O SILÊNCIO DA IGUALDADE A PEQUENA VENDEDORA DE ISQUEIROS
O SILÊNCIO DA IGUALDADE
A PEQUENA VENDEDORA DE ISQUEIROS
Valéria Guerra Reiter
Tudo começou na véspera de Natal. Havia uma menina de olhos tristes, pele enrugada pelo sol, que vendia isqueiros para sustentar seus irmãos mais novos; sua mãe era catadora de lixo, e seu pai, um alcóolatra, porém a pequena Carolina não tinha medo da vida. No dia vinte e quatro de dezembro ela sabia que sua barriga iria roncar mais do que nunca, já que nesta data, as mais variadas guloseimas iriam fazer parte da mesa de muitos abastados, e que ela e sua família não passavam de maltrapilhos desvanecidos. Carolina saiu de casa bem cedo, ou melhor, de madrugada, pegou carona no trem, e foi embora anunciando seu produto: isqueiros. Quase ninguém comprava, e quem o fazia, demonstrava (apenas) pena. Ou, às vezes, revolta, por ver uma criança, de apenas oito anos, solta pela cidade a vender. E diziam: Malvestida, desgrenhada, e tão pequena. Como pode? Onde vamos parar...
Outros ficavam apenas silentes diante do quadro terrível. Calavam diante da desigualdade translúcida...
A criança destemida, desceu na Central do Brasil e dali pegou carona em um trem do metrô, rumo ao centro da cidade do Rio de Janeiro, iria tentar vender os cinquenta isqueiros que sobraram, já havia vendido cinco, porém isso era pouco. Caiu em campo de batalha, andando apressada por entre os transeuntes alucinados pela ânsia mercadológica de comprar, comprar e comprar.... Uma mulher alta, forte e bem vestida, esbarrou na garota, e impacientando-se proferiu dois palavrões, depois seguiu seu farto destino: uma loja de queijos e vinhos.
A pequena vendedora, levantou-se do chão, catou todos os seus isqueiros, e continuou sua trajetória...
Entrou em uma lanchonete conhecida por seus sanduíches, que muitos dizem serem confeccionados com minhocas, e ofereceu sua mercadoria a um homem de óculos, muito apressado que carregava dois refrigerantes e dois sorvetes, ele se mostrou indignado com a presença da garotinha e queixou-se ao gerente dizendo ser um absurdo ele cansado e faminto, depois de enfrentar um péssimo e caudaloso atendimento: ser forçado a fazer caridade. O gerente que era um homem “cristão”, explicou que por ser natal, ele não se sentiria nada bem, em expulsar aquela criancinha tão carente dali.
A menina estava em pé, próxima a um casal que a fitava curioso…a mulher indagou o valor de cada isqueiro, e a menina respondeu animada: “UM REAL”; imediatamente a mulher abriu a bolsa e comprou tudo. Entregou uma nota de cinquenta reais à sortuda criança, que abriu um largo sorriso, e exclamou:- agora já posso comprar pães de rabanada, ovos, leite e fósforos para acender o fogão à lenha da mamãe para termos uma bela ceia ao lado do Senhor Jesus, no dia do seu aniversário, na noite de Natal.