O VATICÍNIO DAS CORUJAS
- Conto gauchesco -
Um estancieiro, de nome Irajiba Leôncio Neves, tenteador de uma poderama de não se dar a fazer cálculo, ( nem ele sabia mais o que tinha), media a laçadas de doze braças as proximidades e outro tanto media a tempo de passitos de cavalgadura, calculados entre o tempo da andadura e dos ponteiros do patacão. Visto que vivia a seu tempo a velha campanha, ao sul do vale do Jacuí, onde retomam as coxilhas, a se perderem de vista.
A terra era dos poderosos e mais tiranos.
Pois este mesmo arremedando os taitas, impertigado e largado a guapetear, tinha fama de tirano e guasqueador de seus agregados. Diziam, que ao mesmo tempo das posses, tinha muitas chinas paradas em rodeio num galpão, cuidadas por uma velha tirana, que já foi dona de bordel. Estavam elas todas cativas ao seu dispor. E quando o chinaredo se abilchonava , o chiripento lhes baixava a guasca. Misericórdia, era uma judieira!
Para fora do galpão, campereava salivando, uma chusma de cão fila.
As pobres, não tinham saída. Era matear, sofrer, se deitar com o mandatário e voltar para o galpão. Fugir, nem pensar. Tentar era morrer no cano da arma de um dos pelegos do chefão.
Feita a descrição do estancieiro, contada até se avizinhar daquí; vamos ao causo:
Passava o figurão com seu tropel de peões e agregados - todos paus mandados do rijo mandachuva - quando vê um taperaço à beira do caminho. Restos daquilo que já fora um casarão. Pousado em uma ruína de torre, estava um formoso casal de corujas, das que vivem nas solitudes.
À la moda dos casais dessa espécie de aves, uma acariciava com o bico as penas da outra, a ver piás apotranhados com xinoquinhas noviças e precisadas.
As corujitas trocavam afagos de bico com bico, como se com febre de beijos se esfogueassem num edílio. Até seus olhitos cerravam às trocas dos "beijos", ela como uma prendinha sonhando em ser princesa, ele em ser um macanudo no seu reino, com muitas torres de castelos para pousar.
O taita, arreliador mas muito supersticioso, dado a mil crendices, tinha nas corujas mui malos presságios, ligados ao libido em se dizer machaço. Achava ele que tais aves eram de mau agouro e roubariam seus arremedos ao arrebanhado de chinas: - "Um taita não ser trafugueiro no seu afogo! Só de pensar ando de marca quente, prefiro bater as botas do que voltar de orelha murcha." - Ala cuê! Mato os bichos, mas dou sustança às chinas. Nem pensar em ser pilungo que até égua velha dá coice!
Chamou seu peão-mor: - Que alcovitam aquelas almas-de-gato!? - perguntou o ricamente pilchado mandatário.
Se tu aceitar¹ a verdade de que tratam os nubentes emplumados, sem açoites, sem me pelenguear a natureza ou me fazer esticar os cambitos, eu te direi! Pois vosmicê não olvida que as corujas, os mochos e aparentados simbolizam o saber, e também poder. E eu, tu bem conhece, tenho as mesmas visões do meu falecido avô , o velho tapejara, - filho de Tupã - que também sabia a linguagem dos animais.
- Sem mais milongas, veja lá o que vai falar, não agüento carona dura, dou a ti palavra de honra de um guasca que não arreda pé, que venha a ser lá o que seja, não te tiro o couro em cepo de povoado. Por ora, veja, não carreo dalgum motivo - replica o figurão.
- Já que me preleva vossa palavra como pai-de-fogo, em resguardo de minha vida, te direi a verdade - disse o peonaço:
O dito cujo peão, alimentava em secreto, um tremedal de ódio pelo patrão: - "Aquele patrazana pimponado, que tinha o rei na barriga, gambeteou sua única e amada china, para potreá-la junto às mais de cento e tantas de seu harém particular; mas... num há-de esperar mui ancho, pero que lo recobro hay que virá mui malo !! É só dar tento ao alimal², como os guri faz co'as pandorga." Após essas elucubrações da alma que era mais gaúcha que a própria carcaça, disse:
- Essas judiciosas aves que ora namoriscam, num upa estarão noivando, - iniciou, ironizando, seu causo:
- A coruja noiva diz ao seu galanteador, como toda boa prenda, que só o vai aceitar por marido se ele lhe jurar de cruz no bico, que ela tão prendada coruja, entrará na posse de vinte povoados derrissados pela guerra, mais tantas aldeia em ruínas com seus cemitérios abandonados, muitos campanários de capelas e taperadas de mansões mui soturnas; como dote de casamento.
