A porca Cacilda

Cacilda era uma porca de família. Nasceu fraquinha, fraquinha e foi criada por Mariana que a trouxe do Sítio com poucos dias de vida. A menina tinha com ela um cuidado de boneca, dava-lhe mamadeira e a mantinha aquecida, enrolada em um cobertorzinho cor de rosa. À medida que Cacilda crescia, o amor de Mariana em relação a ela aumentava, e novas roupas eram confeccionadas para cobrir seu corpinho branquinho como a neve.

Certo dia o pai de Mariana se irritou. A cama que elas dormiam se partiu. Eram 120 quilos de puro torresmo, sem falar que Mariana também era bem gordinha. Mariana, pela milésima vez fez pirraça. Mas toda cena de desespero, dessa vez foi em vão. O pai estava irredutível.

Assim que Cacilda foi retirada da carroceria da camionete, usando botas e vestido branco, foi agredida com palavras de baixo calão pela porcada do sítio.

Sua mãe biológica: A porca Judite, gungunou surdo pelo focinho impregnado de farelo de trigo.

_ Eu deveria tê-la comido no ninho ao invés de abandoná-la. Cacilda virou um monstro humano.

Todos os porcos riram e começaram a gritar em uníssono:

_ Porca humana! Porca humana...

Cacilda foi levada para um chiqueiro comunitário e foi agredida por dezenas de porcos imundos, que rasgaram seu vestido, arrancaram suas botas e em pouco tempo a deixaram nua. Pasmem! Até seus óculos escuros foram quebrados. Por sorte o Senhor Jeremias escutou a gritaria. Mas um pouco e Cacilda teria de ir direto para o açougue.

Seu Jeremias quase a levou de volta para os braços da filha inconformada. Ele também gostava da porquinha, que viu crescer e ficar anos ao lado da menina. Quantas vezes antes de retirar o cobertor as confundiram. Cobertas elas tinham o mesmo volume. Ele a colocou em um chiqueiro vago e lhe deu água fresca. Cacilda estava com fortes dores no lombo e uma luxação no pernil esquerdo e chorava inconformada com a sorte.

Cacilda sentia muita saudade da menina Mariana. No início, a saudade era amenizada pelas visitas de final de semana. Cacilda era trazida do chiqueiro e as duas rolavam pelo gramado e depois abraçadas pulavam na piscina levantando um mundo de água.

Os porcos a deixaram de lado. Cacilda era metida. Não dava mesmo confiança para eles.

Algum tempo depois Mariana mudou-se para a Capital. A saudade foi tanta, que Cacilda muito carente, acabou se envolvendo com o porco Julião e ganhou de presente sete máquinas de fazer sujeira. Os pobres leitões não podiam brincar na terra e morriam de inveja dos outros porquinhos que podiam entrar na lama. Constantemente, eram vítimas de buling.

Os porquinhos, aproveitando a ausência da mãe, que tinha ido colher frutas frescas, fugiram. Em uma fração de segundo estavam na bagunça. Brincando com a leitoada imunda. Felizes como pintos no lixo. Fizeram amizade. E todos viram que aqueles porquinhos, apesar de limpinhos, eram gente boa, e, como todo porco que se presa gosta mesmo é de sujeira, resolveram pular no meio do brejo.

Quando a porca Cacilda chegou e não viu a ninhada, ficou doidinha, doidinha e começou a gritá-los: Florzinha; Sabão; Sabonete; Talquinho; Perfuminho; Alfazema; Creolina, onde estão vocês!

Naquele momento a cadela, Sacha Cristina, passou, e com os ouvidos zunindo de tanto a porca gritar foi logo dizendo com ironia:

_ Cacilda, querida. Eu os vi lá no brejo com o Chouriço a Pururuca a Lingüiça e outros que de tanta lama não deu pra decifrar quem era. Acho que estavam brincando de feijoada.

Cacilda, não queria acreditar no que ouvia. Pensou nos filhos enlameados e teve ânsia de vômito. Rapidamente voltou ao pomar e cortou uma vara de goiabeira e enfurecida partiu em direção ao lamaçal. Quando chegou teve um mal súbito. Eles estavam com barro até nos espíritos. Possessa, quando deu por si, estava cortando de vara a leitoada imunda. Os pequenos gritavam escandalosos como em véspera de Natal. Ao entrarem no chiqueiro sujaram o chão que Cacilda havia levado horas para encerar. Cacilda começou a espancar os leitões. Queria exorcizar aqueles espíritos de porco de qualquer maneira. Foi então que os animais do Sítio se revoltaram, e o burro teve uma ideia, que todos acharam genial: Levar a porca para um lugar bem sujo.( Se conhecessem o Congresso Nacional, não pensariam duas vezes). Cacilda foi jogada na lama e a obrigaram comer lavagem. Cacilda misturada com os seus, acabou gostando da farra, e agora que vive andando com os porcos, não dispensa um cocho de farelo.

FIM

Luiz Cláudio Santos
Enviado por Luiz Cláudio Santos em 24/01/2014
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