Natal Viking

A neve caía em flocos macios, desenhando um manto branco sobre uma antiga floresta nórdica. Era um lugar muito frio, onde em certas épocas do ano, a luz do sol quase não aparecia. No solstício de inverno, quando os dias eram mais curtos e as noites mais longas, em uma aldeia viking, era uma época de maus presságios e medo. As noites longas e congelantes simbolizavam que, nesse período, a luz parecia perder para a escuridão.

Håkon ainda meio atordoado tentava lembrar de sua aldeia, da sua família, de quem era e o que fazia ali naquele lugar tenebroso. Em delírios passaram-se rapidamente momentos de sua vida, lembrou-se da cerimônia em que o sacerdote da aldeia o consagrou para aquela tão penosa tarefa. De repente ouviu um som que lhe recobrou totalmente o senso de realidade: Um poderoso urro de um urso branco enorme a dois passos de onde fora jogado violentamente momentos antes.

Caçar um urso branco para o vinking era símbolo de força. Era seu rito de iniciação para a vida adulta. E ali estava diante dele o desafio. Em sua primeira investida errou o golpe e o urso lhe dera uma patada que o derrubou. Ele não podia errar. O urso estava agora em posição de ataque, em pé apoiando-se nas patas traseiras e com as dianteiras abertas para desferir algum golpe mortal. Håkon apesar de rápido estava ferido e havia perdido sua lança ao tentar golpeá-lo. Estava agora somente com seu machado. E apesar de estar perto não queria arriscar, pois se errasse sabia que seria o fim. Decidiu aguardar o urso se aproximar.

Pouco distante dali, no centro da aldeia, um imponente pinheiro, era enfeitado para a grande celebração, a árvore que mesmo em um inverno rigoroso como aquele continuava verde e viva como nenhuma outra. Ele se tornara o coração das celebrações. Seus galhos, carregados de neve, pareciam estender-se ao céu, buscando a bênção dos deuses. Ao seu redor, um círculo de pedras formava um altar sagrado, decorado com ramos de visco e azevinho, plantas sagradas que simbolizavam a vida eterna e a proteção divina. Aldeões das vilas vizinhas se reuniam ali, em torno do pinheiro. Luzes de velas eram colocadas em grande número, nas casas e no grande pinheiro, enquanto todos faziam preces aos deuses.

O sacerdote da aldeia erguia a prece:

"Que a luz vença as trevas, que a sabedoria vença a ignorância, que a verdade prevaleça sobre a mentira e que a vida sempre vença a morte."

Håkon, apesar de corajoso, estava com pouca ou nenhuma esperança de escapar, mas seu espírito guerreiro vinking moldada desde menino o fazia rir diante do perigo, acreditava que se caso morresse naquela luta, garantiria sua passagem para o paraíso em valhalla. Então embora em apuros seguia pacientemente sua estratégia: um único, mas certeiro golpe. Esperava seu oponente dar só mais um passo.

E finalmente deu. Não foi um golpe muito ajeitado ou com jeito, mas foi fatal, cravou o machado na fronte do grandalhão e o derrubou. O desafio agora era levar o corpo do gigante de volta à aldeia para a grande festa. E seus companheiros de jornada seriam seu trenó e renas, fortes e ágeis, bem capazes de enfrentar o desafio.

Ao se aproximar do lar, viu os preparativos para a celebração em pleno andamento. O aroma de carnes assadas, pães frescos e especiarias enchia o ar, prometendo uma noite de fartura. Os homens afiavam suas armas e preparavam a madeira para a grande fogueira, cujas chamas dançariam até o amanhecer. As mulheres teciam tapetes coloridos e preparavam um banquete com os melhores alimentos que haviam armazenado durante os meses anteriores. Naquela região, o inverno exigia o armazenamento, meses antes, de vários mantimentos. Por isso, havia uma abundância de nozes, castanhas, peixes e carnes.

A noite chegou, envolvendo a aldeia em um manto de escuridão. O céu estrelado brilhava intensamente, como se os deuses observassem a festa. Um a um, os aldeões se reuniram em torno do pinheiro, contemplando as pequenas velas que cintilavam como estrelas. O brilho das velas refletia na neve, criando um espetáculo de luzes mágico.

Håkon, antes da festa tinha mais uma obrigação: retirar toda a pele do urso e vesti-la, com a parte branca voltada para dentro e a parte vermelha com o sangue para fora. Vestido assim, e levando a carne do urso para o sacrifício ele cumpriria os requisitos de guerreiro viking. Estaria oficialmente pronto para proteger sua aldeia e sua futura família que agora seria autorizado a formar.

O sacerdote, um homem de cabelos brancos e olhos profundos, iniciou a cerimônia. Ele ergueu um chifre dourado e entoou um cântico ancestral, invocando os deuses da fertilidade e da luz. As vozes dos aldeões se uniram em um coro poderoso, ecoando pela floresta. Tambores e flautas acompanharam o cântico, preenchendo o ar com uma melodia hipnotizante.

Em seguida, o sacerdote pegou um ramo de visco, planta sagrada para os vikings, ergueu-o acima de sua cabeça e o ofereceu aos deuses, pedindo proteção e prosperidade para a aldeia. A multidão aplaudiu. Uma jovem guerreira aproximou-se com um machado e, com um golpe certeiro, cortou um galho do pinheiro, simbolizando a passagem do tempo e a renovação da vida. O galho foi colocado no altar junto com oferendas de comida e bebida.

O ponto alto da festa foi a entrada de Håkon. Apesar de jovem, ele já possuía uma barba densa que ia ficando branca com a neve que caía. Vestido com a pele do urso, a cor vermelha do sangue destacava-se contra a paisagem branca. Sua chegada foi recebida com gritos e cânticos de alegria. O sacerdote deu-lhe a bênção, reconhecendo-o como um verdadeiro guerreiro viking.

A celebração continuou por toda a noite. Os aldeões dançaram em torno da fogueira, contando histórias e lendas, bebendo, comendo e se divertindo. As crianças brincavam na neve, construindo bonecos e deslizando em trenós. O clima era de alegria, paz e harmonia. As risadas e os cânticos ecoavam pela floresta, enquanto as chamas da fogueira projetavam sombras dançantes nas árvores.

Håkon observava os primeiros raios de sol despontarem no horizonte, dissolvendo a escuridão da noite mais longa do ano. Ao seu redor, os aldeões se despediam da festa com gratidão, certos de que haviam honrado os deuses e garantido a prosperidade do novo ciclo. Ele refletia sobre sua vitória, sentindo que, assim como superara seu oponente, a luz, a sabedoria, a verdade e a vida também triunfavam sobre seus próprios inimigos.

James Taylor
Enviado por James Taylor em 23/12/2024
Reeditado em 24/12/2024
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