A BEIJA-FLOR E O URUBU
Era uma vez uma beija-flor, linda, pequena, notavelmente rara, delicada e muito trabalhadora. Praticamente vivia para trabalhar. Da casa para o trabalho, do trabalho para casa, essa era sua rotina.
Nos momentos de descanso pensava na vida, no que deixou para trás quando deixou seus pais para ter seu próprio ninho. "Ser beija-flor não é fácil, quando terei alguém para viver ao meu lado?", pensava antes de dormir. Parecia não surgir nenhum beija-flor para ela, só gaviões, pombos, pardais, nada a ver com ela.
Um certo dia, ela reparou num urubu. Popular, jovem, tinha dezenas de amigos e amigas com quem voava alto à procura do que comer e parecia sempre estar se divertindo. Além disso, enquanto ela batia as asas dezenas de vezes por segundo para estar no ar, ele aproveitava as correntes de ar planando tranquilamente quase sem esforço.
"Que mal há em fazer amizade?", pensou consigo mesma, "já que não chega beija-flor, vou dar uma chance a esse rapaz", decidiu, e assim fez. Primeiro, passaram muitos dias conversando nos seus horários de folga; ele era muito engraçado. Depois, para sua surpresa, o urubu decidiu morar no galho próximo ao ninho da beija-flor, ela amou.
O urubu gostava daquilo que ela lhe oferecia, tudo era tão limpo, puro, de sabor diferenciado, ninguém do seu meio jamais havia oferecido coisas do tipo. Até as conversas dela e sua visão de mundo eram novas para ele. Sentia-se bem comendo do néctar da beija-flor, mas era muito pouco para seu papo grande acostumado a se encher de carniça.
Para retribuir, ele sempre tentava dar-lhe daquilo que estava acostumado a comer, mas ela recusava. Água mole em pedra dura e uma certa noite ela deixou-se convencer e comeu do que ele tanto oferecia. Seu delicado organismo nunca mais se recuperou, ficou diferente, sua plumagem mudou, mudaram também seus hábitos chegando até a voar para o nível dos urubus para planar em busca de novos ares.
Ela só perdeu. Perdeu tempo e saúde. Mudou por dentro e por fora. O urubu nunca seria um beija-flor e ela não iria viver muito tempo levando a vida urubu.
Seu juízo voltou a funcionar e ela retornou ao seu lugar e seu trabalho.
Deus fez cada um segundo sua espécie e o que Ele faz sempre é bom e por um bom motivo. O tempo passou e ela restaurada da sua saúde e mais linda do que nunca esbarrou com um lindo beija-flor que pouco a pouco conquistou seu coração. Ela viveu feliz com seu amorzinho.
E o urubu? Há quem diga que ainda anda por ai, vivendo com seu bando à procura de diversão. Nunca casou nem vai casar, gosta de voar.