O BREVE HISTÓRICO DE UM SAPATO: DA ASCENSÃO À DECADÊNCIA!

Um velho sapato estacionado, largado no meio da rua. Todos que por ele passavam ignoravam sua presença: carros, motos ou pedestres não lhe davam a mínima atenção. “Quem dera se alguém surgisse para lhe retirar daquele local tão indesejado”. Pensara aquele objeto, aparentemente sem importância, num momento de abandono e amargura. Um filme, passo a passo, veio à tona na mente daquele ser inanimado, estagnado no chão e sacudido às vezes por veículos, pessoas e objetos.

Nascera em uma sapataria social democrata. Fabricado num couro especial e com um brilho reluzente, se tornara a estampa principal da vitrine daquela loja. Todos que por ele passavam, paravam um pouco para admirá-lo e desejá-lo. Despertava sentimentos dúbios nas coisas (seus pares) e nas pessoas. Nestas, o sentimento era de inveja, quase sempre. Naquelas, o sentimento era de intensa veneração! Em contrapartida, esnobava todos os saltos altos, rasteiras, sapatilhas, sandálias... Os vendedores, portanto, passaram a tirar proveito dessa situação e o apresentavam em primeiro plano aos clientes. “Venda garantida!” – Pensavam com veemência e convicção.

Mais tarde, lembrou-se de que havia sido vendido a um jovem playboy da Zona Sul da cidade de São Luís – capital do estado do Maranhão e Ilha do Amor: lugar de ricas culturas, aventuras flutuantes, escorregadias e perigosas. A partir disso, passou a frequentar os melhores bailes, sapateava nos maiores shows, concertos, cinemas, restaurantes e hotéis luxuosos. Confortável e de couro brilhoso, era afeição de seu dono e ambos se tornaram companheiros inseparáveis.

No entanto, seus passeios se tornaram menos frequentes. Nesse intervalo, passou a ser substituído gradativamente por outros modelos esportivos, de cores e marcas diferentes. Se sentiu usado e desprezado, como uma camisa velha que vira pano de chão ou acessório de limpeza.

Outros tempos começavam a se configurar! Fora doado a um brechó da Baixada Maranhense e, por viver empoeirado e desvalorizado, finalmente havia sido oferecido a um morador de rua: frequentou os piores lixões, periferias, favelas e ruas enlameadas. Já não exibia um brilho e muito menos vigor. Era nítido seu desgaste! – Tinha se tornado uma droga, literalmente. E, como tal, havia sido esquecido ou abandonado no meio da rua, deixado por seu dono ao assaltar a padaria do bairro.

Algumas pessoas são como sapatos: esbanjam vigor, beleza e serventia na adolescência; mas com o tempo são esquecidos por familiares, amigos e filhos, vivenciando uma verdadeira “síndrome do sapato velho” ou simplesmente o ciclo da vida, na maioria das vezes frustrante e quase sempre inevitável.

Antonilde Garreto
Enviado por Antonilde Garreto em 29/11/2017
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