Frases De Mário Quintana - Parte III

Fere de leve a frase... E esquece... Nada

Convém que se repita...

Só em linguagem amorosa agrada

A mesma coisa cem mil vezes dita.

CANÇÃO DO AMOR IMPREVISTO

Eu sou um homem fechado.

O mundo me tornou egoísta e mau.

E a minha poesia é um vício triste,

Desesperado e solitário

Que eu faço tudo por abafar.

Mas tu apareceste com a tua boca fresca de madrugada,

Com o teu passo leve,

Com esses teus cabelos...

E o homem taciturno ficou imóvel, sem compreender

nada, numa alegria atônita...

A súbita, a dolorosa alegria de um espantalho inútil

Aonde viessem pousar os passarinhos.

PRESENÇA

É preciso que a saudade desenhe tuas linhas perfeitas,

teu perfil exato e que, apenas, levemente, o vento

das horas ponha um frêmito em teus cabelos...

É preciso que a tua ausência trescale

sutilmente, no ar, a trevo machucado,

as folhas de alecrim desde há muito guardadas

não se sabe por quem nalgum móvel antigo...

Mas é preciso, também, que seja como abrir uma janela

e respirar-te, azul e luminosa, no ar.

É preciso a saudade para eu sentir

como sinto - em mim - a presença misteriosa da vida...

Mas quando surges és tão outra e múltipla e imprevista

que nunca te pareces com o teu retrato...

E eu tenho de fechar meus olhos para ver-te.

O LUAR

O luar,

é a luz do Sol que está sonhando

O tempo não pára!

A saudade é que faz as coisas pararem no tempo...

...os verdadeiros versos não são para embalar,

mas para abalar...

A grande tristeza dos rios é não poderem levar a tua imagem...

EU QUERIA TRAZER-TE UNS VERSOS MUITO LINDOS

Eu queria trazer-te uns versos muito lindos

colhidos no mais íntimo de mim...

Suas palavras

seriam as mais simples do mundo,

porém não sei que luz as iluminaria

que terias de fechar teus olhos para as ouvir...

Sim! Uma luz que viria de dentro delas,

como essa que acende inesperadas cores

nas lanternas chinesas de papel!

Trago-te palavras, apenas... e que estão escritas

do lado de fora do papel... Não sei, eu nunca soube o que dizer-te

e este poema vai morrendo, ardente e puro, ao vento

da Poesia...

como uma pobre lanterna que incendiou!

O verdadeiro analfabeto é aquele que sabe ler, mas não lê.

A esperança é um urubu pintado de verde.

DOS NOSSOS MALES

A nós bastem nossos próprios ais,

Que a ninguém sua cruz é pequenina.

Por pior que seja a situação da China,

Os nossos calos doem muito mais...

Só as crianças e os bem velhinhos conhecem a volúpia de viver dia a dia, hora a hora, e suas esperanças são breves.

A indiferença é a maneira mais polida de desprezar alguém.

Minha vida não foi um romance...

Nunca tive até hoje um segredo.

Se me amar, não digas, que morro

De surpresa... de encanto... de medo...

Minha vida não foi um romance

Minha vida passou por passar

Se não amas, não finjas, que vivo

Esperando um amor para amar.

Minha vida não foi um romance...

Pobre vida... passou sem enredo...

Glória a ti que me enches de vida

De surpresa, de encanto, de medo!

Minha vida não foi um romance...

Ai de mim... Já se ia acabar!

Pobre vida que toda depende

De um sorriso.. de um gesto.. um olhar...

Tão bom viver dia-a-dia...A vida, assim, jamais cansa.

Da vez primeira em que me assassinaram,

Perdi um jeito de sorrir que eu tinha.

Depois, a cada vez que me mataram,

Foram levando qualquer coisa minha.

Hoje, dos meu cadáveres eu sou

O mais desnudo, o que não tem mais nada.

Arde um toco de Vela amarelada,

Como único bem que me ficou.

Vinde! Corvos, chacais, ladrões de estrada!

Pois dessa mão avaramente adunca

Não haverão de arracar a luz sagrada!

Aves da noite! Asas do horror! Voejai!

Que a luz trêmula e triste como um ai,

A luz de um morto não se apaga nunca!

Eu escrevi um poema triste

Eu escrevi um poema triste

E belo, apenas da sua tristeza.

Não vem de ti essa tristeza

Mas das mudanças do Tempo,

Que ora nos traz esperanças

Ora nos dá incerteza...

