto reservam migalhas para a sobrevivência dos indivíduos considerados reles, separados deles pelo muro da vergonha da linha fronteiriça de indigência, humilhação e pobreza.
À TRAGÉDIA humana na qual eles investem, é motivo para se sentirem nobres representantes de um povo maltrapilho, desempregado, flagelado por uma inflação de bens de consumo de primeira necessidade, por uma educação para o tráfico e a prostituição: política social à qual dedicam horas, dias, meses e anos de governança hipócrita, desleal, astuciosa.
A CAPITAL federal sob a gerência presidencial do Capitão Cloroquina, é uma espécie de Vale ou Planalto de Hinom, símbolo de um lugar de horror e desprezo pelas populações indígenas, pelas mulheres, pela população LGBTQIA+, pela preservação da Amazônia.
O PLANALTO Brasília e o Palácio presidencial ocupado pelo Bozo Mussolini Bolsonaro, é um lugar de punição das populações ribeirinhas roubadas em suas áreas de pesca pela pescaria ilegal. O Capitão Cloroquina pune até mesmo a natureza, rios, lagos, aves, plantas, habitantes que margeiam os cursos de água contaminada pelos barões do garimpo com material pesado, mercúrio, em Munduruku no Pará. Seu lema, sua marca registrada é: “o Brasil poluído acima de tudo. O Deus trevoso do Bozo acima de todos”.
O CAPITÃO Cloroquina é associado dos poderosos interesses econômicos que devastam a Amazônia. O Instituto do Homem e do Meio Ambiente da Amazônia (Imazon), no primeiro semestre de 2022 denunciou, através de dados coletados:
— “A área desmatada na região foi de 4.789 quilômetros quadrados. 20% a mais do que no mesmo período no ano passado”. E a devastação da floresta continuou em ritmo acelerado pelo governo celerado que parece odiar os recursos naturais e o meio ambiente.
BOZO POR VEZES quer parecer um sujeito palhaço bem-humorado. Mas só consegue mostrar seu menosprezo a grupos étnicos e às pessoas que dele participam, não as poupando de humilhações verbais tipo:
— “Eu fui a um quilombo. O afrodescendente mais leve lá pesava sete arrobas”.
EM 2017 O presidente Bozo Bolsonaro participou, em palestra no Clube Hebraica (RJ) e afirmou que pretendia acabar com as reservas nas terras indígenas e quilombolas. Orgulhoso e tentando fazer humorismo, foi dizendo:
— “Eles não fazem nada, acho que nem para procriar eles servem mais”. A PGR, na época Raquel Dodge, apresentou denúncia por racismo contra ele, Capitão Cloroquina.
“O QUE ESTÁ embaixo é igual ao que está em cima”. Este princípio de correspondência (Hermes, o Trismegisto) afirma que o que encontramos exteriormente é o espelho do que não conseguimos ver interiormente em nós mesmos”. Ou seja:
— “O que está fora é o reflexo do que está em seu interior”. Jorge Amado escreveu “Capitães de Areia”. Nele conta a história de meninos abandonados nas ruas de Salvador que roubavam para comer e sobreviver mais um dia. Eu me pergunto se eles não são semelhantes aos congressistas que roubam verbas públicas para mais se enriquecerem e forrar os bolsos com verbas do dinheiro público. Verbas saídas de conchavos internos tipo orçamento secreto ou emendas de relator. A diferença é que as crianças roubam por necessidade. Os congressistas roubam por perversidade.
HOMENS LENDO, A LEITURA — GOYA (1819/23)
O CAPITÃO Cloroquina não se pronuncia quando um de seus milicianos mata um militante de seu principal adversário político. O delírio persecutório de seus discursos contra as urnas e as instituições democráticas é cíclico. O presidente Bozo vive na bolha da ciclotimia. Ele está sempre a vacilar entre polos e transtornos bipolares. É uma das características mais marcantes dos transtornos psicóticos dele, presidente Bozo Bolsonaro. Ele talvez tenha nas ideias delirantes a certeza de que é vítima de uma grande emboscada comunista. Ele talvez acredite mesmo que é um patriota que não quer que seus fiéis da milícia evangélica armada “votem vermelho”, como dizem seus pastores do medo, em cultos evangélicos.
ESSES PASTORES do medo, que deliram contra uma ameaça comuna que existe apenas em seus corações e mentes sedentos de dinheiro público sujo e de poder político, não têm racionalidade em suas preleções de culto ao mito deles que é um mico político para qualquer eleitor que raciocina um mínimo. Quando um de seus fanáticos e irracionais militantes armados assassina um membro do eleitorado adversário, ele, Capitão Cloroquina, não atina no significado da paráfrase escrita por frei Leonardo Boff, Hemingway, e tantos outros autores da literatura que a ele sobrevive:
— Nenhum ser humano é uma ilha, isolado em si mesmo. Todos somos parte do continente, partes de um todo. Se um torrão de terra for levado pelas águas do mar, ou a Rainha da Inglaterra viajar para outra dimensão, a Europa ficará decrescida, como se fosse um promontório, como se fosse o solo diminuído de uma parte geográfica ou de uma representação do gênero humano carente de uma parte vital dele que se foi. Por isso não pergunte por quem os sinos dobram. Eles dobram por ti. Por mim. Pelos que se foram do convívio cosmopolita, mundano.
O POETA autor de “Meditações”, John Donne, em 1623, neste excerto XVIII do livro citado, é o autor original do parágrafo muitas vezes reproduzido por autores dos séculos que o sucederam: “... Nenhum homem é uma ilha, isolado em si mesmo. Todos são parte do continente, partes de um todo. Se um torrão de terra for levado pelas águas até o mar, a Europa ficará diminuída, como se fosse um promontório, como se fosse o solar de teus amigos ou o teu próprio, a morte de qualquer homem me diminui, porque sou parte do gênero humano. E por isso não pergunte por quem os sinos dobram; eles dobram por vós”.
MAS, A CULTURA do Capitão Cloroquina é de quartel, é de guarida, é de caserna. Ele interpreta a realidade pelo olhar militante, armado, desconfiado, paranoico, de torturadores que ele não cansa de mencionar. Aqueles dos anos covardes e de chumbo da ditadura militar. O Capitão cloroquina não respeita a vida nem a humanidade que dela faz parte em seus corpos que devem ser protegidos e preservados, nunca mortos e torturados.
O CAPITÃO Cloroquina não se pergunta por quem os sinos dobram. Nem tampouco sente-se diminuído quando um de seus muitos adversários assassinados por fanáticos de suas milícias evangélicas e eleitorais, é suprimido do convívio de seus semelhantes. O Capitão Cloroquina não possui a ânsia Iluminista por cultura poética, literária, dramatúrgica. A iluminação do intelecto, do espírito não lhe diz respeito.
O CAPITÃO Cloroquina se mostra, quase sempre, um fanático em busca do aplauso fácil de seus bundões que berram em seus sermões, louvores ao mito de circo que ele representa na comunidade nacional e internacional: o corpo político, econômico e social da humanidade que possui formação em ciências e artes. Formação que as isenta do ferrão do escorpião que inocula o veneno do ódio (“Gabinete do Ódio”) e quer matar a idoneidade das urnas que o elegeu e a seus zeros à esquerda: 01, 02, 03, 04.
O CAPITÃO Cloroquina é um fanfarrão de palanque que faz propaganda de uma virilidade supostamente existente, mas que ele só pode provar entre quatro paredes e debaixo dos lençóis nos quais ele se denuncia e vulgariza ser, quem sabe, talvez, quiçá, um brocha, que de tão brocha, se quer vender como “imbroxável”. Boca para fora ele repetia, uma repetição cafona do “mito de Narciso, para seus maníacos aficionados, em recente manifestação pública no evento “Sequestro do Bicentenário da Independência”:
— “Eu sou Imbroxável".
— “Eu sou Imbrochável".
— “Eu sou Imbrochável".
SE DÊ AO RESPEITO presidente. Nenhum brasileiro eleitor, decente, moralmente apto, qualificado a votar num aspirante à reeleição ao cargo de presidente da República, poderia querer votar num candidato que cai tão demasiadamente abaixo da “minima moralia” necessária para despertar a confiança e o respeito próprio, em vossa excelência inexistentes. Um patriota que se dá ao respeito, respeita a ouvidoria de seus eleitores!!! Você, presidente, é um Narciso perdidamente apaixonado pela própria imagem criada por suas constantes demências. Uma espécie de escorpião que quer, inconscientemente, suicidar-se e à própria candidatura.
O REI BRINCANDO COM A RAINHA — MAX ERNST (1944)
MEU CORAÇÃO, minha mente infantil não abandonou a memória desse pantanal familiar cheio de truques, traumas e de crimes que nunca serão apurados, investigados e punidos. Todos os adultos contemporâneos da família de Paizão Coisinha e de sua mulher mandona, Mãezona, são igualmente culpados por pertencerem à mesma realidade do campo de concentração Theresienstadt, Teresina, capital do Piauí. Todos os vizinhos e políticos, religiosos, simulação de intelectuais, professores... Toda a população da capital do Estado parecia-me controlada pelas “Moiras”, as filhas da noite, divindades mórbidas que controlam o destino dos mortais e definiam a vida humana. Desumana.
TODOS, HOJE, fazem parte de uma cidade mergulhada no pântano da corrupção política das drogas do Planalto Central, da pobreza, da prostituição, da miséria de mentalidade familiar, política, social, econômica sob o comando, comunicação e controle dos barões das drogas residentes no Palácio de Karnak, nos edifícios da beira do rio Poti, nas câmaras de vereadores e deputados, nas prefeituras e em suas periferias municipais empanturradas da miséria humana mais miserável, dedicada a se reproduzir nas camas onde parteiras particulares e médicos de maternidades trazem mais crianças para fazer parte desse belo quadro coletivo, urbano, protocolar, cerimonial, gregário, chulo, banal, vulgar, barato, pueril, medíocre, trivial, conhecido e consagrado pelos costumes, os mais maquiavélicos. E sádicos..
CRIANÇAA TERÃO, por toda a vida de carregar o baú do entretenimento baixaria do “tio” Silvio e da produção Vai Que Cola da Globo. Adultos com mentalidade de bambinos governados pela máfia dos Bolsonaros. Um país entregue às famílias de baratas kafkianas. As memórias dos demônios da vida íntima desses pirralhos, eles terão de levar a mala pesada de seus complexos e traumas que nenhum psicólogo ou psiquiatra haverão de minimizar, e muito menos de curar-lhes as feridas das almas dilaceradas por uma cultura de fardos e consequências as mais dolorosas.
PORQUE A MEMÓRIA dói. Não adianta dissimular com boas escolas, bons salários, cursos e faculdades universitários. Não adianta mil medalhas nos uniformes militares. De nada vale a colação de grau sabendo-se que toda a formação professoral e docente não passa de orientação mental ordinária para um mundo inexistente. Para um mundo dominado pelo Inconsciente Coletivo Universal de uma educação televisiva de pantanal.
TODA ESSA realidade repetitiva de afazeres domésticos para multidões domesticados pela simulação de civilização, educação e cultura. A sociedade em todas as suas instâncias, subjugada pela militância implacável de segredos e sociedades secretas de liquidificador. A recuperação de informações traumáticas aferidas pelas referências dos memorandos biográficos perdidos na cultura burocrática de secretarias da cultura, as mais desprovidas de um mínimo de intenção de educar e criar pessoas que não sejam extensões da máquina governamental de triturar a criatividade, a dignidade, as possibilidades de crescimento e conhecimento próprio e dos que lhes cercam de Bigbrother.
COMO ESSES adultos dessas novas gerações, novas apenas na função programática da idade cronológica, poderão iniciar uma nova educação que não seja proveniente de suas entranhas apodrecidas pela influência de seus ancestrais sodomitas. Onde estão os caminhos do Sol, numa sociedade iluminada pelas promessas de futuras trevas???
LÁ ESTAVA ela, Dulce It, “A Coisa”, a passar a mão em meus ombros e dizendo estar tudo bem:
— “Ela gosta de você”.
