Fábula “vampírica”...ou seria “vampirista”, quem sabe até “vampiresca”!
Tudo certo, sei muito bem que fábulas são histórias envolvendo animais personificados. Como os personagens centrais dessa digníssima trama são altamente inusitados, permitam-me assim caracterizar essa virtuosa escrita, por toda magnitude que a engloba – nossa!
Era uma vez um caçador, escondido em um ambiente um tanto singular. Mesmo ali enclausurado, o filho do fim destacava-se como uma figura deveras atraente, principalmente pelo modo que ostentava o imenso arco e flecha, perfeita estereotipia de homem destemido, loiro e alto, parecia até dotado de muita força e agilidade, além de bonito e altamente esbelto – garotas, já é o bastante para excitá-las? Suas feições denunciavam certa apreensão, um tanto ansioso, bastava reparar que a cada minuto, observava a fresta na porta, muito sério, como se esperasse o instante certo para agir.
Escondido no apoucado compartimento, observava aquele cômodo imenso, situado do lado contrário da porta, uma cobra pronta para dar o bote... e a vítima, um casal que ali flertava, com certa intimidade naquela típica sala de jantar. A jovem, de maneira ousada, degustava uma taça de vinho tinto, contrastando com a palidez de sua face. Deixava transparecer, pelo olhar sedutor, que a cada tragada, um jogo mais intenso e perigoso estava por acontecer. Sem falar em sua indumentária negra, em forma de um vestido bem justo, proporcionando dimensão perfeita de todos os seus atributos. Sua fala era leve e pausada, um timbre agudo e muito sexy, bem ao estilo “vampira”. Tudo isso, acrescido pelo ambiente rústico, com a iluminação a luz de velas e das minúsculas labaredas que saiam da lareira, brasas que queimavam para aquecer seus corpos, representavam o fogo do prazer. Tudo gerava um cenário perfeitamente insinuante, deixando o rapaz – e a macharada de leitores -, completamente hipnotizados, envolvidos pelo clima de encanto proporcionado pelo deleite do prazer previamente proibido.
Depois de completar a taça e bebê-la de uma única vez, a mulher se ergueu, caminhando languidamente se dirigiu até ao meio da sala, pondo-se a dançar ao ritmo de um som ambiente que não se sabia ao certo de onde vinha. O sujeito entendeu a deixa e imediatamente aceitou o convite, embarcando na desventura pecaminosa altamente excitante. Ao levantar, quase pôs toda prataria do jantar ao chão, era o bastante para denunciar ser um tipinho bem desengonçado.
O caçador a espreitá-los, fatalmente não compreenderia o sentido daquela união, ela tão lindamente encantadora, exibindo vitalidade, enquanto ele uma personagem roliça. Diferentemente – e paralelamente - opostos, seriam coisas de casal? Uma mulher a dançar pela sala, apaixonadamente, enquanto ele tentava desesperadamente acompanhar seus passos, sem sucesso, tropeçando nas próprias pernas. Estranho que a garota não demonstrava qualquer receio de sofrer uma queda, uma vez que ambos sucumbissem, o fim iminente, seria esmagada por aquela carroceria ampla. O conjunto da obra tinha outros dissabores, não se resumindo as medidas bem avantajadas, como aquele horrendo cabelo lambido, com aspecto de sujo, sem esquecer os óculos, que só não eram maiores que sua vasta pança, servindo para esconder seus olhos fundos – então garotas, ainda estão excitadas?
O casal se tocava ferozmente, a dança tomava um ritmo frenético, parecia até arrancar pedaços do pescoço um do outro. Um beijo mais íntimo estava fadado a acontecer. Quando a jovem inclinou o pescoço do amado, abrindo ao máximo que podia a boca, a arcada dentária sofreu uma espécie de mutação, os dentes perfeitos, agora davam lugar a presas enormes e afiadas e quando estava pronta para desferir o veneno e alimentar-se do sangue alheio, era hora do herói finalmente agir. Com apenas um chute, colocou abaixo a porta do compartimento, seguido por um disparo, a flecha atravessou o coração, sangue jorrava sem parar, o panorama romântico mais parecia um filme de terror, epopeia de um assassinato, lá estava o corpo da dama estendido ao chão. Fruto de espécie de fenômeno inexplicável, chamas emanaram do cadáver, transformando em pó a antes beldade de charme tentador.
- Não se acanhe meu jovem, eu sou Notlin Wander Taffo, caçador de vampiros, esse demônio das trevas ia lhe morder, mas eu estava escondido observando e consegui salvá-lo a tempo que o pior acontecesse – proferiu sem tentar mostrar qualquer espécie de “modéstia” pelos seus atos.
- Cara, você é louco? Você a matou logo no instante em que estávamos para nos beijar, não poderia ter esperado mais alguns instantes... – reclama o outro, demonstrando estar bastante indignado.
- Se eu demorasse mais um segundo apenas, nessa hora você também seria um deles.
- Deixasse ela morder, por que se mete no que não é da sua conta?
- Não entende? Eu teria de executá-lo também, só tentei lhe proteger, jovem - argumentava o caçador, tentando conter a fúria do homem.
- POIS! – gritava o outro – se ao fim você me matasse, ao menos eu morreria contente e a essa altura estaria no inferno, mas ao lado dela, agora vou ter de esperar mais 30 anos por um beijo como esse.
PS: Moral da história, quando se trata de mulheres, salvar um homem pode ser uma verdadeira cilada. No entanto, para os órfãos da bela ‘vampira’ não vou deixá-los – literalmente – na mão. Após proferir a última frase, ao fundo foi possível ouvir um grito “CORTA”,
- Alguém me explica que sandice é essa entre vocês, essa discussão não está no script. E quanto aos efeitos especiais, está perfeito – afirma um homem ao fundo da sala.
Em seguida, a garota surge intacta, como se nada tivesse acontecido, fumando um cigarrete, enquanto o diretor dava novas instruções à dupla de atores a respeito de como deveriam reconduzir a cena da tomada. Antes de recomeçar, a celebridade mais rechonchuda prometeu “algum” ao amigo caso atrasasse um pouco sua entrada triunfal, a tempo de roubar ao menos um “Selinho” da gata com qual contracenava...
PS: Moral da História 2, moçada, nunca acreditem, à princípio, em tudo que se lê, pode não passar de um jogo de cena, mera representação teatral.