DUAS LENDAS

Durante todo o século XVI e seguintes, quando os espanhóis e portugueses intensificaram a invasão do Novo Mundo, os missionários, principalmente os jesuítas, foram mandados para cá com o objetivo (nunca revelado) de aniquilar as culturas locais, como forma de consolidar o domínio do colonizador.

A forma mais eficiente posta em prática foi a de atacar a cultura religiosa porque era através dela que os pajés (sacerdotes) detentores de enorme conhecimento, infundiam nas crianças e jovens, ainda não iniciados, os usos e costumes que mantinham a unidade tribal.

Quebrado o elo, seria mais fácil conseguir a mão de obra necessária para a produção agropastoril e fazer a penetração ao interior do continente, atrás de riquezas como ouro e pedras preciosas.

Com a neutralização dos detentores do conhecimento milenar, os colonizadores travestidos de benfeitores até então considerados inimigos, passaram a ser vistos pelos jovens como salvadores dos castigos eternos pregados pelo cristianismo.

As línguas, Tupi e Guarany são (ou eram) apenas faladas. Não havia a escrita e os conhecimentos eram transmitidos “da boca do mestre para o ouvido do aprendiz”.

Sócio e antropologicamente falando, está demonstrado que esse estilo de transmissão de conhecimento ou de comportamento, exige a existência de lendas e mitos para a sua fixação.

Os jesuítas sabiam disso e foram muito eficientes no manejo dessas técnicas, ainda hoje em voga nas comunidades isoladas e/ou analfabetas.

Desse período da história, surgem as duas lendas a seguir:

Caacupé = (Ká akupé, em guarani) = atrás do monte.

Em meados dos anos 60 do século XVI, um índio guarani, já catequizado, estava caminhando pela mata quando se viu cercado por inimigos índios da tribo Mbayares, que ainda não haviam sido catequizados.

Para que não fosse visto e consequentemente morto pelos inimigos, ele rezou para Nossa Senhora, a Virgem mãe de Jesus, pedindo fervorosamente, que ela o livrasse daquela situação e que se ela concedesse esse milagre, ele que era escultor, faria a imagem da Virgem na madeira.

Ainda durante a oração, ele ouviu uma voz doce que lhe dizia – Ká akupé... Ká akupé...

Prontamente ele escondeu-se atrás de um monte onde existiam vários pés da erva mate (Ilex paraguaiensis) e assim, conseguiu escapar da morte certa.

Quando o perigo passou, o índio cumpriu a promessa esculpindo a imagem da Virgem num pedaço de madeira da árvore do chá, e foi construído um nicho para a imagem que passou a ser visitado pelos convertidos.

Aconteceu que o período de chuvas do ano de 1603 foi muito acima do normal, tanto que as águas do Lago Tapaicuá inundaram toda a região. Muitas casas e vidas foram ceifadas pela fúria das águas e foi nessa ocasião que se deu o fato que originou a devoção e transformou rapidamente o local em centro de peregrinação.

Ao baixarem as águas, em meio ao caos, a imagem estava intacta e no local onde havia o nicho que também fora destruído.

Com o passar dos anos a devoção se consolidou e a Virgem de Caacupé foi consagrada padroeira de todo o Paraguay, e sua festa se realiza, todos os anos, no dia 08 de dezembro.

VIRGEM DE LUJÁN

Por volta do ano 1630, um português chamado Antonio Farias Saa, saiu da vila de São Paulo de Piratininga com destino a Buenos Aires, na Argentina.

Numa das paradas para descanso da tropa, já bem perto do destino, na margem do Rio Luján, aconteceu o fato inexplicável.

A carreta que levava a imagem da Virgem Maria ficou extraordinariamente pesada.

Homens e animais pelejaram por muitas horas a fim de deslocá-la sem nenhum sucesso. Foram atreladas outras juntas de bois, mas a carreta parecia que tinha criado raízes e não se movia de jeito nenhum.

Transferiram a carga para outra carreta, mas mesmo assim nada conseguiram. Finalmente tiraram a imagem da Virgem de dentro da carroça que, milagrosamente, saiu do lugar com apenas a agitação dos animais atrelados.

Diante desse fato inusitado, o senhor Antonio entendeu a mensagem sobrenatural de que era desejo da Virgem que fosse construído um abrigo, naquele local, onde a imagem ficaria exposta à devoção dos fiéis.

Hoje esse abrigo é a Basílica de Nossa Senhora de Luján que, por bula papal, foi consagrada padroeira da nação Argentina, cuja festa é celebrada, anualmente, no quarto sábado depois da páscoa.