Nem importa, ao velho Tempo,

Que sejas fiel ou infiel...

Eu fico, junto à correnteza,

Olhando as horas tão breves...

E das cartas que me escreves

Faço barcos de papel!

Ah! Essas Precauções...

Para desespero de seus parentes, o velho rei Mitridates, como todo mundo sabe, conseguiu tornar-se imune a todos os venenos... até que um bom tijolaço na cabeça liquidou o assunto.

Hoje me acordei pensando em uma pedra numa rua de Calcutá. Numa determinada pedra numa rua de Calcutá. Solta. Sozinha. Quem repara nela? Só eu, que nunca fui lá. Só eu, deste lado do mundo, te mando agora esse pensamento... Minha pedra de Calcutá!

A saudade da amada criatura

é bem melhor do que a presença dela.

Não faças da tua vida um rascunho.

Poderás não ter tempo de passá-la a limpo.

Esta vida é uma estranha hospedaria,

De onde se parte quase sempre às tontas,

Pois nunca as nossas malas estão prontas,

E a nossa conta nunca está em dia.

Tenta Esquecer-me

Tenta esquecer-me...

Ser lembrado é como evocar

Um fantasma... Deixa-me ser o que sou,

O que sempre fui, um rio que vai fluindo...

Em vão, em minhas margens cantarão as horas,

Me recamarei de estrelas como um manto real,

Me bordarei de nuvens e de asas,

Às vezes virão a mim as crianças banhar-se...

Um espelho não guarda as coisas refletidas!

E o meu destino é seguir... é seguir para o Mar,

As imagens perdendo no caminho...

Deixa-me fluir, passar, cantar...

Toda a tristeza dos rios

É não poder parar!

Nós vivemos a temer o futuro,

mas é o passado que nos atropela e mata.

Para sempre é muito tempo. O tempo não pára! Só a saudade é que faz as coisas pararem no tempo.

O MATA-BORRÃO

O mata-borrão absorve tudo e no fim da vida acaba confundindo as coisas por que passou... O mata borrão parece gente!

LEGÍTIMA APROPRIAÇÃO

Copio e assino essa frase encontrada no velho Schopenhauer: "A soma de barulho que uma pessoa pode suportar está na razão inversa de sua capacidade mental".

Confesso que até hoje só conheci dois sinônimos perfeitos: 'nunca' e 'sempre'.

O Auto Retrato

No retrato que me faço

- traço a traço -

às vezes me pinto nuvem,

às vezes me pinto árvore...

às vezes me pinto coisas

de que nem há mais lembrança...

ou coisas que não existem

mas que um dia existirão...

e, desta lida, em que busco

- pouco a pouco -

minha eterna semelhança,

no final, que restará?

Um desenho de criança...

Terminado por um louco!

EU QUERO É TEU CALOR ANIMAL

Mas onde já se ouviu falar num amor à distância,

Num teleamor?

Num amor de longe…

Eu sonho é um amor pertinho…

E depois

Esse calor humano é uma coisa que todos - até os executivos têm

É algo que acaba se perdendo no ar

No vento

No frio que agora faz…

Escuta!

O que eu quero

O que eu amo

O que eu desejo em ti

É teu calor animal…

Quero todo o teu espaço

e todo o teu tempo.

Quero todas as tuas horas

e todos os teus beijos.

Quero toda a tua noite

e todo o teu silêncio.

ESPERANÇA

Lá bem no alto do décimo segundo andar do Ano

Vive uma louca chamada Esperança

E ela pensa que quando todas as sirenas

Todas as buzinas

Todos os reco-recos tocarem

Atira-se

E

— ó delicioso vôo!

Ela será encontrada miraculosamente incólume na calçada,

Outra vez criança...

E em torno dela indagará o povo:

— Como é teu nome, meninazinha de olhos verdes?

E ela lhes dirá

(É preciso dizer-lhes tudo de novo!)

Ela lhes dirá bem devagarinho, para que não esqueçam:

— O meu nome é ES-PE-RAN-ÇA...

Nada como o tempo.

Não Olhe para os Lados

Seja um poema, uma tela ou o que for, não procure ser diferente.

O segredo único está em ser indiferente.

Por que será que a gente vive chorando os amigos mortos e não aguenta os que continuam vivos?

A mentira é uma verdade que se esqueceu de acontecer.

O aborto não é, como dizem, simplesmente um assassinato. É um roubo... Nem pode haver roubo maior. Porque, ao malogrado nascituro, rouba-se-lhe este mundo, o céu, as estrelas, o universo, tudo. O aborto é o roubo infinito.

