CONVERSAS COM QUEM GOSTA DE ESCREVER - MOACIR SCLIAR
- Você tem algum método para escrever?
- Trabalho muito. Tenho de conciliar minha atividade de escritor com a de médico de saúde pública, e, além disso, meu método de trabalho é complicado. Parto de uma idéia qualquer – originária de uma figura real ou imaginada, de um incidente, de um fato histórico, de uma notícia de jornal – e sobre ela começo a escrever, ao acaso, trechos que podem ser o começo de uma história, ou o meio, ou o fim. Quando estas anotações chegam a um certo volume, redijo a primeira versão da narrativa. Sempre à mão. Acredito ser a mão um instrumento mais sensível para a palavra escrita. Depois é que datilografo (sic), uma, duas, três ou mais vezes, até que o texto me pareça razoavelmente bom. Sou um perfeccionista que busca a palavra certa no ritmo exato.”
(Moacir Scliar, escritor gaúcho)
-------------------------------------------------------------------
“O sonho do contista Reinaldo era um conto que se escrevesse a si mesmo; dado o tema, ou , no máximo a primeira palavra, as que se seguissem seriam inevitáveis. O contista imaginava uma caneta sobre um papel, fios conectados a uma máquina, um dispositivo de feedback para corrigir os eventuais desvios, de estilo ou outros.
O contista Damasceno propunha um conto de múltipla escolha, escrito na segunda pessoa do singular: “Era uma tarde de verão. Tu estavas: a) em tua casa; b) no cinema; c) numa livraria. Se (a) é verdadeiro...”
O contista Auro Pensava em impregnar as páginas de seu livro com substâncias alucinógenas. Lambendo o Papel, o leitor teria visões erráticas.”
(Moacir Scliar, A Balada do Falso Messias)
-------------------------------------------------------------------
In: Escrever Sem Doer - Ronald Claver, ed. UFMG, 2006.