Jardim secreto.
— Demônio, por que vós não tocais nas flores daquele belo jardim? - perguntou um jovem e inexperiente demônio de ordem inferior.
— A mim é impossível tocá-lo. Neste tipo de jardim eu não encontro brecha para impetrar minha destruição.
— Como não, senhor? Vós sois forte e sedutor. Muitos não resistem aos vossos assaltos.
— Sim. Isto é verdade. Eu sou forte, mas há algo que me enfraquece.
— Temo ser o que estou pensando, meu senhor.
— Não tenho como saber o que tu pensas. Isso só aquele que reina no reino ao qual um dia fui muito luminoso sabe.
— Majestade, revele-me o que este jardim possui que tanto lhe enfraquece.
— Não só a mim, mas a ti e os nossos também. Já que reconheces minha grandeza, revelarei a ti tal segredo, mesmo que isso venha a expor uma vulnerabilidade minha, ferindo, deste modo, meu orgulho.
— Sou todos ouvidos, meu senhor.
— Pois bem... Ele é um jardim fechado e regado com as águas da oração. Por este motivo ele é sempre verde e os pombos constantemente lá pairam e fazem morada. Tais águas são como ácido ao em mim tocarem. Até o barulho destas águas que correm no riacho que lá dentro existe me causam grande aflição.
— Mas parece um som tão inofensivo, senhor.
— Sim. Aos olhos de muitos ele o é. Mas, para nós, ele é um suave som que nos incomoda até às entranhas. Este som se chama louvor. As águas da oração juntamente com o som que ela produz é uma potente arma contra nós. Ordeno-te que nunca reveles isto àqueles que fazem usufruto daquele horto. Muitos deles não fazem a menor ideia das armas poderosas que eles possuem dentro da sua própria propriedade.
— Agora entendo o porquê de eu não conseguir tocar em muitos. Era esta água e o barulho que ela fazia. Hoje consigo entender. Havia certas situações que, ao tentar agir, minhas forças repentinamente se esvaiam e eu perdia completamente a noção do que ia fazer. É como se eu ficasse cego, sem rumo e sem direção e aquele que eu iria iniciar minhas obras sobre se escapava de minhas mãos como uma lebre veloz.
— Creio que agora vós entendeis o quão perigoso para nós é o conhecimento por parte deles deste recurso. Jamais eles podem saber que o impedimento para nossa entrada nos jardins secretos deles é este. Ah se esta arma não existisse! Não só seus jardins já teriam sido destruídos, mas o mundo inteiro já estaria por completo em minhas mãos.
— Mas, meu senhor, todos usam desta água?
— Não. Há os que a usam em pouca quantidade ou nunca usam. Deste modo, acabam por deixarem suas flores secas e murchas. Assim, eu encontro brecha e finalizo por destruir o interior do jardim deles.
— É tão fácil assim, majestade?
— É. Quando parar de usar a água, eles perdem o discernimento do certo e do errado. Logo, mesmo estando tudo desabando ao seu redor, para eles não está acontecendo, já que a sabedoria saiu de sua propriedade. A partir daí eu não preciso fazer mais quase nada. eles mesmo se autodestroem e tudo que a eles pertencem.
— O senhor é genial, majestade!
— Não fui eu que iniciei a obra de destruição. Foram eles mesmos ao constantemente não aguarem suas flores e plantas no interior de suas propriedades. Eu apenas entro e concluo a obra de destruição que eles mesmos iniciaram. Eu nunca entro em algum lugar sem permissão. Em todas as vezes a mim brechas foram dadas. O empecilho para nós são os jardins que estão em constante vigilância.
Contra estes nada podemos fazer. São inabaláveis! Se todos os jardins possuíssem esta rotina de irrigação, o inferno já não existiria mais.