- Tenho na mirada do desejo passar estadias em cada vila de campo na solitude de apojado descanso - completa ela. Tenho planos até de uma estância, virada fantasma...
- O noivo antes de outra, lhe diz: - "É, quem ordenha, bebe o apojo".
- E que lhe responde o noivo? - pergunta o macanudo pimpão.
Ele diz: - "tenha paciência e me dê um pouquito de tempo, para que atine no que tu me pede* - já que o noivo-coruja está vendo, que vai andar de cambão e cangalha nas mãos de sua prenda...
O estancieiro que sempre se acha buenaço, intervém: - Que mais disse o alimal macho?
- Pois olhe, escuta bem. Meu avô não só me ensinou a linguagem dos bichos, como me transmitiu que eles também entendem o que palreamos a solito ou em grupelhos. E, esse coruja macho que te escuta, te acompanha já faz tempo! No seu pio mais evidente, como fosse um vidente, vaticinou: - Gaúcho que se presa, não judia de prenda nem de china, quem é macho raciocina: o que é pior para um taita que se julga garanhão!? Pois escute, não é morrer nem pelear em cima de um cavalo gavião. Nem entrar em refregas, de sabre e facão. É voltar para a casa mocho, no lugar que tu mais presa; dos culhões um aleijão! E disse também que se um certo estancieiro que se julga mui taita, viver mais dois anos, vai dar tudo o que a coruja-prenda pediu.
O ricaço pimpão negaceou falar que ia matar Chico Peão, mas disse que "palavra era palavra de um taita que não arreda pé, não ia courear o peão" isso em frente de toda a peonada, pra mais de trinta.
Chico Peão (o líder dos peões) aquí, ironizou e preconizou o que planeava, colocando o vaticinio na voz das corujas.
- O pimponado patrãozaço, tirano e querendão, acreditava piamente na antiga superstição, ouviu uma vóz que dizia: que já estava a ficar aleijão e podia contar seus dias! Sentindo naquele lugar precioso, como uma orelha de flete murchar, e encolher barbaridade!
Desencadeou aloucado, taita arrancada pras macegas de guanchuma e capinzal, abrindo espinhaço no peito, tomado de um terror de jogar o pelego.
Bateu nele um pavor mui supersticioso e estava se borrando de medo, com os fundilhos da bombacha na mão, tentando reter o que não dava. Seu intestino roncava mais forte que em dia de tempestade de corisco e trovão. Sentia os bagos arder como pimenta malagueta.
-"Maldição das corujas, crias do capeta!"
A peonada cascou o bico numa gaitada só. O buenaço estava desmoralizado! Mais derrissado que taperada depois de uma refrega bastarda .
Era o que os chirus e outros guascas estavam a esperar: esse dia glorioso de vingança aos maus tratos e soberbia do tal patrão.
- Ala pucha che! En la justicia hay demora pero no hay falta. - emendaram uns fronteiriços...
- Barbaridade que cagaço! Desceu todo pela bombacha pilchada, encharcou as botas. A catinga ninguém aguentou. Nem o seu bagual que se empinou, corcoveou, relinchou e disparou teatino. Dizem que até virou cavalo alçado.
A peonada se debandou toda, cada um para um lado. Voltando a se reunir debaixo de um grande pinheiro araucária.
O líder, Chico Peão, mandou seus mais confiaveis chirus, bem armados, irem até a estância de Irajiba Leôncio Neves, e usar de todos os meios, para libertar as chinas, mas dando uma coça bem dada, de guasca e rebenque na tirana.