“A COISA” FALAVA” mesmo comigo??? Ela que sempre me ignorou completamente. Ela e a sua Mãezona dona de seu olhar fixo, psicótico, como quem deseja fazer acontecer algo maldoso, lesivo, nefasto, e não consegue esconder sua enorme ansiedade para que esse algo aconteça. Ela era influenciada pela prima sapatão, a Teresona. Havia também feito um curso, dito superior, de magistério. Que poderia ela aprender ou ensinar???
ESTAVA EU vendo um programa de Tv na sala. Estranhei que logo depois chegou Mãezona dizendo-me:
— Ela é boa no fazer trabalhos manuais. Eu me perguntei, já antecipando do que aquelas atitudes inusuais estavam querendo dizer. Aquelas pessoas, Dulce It e Mãezona nunca se interessaram por minha literatura, por uma conversa amigável, uma troca de ideias, um diálogo. Que estavam a tramar no momento??? Por que essas delicadezas repentinas???
LOGO ATINEI com a coisa toda. Estavam querendo me aproximar de uma das três filhas de Dulce It. Aquela a quem eu chamava, de mim para comigo, a Cabeludinha. Porque tinha as pernas cabeludas, essa coisa repetitiva e autoexplicativa. Nunca nenhuma delas me perguntou se eu simpatizava com ela para ter um namoro. Mesmo porque a diferença de idade não favorecia à uma aproximação de intimidade.
ERA ASSIM que agiam: iam infiltrando-se aos poucos na convivência da sala de estar onde eu via episódios da série “Lost” na Tv. Eu não sou de rejeitar um rabo de saia. Mas aquele rabinho de saia não me interessava nem um pouco. Filha de Dulce It e neta de Mãezona, o pai com um pé no crime organizado, amigo do militar PM que havia se comovido, a ponto de ficar com olhos cheios de lágrima, ao ver adentrar na sala da Cia. de Guarda do Palácio de Governo o mal afamado coronel Correia Lima. Em que arapuca sem saída eu estaria me inserindo se aceitasse a aproximação.
NÃO QUE A Cabeludinha não fosse bonitinha. Pelo contrário. Mas, somando-se todos os indícios do que estava a ocorrer nos bastidores familiares, com o coronel Fulano, que não parava de me chamar de “Baixinho” (El Chapo) nome do notório traficante mexicano, somados à uma série de insinuações, com Paizão Coisinha, Mãezona, Coisinha Júnior, o marido de outra irmã minha me abrindo as portas de sua casa para altas sessões de “cafungação” de coca, insinuando que eu deveria também negociar participação, não sabia, nem quis saber no quê, exatamente. Mas ele dizia:
— ““Já negociei com todos na tua família só falta você. A “Maritaca”, nome fictício da mulher dele, outra de minhas irmãs, essa já está sob controle””.
O QUE EU poderia fazer numa situação dessa, senão simular que não estava a compreender nada??? Talvez os sinais que eu emiti quando em minha juventude fumava marijuana, participava do movimento “hippie”, e tive minha fase de viciado em coca, em companhia de pessoas que faziam viagens de LSD. Eu vivi toda essa mixórdia existencial, em parte porque era o que a realidade dos jovens que saíam de suas famílias para a Estrada, por não terem outra melhor opção de vida, faziam. Eu estava no embalo de uma situação que a sociedade alternativa me induzia a seguir.
PAIZÃO COISINHA não podia me financiar um curso pré-vestibular no Rio de Janeiro. Mãezona, quando eu dizia que precisava de uma mesada mínima para estudar, vinha sempre com a mesma lenga-lenga:
— Meu filho, seu pai não têm condições. Seu irmão Sicrano tal está precisando de dinheiro, o Beltrano precisa de uma mesada, a irmã Beltrana, seu pai está comprando um apartamento para ela, dividindo com a prima Teresona, as prestações... Era como se ela estivesse me dizendo também nas entrelinhas:
— “Caia na gandaia, na vadiagem, na boemia. Aqui não tem nada pra você. Nunca teve. Será que você ainda não percebeu isto”???
A SEQUÊNCIA vocês, caros leitores, já sabem: eu vivia de empregos temporários. Freelance em agências de publicidade, improvisações nas ruas de Ipanema, traficando pequenas quantidades de marijuana e drogas que de improviso aparecessem para comercialização. O ponto principal das transações: Miguel Lemos, Djalma Ulrich, Xavier da Silveira, pontos próximos ao calçadão de Copacabana, com variação de locais, conforme as incursões policiais. Domingos Ferreira, Leopoldo Migues, Posto Seis.
A EXPLORAÇÃO da necessidade de consumo de drogas por viciados filhos da pequena burguesia da zona sul do Rio de Janeiro. No final das contas eu tinha de pagar as minhas contas de sobrevivência. Com a família não podia contar. De há muito seus membros me hostilizavam pelo simples fato de ter nascido e estar a permanecer vivo. Eles me queriam morto, para que minha presença não perturbasse suas consciências pesadas por serem obrigados a me hostilizar. Todos me tinham em conta do “Bode Expiatório da Família". Eu não me conformava com isso. Aceitava essa condição degradante apenas aparentemente. Mas a revolta contra essa condição estava sempre em riste.
DOIS VELHOS COMENDO SOPA — GOYA (1819)
A REPRESSÃO social promovida pela ditadura reinava nas ruas, praças e avenida das cidades apavoradas. As pessoas espancadas nas praias por simplesmente estarem fumando e dialogando sobre os últimos acontecimentos. Nas salas de espera de cinemas e teatros, lá estavam os valentões das FFAA a ameaçar pessoas que estivessem a trocar ideias numa roda viva de amigos. Logo eram ameaçadas:
— “Vamos circulando, comitês estão proibidos. Vamos, vamos logo, vamos circulando, se não quiserem dormir na delegacia do Dops”.
NÃO É POSSÍVEL escrever este texto sem estar deprimido com a condição existencial de meus familiares. Cada um deles, meus irmãos e irmãs, eram portadores genéticos do direcionamento emocional cego deletério, deteriorado por uma intenção perversa de fazer de mim um “Bode Expiatório” de suas intenções, as mais perversas. Também não é possível a leitura deste texto se não for na condição perceptiva da polissemia. A Arte literária, e qualquer outra forma de Arte, induz o leitor à leitura conotativa.
AREDITO MESMO que Mãezona representava a Maria que motivava os ritos satânicos do Vaticano, dedicados à mulher que cedeu às piores intenções para com seus filhos e a sua descendência. Uma mulher que não aceitou a condição de Mãe benevolente e compreensiva. Mas, ao contrário, se dedicou a reinar numa comunidade de uma família e sociedade emocionalmente destrutiva. Essa Maria rejeitou a circunstância benevolente da maternidade. A oração dela, ela professava consciente ou inconscientemente:
AVE MARIA/Cheia da chalaça/O senhor do mal é contigo/Maldita sois vós entre as amantes/Maldito é o fruto do vosso ventre/Satã. Malvada Maria, mãe da maldade/Rogai por vossos pecadores/Agora e na hora de vossa extinção/Amém.
MAS, QUEM É Satã, senão a própria Sombra??? As atividades e desejos devassos, obscenos e violentos que ela, Mãezona, não aceitava no nível consciente de sua personalidade tosca??? Seu lado obscuro, negro, que ela projetava em mim, quem sabe em outros filhos, e negava nela mesma, porque não tinha coragem de se encarar. Ela tinha medo da manifestação deles na prole: seus recalques reprimidos. Todas as pessoas têm um lado sombra. Sombra: arquétipo do Inconsciente Pessoal, herança do Inconsciente Coletivo: o complexo kit de estruturas inatas, herança do conflito entre instâncias do Inconsciente Coletivo. Este, promove os conflitos que dão sentido e movimentam à vida. Vida que nela era tortuosa e inaceitável.
A FAMÍLIA É A plataforma principal da sociedade. Mas, certamente, esse tipo de família não se faz benéfica à continuidade dela mesma e da sociedade à qual pertence. Ela é a cartomante que planta nos corações e mentes de seus membros, uma portabilidade genética totalmente dotada de inconsequentes desejos de domínio e sedução. Sedução e desejos que extrapolam os limites da melhor civilização e da cultura. Tornando essa civilização e essa cultura uma condição de sobrevivência deletéria de seus membros. Sócios, familiares e parceiros de uma condição de convivência simplesmente sub-humana. De intenções inconfessáveis e as mais suburbanas possíveis.
ACREDITO QUE A inconsciência de seus atos é movida por mecanismos orgânicos que elas próprias desconhecem como gerir. Acredito que não foram, essas mulheres, programadas para transcender o pior do que há na genética delas mesmas. São, com certeza, seres biológicos com DNA programado, desde a primeira fêmea da espécie sapiens, Eva, para engravidarem de extensões da estirpe e linhagem da família, dita humana, destinada ás finalidades familiares e sociais que hoje vemos acontecer nas mais diversas instâncias das instituições de uma sociedade autodestrutiva.
NOSSO CÉREBRO É uma máquina de aprendizagem quântica. Não foi, não é e não será educado para se monitorar e a seus dependentes familiares e sociais, de maneira adequada à uma sobrevivência fora da possibilidade de extinção da espécie. O que Paizão Coisinha e Mãezona aprenderam com a suposta civilização e cultura sapiens??? Aprenderam, tal como estamos sabendo pelo comportamento deles e da maioria de seus descendentes, a repetir a agregação de laços afetivos de parentesco familiar e social, semelhantes aos trogloditas do tempo da caverna dos brucutus.
COMO PODERIAM, os membros dessa família, permanecer em estado de respeitabilidade própria e de socialização, se seus indivíduos, quase todos, aceitavam a escravização mental acrítica entre si mesmos, a partir do “eu” de referência dos pais, perversos, sadomasoquistas e irresponsáveis??? Que afinidades eletivas poderiam, no futuro promover enquanto eles também pais de família??? Como poderiam distinguir-se do parentesco por afinidade, a se estabelecer pelo casamento, no parentesco consanguíneo por descendência???
O LAÇO NEURAL entre pais e filhos, uma vez degradado pelas impertinentes e repetitivas sessões paternas de sadismo e morbidez sodomita, como extirpar a memória desses eventos traumáticos a muito longo prazo??? As milhares denúncias de práticas sodomitas entre clérigos e pastores de igrejas e templos, não têm nada de minimamente cristão. O laço neural que os une é a falta de controle, é a carência de afetividade. A elaboração mórbida dos compromissos paternos resulta numa sociedade da qual somos partícipes de seus crimes de responsabilidade familiar, política, econômica.
ESSE TIPO DE pais faz, todos os dias, o upload das adversidades que de há muito afligem as crianças e a descendência da espécie. Esses Laços de Família mantêm uma espécie cênica de simulação de respeitabilidade. Como cantava a canção de Belchior:
“NO CENTRO DA sala/Diante da mesa/No fundo do prato/Comida e tristeza/A gente se olha/Se toca e se cala/E se desentende/No instante em que fala/Cada um guarda mais o seu segredo/Sua mão fechada/Sua boca aberta/Seu peito deserto/Sua Mãezona parada/Lacrada/Selada/Molhada de medo/Pai na cabeceira...”.
É HORA DO ALMOÇO/para os familiares do Bozo/Eu ainda sou bem moço/Para essa tristeza/Minha mãe me chama/Minha irmã mais nova/Loura cabeleira/Minha trisavó me chama/É hora do almoço/Pra que toda essa tristeza/Onde está nessa união/A vida ou coisa parecida/Que nos arrasta, moço/Sem ter visto e sentido/Na vasta manhã, o sabor da vida/A juventude perdida/Na hora do almoço/Dessa forma perdido, o alimento se mastiga na boca/Sem sabor ou aroma.
ABAPORU — TARCILA DO AMARAL (1928)
O PARENTESCO é um vínculo jurídico entre fulanos, beltranos e sicranos, sujeitos de uma mesma origem biológica, um tronco comum de similitude consanguínea. Mas, há no DNA de cada um deles diferenças biológicas na química nos 23 pares de cromossomos. 22 desses pares são autossômicos: não associados ao sexo biológico do indivíduo. Esses pares não são idênticos. Eles são herança dos pais, mix de aprendizagens, conhecimentos, fundamento e sintonias genéticas. São repassados de geração em geração ao acaso: 50% da mãe. 50% do pai. O extremo que alguém pode herdar de uma avó é 25%. De uma bisavó, 12,5%.
