Uma boa pessoa

Alguém o encontrou na rua naquele dia. Um vizinho do bairro com quem ele trocava “oi” de vez em quando. Parou diante dele e disse:

- Eu gosto de você. Você é uma pessoa boa.

Agradeceu.

Seguiu para sua casa e lembrou que ele era um criminoso recém saído da cadeia. Ele não se achava uma pessoa boa. Arrependido ele estava. Não pretendia delinquir novamente. Mas ele não se considerava uma pessoa boa.

Uma vez que o crime te acha e você faz coisas das mais horríveis é difícil voltar a ser o que era ou tentar ser diferente da pecha que ficou como consequência dos atos falhos da vida.

Não. Ele não era ingênuo a esse ponto. Aprendeu na penitenciária que a sentença é algo que se carrega pro resto da vida. Você pode casar, ter filhos, mas nunca será mais uma boa pessoa. E pode ter certeza que o passado volta. Mesmo que como uma tonelada que cai com tudo encima da cabeça diante de um elogio.

Ele sabia disso. E tinha medo que as pessoas o descobrissem.

Por outro lado, tinha vontade de enfrentar seus próprios demônios e não se sentir como se estivesse enganando alguém.

Tinha vontade de gritar. De urrar. De dar a cara pra bater. Dizer a Deus e ao mundo:

- Não. Eu não sou uma boa pessoa! Eu sei disso!

Mas ele tinha medo da solidão. Da vergonha. De perder-se de novo. De não ser outra coisa que o culpado confesso para sempre.

Poderia pedir perdão. Mas pedir perdão não apaga nada. Pedir perdão não conserta as vidas destruídas, nem anula as consequências. Ele deveria ser grato por estar vivo.

Será que um dos privilégios das pessoas boas é poder se vingar sempre daqueles que são indignos? E ter o poder de conceder ou não misericórdia aos que caíram? De negar uma segunda chance?

No fim: o caçador virou a presa que anda de cabeça baixa.