O Pássaro Engaiolado
Sempre preferiu a terra do que o ar, o que não quer dizer que nunca voava, mas só fazia em caso de extrema necessidade, e quando alçava voo, optava voar baixo e preferia estar sozinho do que em bandos.
Desde sempre, o sabiá sabia que era diferente dos demais, sentia ser incompreendido pelos outros, como se não fizesse parte da mesma espécie e não pertencesse a nenhuma outra. O passarinho também sabia que para não parecer mais estranho do que já era, seria preciso ter uma convivência mesmo que superficial com os outros pássaros, e assim, vez ou outra voava com um sabiá pra cá, tomava banho de areia com outro pra lá. O sabiá forçava uma socialização que não queria, mas que inconscientemente no fim acabava fazendo se sentir bem, mesmo que fosse algo efêmero.
Um dia, ao ser pego por uns caçadores e ser transferido do alçapão para uma gaiola maior, o sabiá se viu com diversas especiés de aves, entre eles canários, pardais, coleirinhas e alguns outros sabias. A partir daquele momento o sabiá estava preso, e era ali que teria que ficar e conviver sem tempo determinado para sair.
Custou para o pássaro entender o que havia acontecido com ele, mas tinha plena consciência que ali não era um bom lugar. O passarinho semivoava os quatro cantos da gaiola na intenção de encontrar nas finas barras separadas e pequenas frestas uma brecha que pudesse escapar. Contudo, não demorou a perceber, era impossível fugir daquela caixa de metal.
Assustado com a imprevisível prisão e acanhado com as outras aves, o sabiá então se deslocou dos demais e num cantinho da gaiola ficou a mercê da sua já acostumada solidão.
A princípio, os outros pássaros que juntos ali estavam, não estranharam a postura do pássaro recém-capturado e respeitaram seu espaço, uma vez que cada um deles, por experiencias próprias passaram pela mesma e delicada situação de tal modo que entendiam perfeitamente a condição que o sabiá se encontrava. No entanto, a cada novo amanhecer, no decorrer dos dia que se passavam, o sabiá ainda continuava quieto, acanhado e pouco interativo com as aves, enquanto as mesmas viviam a cantar e quicar nos poleiros dos quatro cantos do pouco espaço que a gaiola oferecia. Os pássaros entendiam que para sobreviver ali era preciso buscar forças, pois só assim seria possível encontrar a esperança para o dia seguinte. Afinal, a qualquer momento poderiam estar livres novamente. Mas o que acontecia, era que o sabiá não tinha esta mesma visão, e por mais que enxergasse claramente a alegria dos pássaros quando esses fossem de liberdade - naturalmente sairiam voando o mais alto que pudessem, felizes da vida por estarem livres novamente -, o sabiá não pensava do mesmo modo.
A prisão para o sabiá, toda vida havia sido uma constante, ser preso na gaiola, no fim das contas era apenas a ironia do destino completando de forma literal o ciclo de suas prisões. Foi num dia de muita chuva que o sabiá saiu em liberdade, e enquanto esteve ali, teve a oportunidade de ver todos indo embora voando alto aos céus emocionados, como havia previsto, mas o sabiá não, ele estava livre apenas das grades externas, as internas e por vezes piores ainda permaneciam enraizadas em todo seu ser. Num silêncio gritante, o pássaro saiu da gaiola em voo baixo, já que sempre preferiu a terra do que o ar.