SOMOS CRIADOS a partir de um “eu” de referência genética, de relações de identificação que se distinguem por parentescos de afinidades estabelecidas via união do casamento consanguíneo por descendência. Em família, somos uma agregação de seres unidos por laços afetivos. Em sociologia, a família assimila-se na compreensão de uma instituição que socializa seus indivíduos. A família de Mãezona retratava, suponho, a família nacional de modo geral: tinha um grande corpo físico numa cabeça de alfinete. Uma representação do Abaporu.
UMA SITUAÇÃO na experiência familiar, era a imposição que Paizão e Mãezona estabeleciam entre irmãos. Eu e meu irmão nascido depois de mim, fazíamos um par que se contrapunha a outros pares de irmãos e se debatiam e contrariavam entre si. Nesse jogo familiar eu fiquei sozinho: sem pai, nem mãe, nem irmãos. Eu, o cordeiro do sacrifício. Eu, o bode expiatório que deveria sempre gostar de se sacrificar pelos irmãos menores. Mas eu nunca comprei essa ideia. Eu sempre acreditei em oportunidades iguais. O que certamente não aconteceu. Longe disso.
HAVIA UMA genealogia em mim que não combinava com eles. Eles todos. Talvez em parte, não apenas pela realidade do DNA, mas pela própria estimulação que tinham com relação à minha incômoda existência dentre eles. Familiares. A identificação inexistia. Eu não me aparentava com eles. Não havia identificação de identidades. Havia uma nuvem a pairar sobre eu e meus familiares. Eles todos estavam cooptados pela mesma ideia de me hostilizar. Quando não claramente, sub-repticiamente. Ssa hostilização era incentivada por ambos: Paizão e Mandona.
EU DESCONFIAVA que o motivo não era apenas a precária economia familiar. Havia algo, uma força forte por sob suas intenções mal geridas. Eles pensavam que uma criança, eu, não teria forças para ir contra essas radicais e tenebrosas tensões que todos os dias se intensificavam em minha direção. Eu era um bom aluno na disciplina “moral e cívica”. As coisas que aprendia nos livros não se justificava, de jeito nenhum, no cotidiano familiar. Eu achava isso muito estranho, perverso e detestável.
ELES ME cercavam de fardos que se acumulavam em minha memória infantil. Memória essa que, na juventude, retornei de uma ótica e um enfoque que mudou completamente minha avaliação sobre eles. Para mim eles não eram uma família. Eram torturadores perversos. Mas, eu não poderia fazê-los ver meu ponto de vista, ou não teria deles a guarita que muitas vezes precisei evocar e perscrutar.
ESSA ATITUDE crítica, ao mesmo tempo que servia para me afirmar enquanto um ser humano independente deles, me fazia, simultaneamente, sofrer por uma culpa de estar a manter essa de desaprovação e depreciação deles:
— Então, pensava eu, todos os meus irmãos fingiam não ver a quantidade de ameaças organizadas para que sempre estivessem dispostos a criar situações de hostilidade contra mim??? Faziam de conta que não as viam!!! Eu que me danasse por minha própria conta. Ou que ousasse sair dessa rede de intrigas que se configuraram, no futuro, também da parte de conhecidos e vizinhos.
DULCE IT, “A Coisa”, não perdia uma única oportunidade de me detratar para quem quer que fosse. Mesmo sabendo que minha situação familiar já era por demais insustentável. Paizão dava a ela o exemplo mais detestável e sádico de hostilização á minha pessoa, principalmente em minha juventude. Lembro que precisei sair do convívio deles, mais uma vez, porque Coisinha Júnior, que alguns vizinhos que o conheciam chamavam de “Toni Ratazana”. Porque sabiam que roubava do velho o quanto podia, sob a alegação de que sua situação o fazia ter ímpetos de suicidar-se.
TONI RATAZANA roubava o salário do já idoso Paizão, com a conivência da Mandona e de Dulce, A Coisa. Ambos tinham tirado da responsabilidade de Dulce It a tarefa de retirar o salário de Paizão porque ela gastava nas próprias despesas familiares dela. A mãe tinha-se abstido da responsabilidade pela retirada mensal no banco. Havia um consenso entre familiares de que ela, Mãezona, poderia beneficiar-me com algum provento proveniente dele, salário. A crença de que ela, de alguma forma, poderia me passar alguma grana por debaixo dos panos. Era apenas uma especulação. Eles sabiam que a mãe não me daria nada. Exceto o direito que eu tinha, segundo a Constituição e Código Civil, de habitar na residência deles. A contragosto deles.
PAIZÃO JÁ HAVIA visto que seu filho mais novo, ao qual dedicou inúmeros investimentos (carro, terreno, casa) negava-lhe quantias mínimas de seu próprio salário que ele pedia para gastos simples, pessoais. Mas, Toni Ratazana contava com o apoio incondicional da mãe, que tinha por ele não apenas uma atenção de filho mais novo. Ela estava em conluio com seu rato de estimação porque ele dividia com ela algumas migalhas do salário do marido, do qual não perdia oportunidade de falar maledicências sobre membros da família dele.
TALVEZ POR todas essas coisas juntas, Paizão tinha se ajoelhado diante de mim, quando fazia trabalhos dissentes, voltado seus braços para o alto e me olhando com olhos penitentes, repetia inúmeras vezes:
— Me perdoe, me perdoe, me perdoe. Como poderia eu, depois de ter sido sistematicamente aviltado por ele, desde a mais tenra infância, de repente perdoá-lo??? Perdoa-se, segundo O Evangelho de Mateus (18:21-22): então Pedro aproximou-se de Jesus e perguntou:
— Senhor, quantas vezes deverei perdoar meu irmão quando ele pecar contra mim??? Até sete vezes??? Jesus respondeu:
— “Eu digo a você. Não sete, mas setenta vezes sete”. Aquele ser, dito humano, meu pai, havia feito suas apostas na filiação errada. Tinha investido num filho que agora o roubava descarada e perverti amente, negando-lhe migalhas de seu próprio salário que ele retirava no banco todos os meses. E com conivência da própria mãe. Era, certamente, uma humilhação demasiada, até para ele.
MEU CORAÇÃO, posteriormente, nesse gesto se comoveu e entristeceu. Naquele momento eu apenas olhei para sua figura patética, ajoelhada diante de mim, e ignorei seu ato de contrição. Afinal de contas, ele havia me oprimido, abatido e aviltado não 70 X 7, mas milhares de vezes. Naquele momento ignorei seu gesto. Era um nada, com relação a tantos vexames impostos a mim no decorrer da infância, na juventude, e na vida adulta.
O SONHO DA LUA — LAYLA ROUGAN (2012)
A CIDADE SUBTERRÂNEA, dominada por controles automatizados do Inconsciente Coletivo Metropolitano, partilha não apenas indústria, comércio, escolas, universidades, teatros, cinemas, shoppings, infraestruturas e habitações. Partilha também corrupção, mentiras rituais, agressões contra a democracia, assassinatos em massa de milhares de brasileiros pelo negacionismo das vacinas. Patilha principalmente soberania tirânica contra a democracia, soberba, avareza, luxúria, inveja, gula, ira e preguiça moral.
O QUE QUER dizer realmente a frase: “o que está em cima é como o que está embaixo. O que está embaixo é como o que está em cima”??? Quando um astronauta sobe até a estação espacial, ao sair da nave usa roupas especiais adequadas ao ambiente da falta de oxigênio. Ele se protege, ao vesti-la, o sangue e os fluidos do corpo da pressão atmosférica. Se não as usasse os fluidos e o sangue começariam a ferver. O astronauta ficaria inconsciente em menos de quinze segundos. Dentre as muitas funções da roupa espacial, essa é apenas uma delas.
HÁ PERIGOS para os “astronautas do mar”. Eles se projetam em sentido inverso à direção da lua e planetas externos. Não há tecnologia equivalente para mergulhos em distância abissais, em direção às profundidades oceânicas, devido à pressão atmosférica. A empresa canadense Nutyco criou um traje de mergulho (Exosuit) que pode descer à profundidade de mil metros. A roupa de metal lembra a usada pelos astronautas. Uma nova versão desse traje pode atingir dois mil (2000) metros de profundidade. Pesa “apenas” 220 kg.
OS PROBLEMAS de subir rumo à Estação Espacial Lunar ou de descer em direção à profundidade abissal das Marianas (“o que está em cima é igual ao que está embaixo”) diz respeito à estrutura da matéria: prótons, nêutrons, elétrons. Toda matéria é átomos. Cada elemento químico possui átomos diferentes. Essa frase que originou menção no segundo parágrafo, cede nossa atenção numa outra: “a matéria é feita de sonhos”.
CRIANÇAS E adolescentes dizem, em cada vez maior quantidade: “quando crescer quero ser um astronauta”. Um astronauta para cima ou um astronauta em direção aos abismos subterrâneos do grande universo oceânico??? Vamos agora nos concentrar no abissal mergulho no Inconsciente Coletivo. Porque as pessoas precisam mergulhar em si mesmas para ter condições de autoconhecimento!!! Tanto o astronauta na lua ou na estação espacial, quanto o “astronauta” que só pode mergulhar, no máximo, 200 metros em direção ao fundo da Fossa das Marianas, desejariam também mergulhar na Fossa Insondável do autoconhecimento, na abissal viagem ao centro da Terra do Inconsciente.
DESDE QUE “tio” Freud descobriu a Psicanálise, as pessoas tentam desvendar os enigmas na Terra Devastada do Inconsciente Pessoal que desvia o sujeito em direção às estradas vicinais que conduzem ao Inconsciente Universal, Coletivo. Essa viagem não é nada cômoda, mas é essencial se você deseja se autoconhecer. O autoconhecimento engloba desde o Bigbang às atualidades das notícias dos jornais de hoje.
QUER DIZER, para se autoconhecer você precisa ter coragem, disposição, tempo útil, valorizar o ócio cognitivo, e encarar horrores emocionais que estão vizinhos da consciência, mas permanecem subconscientes. Conteúdos que um dia foram conscientes, mesmo que por nano segundos, mas que agora se encontram reprimidos. Seu Ego não aguenta muita realidade sobre você mesmo, e transfere esses conteúdos armazenando-os em seu Inconsciente Pessoal.
VOCÊ PRECISA vestir a roupa do astronauta que vai aterrissar na lua e fazer reparos na Estação Espacial e, ao mesmo tempo, vestir a roupa do astronauta oceânico que vai descer em direção aos mais de onze mil metros oceânicos da Fossa das Marianas. Este último só pode chegar, vestido da tecnologia mais avançada a roupa Exosuit, a no máximo dois mil metros. Como já dissemos, o traje que desce 2 mil metros pesa 220 kg.
OS NÍVEIS DE poluição nas fossas oceânicas é correspondente aos níveis de poluição na órbita baixa espacial. Ela abriga 40% de todo o lixo sideral. Está entre 200 e 2000 km da Terra. O telescópio Hubble e a Estação espacial nela se encontram. Não há como, no atual estágio “high-tech” limpar as camadas atmosféricas do lixo astral. Esse lixo está, segundo a Nasa, em rota de colisão: são 21.000.000 (vinte e um milhões) de pedaços de satélites, restos de naves, tanques de combustíveis, ferramentas soltas por astronautas e demais objetos metálicos que estão a girar em órbitas da Terra.
“O QUE ESTÁ acima é igual ao que está embaixo”. Os crustáceos que habitam a Fossa das Marianas, apropriados por um submergível robô continham uma quantidade exorbitante de poluentes, cinquenta vezes superior à quantidade de poluentes encontradas nos campos de arroz do rio Liaohe, na China. Informação esta extraída de artigo editado na revista Nature Ecology & Evolution, subscrito por cientistas.