Uma alegria para sempre

As coisas que não conseguem ser

olvidadas continuam acontecendo.

Sentimo-las como da primeira vez,

sentimo-las fora do tempo,

nesse mundo do sempre onde as

datas não datam. Só no mundo do nunca

existem lápides... Que importa se –

depois de tudo – tenha "ela" partido,

casado, mudado, sumido, esquecido,

enganado, ou que quer que te haja

feito, em suma? Tiveste uma parte da

sua vida que foi só tua e, esta, ela

jamais a poderá passar de ti para ninguém.

Há bens inalienáveis, há certos momentos que,

ao contrário do que pensas,

fazem parte da tua vida presente

e não do teu passado. E abrem-se no teu

sorriso mesmo quando, deslembrado deles,

estiveres sorrindo a outras coisas.

Ah, nem queiras saber o quanto

deves à ingrata criatura...

A thing of beauty is a joy for ever

disse, há cento e muitos anos, um poeta

inglês que não conseguiu morrer.

O melhor do susto é esperar por ele.

O despertador é um acidente de tráfego de sono.

O silêncio é um espião.

O poema é uma bola de cristal. Se apenas enxergares nele o teu nariz, não culpes o mágico.

Amigos não consultem os relógios quando um dia me for de vossas vidas... Porque o tempo é uma invenção da morte: não o conhece a vida - a verdadeira - em que basta um momento de poesia para nos dar a eternidade inteira.

A morte é a libertação total: a morte é quando a gente pode, afinal, estar deitado de sapatos.

Atirei-me, pois, metaforicamente, pela janela do tricentésimo-sexagésimo-quinto andar do ano passado.

Morri? Não. Ressuscitei.

Da amizade entre mulheres

Dizem-se amigas... Beijam-se... Mas qual!

Haverá quem nisso creia?

Salvo se uma das duas, por sinal,

For muito velha, ou muito feia...

Do sabor das coisas

Por mais raro que seja,

Ou mais antigo,

Só um vinho é deveras excelente:

Aquele que tu bebes calmamente

Com o teu mais velho

E silencioso amigo...

Mario Quintana

RECORDO AINDA

Recordo ainda... e nada mais me importa...

Aqueles dias de uma luz tão mansa

Que me deixavam, sempre, de lembrança,

Algum brinquedo novo à minha porta...

Mas veio um vento de Desesperança

Soprando cinzas pela noite morta!

E eu pendurei na galharia torta

Todos os meus brinquedos de criança...

Estrada afora após segui... Mas, aí,

Embora idade e senso eu aparente

Não vos iludais o velho que aqui vai:

Eu quero os meus brinquedos novamente!

Sou um pobre menino... acreditai!...

Que envelheceu, um dia, de repente!...

O maior truque já realizado pelo diabo foi convencer o mundo de que ele não existe.

O cotidiano é o icógnito do mistério.

As mãos que dizem adeus são pássaros que vão morrendo lentamente.

Se eu fosse acreditar mesmo em tudo o que eu penso, ficaria louco.

O velho do espelho

Por acaso, surpreendo-me no espelho: quem é esse

Que me olha e é tão mais velho do que eu?

Porém, seu rosto...é cada vez menos estranho...

Meu Deus, Meu Deus...Parece

Meu velho pai - que já morreu!

Como pude ficarmos assim?

Nosso olhar - duro - interroga:

"O que fizeste de mim?!"

Eu, Pai?! Tu é que me invadiste,

Lentamente, ruga a ruga...Que importa? Eu sou, ainda,

Aquele mesmo menino teimoso de sempre

E os teus planos enfim lá se foram por terra.

Mas sei que vi, um dia - a longa, a inútil guerra!-

Vi sorrir, nesses cansados olhos, um orgulho triste...

O amor é quando a gente mora um no outro.

Mario Quintana

Alma errada

Há coisas que a minha alma,

já mortificada não admite:

assistir novelas de TV

ouvir música Pop

um filme apenas de corridas de automóvel

uma corrida de automóvel num filme

um livro de páginas ligadas

porque, sendo bom,

a gente abre sofregamente a dedo:

espátulas não há…

e quem é que hoje faz questão de virgindades…

E quando minha alma estraçalhada a todo instante pelos telefones

fugir desesperada

me deixará aqui, ouvindo o que todos ouvem,

bebendo o que todos bebem,

comendo o que todos comem.

