O caçador de duendes - Contos de fadas para adultos

Contos de fadas para adultos

O caçador de duendes

Em algum momento no tempo, quando castelos se erguiam sobre as montanhas e dragões flutuavam ao lado das nuvens, um caçador chamado Josef era aclamado em seu reino, tido como o mais brilhante entre todos os homens por conta das suas faculdades de guerra. O homem tinha porte grande e cabelos loiros, que esvoaçavam quando em cima do seu fiel companheiro, o quadrúpede Niki. Todas as mulheres o amavam, mas ele não amava nenhuma delas. Josef se vangloriava pela sua habilidade sobre-humana de não entregar seu coração a ninguém; ele dizia que só havia duas coisas no mundo pelas quais era apaixonado: o dinheiro e a liberdade, e possuía ambas. O dinheiro do seu cofre vinha do reino, ele era chamado para os piores trabalhos, para as maiores recompensas. Um dia tinha de matar um dragão que invadira as cavernas onde os mineradores do rei exerciam suas funções, no outro era chamado para exorcizar os gigantes das lavouras reais. Ninguém tinha a sua coragem e a sua força. Mas ele vivia livre, correndo com seu cavalo, afiando a ponta de suas flechas, passeando na mata junto às belas ninfas que por ele nutriam paixão voraz, como a de uma jovem na puberdade a ver o príncipe em seu cavalo branco. Josef era um homem feliz, quem sabe por não amar...

Houve uma vez em que as florestas se encheram de duendes, e isso foi um grande problema para o rei, porque as pequenas criaturas queriam impedir a extração de árvores por parte dos homens, já que era dentro delas que os pequeninos viviam e se alimentavam. Eles se proliferavam mais do que ervas daninhas, e o reino começou a falecer em sua economia, pois não conseguia expandir suas terras para extrair ferro e ouro das montanhas, uma vez as florestas as contornavam e os diabinhos impediam a chegada do homem até os minérios. Foi aí que Josef fora chamado, logo a sociedade dos duendes recebeu a notícia com horror, eles todos seriam caçados pelo maior matador de criaturas mágicas do mundo.

Não tardou para iniciar o seu trabalho. Josef usava de suas armaduras robustas, confeccionadas pelos melhores alquimistas, para se proteger dos ataques mágicos dos pequenos duendes, eles tentavam confundi-lo na floresta, criando caminhos infinitos e informantes traiçoeiros, porém sua lupa da verdade o fazia encontrar sempre a estrada correta. Suas flechas incendiavam as árvores, caçavam criaturas, sua espada se reconstituía sempre que quebrada pela magia dos baixinhos. Era difícil caçá-los, todos se esgueiravam na mata e pulavam entre os galhos iguaiszinhos aos macacos. Quando pegava um deles, estripava-o de forma asquerosa e pendurava o seu corpo sangrento em uma árvore para que todos os duendes temessem a volta do caçador.

Foi questão de semanas para que o número de pequenos orelhudos diminuísse alarmantemente, porém, enquanto Josef não capturasse o duende Tiririn, eles nunca seriam extintos, pois este era simplesmente o mais poderoso de todos, o conhecimento dos seus poderes se espalhara por toda o planeta, pessoas do deserto vinham oferecer tesouros em troca de sua magia. Tiririn era forte demais para ser pego por Josef, e Josef forte demais para ser pego por Tiririn.

Um dia, na floresta, o esplêndido caçador recebeu a visita do magnífico duende, que fez uma proposta:

- Tu estás acabando com o meu povo, és tão forte quanto as florestas. Um dia eu estarei sozinho entre todos, e não haverá graça caminhar na solidão. No entanto, se não tiver a mim, jamais conseguirá escavar até as montanhas, pois meu poder verte por toda a relva. Eis que te faço uma proposta: dá-me o coração daquele a quem tu mais amas e em troca eu te deixo me prender.

Josef alegrou-se. Ele não amava ninguém, portanto só teria a lucrar com isso. Aceitou a proposta e levou preso o duende, que não se deixava ser morto. Ele foi trancado em uma masmorra e lá ficou por todo o resto dos dias...