VOCÊ, CARO leitor, já imaginou a quantidade de lixo emocional que encontrarás quando mergulhar em direção aos conteúdos de seu Inconsciente Pessoal e Familiar??? E quando se abrirem as janelas para o conhecimento dos recheios tópicos menos superficiais que fundamentam o Inconsciente Coletivo Social e Universal??? Você vai suportar a “pressão atmosférica” quando estiver começando a descer na profundidade oceânica dos níveis mais subliminares, que guardam os horrores indescritíveis de sua participação em vidas que foram suas, e que, atualmente, você não possui a menor ideia do quanto desconhece de si mesmo???!!! Até mesmo nossos conhecidos poetas Dante Alighieri, Drummond, João Cabral, e dramaturgos tais que Nelson Rodrigues, detiveram-se nessa ambientação apavorados. Por isso as pessoas, em suas sessões psicanalíticas, só se concentram nas camadas mais superficiais, ao submergir no mergulho oceânico do Subconsciente.
“FAMÍLIA ENFERMA” — LASAR SEGALL (1920)
SER OU NÃO, eis a questão: ser ou não conhecedor de suas profundidades psicológicas a caminho dos astros ou a caminho da Fossa das Marianas. Mãezona costumava dizer que “o sangue puxa mais do que cem bois”. Esse era um de seus ditos favoritos. Queira você ou não, seu ser está presente nas duas extremidades. No meio dela está a cultura diária do entretenimento, da educação para boi dormir, da corrupção institucional, das bilhões de bocas em todos os lugares do planeta, inconscientemente falando banalidades: o trivial variado de insignificâncias. É o que me sugere o quadro expressionista “Família Enferma”, de Lasar Segall.
VOCÊ, EU nossos vizinhos, todos estamos sob camadas PSI-"geológicas" de entulhos ancestrais que não nos ensinaram a limpar. Não ensinaram, nem ensinam, porque não sabem. Porque as autoridades do planeta Terra nascem para ser o que são: autômatos bi orgânicos em busca de se dá bem na vida. De ganhar o máximo possível para garantir o narcisismo de simular ser melhor uns que os outros. Nenhum deles, nenhum de nós, sabe, quer ou pode modificar-se. Eu, sabedor dessa verdade existencial elementar, tentei. Quem sabe até mesmo logrei conseguir. A metamorfose deles, familiar, estava no sobreviver inteiros às explosões atômicas da IIIª Guerra Mundial, conflito diário de todos contra todos, todo tempo.
A ARTE de Segall parece-me ser uma denúncia manifesta do sofrimento de povo judeu nos campos de concentração da Alemanha nazista. Ele esteve, por duas vezes, na condição de refugiado de guerra. A onda da arte modernista estava em perfeita harmonia estética com suas emoções e comoções, as mais íntimas. Conhecer pela sensibilidade. A sensibilidade enquanto território e dimensão que amplia a consciência, desafia o pensamento a ir mais longe na compreensão das dores do mundo. E desafia a razão a se engajar na mudança desse mundo Cão.
A LINGUAGEM do modernismo está presente intensamente em suas obras de Arte. Nelas, ele espelhou a dramaticidade trágica da realidade latino-americana. O expressionismo, meu modo de vê-lo, é um desafio radical ao espectador na arte de visualizar as personagens do mundo: suas angústias, tristezas, decepções. As relações do pessoal com o familiar, este, com o social, este, com as associações éticas com a política local, regional, nacional, continental e mundializada. Vivemos num mundo expressionista, sim. Será que nos damos conta dessa realidade elementar???
POSSUÍMOS OS recursos de conhecimento existencial, histórico, estético. A sensibilidade PSI exigência de quem deseja e consegue saber-se individualmente responsável por esse Mondo Canibal??? Somos racionais o suficiente para estarmos sempre atentos e prontos a conhecer cada nova situação gnosiológica que a realidade se nos apresenta a todo momento??? Dialogamos realmente com os outros sujeitos de nossa realidade simplória e medíocre??? Se dialogamos, o que aprendemos de diálogos que se definem enquanto medíocres e simplórios??? Cada sujeito cognoscente é parte integrante da integralidade que nos fundamenta. Se não temos saber suficiente para nos comunicar com outros saberes equivalentes, de que adianta trocarmos impressões e conversas de coquetel??? Somos apenas narcisos de reuniões, recepções e cerimoniais de transição de poder político??? Pertencemos apenas à intelectualidade de fila de cinema e coquetéis???
TEMOS A sobriedade sugerida na presença dos tons sóbrios da pintura??? Nos identificamos com as personagens da “Família Enferma”??? Somos capazes da empatia sugerida pela melancolia, a mágoa, o desgosto e a aflição presentes nas personagens do quadro??? Temos a equivalência daquelas vidas secas em nós??? Seu desalento, desconforto, indignação, depressão, desesperança e soturnidade??? Quem se identifica com personagens do Bigbrother, do Vai Que Cola, das novelas tipo Verdades Secretas, do deboche supostamente inteligente do “papo de segunda”, possui condições de se identificar com a condição mais depressiva do mundo???
SUAS FACES podem realmente conseguir identidade com a expressividade dos símbolos da sensibilidade, os presentes e os ausentes no quadro “Família Enferma??? Eu, você, nossos vizinhos vivemos mergulhados num oceano de mediocridades políticas, “artísticas”, Tv visivas, esportivas, lendo revistas e jornais, participando, direta ou indiretamente do noticiário da noite, dos shows nacionais e internacionais das bandas do pop, dos pagamentos, agendas, registros, salários... Temos condições de visualizar, conforme as sugestões, estatutos e códigos estéticas, a realidade que está mais dentro do que fora de cada um de nós???
TENHA A impressão que somos demasiadamente narcísicos para nos permitir ver no espelho no lado de fora, as realidades que se passam e trespassam nossas ações e reações ao que vemos nas telas, nos palcos, na Tv, e ouvimos no rádio: a geometria dos sons e formas, nem sabemos o quanto ela nos envolve e condiciona nossa trajetória e experiência cotidianas de vida e da falta dela. Principalmente.
SERÁ QUE conseguiremos tempo para a neuro reformatação de nossas ideias, pensamentos, ações provenientes de nossas mentes, cada uma com suas próprias lógicas, e diferentes categorias de percepção da própria realidade. E da realidade alheia??? Temos condições de habitar outro planeta que não seja o planeta primata, lêmure. Temos condições de sair da prisão das longas noites de grande apreensão e sentimentos de medo e terror que nos fazia recolhermo-nos nos ermos das cavernas paleolíticas??? Temos humildade de saber que somos dinossauros em franca lide de extinção da espécie???
ANTHROPOPHAGY (CANNIBALISM) — TARCILA DO AMARAL, 1929
O PLANETA Terra está vivenciando o estertor da própria espécie. A sociedade do cyberespaço é a realidade na “Nova Era” que outra vez se reinicia. Desde o início dos tempos a “Nova Era”. Os movimentos estéticos libertários da virada do século XIX para o XX, só agora, na virada do século XX para o século XXI está a mostrar seus efeitos. O horizonte fugidio do Tempo tornou-se fixo. Somos o resultado de experiências híbridas entre espécies. Você vai aguentar a pressão PSI que poderá abrir uma janela mental para a compreensão de quem és??? Você vai abandonar o narcisismo do “espelho, espelho meu” para, finalmente, ter uma ilustração real, uma alegoria de quem és???
MÃEZONA NÃO tinha princípios. Reforçava-se no reflexo ligeiro do espelho buscando uma mentira que justificasse seu estar no mundo. Era como se a tivessem posto no mundo, ela não soubesse para quê??? Por isso se deslumbrou porque descobriu ser capaz de parir. Especializou-se nisso. O desenvolvimento da sensação de seu estar no mundo começava ou recomeçava toda vez que ela paria. Começava então a brincar com a criança até que chegava no limite de descartá-la enquanto brinquedo. Quando a criança crescia, terminava seu interesse nela, seu divertimento. Entrava então num processo de “retrogênese”. A criança ficava à mercê de uma psicomotricidade materna:
ELA TINHA pleno poder para impedir o processo de maturação do corpo e de suas aquisições cognitivas. Ela não teve, em seu processo de imaturidade infantil, uma orientação que a fizesse saber que o desenvolvimento da afetividade está associado ao desenvolvimento do intelecto. Deste, ela desconhecia tudo. A habilidade de coordenar a consciência corporal e a consciência cognitiva, dela não fazia parte. Ela simplesmente ignorava, propositalmente, que as interações cognitivas, sensório motoras e sociais dos filhos, precisavam de incentivo materno. Esse incentivo nela era uma impossibilidade.
PARA ELA me ver crescer era uma ameaça. Eu tinha atributos cognitivos que ela reprimia fanaticamente. Um exemplo eram minhas estorinhas escritas que ela nunca valorizava minimamente. Ela investia em meu retrocesso de desenvolvimento. A inteligência para ela era uma ameaça. Ela reprimia mesmo. A todo vapor, intensamente. Eu obtinha a promoção de meu intelecto e imaginação, via as HQs. As histórias em quadrinho que me proporcionavam um lucro que, em suas mãos, se esvaía. Esvaindo-se também minha educação futura. Desde que ela não queria que acontecesse.
UMA MOSTRA de como ela zombava e esculhambava a criança ainda em seu ventre, ficou evidente quando, ao caminhar em direção à beira do rio, num sábado, por volta das 15 horas, ao lado da Zélia, jovem que estava hóspede de um quarto da casa, eu a ouvia como que querendo extirpar de dentro de sua barriga o feto em desenvolvimento. Nessa ocasião ela tinha por pretexto ir em busca dos filhos que estavam em companhia de Paizão na coroa de areia do rio Paranaíba. Ela olhava a barriga crescida enquanto dizia:
— “Pudesse, eu tirava essa coisa de dentro de mim e jogava no lixo. Para que eu engravidei mais uma vez desse miserável (Paizão)”??? Dizia ela. — Paizão Coisinha não me levara para banhar no rio porque sabia que eu contaria para ela, ao voltar para casa, as coisas que eu haveria de testemunhar: o namoro dele com a amante de nome Tieta, os papos, as intimidades, as conversas de bebum. Afinal, eu era como que um olheiro dela. Uma criança usada e abusada por seus caprichos. Usava-me para obter, processar e trabalhar as informações que eu transmitiria para ela. Eu, seu principal informante.
A PULSÃO sempre traía a mulher a quem eu chamava mãe. A Zélia a reprovava dizendo:
— “Não fale assim de seu filho. O mais velho (eu) está ouvindo você dizer essas coisas do irmão dele que ainda nem nasceu...”. — O filho mais novo ainda nem nascera, ela, irada, já o forçava a ficar de joelhos. Estava em período final de gestação. Sabe-se que a partir do 5° mês o bebê começa a ouvir e processar sons de baixa frequência, refinando a sensibilidade aos sons ao avançar da gestação. O sistema nervoso amadurece a partir da 24ª semana. No sexto mês os olhos estão desenvolvidos e olham em todas as direções.
O FETO possui vida emocional. É extremamente sensível. Através do ultrassom sabe-se que os bebês interagem com o mundo externo. Estímulos químicos da gestante transmitem ao feto o estado emocional da mãe. Pode sentir dor, prazer, tristeza, bem-estar, alegria, angústia e outros estados emocionais da mãe. Seus neurotransmissores atravessam a barreira placentária em estímulos, por vezes nocivos, quando frequentes. A vida que ela passava para o filho ainda no ventre, era a narração maternal mais confiável.
QUEM, FUTURAMENTE, poderia secar suas lágrimas??? O choro da criança em busca de amor no berço da escuridão de uma noite sem lua. Não havia amor nela para ser doado. Mesmo se houvesse, ela não sabia como fazer que ele se sentisse amado. Poderia esse filho, seus outros filhos, amá-la??? Após toda essa memória de rejeição??? O Coisinha Júnior nem nascera, ela já estava a abandoná-lo. Mãezona era uma divindade má. Uma potestade familiar empoderada.
COMO SERIA o “Dia Seguinte” dessa prole, metáfora antropofágica de uma pedra rolando na ribanceira da caverna primitiva, gerida por essa troglodita toda poderosa???
