A COBRA E O PASSARINHO
Um dia o sr. Passarildo estava pousado tranquilo no galho de uma árvore na floresta, enquanto descansava as asas. Então, avistou a dona Cobrusca esgueirando-se pelas folhas e plantas lá no solo, bem perto da árvore onde ele estava. Ela, por sua vez, olhou para cima e, vendo Passarildo e o reconhecendo, cumprimentou lhe prontamente:
_ Olá, sr. Passarildo! Como vai o senhor?
_ Opa, dona Cobrusca, vou bem, obrigado! E a senhora?
_ Ah, tudo certo. Vou levando com a barriga, sabe como é.
_ Sei. A senhora parece meio abatida, aconteceu alguma coisa?
_ Não, nada demais. Talvez seja porque quando vi o sr. aí em cima me lembrei de um pensamento meio melancólico que estou tendo recentemente.
_ É mesmo, dona Cobrusca? Que pensamento, poderia partilhar comigo?
_ Sim, sem problemas. É que eu vejo vocês pássaros voando para lá e para cá, lépidos e fagueiros, e me sinto triste ás vezes por não ter asas igual a vocês e não poder ir para lá e para cá como vocês fazem. Fico pensando o quão prazerosa não é a vida de pássaro, cheia de diversão e alegrias facilmente acessíveis.
_ Ah, entendi. Realmente é um pensamento desanimador. Não posso mentir para a senhora, a vida de pássaro é vida boa, de fato, cheia de privilégios. Mas...
_ Mas o que? — interrompeu dona Cobrusca, com um tom de quem buscava ao menos um fio de esperança.
_ Alegra-te, dona Cobrusca, hoje a senhora tirou a sorte grande!
_ Sorte grande!? O que quer dizer?
_ É que a senhora falou com a pessoa certa. Acho que eu tenho uma solução para a senhora.
_ Jura!? Qual?
_ Às vezes, quando estou voando mais alto, vejo um anjinho aqui ou acolá, subindo e descendo, carregando mensagens do Todo Poderoso para os seres sub-celestes. Daí, então, quem sabe eu não possa abordar um deles, qualquer dia desses, e pedir para que intervenham em relação à senhora, para que Deus um dia possa te dar asas e fazer de você também uma espécie de pássaro.
_ Nossa! Incrível, senhor Passarildo! Eu jamais teria cogitado isso. O senhor é mesmo engenhoso, e muito gentil e amável de pensar em tão grande favor à minha pessoa! Faça isso, sim!
_ Tudo bem, dona Cobrusca, pode deixar. Mas, contudo, eu coloco uma única condição para fazer esse favor para a senhora.
_ Pois sim, qual?
_ É que se eu pedir para que você tenha asas, vou pedir para que também você perca o seu veneno.
_ Perder o meu veneno? Mas como assim!? Você é um piadista, por acaso!? Agora você me deu um banho de água fria, sr. Passarildo. Não quero mais conversa com o sr.
_ Ora, dona Cobrusca, mas por que? Por que essa decepção? Perdeu o interesse pelas asas!? Sem elas, você jamais será um pássaro.
_ E sem o meu veneno, eu jamais serei uma cobra! Agora passe bem, sr. Passarildo, passe bem!