Josef continuou sua vida normalmente depois que os duendes desapareceram da floresta. A relva tinha proporções colossais, demoraria décadas para que os lenhadores chegassem até as montanhas, ricas de ouro e de ferro. O trabalho começou cedo e o reino prosperou rapidamente. O caçador ainda fazia os seus trabalhos dez anos mais tarde, mas a velhice deu sinais de sua existência e ele diminuiu o ritmo. Josef tivera um romance com uma camponesa e de suas noites de prazer nascera Florença, uma bela garotinha de cabelos negros e olhos azuis. Os anos passaram e as pessoas não o amavam como outrora, viveu a beber em bares e dormir embriagado nas ruas; as mulheres tinham nojo dele, exceto quando havia moedas de ouro em seus bolsos. Florença tentou ajudá-lo de todas as formas e quando ele ficou doente cuidou de seu pai, em um momento em que ninguém mais quis fazê-lo. Josef se recuperou e percebeu, em uma manhã, sozinho em casa, que estava com saudade de sua filha, e ali ficou sabendo que pela primeira vez na vida sentia amor, amor por aquela que trouxera ao mundo. O amor lhe rejuvenesceu, ele voltou a caçar, não tão intensamente como antes, o dinheiro retornou ao seu cofre e comprou um novo cavalo, Estevão. As mulheres passaram a desejá-lo novamente.

Sua filha, Florença, era a mais bondosa de todas as donzelas do reino, e junto a um grupo de mulheres realizava trabalhos benevolentes para com os mais pobres. Um dia elas foram limpar as masmorras e cuidar dos ferimentos dos encarcerados. Lá a filha do caçador conheceu um rapaz de estatura pequena e pele escamosa, mas na escuridão não era possível ver sua feição. Ela voltou uma semana depois para continuar seu trabalho. Retornou mais uma vez em três dias, em dois, em um... Florença não saía mais das masmorras, tornou-se a guardiã dos delinqüentes, às vezes dormia no corredor das prisões. Certa noite voltou para casa, andava por aí com os olhos distantes, pensamentos tão vagos quanto as folhas que bóiam nos riachos. Josef quis saber o que andara acontecendo, mas Florença permanecia em silêncio. No meio da madrugada, quando todos descansavam, pegou o machado do seu pai e acertou-o nas costelas, ele acordou, porém, sem a capacidade de andar, quando tentou fazê-lo, sucumbiu ao chão. Florença o acertou mais uma vez, agora no ombro, e seu braço direito pendeu, suspenso no corpo, ele rogou por sua vida, lamentou que ela estivesse a açoitá-lo, caçado pela única pessoa que amara. Sua filha revelou que se apaixonara por um duende das masmorras, Tiririn, e que ele contara toda a verdade sobre os pequenos, a floresta e o reino. Segundo suas palavras, era injusto que os homens tomassem o lugar dos verdadeiros moradores da mata, e ela faria de tudo para passar a viver ao lado do duende, por quem seu amor latejava no peito, e lutaria até seu último dia de vida para dar a floresta de volta a quem ela realmente pertencia.

Antes que pudesse exalar seu último suspiro, Josef teve a cabeça decepada pelo próprio machado.

Na mesma noite o duende Tiririn libertou-se das masmorras e gritou para que os duendes escondidos se revelassem de onde estavam guardados: debaixo da terra. Eles comemoraram a morte daquele que era o único homem vivo a poder derrotá-los. Tiririn tirou o feitiço de amor que amaldiçoava Florença, e quando esta percebeu o que fizera, cometeu suicídio, enforcando-se em uma árvore perto de onde os lenhadores trabalhavam.

Os duendes mataram todos os lenhadores e voltaram a reinar entre as árvores.. O plano de Tiririn fora sucedido com esplendor, pois bem sabia que a única pessoa a conseguir matar seu rival era aquela que ele jamais temeria por uma trapaça, e assim seu povo voltou a viver feliz na floresta.

Moral:

Tema o riacho, ele pode conter um poço fundo e traiçoeiro ao qual você se afogará por descuido.

O Tirano
Enviado por O Tirano em 01/09/2015
Código do texto: T5367356
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