O TIME FAMILIAR: 11 X UM — "VAI TE QATAR" (2022)
DULCE IT, “A COISA”, nunca foi mais do que uma extensão da maldade facínora dos pais. Essa maldade cresceu quando conheceu a prima sapatão, Terezona, que a influenciou sobremaneira desde então. Sempre teve o apoio dos pais e de seu principal representante, o coronel pêeme Fulano. Sua principal tarefa na vida era a vivência intensa e maquiavélicas tramas. Um dia chegou à porta de meu quarto, ao lado do irmão caçula, Toni Ratazana, dizendo que eu tinha de sair urgente, naquele mesmo dia, porque a casa tinha sido vendida e o comprador queria os cômodos desocupados. Lá fora estava um caminhão que levaria meus pertences a outro lugar. Ainda hoje, mais de década depois, continuam lá.
EU SIMPLESMENTE poderia me negar a sair. Mas, estava saturado de ver aquelas caras agourentas, sinistras, nefastas, cruzando comigo todos os dias. Eu poderia ter ido à delegacia do idoso reivindicar meus direitos. Resolvi mudar para um apartamento que passei a alugar de uma namorada que trabalhava no serviço público de saúde. Tonho Ratazana e Dulce It, “A Coisa” estavam a serviço do coronel Fulano, aquele que proporcionava mais orgasmos a Paizão, sentado em seu colo, do que a própria mulher dele, Mãezona, lhe tinha proporcionado. O coronel queria a casa para ele, para a filha se estabelecer no atendimento de cães. Ela havia se formado em veterinária e queria um lugar para comercializar serviços a cachorros.
EU, ERA UM cara simplesmente descartável, como sempre havia sido. Uniram-se todos para me tirar até o lugar onde poderia ler meus livros e dormir. Mãezona, Paizão Coisinha, Toni Ratazana, “A Coisa” e os demais membros da família (quem cala consente) unidos para, mais uma vez, me solapar. Todos tinham suas razões. Afinal, já sabiam, eu não era um deles. Era um Estranho naquele ninho de morcegos, escorpiões e serpentes. Nesse campo minado do futebol familiar, eu jogava contra o time de futebol deles e as demais reservas. Um massacre: todos contra um.
CADA UM DELES vivia segundo os mandamentos de levar vantagem sobre minha aparente debilidade no conceito dos interesses da família. Já haviam se estabelecido com famílias, filhos, negócios e empregos. Estavam todos bem encaminhados. Eu, vivia a valorizar a aquisição de conhecimentos. Era como se não tivesse sido parido do mesmo ventre de Mãezona. Meu DNA não combinava com o deles. Eu também estava farto das ameaças veladas de suas conversas, de suas pressões para me ausentar da proximidade deles. Eles tinham tentado, de todas as maneiras, me fazer participar do Inconsciente Pessoal e Familiar deles. Mas eu não havia nascido para ser cooptado pela vulgaridade insignificante de suas realidades e tramas.
A SOCIEDADE À qual pertenciam de corpo e alma, era a sociedade de interesses de mercado. Viviam da fixação de consumir. Consumir mercadorias do mercado de bugigangas, de drogas e de carne. Da carne que mais dia, menos dia, apodrece. O espírito, que também deveria alimentar seus corações e mentes, para eles era uma ficção de dementes. Eu via e sentia com toda clareza, que aquela família estava sob a comunicação, domínio e controle do mal. De algum DNA ancestral que os afastou de qualquer aproximação de algum valor que não fosse material. Pairava sobre ela, família, a nuvem invisível de interesses sórdidos, aleatórios. Todos eles se doavam, sem questionamentos, suas cabeças desprotegidas. Desprotegidas e tuteladas por pais psicóticos, sem que esboçassem a mínima reação a seus delírios. Cabeças sob comando do mal pessoal, familiar, social. Mal, sinônimo de atitudes mentais contrárias à virtude.
NINGUÉM PODE, suponho, viver num mundo autodeterminado por interesses pessoais, políticos, sociais, financeiros e econômicos, exclusivamente materiais, e não ser por esse mundo de interesses influenciado. É natural que exista muito pouco gente que consegue manter, ao lado dos esforços por sobrevivência, uma atitude de honra e dignidade. O investimento no tempo da espiritualidade é difícil. A possibilidade de ser honesto numa sociedade onde todos fazem chacota, zombarias e debocham de quem não busca ser o mais esperto, o mais ladino, escolado, finório, cigano, malandro, esse investimento em apuro, esmero, elevação, torna-se uma real impossibilidade.
ELES SABIAM que eu nunca estaria disposto a jogar o futebol que eles jogavam, tendo como treinador do time familiar, Paizão Coisinha e a sua implacável vândala, Mãezona. Ela havia subordinado os costumes e hábitos, os perfis do pior caráter do marido, para que sua própria natureza de mulher que se julgava detentora da superioridade da raça ariana, pudesse sujeitar e submeter não apenas ele, mas todos os demais membros do larbirinto. Que mais saberia ela ser, senão a supremacista inquestionável do larbirinto???
DULCE IT, “A Coisa”, estava de há muito subjugada pela influência nefasta da prima sapatão, filha da irmã de Mãezona a quem ela devotava um ódio irresistível, facilmente detectável nas opiniões que emitia sobre ela. Sua atitude “normal”, dela, “A Coisa”, era a de quem estava sob controle de uma entidade maligna de outra dimensão. Uma entidade que a fazia parecer um androide, um fantoche sempre fixado em alguma coisa que controlava seu olhar, gestos, fala, o modo de caminhar, e tudo o mais que viesse dela. Quando ela percebeu que eu não estava disposto a namorar sua filha peludinha, nem me permitir influenciar pela tentativa de Mãezona de fazer isso acontecer, então, a aversão e a malquerença que a dispunha contra mim aumentou de modo exponencial.
ELA E COISINHA Júnior, que me queria fora da casa de Paizão porque não conseguia conviver com alguém que não se subordinava às suas patologias, ao histerismo e ao histrionismo de comediante bufão que ele representava, estavam unidos para me fazer sair fora do quarto que eu ocupava na casa. Não apenas eles, eram todos os demais membros do time de futebol familiar que me queriam distante do clube da bola, da pelada familiar, único jogo sujo que sabiam jogar, ao qual haviam se associado.
TODOS ERAM, todos são membros da mesma sociedade esportiva familiar, nacional, da cooperativa do Grande Larbirinto de grupos, consórcios, empresas, estabelecimentos, ligações, centros, uniões, parcerias, assembleias, câmaras, ministérios, senado e governos. Todos estavam, todos estão irmanados em torno da vitimização de alguém, que não conseguiram arregimentar para seus intentos e subterfúgios, aos quais deviam e devem permanecer fiéis.
58 MILHÕES de eleitores cães fiéis e encabrestados ao matriarcado empoeirado e empoderado de mãezonas e paizões trogloditas, entidades patriotas da pátria dos mitos toscos, rudes, supremacistas. Com seus filhos nazifascistas, educados para serem jogadores de pelotas. Todos querendo e torcendo para que o time do qual fazem parte, seja campeão da nacionalidade familiar, a vestir a camisa de uma hegemonia de galera treinada para ignorar o alto grau de malignidade de seus governantes. Tipo o Bozo. Parece-me evidente que essas multidões de torce dores, não pode ser, ou estar, nessa dimensão do espaço tempo. Estão longe da percepção de si mesmos. Em outra Terra e dimensão que nem sabem.
AS DUAS LUAS DE MÃEZONA
É CERTO: leis existem para punir procedimentos, comportamentos que estão errados. Mas, quando as leis não punem os acontecimentos familiares que não estão visíveis aos olhos de pessoas que não os veem, e de outras que os veem, mas não têm disposição para denunciá-los??? Vizinhos sabiam as barbaridades que aconteciam na sala de estar da família de Paizão Coisinha e de Mãezona, que se fazia de ceguinha. Ela não via nada. Impressionava-me sua altivez e hipocrisia. Estava praticamente ao lado da rede de tucum onde Paizão tinha orgasmos nos bumbuns dos filhos. Mas ela não estava nem aí.
A TRANSFERÊNCIA do magnetismo privado, unida à força do Inconsciente Familiar, exercia-se em direção a um único objetivo: o de me atingir com hostilidades crescentes, constantes, contínuas, manifestas ou silenciosas. Atitudes domésticas, provocavam em mim um persistente mal-estar. Uma sensação de me sentir sempre inoportuno, inconveniente, deslocado, inadequado.
TODO O TIME de meus pais (se é que é justo esta forma de denominá-los) os nove irmãos, assim como os reservas eventuais, parentes, amigos e vizinhos em visitas, renovavam uma pressão insuportável dentro de minha mente indefesa a ataques silenciosos de hostilidades. Lembro-me desses familiares na mesa. Na hora do almoço, na hora do jantar. Ao lembrá-los, lá estão eles, personagens no quadro de Van Gogh: “Os Comedores De Batatas”. Os antropófagos que devoravam os filhos todos os dias, saboreando a carne tenra, indefesa, ingênua, como se quisessem absorver suas essências e depois jogá-lo na lixeira. Como diria Machado de Assis: a esses perdedores, as batatas.
A CIDADE de Theresienstadt estava a se transformar numa capital de transformistas. Num reduto satanizado de crianças traídas. Crianças que cresceriam aceitando essa condição vivencial nefasta. Quando a criança é traída por uma farsa de educação escolar, familiar e dificuldades sociais de se adaptar à uma sociedade hostil, de competitividade covarde, onde alguns têm privilégios e outros apenas malefícios e sortilégios, essa criança, ensinada a se dar mal, vai viver no sofrimento das tentativas de sobreviver.
MÃEZONA, RAINHA e mãe da zona familiar, administrava a energia do Inconsciente Coletivo Doméstico para melhor sugar a vitalidade física, mental e roubar de mim a consciência pessoal de que tinha direito sobre à própria liberdade de ser uma criança diferenciada da vontade domesticada dela. Vontade essa de dirigir as intenções e quereres de cada um, segundo suas percepções de cidadã da cidade troglodita de Theresienstadt.
QUANTO MAIS traumatizada a criança ficasse, mais ela teria como mostrar o quanto era boa e compreensiva. A oportunidade de colocar panos quentes nas feridas só poderia acontecer se a criança tivesse sido espancada, de alguma forma hostil, traumatizada. Ela sugava energia dos traumas que enfraqueciam física e mentalmente o filho. Eu tinha plena consciência de que aquele não era o papel que desempenharia uma mãe que fosse realmente materna.
O ATO DE PENSAR a natureza sádica das barbaridades das quais eu era vítima, de alguma forma me confortava. Afinal eu tinha um lugar mental, espiritual, íntimo, no qual nem ela nem o marido podiam chegar para me reprimir e maltratar. O ato de pensar me distinguia daqueles animais de racionalidade duvidosa.
APESAR DAS tentativas daquela mulher acabar com minhas melhores possibilidades, negando-me uma educação de qualidade, no lar e na escola, eu gostava dela. Afinal aquela coisa lésbica, sem feminilidade, sem urbanidade, suavidade ou erudição, aquela coisa era minha mãe. Havia-me parido de suas entranhas. Havia por certo vivido os traumas que uma mulher troglodita, habitante de buracos escavados nas rochas, sob a dominação de um hominídeo temeroso e tenebroso, quase um chimpanzé, eu imaginava quanto tempo seu passado a havia submetido às muitas brutalidades. Ela certamente, de alguma forma, ainda pertencia ao povo que habitava as cavernas de há 40 mil anos.
A DIFERENÇA estava em que as cavernas agora eram mais sofisticadas. Contavam com eletrodomésticos, sofás, Tv, fogão a gás, armários decorativos, reprodução de quadros de pintores de talento inigualável, prateleiras de livros em estantes. Mas a essência daquela mulher brutal e brutalizada não havia mudado quase nada com os séculos dos séculos que a separavam da mulher antiga, habitante de buracos nas rochas.
EU, POR VEZES, me divertia com ela. Estava ela na mesa da sala ensinando uma aluna em aula de corte e costura. Habitávamos a casa na rua Senador Teodoro Pacheco, 1047. A habitação tinha uma longa extensão ambiental que ia da porta da rua até o quintal. Pequena parte dela era encoberta. A mais ampla, onde havia um tanque, se prolongava até o terreno onde estavam o banheiro e a retrete.
