Frases De Mário Quintana - Parte I
AS INDAGAÇÕES
A resposta certa, não importa nada: o essencial é que as perguntas estejam certas.
Quando alguém pergunta a um autor o que este quis dizer, é porque um dos dois é burro.
A alma é essa coisa que nos pergunta se a alma existe.
A amizade é um amor que nunca morre.
A arte de viver é simplesmente a arte de conviver... simplesmente, disse eu? Mas como é difícil!
A poesia não se entrega a quem a define.
A preguiça é a mãe do progresso. Se o homem não tivesse preguiça de caminhar, não teria inventado a roda.
Ah, esses moralistas... Não há nada que empeste mais do que um desinfetante!
Mas o que quer dizer este poema? - perguntou-me alarmada a boa senhora.
E o que quer dizer uma nuvem? - respondi triunfante.
Uma nuvem - disse ela - umas vezes quer dizer chuva, outras vezes bom tempo...
Autodidata é um ignorante por conta própria.
Mario Quintana
Bilhete
Se tu me amas, ama-me baixinho
Não o grites de cima dos telhados
Deixa em paz os passarinhos
Deixa em paz a mim!
Se me queres,
enfim,
tem de ser bem devagarinho, Amada,
que a vida é breve, e o amor mais breve ainda...
DA FELICIDADE
Quantas vezes a gente, em busca da ventura,
Procede tal e qual o avozinho infeliz:
Em vão, por toda parte, os óculos procura
Tendo-os na ponta do nariz!
Mario Quintana
DA OBSERVAÇÃO
Não te irrites, por mais que te fizerem
Estuda, a frio, o coração alheio.
Farás, assim, do mal que eles te querem,
Teu mais amável e sutil recreio.
DAS UTOPIAS
Se as coisas são inatingíveis... ora!
Não é motivo para não querê-las...
Que tristes os caminhos, se não fora
A presença distante das estrelas!
De um autor inglês do saudoso século XIX: O verdadeiro gentleman compra sempre três exemplares de cada livro: um para ler, outro para guardar na estante e o último para dar de presente.
Dizes que a beleza não é nada? Imagina um hipopótamo com alma de anjo... Sim, ele poderá convencer os outros de sua angelitude - mas que trabalheira!
DO AMOROSO ESQUECIMENTO
Eu, agora - que desfecho!
Já nem penso mais em ti...
Mas será que nunca deixo
De lembrar que te esqueci?
DOS MILAGRES
O milagre não é dar vida ao corpo extinto,
Ou luz ao cego, ou eloquência ao mudo...
Nem mudar água pura em vinho tinto...
Milagre é acreditarem nisso tudo!
Mario Quintana
E um dia os homens descobrirão que esses discos voadores estavam apenas estudando a vidas dos insetos...
Esquece todos os poemas que fizeste. Que cada poema seja o número um.
Esses padres conhecem mais pecados do que a gente...
Esses que puxam conversa sobre se chove ou não chove - não poderão ir para o Céu! Lá faz sempre bom tempo...
Há 2 espécies de chatos: os chatos propriamente ditos e os amigos, que são os nossos chatos prediletos.
Mario Quintana
Há uns que morrem antes; outros depois. O que há de mais raro, em tal assunto, é o defunto certo na hora exata.
Maravilhas nunca faltaram ao mundo; o que sempre falta é a capacidade de senti-las e admirá-las.
Minha vida é uma colcha de retalhos. Todos da mesma cor.
Pergunta Errada
Se eu acredito em Deus? Mas que valor poderia ter minha resposta, afirmativa ou não? O que importa é saber se Deus acredita em mim.
Não me ajeito com os padres, os críticos e os canudinhos de refresco: não há nada que substitua o sabor da comunicação direta.
Não tem porque interpretar um poema. O poema já é uma interpretação.
No céu é sempre domingo. E a gente não tem outra coisa a fazer senão ouvir os chatos. E lá é ainda pior que aqui, pois se trata dos chatos de todas as épocas do mundo.
No fim tu hás de ver que as coisas mais leves são as únicas
que o vento não conseguiu levar:
um estribilho antigo
um carinho no momento preciso
o folhear de um livro de poemas
o cheiro que tinha um dia o próprio vento...
Nos acontecimentos, sim, é que há destino:
Nos homens, não - espuma de um segundo...
Se Colombo morresse em pequenino,
O Neves descobriria o Novo Mundo.
O grande consolo das velhas anedotas são os recém-nascidos...
O mais triste da arquitetura moderna, é a resistência do seu material.
O passado não reconhece o seu lugar: está sempre presente...
O pior dos problemas da gente é que ninguém tem nada com isso.
O que me impressiona, à vista de um macaco, não é que ele tenha sido nosso passado: é este pressentimento de que ele venha a ser nosso futuro.
O tempo é um ponto de vista. Velho é quem é um dia mais velho que a gente...
A saudade é o que faz as coisas pararem no Tempo.
