Pequenas igrejas, grandes negócios

Wilson Correia*

Ontem:

A igreja católica se tornou uma organização presente em todo o mundo cristão. Constantino, imperador que governou o Império Romano entre 313-337 d.C., fez do catolicismo a religião oficial de Estado, motivo pelo qual nenhuma coroa chegava perto de seu poder. Assim, dominava a política, o direito, a vida social e econômica Europa afora. A igreja foi a maior proprietária de terras no feudalismo, chegando a deter 75% delas. Enquanto os nobres viam seus bens se fragmentarem, a igreja católica concentrava riqueza e mais riqueza, nunca abrindo mão do dízimo, a décima parte dos bens de todos quantos a ela se filiavam (ver: HUBERMAN, L. ‘História da riqueza do homem’. 21. ed. Trad. W. Dutra. São Paulo: LTC, 1986).

Hoje:

“O pedido de cooperação internacional feito pelo Ministério Público de São Paulo ao governo dos EUA para investigar as contas relacionadas ao bispo Edir Macedo, líder da Igreja Universal, tem como alvo a movimentação financeira de seis empresas ‘offshores’ ligadas a cinco doleiros brasileiros que movimentaram, somente nos EUA, ao menos US$ 862 milhões, ou R$ 1,47 bilhão, ao câmbio de ontem” (FOLHA ONLINE. ‘Contas da Igreja Universal movimentaram R$ 1,4 bilhão’. Disponível em: <http:// www1.folha.uol.com.br /folha/brasil/ult96u653445.shtml>. Acesso em: 17.11.2009.

O poema de São Boaventura precisa de complemento:

“Quem não se ilumina com o esplendor de todas as coisas criadas, é ‘cego’.

Quem não desperta com tantos clamores, é ‘surdo’.

Quem, com todas essas coisas, não se põe a louvar Deus, é ‘mudo’.

Quem, a partir de indícios tão evidentes, não volta a mente para o primeiro princípio, é ‘tolo’” (In: COTRIM, G. 'Fundamentos de Filosofia: história e grandes temas'. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 106).

Quem, diríamos nós, não pilha e se locupleta em nome da fé, é um ‘parvo paspalhão’.

Perguntar deveria doer:

– Se a vida verdadeira é no pós-morte, no céu, porque essa loucura de querer se salvar na Terra, mediante a acumulação de riquezas que não poderão ser carreadas até o céu - ou até o inferno?

O espanto em frases:

“A primeira razão pela qual os homens servem com boa vontade é porque nascem servos e como tal são criados. Como é que o chefe ousaria pular em cima de vós, se vós não estivésseis de acordo?” (Etiene de La Boetie, 'Discurso da servidão voluntária', França, século XVI).

“Nada no mundo pode impedir o homem de se sentir nascido para a liberdade. Jamais, aconteça o que acontecer, ele pode aceitar a servidão: pois ele pensa” (Simone Weil, ‘Opressão e liberdade’).

"Uma besteira repetida por trinta e seis milhões de bocas não deixa de ser uma besteira. As maiorias têm mostrado as mais das vezes uma aptidão superior à servidão” (Anatole France, ‘O Sr. Bergeret em Paris’).

"A estupidez humana sempre me leva ao inominável" (Wilson Correia).

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*Wilson Correia é filósofo, psicopedagogo e doutor em Educação pela Unicamp e Adjunto em Filosofia da Educação na Universidade Federal do Tocantins. É autor de ‘TCC não é um bicho-de-sete-cabeças’. Rio de Janeiro: Ciência Moderna: 2009. Endereço eletrônico: wilfc2002@yahoo.com.br