ANOITECIA, A LUA estava atraente e harmoniosa no céu. Eu brincava na área a céu aberto e corria até a calçada na rua olhando o céu de onde se irradiava o luar. Não passava eu de uma criança, mas sabia perfeitamente que havia apenas um satélite terrestre e não dois. Ao olhar a lua no alto, da calçada na rua eu a avistava no céu claro da noite que começava. Eu estava vendo “uma” lua. Então eu corria, através da área coberta do corredor, até o amplo espaço descoberto do qual se descortinava a área da sala e os quartos da casa. Eu olhava para cima e lá estava “a outra lua”.
ENTÃO, DESTE lugar eu olhava para o céu e via no alto “outra” lua. Chamei com grande convicção Mãezona, enquanto afirmava:
— Mãe, venha ver. No céu estão duas luas. Duas luas. Não é só uma. As luas são duas. Uma deste lado e outra que pode ser vista lá na rua, da calçada. Venha ver se você não acredita. Venha ver. Eu tenho certeza: são duas as luas.
MÃEZONA, DO alto de sua cultura e de seus conhecimentos inexistentes de astronomia, ficou, por momentos, convencida de que, realmente, as luas no céu poderiam ser duas. Eu a segurei por uma das mãos e mostrei, a lua da ária aberta da casa, e “a outra”, que estava visível da calçada. Bastava olhar para cima uma e duas vezes. De ambos os lugares.
— Você está vendo, veja, ela está ali. Logo depois a puxei pela mão, atravessando a área do corredor, até a rua. Chegando na calçada apontei para o céu a segunda lua: — Veja. O dedo apontando para o alto na extremidade superior do braço esticado, mostrei para ela com toda convicção:
— Aquela outra lua estava lá do outro lado. Esta que estamos vendo agora, é outra. São duas as luas, tá sabendo??? Essa e a outra.
MÃEZONA PAROU para pensar e disse, interrogativa:
— Será que é mesmo??? Existem mesmo duas as luas??? Demorou um bom tempo para ela se convencer, após interrogar a si mesma, que a lua era mesmo apenas uma, vista de dois ângulos diferentes.
EU SORRI DA ingenuidade dela. Daquela mulher grandona, cheia de emoções empoderadas de vontade de dominação. Ela, em seu modo de ser, talvez amasse tanto a mim, que fazia de tudo um pouco para que eu ficasse, nunca saísse de perto dela. Sua ignorância se mostrava escancarada. A inocência estampada no rosto interrogativo de até então, pasma:
— “Será que são mesmo duas as luas e eu nunca tinha visto isso”??? A complexidade inquisitiva da pergunta se expressava em seu rosto, em sua cara. Logo ela se deu conta de que eu a estava zoando, e disse:
— “Para de besteira, menino. Não pode haver duas luas”. Mas, por não poucos momentos, ela acreditou mesmo que as duas luas existiam. E perguntou à amiga e aluna:
— Será mesmo que existem duas luas???
CAMPO DE TRIGO COM CORVOS — VAN GOGH (1890)
SE VOCÊ ACREDITA mesmo que demônios não existem, é porque suas ações e intenções já se confundem com as deles. Você não pode vê-los com seus traumas, recalques e complexos, porque se tornou parte da intencionalidade deles. Mãezona tinha um repertório imenso de músicas de ninar. Ela gostava muito do encanto que surgia de sua voz maviosa ao cantá-las. Ela simplesmente encantava. A emoção vinha de um lugar de grande profundidade emocional. Quem a ouvia se encantava. Como se ela fosse uma sereia que conduzia seus ouvintes a abismos emocionais encantados. E deletérios.
MÃEZONA CANTAVA e encantava. Talvez por isso quisesse parir tantos filhos e filhas. Parir despertava nela mesma uma intensa orgia de emoções que externava nas canções de ninar. E em outras muitas. A letra cantada do Acalanto de Brahms, era exemplar. Talvez ela tenha criado uma letra a partir de suas próprias e profundas percepções da emoção que a motivava acreditar que era uma divindade parideira. Pensava estar a povoar o mundo, a criar um mundo para si. Para governá-lo. Ela talvez se acreditasse uma deusa mãe que queria, ao parir os filhos, direcionar cada um deles para a vivência de um mundo caído. Caído no interior das ilusões perdidas dela.
A PROFUNDA idade da emoção que ela externava ao cantar as canções de ninar, exteriorizava uma manifesta lamentação por não poder direcionar suas criações filiais em direção a um mundo que não fosse o mundo cão que elas teriam de viver ao crescer. Alguma coisa interior naquela mulher estava radicalmente associada à uma outra dimensão do existir. Ao mesmo tempo presente e longínqua. Ela cantava e, por vezes, parecia estar tão distante, como quanto se concentrava em dá laçadas em cada nó numa linha pendente num pedaço de pano, onde parecia estar a querer, nos “nó” prender alguma coisa. Eu desconfio que cada alma, de cada filho que ela achava não estar nos conformes de suas querenças. Ela estava a prender a alma de cada filho ou filha que estivesse a reagir às suas inconfessáveis intenções.
POR QUE prendê-las??? Aquela mulher vivia num ambiente interno de grande confusão e depressão imensa. Sua solidão era contagiosa, tal qual a solidão que a paisagem pintada por Van Gogh no “Campo de Trigo Com Corvos”, transmitia. Uma solidão que comunicava toda a desolação que havia dentro da alma pessoal dela. Da alma social de seu mundo cão. Toda a perturbação mental dela estava camuflada na suave cantoria das canções de ninar. Na deliberada emoção de quando cantava “A Noite do Meu Bem”:
— “HOJE EU quero a rosa mais linda que houver/E a primeira estrela que vier/Para enfeitar a noite do meu bem/Hoje eu quero paz de criança dormindo/E abandono de flores se abrindo/Para enfeitar a noite do meu bem/Quero a alegria de um barco voltando/Quero ternura de mãos se encontrando/Para enfeitar a noite do meu bem/Ah, eu quero o amor/O amor mais profundo/Eu quero toda a beleza do mundo/Para enfeitar a noite do meu bem/Ah, como esse bem demorou a chegar/Eu já nem sei se terei no olhar/Toda a ternura que eu quero lhe dar”.
EU A OBSERVAVA: ela estava completamente absorvida num astral de um universo paralelo. Ela, ao dá cada nó na linha que pertencia a um pedaço de pano maior, estava a prender a energia vital de alguém, eu talvez, por achar que eu devia ficar prisioneiro numa arapuca de tempo e espaço dela. Só dela. Que desse tempo e espaço não pudesse sair para divergir dela. De sua “educação” de suas intenções de criação, dos objetos familiares impregnados pelo poderoso eletromagnetismo anímico dela: Semelhante ao canto lendário e sedutor das sereias, na narrativa de Homero. Ulisses sabia que, uma vez atraído por elas, e seus cantos, isso o conduziria à morte. Seu canto, seus “nó”, era uma metáfora da alma do mundo particular, em busca da cessação de vida que não fossem as vidas nomeadas por ela. Da vida que ela negava ao filho, que desejava fisgar e manter em suas entranhas frustradas. Se eu escapasse dela, ela teria perdido tempo ao me parir.
A REALIDADE que ela criava naquele universo paralelo em que se concentrava, coexistia com a realidade do mundo normativo no qual ela direcionava os destinos dos filhos, e controlava os desdobramentos de suas vidas, numa realidade paralela, separada da geografia do tempo e do espaço onde vicejavam suas almas. Na minha compreensão, ela estava tão absorta e concentrada na região anímica em que o Barco de Caronte navegava, a conduzir a alma alternativa daquele filho, ou filha, que ela desaprovava. A concentração no “nó” era total. De repente, após um período de espera, ela, de repente, puxava a linha para ambos os lados, com o polegar e o indicador de cada mão, com muita força, mas contida para não quebrar o laço.
ELA TALVEZ achasse que tinha o poder de direcionar a força quântica da alma daqueles a quem pariu, em direção a universos paralelos nos quais, talvez, existiu. Ou achava que, tenha neles vivido em outras encarnações de seu DNA, poderia fazê-los voltar para lá. De qualquer forma era uma atitude claramente insana. Era como se ela estivesse naquele universo paralelo a direcionar em cada nó que dava na linha do pedaço de pano, o algoritmo da sequência da vida e ações que não lhe interessava ver no desenvolvimento da vida do filho. Esse seu procedimento preciso, padronizava, de modo eficiente, a vida segundo ela queria que não existisse nesta dimensão. Parece complicado. E é.
AQUELA SUA atitude de concentração intensa e patética intencionalidade, lhe dava a sensação de um poder estranho, bizarro, extravagante. Um poder que ela realmente acreditava ter. A intenção de vida que não fosse deliberada por ela, não lhe interessava ver prosperar. Então ela mandava para outra dimensão no nó que apertava na linha do pano em que já havia vários outros “nó”. Em cada nó um destino de vida que ela despachava para a outro espaço no qual, naquele momento, ela também se encontrava.
MÃEZONA SE achava empoderada em suas ações que reforçavam a força determinada de sua vontade de poder sobre aquelas criaturas que ela havia parido. Cada filho dela era dela. Dela e de ninguém mais. Ela havia gestado cada um deles por nove meses. Haviam saído de sua barriga, de seu ventre. Ela os havia alimentado desde o líquido amniótico. Não admitia que os tirassem dela. Exceto pelo processo natural de crescimento que os conduziria ao emprego, ao namoro e ao casamento.
NA VIDA DIÁRIA, lá estava ela colhendo informações de um e de outro. Informações que ela redirecionava conforme seus interesses de dominação. Ela identificava cada informação que devia ser entregue a um e a outro. Ela decidia como ranquear os resultados de um “feed” ou fluxo de dados de um para outro membro da família, criando formas de comunicação entre eles, conforme exigiam seus interesses de comando, comunicação e controle do Inconsciente Coletivo Familiar. Ela era a rainha da zona.
TALVEZ, QUEM sabe, Mãezona estivesse agindo conforme uma vontade externa, superior à vontade dela. Alguma entidade astral, criada e mantida dentro dela, a partir de suas expectativas radicais de comandar as vidas que dela saíram. E que dela dependiam. Não havia nenhuma conduta moral a observar. A vontade dos outros, suas programações de DNA não poderiam nunca, superar as dela. Moral era a última coisa com que ela poderia se importar. Ela era incontestável em suas deliberações de surdina.
NA FAMÍLIA só poderia haver uma vontade: a dela. Desconfio que Mãezona pertence à uma rede mundial de computadores orgânicos, biológicos, com “sites” emocionais especializados nos conteúdos que interessam a um matriarcado sobrenatural. Os portais desse matriarcado se afirmam através do nicho que nasce e se desenvolve no líquido amniótico em suas barrigas. As gerações se sucedem sem cessar para promover a continuidade de uma dominação que vem de longe, muito longe, criada por astronautas de outros sistemas solares. Sabe-se lá, de outras galáxias. Certamente de uma civilização Et muito mais “high-tech” que a nossa.
ASTRONAUTAS aqui estiveram com ferramentas impensáveis para nosso atual grau de desenvolvimento tecnológico. Esses deuses astronautas trabalharam os muito conteúdos específicos na cadeia de DNA de hominídeos que se sucederam a outros hominídeos, através do espaço e do tempo nas épocas, períodos e estágios de desenvolvimento dito humano. Hominídeos que, por sua vez deram origem ao não tão ficcional Paraíso Perdido, Paraíso de onde surgiu o casal inicial Adão e Eva. É evidente que, mesmo essa tecnologia, não conseguiu manter na Criação, a separação entre homem/mulher.
O CONTEÚDO específico dos compostos orgânicos humanos, formados por moléculas de carbono, que agora começam a existir via manipulação em laboratórios criadores de novas formas de vida, vem sendo manipulado há milênios. Veja-se no livro de Aldous Huxley, “Admirável Mundo Novo”. O fim do Homo sapiens não apenas se inicia, mas já está em ávido processo de substituição de paradigmas de antigamente, pelo homem cibernético que está a substituir, célere, a estrutura psicofísica do primata Homo sapiens. Sapiens. Ele, parte integrante da Biota terrestre: terrestre, marinha, aquática, estuarina, lagunar, bentônica...
