A Primeira Flor de Vovó Onça
Naquela manhã fria, o cheiro de terra molhada subia do chão como um abraço silencioso. Vovó Onça, com seus passos lentos, se dirigiu ao jardim que havia cultivado com tanto carinho. Ela não plantava só flores, plantava memórias. Cada canto daquele pedaço de terra era um fragmento de uma vida vivida em sintonia com a natureza, mas também cheia de desafios.
Era ali, entre as hortênsias e as rosas, que a primeira flor realmente floresceu em sua alma. Muitos anos antes, Vovó Onça, ainda uma jovem mulher, sentiu pela primeira vez o chamado da terra quando enterrou uma semente que encontrou por acaso. Não era uma semente comum, pelo menos não para ela. Naquele momento de dor, a semente simbolizava a promessa de um futuro, algo que ela precisaria para seguir em frente.
Havia perdido seu primeiro filho para a vida dura do campo. Nas longas noites em que o vento assobiava entre as árvores, ela chorava baixinho, segurando suas dores. Mas uma mulher como Vovó Onça não desiste fácil. A terra a chamava, e nela depositava tudo: seus sonhos, medos e esperanças.
Quando a primeira flor surgiu naquele canto solitário do jardim, ela soube que algo havia mudado. Era como se a natureza tivesse respondido ao seu pedido de consolo. A cada pétala, sentia sua força retornar, sentia o campo a envolvê-la, e pela primeira vez em meses, sorriu.
Agora, muitos anos depois, já uma senhora de cabelos prateados e mãos calejadas, ela ainda olhava para aquela flor, que brotava a cada estação como uma lembrança viva de sua resiliência. Não importava quantas tempestades ou geadas viessem, aquela flor sempre ressurgia, teimosa como ela.
"Você ainda está aqui", murmurou, ajoelhando-se ao lado da planta. "E eu também estou."
O vento soprou leve, e os pássaros cantaram ao longe. Era mais um dia simples na vida de Vovó Onça, mas um dia repleto de significado. E ali, naquele pequeno jardim, ela encontrou o que sempre buscou: paz.
Helena Bernardes, outubro 2024