A estes, a falta de alma não incomoda.

(Desconfio até que minha pobre alma fora destinada ao habitante de outro mundo).

E ligarei o rádio a todo o volume,

gritarei como um possesso nas partidas de futebol,

seguirei, irresistivelmente,

o desfilar das grandes paradas do Exército.

E apenas sentirei, uma vez que outra,

a vaga nostalgia de não sei que mundo perdido…

Viver é acalentar sonhos e esperanças, fazendo da fé a nossa inspiração maior. É buscar nas pequenas coisas, um grande motivo para ser feliz!

Slogan para o ministério da saúde: o fumante é um retardado que ainda não conseguiu deixar de mamar.

"Diabético" é quem não consegue ser doce.

"Anão" é quem não sabe deixar o amor crescer.

Um dia...Pronto!...Me acabo.

Pois seja o que tem de ser.

Morrer: Que me importa?

O diabo é deixar de viver.

Nunca me dê o Céu...Quero é sonhar com ele na inquietação feliz do Purgatório.

Do Mau Estilo...

Todo o bem, todo o mal que eles te dizem, nada

Seria, se soubessem expressá-lo...

O ataque de uma borboleta agrada

Mais que todos os beijos de um cavalo.

DA DISCRETA ALEGRIA

Longe do mundo vão, goza o feliz minuto

Que arrebataste às horas distraídas.

Maior prazer não é roubar um fruto

Mas sim ir saboreá-lo às escondidas.

DA BOA E DA MÁ FORTUNA

É sem razão, e é sem merecimento,

Que a gente a sorte maldiz:

Quanto a mim, sempre odiei o sofrimento,

Mas nunca soube ser feliz...

DA PAZ INTERIOR

O sossego interior, se queres atingi-lo,

Não deixes coisa alguma incompleta ou adiada.

Não há nada que dê um sono mais tranquilo

Que uma vingança bem executada...

DA MEDIOCRIDADE

Nossa alma incapaz e pequenina

Mais complacências que irrisão merece.

Se ninguém é tão bom quanto imagina,

Também não é tão mau como parece.

DO ESPÍRITO E DO CORPO

O espírito é variável como o vento,

Mais coerente é o corpo, e mais discreto...

Mudaste muita vez de pensamento,

Mas nunca de teu vinho predileto...

DA ANÁLISE

Eis um problema! E cada sábio nele aplica

As suas lentes abismais.

Mas quem com isso ganha é o problema, que fica

Sempre com um X a mais...

DA ETERNA PROCURA

Só o desejo inquieto, que não passa,

Faz o encanto da coisa desejada...

E terminamos desdenhando a caça

Pela doida aventura da caçada.

DOS PONTOS DE VISTA

A mosca, a debater-se: "Não! Deus não existe!

Somente o Acaso rege a terrena existência."

A Aranha: "Glória a Ti, Divina Providência,

Que à minha humilde teia essa mosca atraíste!"

Ela era branca, branca. Dessa brancura que não se usa mais. Mas sua alma era furta-cor.

Com o tempo, não vamos ficando sozinhos apenas pelos que se foram, vamos ficando sozinhos uns dos outros.

A eternidade é um relógio sem ponteiros.

Os antigos retratos de parede

Não conseguem ficar por longo tempo abstratos.

Às vezes os seus olhos te fitam, obstinados.

Porque eles nunca se desumanizam de todo.

Jamais te voltes para trás de repente:

Poderias pegá-los em flagrante.

Não, não olhes nunca!

O melhor é cantares cantigas loucas e sem fim...

Sem fim e sem sentido...

Dessas que a gente inventava para enganar a solidão

dos caminhos sem lua.

Só as crianças e os velhos conhecem a volúpia de viver dia-a-dia, hora a hora, e suas esperas e desejos nunca se estendem além de cinco minutos...

PROJETO DE PREFÁCIO

Sábias agudezas... refinamentos...

- não!

Nada disso encontrarás aqui.

Um poema não é para te distraíres

como com essas imagens mutantes de caleidoscópios.

Um poema não é quando te deténs para apreciar um detalhe

Um poema não é também quando paras no fim,

porque um verdadeiro poema continua sempre...

Um poema que não te ajude a viver e não saiba preparar-te para a morte

não tem sentido: é um pobre chocalho de palavras.

Vinicius Moratta e Mário Quintana
Enviado por Vinicius Moratta em 10/01/2019
Código do texto: T6547150
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