ADMIRÁVEL MUNDO NOVO — ALDOUS HUXLEY (1932)
ADMIRÁVEL MUNDO MORTO — DECIO GOODNEWS (1990)
QUE PODE um jovem contra as evidências de que o mundo, a alma do mundo está vigilante, ou pode estar distante de seu existir??? Quem está a controlar seus pensamentos, palavras e ações??? Que fazer para ter controle sobre eles!!! Como pode a juventude na proa conquistar o prazer do leme???!!!
SE VOCÊ ACREDITA mesmo que demônios não existem, é porque suas ações e intenções já se confundem com as deles. Você não pode vê-los com seus traumas, recalques e complexos, porque se tornou parte da intencionalidade deles. Mãezona tinha um repertório imenso de músicas de ninar. Ela gostava muito do encanto que surgia de sua voz maviosa ao cantá-las. Ela simplesmente encantava. A emoção vinha de um lugar de grande profundidade emocional. Quem a ouvia se encantava. Como se ela fosse uma sereia que conduzia seus ouvintes a seus abismos emocionais encantadores. E traiçoeiros.
MÃEZONA CANTAVA e encantava. Talvez por isso quisesse parir tantos filhos e filhas. Parir despertava nela uma intensa orgia de emoções que externava nas canções de ninar. A letra cantada do Acalanto de Brahms, era exemplar. Quando cantava ela transmitia suas próprias e profundas percepções da emoção que a motivava acreditar que era uma divindade, que estava a povoar o mundo, a criar o mundo familiar ao seu bel-prazer. Ela talvez se acreditasse uma deusa mãe que queria, ao parir os filhos, direcionar cada um deles para a vivência de um mundo que existia apenas nas ilusões perdidas dela.
A PROFUNDA idade da emoção que ela externava ao cantar as canções de ninar, exteriorizava uma manifesta lamentação por não poder direcionar suas criações filiais em direção a um mundo que não fosse o mundo cão que elas teriam de viver ao crescer. Alguma coisa interior naquela mulher estava radicalmente associada à uma outra dimensão do existir. Longínqua. Ao mesmo tempo presente e alhures. Ela cantava e, por vezes, parecia estar tão distante quanto se concentrava em dá laçadas em cada nó numa linha pertencente a um pedaço de pano onde parecia querer prender alguma coisa. Eu desconfio que cada alma, de cada filho. Ela estava a prender a alma de cada filho ou filha que estivesse a reagir às suas inconfessáveis intenções.
POR QUE prendê-las??? Aquela mulher vivia num ambiente interno de grande frenesi, pandemônio e depressão. Sua solidão era contagiosa, tal qual a solidão que a paisagem pintada por Van Gogh no Campo de Trigo Com Corvos, transmitia. Uma solidão que comunicava toda a desolação que havia dentro da alma pessoal dela. Da alma social de seu mundo cão. Toda a perturbação mental dela estava camuflada na suave cantoria das canções de ninar. Na deliberada emoção de quando cantava outras canções, a exemplo de “A Noite do Meu Bem”, lamentosa e nostálgica composição de Dolores Duran:
“HOJE EU quero a rosa mais linda que houver/E a primeira estrela que vier/Para enfeitar a noite do meu bem/Hoje eu quero paz de criança dormindo/E abandono de flores se abrindo/Para enfeitar a noite do meu bem/Quero a alegria de um barco voltando/Quero ternura de mãos se encontrando/Para enfeitar a noite do meu bem/Ah, eu quero o amor/O amor mais profundo/Eu quero toda a beleza do mundo/Para enfeitar a noite do meu bem/Ah, como esse bem demorou a chegar/Eu já nem sei se terei no olhar/Toda a ternura que eu quero lhe dar”.
EU A OBSERVAVA: ela estava completamente absorvida num astral de um universo paralelo. Ela, ao dá cada nó na linha que pertencia a um pedaço de pano maior, estava a prender a energia vital de alguém, eu talvez, por achar que eu devia ficar prisioneiro numa arapuca de tempo e espaço dela. Só dela. Por vezes o pedaço de pano tinha vários seguimentos ao redor.
NESSE TEMPO E espaço no qual se refugiava dos problemas que ela mesma criava. No tempo e espaço de seu larbirinto, ninguém podia divergir dela. Semelhante ao canto lendário e sedutor das sereias, na narrativa de Homero, quem a ouvia sentia-se atraído pela emoção transbordante. Ulisses sabia que, uma vez atraído por elas, sereias, seus cantos, isso o conduziria à morte. Seu canto, seu “nó”, era uma metáfora da alma do mundo em busca da cessação de vida que não fosse a dela. Da vida que ela não havia vivido. Da vida que ela negava ao filho.
A REALIDADE que ela criava naquele universo paralelo em que se concentrava, coexistia com a realidade do mundo normativo no qual ela direcionava os destinos dos filhos, e controlava, até certo ponto, os desdobramentos de suas vidas, numa realidade paralela, separada da geografia do tempo e do espaço onde vicejavam seus corpos. Em minha compreensão, ela estava tão absorta e concentrada na região etérea de seu psiquismo ionizado por uma mediunidade facécia, em que o Barco de Caronte navegava. Como se já estivessem mortos.
ELA TALVEZ achasse que tinha o poder de direcionar a força quântica da alma daqueles a quem pariu, em direção a universos paralelos nos quais existiu. Ou no qual existiram seus ancestrais. Ela não atinava nada das mudanças que do mundo real, exterior às suas frívolas percepções: ela se fechara às realidades do mundo exterior ao mundo superficial de suas bailarinas e príncipes, que ela manipulava com pinça quente na pele de seus bonecos e bonecas. Nesta dimensão do existir, seu DNA não estava nada confortável.
MÃEZONA SE achava empoderada de suas ações que reforçavam a força determinada de sua vontade de poder sobre aquelas criaturas que ela havia parido. Cada filho dela era dela. Dela e de ninguém mais. Até onde ela pudesse resguardá-los da vida real do mundo exterior. Ela havia gestado cada um deles por nove meses. Haviam saído de sua barriga, de seu ventre. Ela os havia alimentado desde o líquido amniótico. Eram dela, até onde ela poderia retê-los. De ninguém mais.
TALVEZ, QUEM sabe, Mãezona estivesse agindo conforme uma vontade externa, superior à vontade dela. Alguma entidade astral, criada e mantida dentro dela, a partir de suas expectativas radicais de comandar as vidas que dela saíram. E que dela dependeram completamente quando hóspedes do líquido amniótico. Não havia nenhuma conduta moral a observar. A vontade dos outros, suas programações de DNA não poderiam nunca, superar às programações dela. Ela era incontestável em suas deliberações de surdina.
NA FAMÍLIA só poderia haver uma vontade: a dela. Desconfio que Mãezona pertence à uma rede mundial de computadores orgânicos, biológicos, com “Soft” emocional especializados nos conteúdos que interessam a um matriarcado sobrenatural. Os portais desse matriarcado se afirmavam e confirmavam para promover a continuidade de uma dominação matriarcal que vem de longe, muito longe, criada por astronautas de outros sistemas solares. Sabe-se lá, de outras galáxias. Seu coração era duro igual a rigidez do Q-Carbon. Seus compostos carbônicos talvez tenham sido criados para ser, através dos séculos dos séculos, sempre os mesmos.
ELA ERA PRODUTO específico dos compostos orgânicos, ditos humanos, formados por moléculas de carbono, manipuladas em laboratórios criadores de várias formas de vida. Laboratórios Ets destinadas a povoar esse planeta. Entre outros. Veja-se o livro de Aldous Huxley, “Admirável Mundo Novo”. O fim do Homo sapiens não apenas se inicia, mas já está em ávido processo de substituição de paradigmas geracional antanho. A espécie à qual Mãezona pertence, em breve será substituída pelo homem cibernético. Em sua estrutura psicofísica anacrônica de primata Homo sapiens. A espécie dela, em poucas centúrias de anos, passará a existir apenas em museus. Que pode um jovem contra as evidências de que o mundo, a alma do mundo, está vigilante de seu existir??? A controlar seus pensamentos, palavras e ações??? Que fazer!!! Como pode a juventude na proa do Tempo, conquistar o prazer do leme???!!!
O PRIMEIRO LIVRO URIZEN (PLANILHA 15) — WILLIAM BLAKE (1794)
MÃEZONA CANTAVA e encantava dezenas de canções de ninar. Dentre elas, esta que dizia: “Dorme, oh meu anjo lindo/Bem calmo sorrindo/Que eu velo por ti/Dorme, e sonha com a lua/Dorme sossegado/Que minha´lma é tua/Dorme que esse dia é findo/E a lua está sorrindo/A brilhar por ti/Dorme que meus lábios cantam/Esperam meu amado/Você dormir/A noite chega, a lua sorrir/Meus lábios cantam/Cantam por ti/Dorme, que a noite é da lua/Como minha´lma é tua/E eu canto por ti”.
A SONORIDADE emocional dessa canção soava pela casa como se fosse o hino entoado por um Anjo do Senhor em homenagem a alguma divindade. Um anjo, que em certas comemorações que envolvem adoração e emoção daqueles que cantam em sua homenagem. Cantam por sentirem no fundo de suas mentes, a amorosidade intensa de seus corações. Eu me emocionava a ouvi-la. Não por muito tempo. Afinal de contas, ela agia no dia a dia, como se eu fosse alguém muito distante dela.
EU NÃO ERA mais uma criancinha. Eu não era mais um bebê. Ela cantava para todos os recém paridos, no berço de cada um deles, por algum tempo. Quando crescessem mais um pouco, saíam todos do interesse sentimental dela. E minhas necessidades de criança crescida, ela fazia dormir, quando eu mais precisava dela para me ajudar a investir em minha educação e me despertar em direção às reponsabilidades da vida adulta, ela sempre, com muita convicção, me faltou.
ELA CANTAVA canções de ninar, como se seu canto fosse um acalanto, quando, realmente, era uma atração emocional profunda, que conduzia cada criança, desde o berço, em direção ao Inconsciente Pessoal dela, que representava o buraco negro da escuridão. Seu canto soava como se da garganta de um Anjo do Senhor. Anjo do Senhor tenebroso das trevas, que mantinha vivo seu DNA através do tempo. Das gerações, das eras. A criança quando crescesse, não mais seria uma atração para ela. Então, ela se dedicava a seus bonecos e bonecas. Os quais podia moldar conforme sua insana vontade.
A ÁRVORE DA Vida para Paizão Coisinha, era um sapotizeiro. Uma árvore frondosa, plantada na área de serviço da casa no bairro Ilhotas. O sapoti, fruto do sapotizeiro, originário da Ásia, América Central e Oceania. Fonte de vitaminas A, C e do complexo B, que funcionam como aliados da imunidade. Altas temperaturas e umidade favorecem seu crescimento que pode atingir até 15 metros. O sapotizeiro atrai morcegos e problemas decorrentes de colônias destes. Três dessas espécies se alimentam de sangue.
PAIZÃO SE orgulhava de ter plantado o sapotizeiro. Distribuía seus frutos abundantes a vizinhos. Paizão era, ele mesmo, um morcego. Um morcego humano que controlava o sistema nervoso central dos filhos que haviam sentado em seu colo de pedófilo. Uma vez crescidos, já adultos, ele gostava de magnetizar suas mentes a partir de seus traumas. Uma vez silenciadas na infância. Elas tinham medo, mas, que podiam fazer para sair da dependência anímica nefasta que ele criava nelas??? Lembro-me ainda daquela energia que de seu corpo e mente emanava quando tentava me fazer absorver por pelo negror de uma neblina que me envolvia a alma infantil. Eu berrava desesperadamente. Tanto, que ele perdia a paciência e por vezes me lançava no solo frio da sala da casa antiga.
EU FICAVA coberto de escoriações. E continuava berrando, até que, finalmente, Mãezona vinha em meu socorro. Aquele morcego humano se alimentava da alma singela de suas crianças para infundir um princípio de dominação anímica macabra, que se prolongava pela vida adultas. Ele sabia atrair na alma adulta da prole, a alma infantil que nela, memória astral, ainda estava lá, disponível.
