O PRÍNCIPE E O SAPO
Noutros tempos, quando subir na goiabeira era apenas coisa de moleque para comer goiaba fresca, havia um rei que se confundia com o bufão da corte e que tinha três filhos chamados Príncipe Zero-Um, Príncipe Zero-Dois e Príncipe Zero-Três, e eram três marmanjos mais mimados do que menino criado por vó.
Um dia o príncipe do meio, o Zero-Dois, foi tomar banho no rio real, escorregou na margem direita e sua metralhadora AK-45 caiu na ribanceira e desapareceu na água barrenta. Então ele pôs-se a berrar feito menino malcriado real, querendo que alguém enfrentasse a correnteza e pegasse a sua arma. Nenhum ministro se animou a entrar na lama. Todos alegavam que estavam ocupados em projetos para acabar com a civilização que assolava no reino. Nisso, saiu um sapo falante das águas fétidas e perguntou ao príncipe:
- Por que chora essa pessoa tão delicada?
- Pessoa delicada é a puta que lhe pariu! Eu sou filho do rei e mando em tudo aqui! Exijo que você pegue a minha arma que caiu no rio!
- Está certo, eu pego, mas só depois que você me prometer uma coisa.
- Príncipe não faz promessa, principalmente a sapo!
- Mas seu pai fez um bocado antes de se eleger rei. Prometeu que ia acabar com o desemprego, melhorar a Saúde, investir na Educação...
- Mas não cumpriu porra nenhuma, babaca!
- Não importa. Só quero que você prometa.
- E o que é que você quer que eu prometa?
- Quero que você prometa que vai mandar limpar o rio. Tem muita sujeira.
- Eu sei que tem sujeira. Mas se limparmos vão aparecer as laranjas.
- Laranjas?
- Sim. Laranjas.
- Mas só quero que prometa que vai limpar o rio!
- Tá bem, eu prometo, mas fique sabendo que não vou cumprir. Agora pegue o meu fuzil de estimação.
O sapo mergulhou contente nas águas fétidas na ilusão de que um dia nadaria em águas límpidas. Vasculhou o fundo do rio até encontrar a arma. Chamou a saparia e dezessete sapos apareceram e ajudaram o sapo falante a levar a metralhadora até a margem. O príncipe segurou pela coronha sentindo um prazer orgástico. Destravou o gatilho e o som de dezessete estampidos sequenciais perturbaram o silêncio das águas turvas, despertando os morcegos que dormiam o sono dos justos, bicos molhados com o sangue da corrupção.
Apenas o sapo falante escapou da chacina às margens do rio e, antes de enterrar os sapos mortos, fez um selfie com os corpos ao fundo e postou nos sites sociais comentando que se seus irmãos estivessem armados não teria acontecido aquela tragédia.