Fábula Sombria
Dorothy parecia um anjo e vivia com sua avó.
Sempre que voltava da escola, precisava atravessar um bosque para chegar em casa. E em geral o bosque era claro, fazia um sol bonito, mas naquele dia chovera e estava bem escuro.
Como não gostava de se molhar, mal podia esperar por estar em casa, andando depressa. O guarda-chuva com alguns pequenos furos irritava um pouco, mas pelo menos a sua capa vermelha tinha um capuz.
O problema foi quando bateu um vento forte, e ouviu passos provenientes das moitas. Sentiu medo. E logo comprovou que estava certa nisso: apareceu um crocodilo, andando bem ereto, segurando um machado todo sujo de sangue.
– Até que enfim achei você! – falou o réptil.
– O que quer comigo? – Com as pernas bambas, Dorothy pensou em fugir, mas não conseguiu. O terror acelerado era forte demais para permitir qualquer coragem do corpo.
– Esse sangue é da sua avó, sabia?
– O que fez com ela?
– Você é uma criança, mas não é burra. O que está imaginando é verdade.
– Por que você matou ela?
– Pra te mostrar o que é a vida. Agora você está sozinha.
– Isso não é justo! É mentira sua!
– Não. É a única verdade que já contei.
Chorando, Dorothy correu para a escuridão da floresta. Não voltaria para casa. O crocodilo não a seguiu, porém deu de cara com um lobo.
– Será que você pode me ajudar? – indagou o animal.
– Não posso ajudar ninguém agora.
– Um caçador atirou em mim e acertou uma das minhas patas. – O lobo, que mancava, mostrou a pata que fora atingida. O sangue do ferimento brilhava. – Consegui fugir, mas ainda dói muito, e talvez eu perca essa pata.
– Sinto muito. Não posso cuidar de você. Não sei tratar de feridas.
– Você sabe. Só precisa acreditar.
– Não quero acreditar em nada. Hoje mataram a minha vó.
– Sinto muito.
– Sente nada. Você é um lobo. Fere, mata.
– Mas eu que fui ferido!
– Me desculpa, não quero saber de nada hoje! – Dorothy correu e se afastou do lobo.
Correu mais. E correu.
Até desaparecer de vez nas trevas.