PAIZÃO SABIA como acessar a espiral de DNA de suas crias. A árvore da vida de Paizão Coisinha, era um lugar de reunião de morcegos familiares que tinham a mesma tecnologia de acesso à alma infantil de seus filhos. O Inconsciente Coletivo Familiar Mundial, de uma enorme colônia universal de morcegos que haviam induzido os filhos pequenos, à entrega de suas almas ingênuas, uma vez dominadas pela infiltração das trevas da pedofilia nelas. Ele sabia como atraí-las ainda tanto tempo depois de escravizadas.
O ATO SEXUAL possui uma sensibilidade especial, uma expressão intencional de busca de prazer e reciprocidade. Uma criança exposta às taras de um pedófilo, não tem como fugir da empatia forçada à qual é submetida. Uma vez submersa nessa intencionalidade, fica nela presa e exposta aos malefícios da intenção adulta. A memória dessa experiência traumática não é facilmente recuperada pelo adulto que a sofreu quando criança. Paizão fazia parte desse Inconsciente Coletivo Traumático Universal, que de há muitas gerações vem impondo suas mazelas e problemas, através do ato libidinoso covarde, com intuito de se aproveitar futuramente desse crime para o qual não há punição. Nem perdão.
NÃO HÁ PUNIÇÃO porque perpetrado pelo criminoso nos mais subterrâneos nichos do “lar amargo lar”, onde ninguém mais tem acesso a um pai que traumatiza o filho ou a filha com atos de pedofilia, como se estivesse a brincar de satanizar sua alma e, posteriormente a ela ter acesso, a partir do gatilho de uma memorização PSI da qual nem a criança nem o adulto vitimado sabem como dela sair.
AS CRIANÇAS esperam dos pais amorosidade e empatia à sua condição de ingenuidade. A pedofilia não respeita essa condição. Essa paternidade criminosa sabe, tem plena consciência, de que as crianças têm medo do que não conhecem. Não há amor nem afetividade no sexo com crianças. Há maldade que traumatiza sua fragilidade. Crianças carecem de respeito enquanto seres humanos indefesos às taras de seus pais que não sentem obrigação de respeitá-las.
O ÓDIO, A raiva, a ira que subjaz no Inconsciente Pessoal Coletivo dessas crianças traídas, acompanham os adultos que se tornarão futuramente, seres frustrados, que não conseguem fazer fluir harmoniosamente a energia vital contaminada na aquisição de suas experiências na escola, nos grupos de conhecidos, vizinhos, nos relacionamentos com outras crianças e jovens também vitimadas.
ESSAS CRANÇAS e jovens não sabem como sair da arapuca em que seus tutores inseriram em suas semiconsciências malbaratadas. Eles incineraram suas vidas, antes mesmo que as pudessem viver. Transformam-se, grande maioria deles, em fantasmas de seus fantasmas. O elo emocional que os conecta com seus pais ou parentes chegados a atos de pedofilia, os faz sentirem-se algemados a eles, resultando numa associação tipo “Síndrome de Estocolmo”: quando a vítima da agressão, sequestro ou abuso desenvolve sentimentos de empatia com seus chupins, parasitas ou sanguessugas.
O PRIMEIRO LIVRO de Urizen reescreve de forma pouco ortodoxa “O Pentateuco”. Tal reescrita das Escrituras judaicas e cristãs fornece a oportunidade de uma leitura de decodificação polissêmica dos textos sagrados. William Blake escreveu duas colunas de texto em cada folha. Essa façanha ou performance literária expões eu espírito indomável, radical. Existem duas únicas cópias desse Livro que incluem a série completa de vinte e oito placas. Sua criação inclui artes plásticas e literárias. Reconhecido por suas gravações e poesias. Expressou o contexto político e social de sua época.
WILLIAM BLAKE afirmou que seu nascimento patenteou “o surgimento de um novo céu” na Arte, no qual sua criatividade havia sido configurada por Milton e Michelângelo. Um grupo de jovens artistas que se denominavam “Os Antigos”, trabalharam para perpetuar a continuada influência dele nas gerações futuras. No livro “O Casamento do Céu e do Inferno”, escrito no estilo imitativo das profecias bíblicas, expressou opiniões e convicções românticas de vanguarda, no período histórico do registro iluminista e da revolução industrial. Ele é aqui citado, devido a influência de sua concepção cósmica e mística, que ironizava a mandi-visão maniqueísta e convencional do filósofo Swedenborg em Paraíso e Inferno. Para ele o mundo material e o desejo físico são igualmente sancionados pela ordem divina.
FIRST BOOK OF URIZEN (PLANILHA 17) — WILLIAM BLAKE (1794/96)
OU: MECÂNICA DO MAGNETISMO PELA GEOMETRIA SAGRADA
VIVEMOS NUMA sociedade de trogloditas vestidos em grifes da moda. Quem que vai pagar por isso??? Como se desvencilhar dos elos traumáticos que ligam as vítimas de pedofilia ao sentimento de empatia com seus vampiros??? Como se livrar dessa danação??? Quem que vai pagar por isso??? A criança acorda para ver seu futuro pendurado numa corda. Quem que vai pagar por isso??? Os bilhões roubados da saúde, da educação pelas “Gretchen” do orçamento secreto... Quem vai pagar por isso??? As milhares de mortes por falta de vacina no braço dos brasileiros assassinados pelo “Corvo do Planalto”. Quem vai pagar por isso???
QUEM É QUE VAI pagar por uma sociedade gerida por satanistas que querem, por todos os meios e fins, direcionar os destinos que comandam a partir do incremento pessoal, familiar e social da necessidade??? Se você não frequenta o Rotary Clube, azar o seu. Se você não quer satanizar sua vida, seus sentimentos, seu emocional... Azar o seu.
QUEM É QUE VAI parar com isso??? Quem é que vai parar com isso??? A cultura familiar da pedofilia universalizada, originou não apenas a dramaturgia de Nelson Rodrigues. Originou a realidade brasileira em que ela se baseia e estrutura. Quem que vai pagar pelas multidões de vítimas??? Quem que vai pagar pelas paradas gays. Elas deram origem às massivas manifestações de trágica e suposta alegria. Como são tristes em suas troças, dissipações, suas saturnais rapiocas. Seus festins e diversões.
NO BRASIL e em volta do mundo globalizado por uma prática troglodita de habitantes das cavernas urbanas, dedicados à pirataria da libido universal em suas denominações de degenerada sexualidade. Existem 52 opções de identidade sexual. Alguns exemplos: LGBTQIA+: (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Transgêneros, Queer, Questionando, Intersexuais, Curiosos, Assexuais, Aliados, Pansexuais, Polis Sexuais, Familiares, “Two-spirit” e “Kink”). Two-spirit = identidade indígena americana de quem não possui padrão de gênero homem/mulher. Kink = fetiche. Pessoa com fetiche.
CONSIDEREMOS QUE existe uma “Linha de Visibilidade” e simultaneamente uma “Linha de Interação” nas ações e reações de cada indivíduo. Quando vemos uma multidão de pessoas fantasiadas de todas as formas nas paradas gays, a esconder a real identidade de cada uma, suas características de personalidade, suas capacidades inatas (que por vezes elas mesmas desconhecem) ... O que realmente estamos vendo??? Qual a realidade por detrás da suposta e da real insanidade???
ESTAMOS, NESSAS ocasiões, vendo o aspecto mais exterior de uma farsa: pessoal e coletiva. Estamos vendo a mistificação, uma miscigenação que dramatiza uma situação pessoal e social de grande dramaticidade. Seus dramas mais íntimos estão expostos e esconsos ao mesmo tempo. Não há mais reserva de pudor. Não há mais constrangimento, humilhação, timidez, vexame em mostrar o que nelas se desgastou, se esvaiu, se carnavalizou. A mostra está, e não está, em nível subterrâneo e externo. Não há mais sonhos que não estejam contaminados por essa realidade revelada nessas passatas.
O PRIMEIRO LIVRO de Urizen está em íntima relação com a Bíblia. É uma reescrita heterodoxa do Livro do Gênesis: “A Queda” e a quebra das leis abstratas quando Urizen se separa de seus companheiros. Criada a diferença, a ausência, a autoconsciência, Urizen cai no vazio da Criação: construiu a própria materialidade na dimensão de um tempo no qual não mais pode descer ou subir. Dependendo do entendimento da própria perspectiva epistemológica e/ou ontológica, ele, Urizen, fundamenta sua reflexão sobre a natureza, o conhecimento de suas fontes: a percepção, a memória, a razão, ao definir as diferenças entre crença, conhecimento e verdade.
A MULTIDÃO numa parada gay está em busca de se aceitar. Aceitar-se pessoal e socialmente. Esconde e ao mesmo tempo mostra, a devastadora verdade de que a realidade pessoal, familiar e social danificou nela, manada, definitivamente: outra possível identidade. Qualquer que sejam seus valores e atributos, essas pessoas estão definitivamente contaminadas por outra formação de identidade e influências interpessoais das quais não podem mais sair. Às quais só podem se adaptar.
FORAM CAPTURADAS por uma rede de intrigas e futricas. Foram absorvidas, sugadas, abduzidas por uma civilização e cultura fraudulentas: aprenderam a ser o que são na universidade familiar e social das candongas e fuxicos. Uma rede de intrigas da qual não podem mais sair. Tal como peixes numa tarrafa de pescador. O pescador é toda pessoa que delas tira proveito de suas fraquezas, de suas abominações psicológicas das quais não é mais possível esquivar-se ou se evadir. Não podem mais parar de impactar suas vidas fora dessa morbidade que elas vendem como se fosse “orgulho gay”.
ELAS BUSCAM fazer sentido a si mesmas, a si mesmos, aos outros. O complexo de conhecimentos, crenças, moral, costumes, leis, artes e qualquer outra capacidade inata ou adquirida, não pode mais ser mascarado. Elas simplesmente acataram o comportamento padrão, na dimensão que ele se apresenta uma inevitabilidade cultural. Uma continuidade frenética, social, de natureza animal sodomizada da qual não há como sair. Correr. Fugir.
CHRISTOPHER HOBSON registrou que Blake não era homossexual ou bissexual. Ele simpatizava com homossexuais e lésbicas em solidariedade ao preconceito e a discriminação sofridas por eles. E elas. Sua pesquisa está justificada na história da sociedade no século XVIII, início do XIX, quando surge a consciência de identificação uranista masculina, ao mesmo tempo que a intolerância e a repressão de antagonismo popular. A tradição republicana na época era inimiga da sodomia. Seu contemporâneo contíguo, Jeremy Bentham, aceitava a homossexualidade enquanto um traço do caráter grupal que diferenciava esse grupo de outras variantes do comportamento sexual, social e cultural humano.
BLAKE IDENTIFICA-SE com Milton em conexões literárias de sentido e significado, reservando-se independência, conquanto sugira simultaneidade de caráter cultural e social ao grupo compartilhado na comunidade à qual pertenciam. Pertenciam ao mesmo conjunto de valores que definem as relações instrutivas relativamente ao padrão cultural da sociedade em que viviam. Milton obteve de Blake as mais sugestivas homenagens, devido as afinidades de ambas as literaturas. Talvez seja possível identificar ambos esses autores à influência exercida em Blake por Milton.
“MILTON” É UMA POESIA épica de William Blake escrita e ilustrada por ele. Nela, John Milton retorna do céu e confraterniza com Blake. Ambos objetivam servir-se dos nexos e conexões literárias entre os escritores contemporâneos e à progênie libertária à qual ambos pertenciam. A obra permite uma avaliação do cenário ambiental da época:
“DEUS TODO-PODEROSO assenhorou-se de todas as coisas, no céu, na terra e nas águas, na mais excelsa e perfeita ordem. No céu uniu diferentes ordens e classes de arcanjos e anjos. Na terra dispôs reis, príncipes e outros governantes sob eles, todos em justa e necessária bordem... O homem em todas as suas partes, interiores e exteriores: alma, coração, mente: memória, entendimento, razão, linguagem. A cada membro do seu corpo em uma útil, necessária e agradável ordem. Cada categoria de pessoas com sua vocação, ofício e função as dispôs em seu dever e configuração. Algumas estão em posições altas, outras em posições baixas, alguns são reis e príncipes, outros são subalternos e subordinados, sacerdotes e leigos, mestres e servos, pais e filhos, maridos e esposas, ricos e pobres, e um precisa do outro...”. Sempre.