CONVERSAS COM QUEM GOSTA DE ESCREVER - V. S. NAIPAUL

“Na verdade, eu não sei como me tornei escritor. Posso citar algumas datas e alguns fatos de minha carreira. Mas o processo em si continua misterioso. É misterioso, por exemplo, o fato de a ambição ter vindo primeiro – o desejo de ser um escritor, ter essa distinção, essa fama – e que essa ambição tinha vindo muito antes de eu pensar em alguma coisa sobre a qual escrever.

Todo escritor sério tem que ser original; não pode se contentar em fazer ou oferecer uma versão do que já foi feito antes. E todo escritor sério, em conseqüência disso, torna-se consciente dessa questão da forma; porque sabe que, por mais que tenha sido educado e estimulado pelos escritores que leu ou lê, as formas combinavam com a experiência desses escritores, e não servem estritamente à sua...

O conhecimento ou experiência que um escritor busca transmitir é social ou sentimental; leva tempo, pode levar grande parte de uma vida humana processar essa experiência para compreender o que viveu; e requer muito cuidado e tato, assim, pois a natureza da experiência não se deve perder, não se deve diluir pelas formas erradas. As formas dos outros serviram aos pensamentos dos outros. Eu sempre me preocupei com esse problema da forma, do vocabulário, porque muito cedo compreendi que entre a literatura que eu conhecia e lia, a literatura que fertilizou a minha ambição, entre essa e minhas origens havia uma divisão, uma dissonância. E tornou-se logo claro para mim que não se trata simplesmente de imitar as formas.”

(V.S. Naipaul, Jornal do Brasil, 1987)

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In: Escrever Sem Doer - Ronald Claver, ed. UFMG, 2006.

josé cláudio Cacá
Enviado por josé cláudio Cacá em 13/09/2009
Código do texto: T1808540
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