Reconhecendo-me

De livre arbítrio somos nós feitos... até certo ponto. Nós temos necessidade de sermos valorizados. Essa necessidade é fundamental desde que nascemos. Nos primeiros anos de vida somos seres completamente dependentes em tudo - estamos completamente à mercê de terceiros (normalmente os pais). Sorte para aqueles que são valorizados nos primeiros tempos de vida e que, normalmente, continuam sendo valorizados nos anos sequentes - estão imersos num ambiente familiar de encorajamento e valorização. Azar para os que não têm essa oportunidade. Esta é uma questão muito sutil: não basta ter conforto habitacional ou alimentar, é preciso ter um ambiente familiar afectuoso e valorizante, que nos faça sentir valorizados. Muitas vezes isso não acontece, existe uma certa neutralidade afectiva, os afectos não são praticados. A criança sente-se vazia, sente que tem pouco valor. Na altura nem pensará nisso, não tem consciência nem capacidade para pensar estas questões.

Mais tarde, quando começa a ter capacidade para interrogar as coisas, para querer achar sentidos, vai percebendo o que lhe aconteceu: "nunca fui valorizado na vida por aqueles que deveriam tê-lo feito e, na verdade, embora nunca mal tratado, nunca fui objecto de grandes afectos. Não é qualquer coisa que se faça com intenção, o próprio ambiente familiar sempre foi seco, recalcado, reprimido, onde a expressão de afectos era vista com vergonha. Os pais não tiveram culpa, não sabiam melhor. Fizeram o melhor que esteve ao seu alcance".

Mas fazerem o melhor que esteve ao seu alcance, não evita que uma criança se sinta vazia, sem afectos, não amada e desvalorizada. Eu fui esta criança, eu sou este adulto. É aqui que entra o livre arbítrio.

Temos duas opções: lamentarmo-nos para o resto da vida ou, nós mesmos, mesmo que tenhamos que carregar uma montanha às costas, valorizarmo-nos, sermos pessoas dignas e construtivas, fortalecendo a nossa identidade. É uma questão de dignidade: quanto mais digno me sentir, mais valoroso me vejo e merecedor do apreço dos outros. Porque, não se enganem, embora sejamos senhores de nós mesmos, dependemos dos outros para sermos amados e valorizados, desde o nosso primeiro grito até ao nosso último suspiro.

Inquieto
Enviado por Inquieto em 16/08/2010
Código do texto: T2441038