No cemitério

"Não,não estavam ali, os morcegos grotescos de asas a ruflar, de trajetórias nervosas em pleno vôo. Vez em quando caia um chuvisco fino e ventava-natural, no mês de agosto,normal que faça frilo.Apesar de não querer destacar um previsível clichê,notei que as árvores eram de caules retorcidos, secos e retorcidos ,as poupas das árvores tinham poucas folhas,que eram na sua maioria ressecadas pelo tempo,de aspecto envelhecido-a cor ocre num míster de abóbora.Uma ventania invadia o ambiente,entoando o som de uma sinfonia de timbre sombrio,assustador.Eu estava sentado à cova.Impressionava-me o semblante na foto da lápide-sério,e ostentando uma palidez mórbida no rosto,como se fosse um cadáver-antes da morte,ali diante do fotógrafo. Apesar de que era uma foto antiga,da mocidade.Ostentava-podia se ver-um paletó rústico,de cor escura,feito uma múmia de faraó,com milhares de anos resistindo ao tempo que a devorava de forma implacável. O tempo não perdoa nem os poderosos.

O tempo passava.Noites e dias. Vez em quando o local-que era sombrio e assustador à noite-um por-do-sol,de beleza agradável no fim da tarde.Aconteciam alguns enterros durante a semana.Pessoas choravam.Outras permaneciam com um aspecto sério,de semblante triste-como se estivessem diante de uma dura realidade:a morte existe,e o momento será chegado-para todos,sem exceção.Até mesmo,os gregos morriam,e não gostavam de saber disso.Que um dia se morre,e que esse dia chegaria acabando com as farras de Dionisio e com as músicas barulhentas dos sátiros diante das orgias do deuses da Grécia antiga.Tudo em busca de celebrar a vida,as alegrias da vida. Orgias,prazeres carnais,as ilusões que sufocam as amarguras do dia a dia.

os deuses humanizados.Cheios de ódios e de desejos profanos. gregos:Zeus,Hera,Poseidon,Atena,Ares,Deméter,Apolo,Artêmis,Hera,Hefesto,Afrodite,Hermes e Dionísio. Adorados,por serem bem humanos.Alvos de grande tragédias pessoais,e de grandes feitos heróicos.Os prazeres e as dores em mesmas proporções.Tantos deuses,tantas dores,tantas decepções-tantos bárbaros escravizados e revoltosos.

Dizia Nietzsche,o fenomenal filósofo e pensador alemão:" a tarefa da arte é conferir um sentido à vida.Nós temos a arte a fim de não se morrer de verdade."

Estou morto.Enganei-me durante toda a vida.Enganaram-me os autores dos livros de história clássica da humanidade..."

- Não foi enganado.Não pelos os que contaram a história do povo grego,pelo menos...

Disse-lhe a voa,às suas costas.Era um homem de estatura mediana. Vestia-se com um manto de alvura singela.Ostentava cabelos compridos,de barba longa.

-Estamos num cemitério...

Disse com uma mansietude angelical,sublime.Parecia se quer respirar-tirar ou por ar nos pulmões para se expressar.O olhar dirigia-os para as nuvens que o vento carregava.

-Sei disso.Aqui estou enterrado.E aqui estou preso.Aqui estou vivo e estou morto...que situação bizarra,seria surreal ou abstrato...não sei...sombrio..uma pintura de Edward Munch,talvez

Então foi-lhe concebido a verdade de que a morte-de verdade-,não existe."Temos uma vestimenta de energia primitiva e densa que com o tempo se desgasta e perece,ou poderá ser destruída ou perecer, de outras formas,de acordo com as circunstâncias da vida".

-Cadê Jesus..?.pensei que viria me buscar e me dar um abraço...

-O homem,que se encontra nas farras de Dionísio,Afrodite .Nas orgias dos deuses gregos têm muito a aprender.Sei que é fã dos povos da Mesopotâmia,dos egípcios,Grécia e da Roma antiga.Perdia longas noites lendo livros de páginas amareladas pelo tempo...Muitos foram até encontrados nos lixo.

-Os egípcios acreditavam que o KA,o espírito do Faraó era imortal.Até mesmo os seus pertences eram depositados na sua tumba-que era planejada,de forma arquitetônica,que durasse para sempre.Uma estátua acompanhava os pertences para que lhe servisse de novo corpo. A grande preocupação da arte no Egito era garantir a vida após a morte dando conforto ao espírito dos soberanos...A minha igreja me enganou...E os faraós,também, viveram enganados,por milhares de anos...Pensavam que eram deuses,que eram eternos,mesmo que perdêssemos o corpo de carne...a matéria primitiva.O corpo dos prazeres.

-Não.Foi cumprido o papel.Cada qual recebe o que merece,ou o que pode absorver,nada demais,ou de menos. E,somos eternos,mesmo que se perca o corpo de carne.Venha comigo...

-Para onde Vamos...?

-Para o Olimpo,quem sabe..ou para o Oráculo de Delfos...para o limbo,ou para o Paraíso...nunca sabemos ao certo.Quando deixamos a vida tudo se torna um grande mistério.

A noite ficou mais fria.Os morcegos surgiram do nada e bailavam por sobre as copas das árvores,de folhas amareladas,secas.Uma lua cheia se destacava na abóbada celestial acompanhada pelas estrelas,como se fôssem sátiros raivosos em mais um festim dos deuses do Olimpo.Afrodite não estaria presente.Não era uma festa,mas,sim,uma tragédia helenista,com ares irrefutáveis voltados para a dor,o desespero e a luta inglória do homem comum e a vida do além- túmulo,onde a Festa de Baco muitas vezes não encontra o devido personagem,o devido Deus,Dionísio-e o vinho da existência no mundo do invisível parece amargo,uma Tragédia Grega. E a festa é,na verdade,um enterro. De consola,resta crer no KA-a vida eterna a ser preenchida e vivida numa estátua rica,de mármore,gesso,granito,ou até mesmo bronze,ouro. Talvez deixem litros de um bom vinho na tumba do faraó,e possa,pelo menos beber em paz-ja que não descansará em paz descobrindo que a vida continua.Uma grande e desagradável surpresa.

LG