Os verdadeiros analfabetos são os que aprenderam a ler e não lêem.
Qual Ioga, qual nada! A melhor ginástica respiratória que existe é a leitura, em voz alta, dos Lusíadas.
Qualquer ideia que te agrade,
Por isso mesmo... é tua.
O autor nada mais fez que vestir a verdade
Que dentro em ti se achava inteiramente nua...
Quando eu for, um dia desses,
Poeira ou folha levada
No vento da madrugada,
Serei um pouco do nada
Invisível, delicioso
Que faz com que o teu ar
Pareça mais um olhar,
Suave mistério amoroso,
Cidade de meu andar
(Deste já tão longo andar!)
E talvez de meu repouso...
Quando guri, eu tinha de me calar à mesa: só as pessoas grandes falavam. Agora, depois de adulto, tenho de ficar calado para as crianças falarem.
Quem pretende apenas a glória não a merece.
Quiseste expor teu coração a nu.
E assim, ouvi-lhe todo o amor alheio.
Ah, pobre amigo, nunca saibas tu
Como é ridículo o amor... alheio!
"Nada se perde, tudo muda de dono" - tardia reflexão de Lavoisier ao descobrir que lhe haviam roubado a carteira.
Se eu amo o meu semelhante? Sim. Mas onde encontrar o meu semelhante?
Se me esqueceres, só uma coisa, esquece-me bem devagarinho.
Se um poeta consegue expressar a sua infelicidade com toda a felicidade, como é que poderá ser infeliz?
Sempre me senti isolado nessas reuniões sociais: o excesso de gente impede de ver as pessoas...
Senhora, eu vos amo tanto
Que até por vosso marido
Me dá um certo quebranto.
Só a poesia possui as coisas vivas. O resto é necropsia.
Só se deve beber por gosto: beber por desgosto é uma cretinice.
Sonhar é acordar-se para dentro.
Tão bom morrer de amor! E continuar vivendo...
Três amores... Quem me deu
Tão estranha sorte assim?
Três amores, tenho-os eu
E nenhum me tem a mim!
Tudo o que acontece é natural - inclusive o sobrenatural.
Vale a pena viver - nem que seja para dizer que não vale a pena...
Os poemas são pássaros que chegam
não se sabe de onde e pousam
no livro que lês.
Quando fechas o livro, eles alçam vôo
como de um alçapão.
Eles não têm pouso
nem porto;
alimentam-se um instante em cada
par de mãos e partem.
E olhas, então, essas tuas mãos vazias,
no maravilhado espanto de saberes
que o alimento deles já estava em ti...
DA DISCRIÇÃO
Não te abras com teu amigo
Que ele um outro amigo tem.
E o amigo do teu amigo
Possui amigos também...
SEMPRE QUE CHOVE
Sempre que chove
Tudo faz tanto tempo...
E qualquer poema que acaso eu escreva
Vem sempre datado de 1779!
Mario Quintana
INSCRIÇÃO PARA UM PORTÃO DE CEMITÉRIO
Na mesma pedra se encontram,
Conforme o povo traduz,
Quando se nasce - uma estrela,
Quando se morre - uma cruz.
Mas quantos que aqui repousam
Hão de emendar-nos assim:
"Ponham-me a cruz no princípio...
E a luz da estrela no fim!"
SIMULTANEIDADE
- Eu amo o mundo! Eu detesto o mundo! Eu creio em Deus! Deus é um absurdo! Eu vou me matar! Eu quero viver!
- Você é louco?
- Não, sou poeta.
Um bom poema é aquele que nos dá a impressão de que está lendo a gente... e não a gente a ele!
PEQUENO ESCLARECIMENTO
Os poetas não são azuis nem nada, como pensam alguns supersticiosos, nem sujeitos a ataques súbitos de levitação. O de que eles mais gostam é estar em silêncio - um silêncio que subjaz a quaisquer escapes motorísticos e declamatórios. Um silêncio... Este impoluível silêncio em que escrevo e em que tu me lês.
URBANÍSTICA
Como seriam belas as estátuas equestres se constassem apenas dos cavalos!
Canção do dia de sempre
Tão bom viver dia a dia...
A vida assim, jamais cansa...
Viver tão só de momentos
Como estas nuvens no céu...
E só ganhar, toda a vida,
Inexperiência... esperança...
E a rosa louca dos ventos
Presa à copa do chapéu.
Nunca dês um nome a um rio:
Sempre é outro rio a passar.
Nada jamais continua,
Tudo vai recomeçar!
E sem nenhuma lembrança
Das outras vezes perdidas,
Atiro a rosa do sonho
Nas tuas mãos distraídas...
Dupla delícia
O livro traz a vantagem de a gente poder estar só e ao mesmo tempo acompanhado.
Quem faz um poema abre uma janela.
Respira, tu que estás numa cela abafada,
esse ar que entra por ela.
Por isso é que os poemas têm ritmo
- para que possas profundamente respirar.
Quem faz um poema salva um afogado.