Os jovens amantes: uma lenda de ficção e amor
Acabara de sair do mar… Em suas mãos trazia os peixes que abasteceriam a aldeia. Era um grande pescador, apesar da pouca idade! Filho do curandeiro da aldeia todos achavam, à boca pequena, que ele enfeitiçava os peixes… Nunca trazia de mais nem de menos, trazia sempre a conta certa para satisfazer a todos… Na aldeia cada um tinha uma função definida. Os homens eram caçadores, pescadores, plantadores, curandeiros etc… às mulheres cabiam a colheita, o preparo dos alimentos, a educação das crianças entre os demais e infindáveis afazeres domésticos. Era uma aldeia pequena e a organização e planejamento, do grande chefe, era o sucesso visível para todos. Todos tinham igualmente os mesmos direitos, era uma única família! Porém, há um certo tempo, notava-se que as crianças já não vingavam e muitas, quando vingavam, precisavam serem “libertados” amorosamente pela mãe, antes da primeira mamada (nessas aldeias as mulheres vão sozinhas para a floresta. Lá, depois do parto, examinam a criança. Se ela tiver alguma deficiência, a mãe volta sozinha para a aldeia se for gêmeo, volta com uma, no caso de casal, será sempre poupado o filho homem), o chefe depois de muito meditar, junto com curandeiro, achou melhor proibir novos acasalamentos evitando assim a chegada de novas crianças… Achava que a aldeia estava purgando algum pecado e até descobrir a causa permaneceria tabu o casamento entre si … Acontece que o jovem pescador amava a linda Kerexu (Lua crescente), filha do chefe da aldeia que, por sua vez, era filho do pai do jovem pescador, Kaique, com uma prima da sua mãe… Os jovens que cresceram junto brincando nas águas do mar, certa noite estrelada, se viram como homem e mulher e perceberam que se amavam. Uma forte atração, que logo foi descoberta por toda aldeia. Assim começou o sofrimento do jovem casal que as escondidas quebravam aquele estranho tabu criado para apartá-los. Sempre a noite se encontravam e embaixo das estrelas se amavam na canoa de Kaique, depois mergulhavam no mar, contavam estrelas e se separavam ao cantar do primeiro pássaro… E assim passaram-se os meses e os dois amantes enredados nos seus sonhos de jovens perceberam que Kerexu estava grávida! E agora como fazer? Teriam que enfrentar a tribo e depois, com certeza, “libertar” a criança… Foram muitas lágrimas derramadas, muitas noites sem se amarem, sem mergulharem no mar a pensar uma maneira de resolverem o triste futuro! Pensaram em fugir mata a dentro, mas, viram ser impossível devido as maldições que certamente iriam acompanhá-los. Um dia vendo que não tinha solução resolveram se encontrarem no ybaka (céu) , mas, para isso, Kaique, precisava dar-lhe algo para reconhecê-la entre tantas estrelas… Então ele mergulhou bem fundo e encontrou uma linda concha. Voltou para a canoa e em reverência, prostrou-se aos seus pés, jurando ficar ao seu lado para sempre, entregando-lhe. Kerexu fascinada com o presente abriu a concha deixando à mostra uma linda e reluzente pérola! Ela a beijou e a pendurou no seu pescoço… Ficaram assim fitando aquela estranha luz que os incitava a navegar mar a dentro… Entraram na canoa e seguiram rumo ao horizonte, sempre seguindo o raio de luz dispensado pela pérola. Depois de um tempo, já na imensidão do mar a canoa parou e a luz apontou para baixo e assim após se abraçarem e rindo muito, seguraram as mãos e mergulharam para o infinito. Hoje a aldeia contempla, em noites sem lua, duas brilhosas, sorridentes e estranhas estrelas, tão ligadas uma a outra que parecem ser uma só. O feiticeiro reconheceu o filho e a jovem índia e colocou o nome das estrelas kaaru Ko. Ao anoitecer, no dia seguinte à lua nova, os dois astros (correspondentes a estrela Dalva e Vesper) se encontram bem próximos, no lado oeste. Eles se distanciam conforme as fases da lua e só na lua nova, seguinte, quando a pérola do pescoço de Kerexu brilha extraordinariamente, voltam a se unirem recomeçando todo o ciclo.
Umburana de Cheiro