O chinaredo saiu como tufo de vespeiro direto para a porteira, correndo fazendo rabicho; aguardando o Chico peão, no povoado de uma rua só.
Lá era lotado um único brigadiano³ cujo posto era num antigo capitel estilo alemão. Era só um brigadiano era certo, mas valia por três, para trabalhar sozinho escolheram, de propósito, o mais taita. Um gigante, da cor de um tição. Cavalariano de primeira, montou no ginete e disparou. Logo voltaram em trinta. Camperearam até a estância.
- Quem não sei! Vou morrer sem saber, mas tocaram fogo na estância do tal Irajiba. Não sobrou nada que prestasse - afirmou Chico Peão.
Os brigadianos sairam, volteando a tropilha cavalariana, fazendo figuraça, eram mesmo taitas e conheciam o ofício, enveredaram para as bandas que Chico apontara. A intenção dos homens da lei era camperear, por caso de achar Irajiba, onde Cândido,"O Candão", praça do povado, era o ponteiro da empreitada, mesmo tendo alí um sargento, mas cedera a Candão o ponteio, visto o soldado ser o primeiro a tomar conhecimento dos fatos e portar o mandado de prisão.
As acusações contra Irajiba Leôncio Neves, começaram a chover: desde assassinato, mando de assassinato, grilhagem de terras do pobrerio de pequenas propriedades a quadrilhagem de roubo contra comboios e peonada tropilhando cavalares, muares, ovinos e vacuns e o cárcere privado das chinas e exploração sexual não consentida dessas mulheres.
Os tempos eram antigos, mas as leis, que hoje são antigas, na época eram fresquinhas, e as autoridades valiam o que recebiam.
O peão Galdêncio Oliveira, reencontra sua amada prenda, a Mariana Wenzel, que foi muito machucada, pela sua relutância em ceder, onde Irajiba lhe batia sem dó nem piedade. Mas orgulhosa, preservou sua dignidade!
O retorno dos soldados brigadianos, foi saudado pelo povaréu que veio vindo da região e se acumulando no povoadinho de Pedregulhos.
Candão atravessou Irajiba de bruços, no cavalo reserva levado pelos brigadianos, por cima do corpo voavam varejeiras, que já começavam a sentir o cheiro passado da morte.
Chico Peão pensou que foi troca de tiros. Mas não; Candão já foi explicando: - Não sou nenhum mestre-cura, mas garanto que foi jararaca, e o dotô, vai dizê donde qui a cobra picô!
O corpo foi levado para Ponte do Areal, onde a delegacia, recebia um legista. O diagnóstico de Candão era correto. Jararaca! E por ironia do destino a picada era no bago, que estava do tamanho de um porongo. Ironia, o garanhão agachado e se espremendo; a jararaca por detrás deu o bote. Irajiba, segundo Candão não deve ter visto a rodilha da bicha, requentando no sol, pensou ela que iam lhe sentar em cima e,
bau bau um garanhão todo pilchado e também borrado.
Todos ficaram vingados e a estância até hoje é um taperão fantasma!
- Conto gauchesco -
Um estancieiro, de nome Irajiba Leôncio Neves, tenteador de uma poderama de não se dar a fazer cálculo, ( nem ele sabia mais o que tinha), media a laçadas de doze braças as proximidades e outro tanto media a tempo de passitos de cavalgadura, calculados entre o tempo da andadura e dos ponteiros do patacão. Visto que vivia a seu tempo a velha campanha, ao sul do vale do Jacuí, onde retomam as coxilhas, a se perderem de vista.
A terra era dos poderosos e mais tiranos.
Pois este mesmo arremedando os taitas, impertigado e largado a guapetear, tinha fama de tirano e guasqueador de seus agregados. Diziam, que ao mesmo tempo das posses, tinha muitas chinas paradas em rodeio num galpão, cuidadas por uma velha tirana, que já foi dona de bordel. Estavam elas todas cativas ao seu dispor. E quando o chinaredo se abilchonava , o chiripento lhes baixava a guasca. Misericórdia, era uma judieira!
Para fora do galpão, campereava salivando, uma chusma de cão fila.
As pobres, não tinham saída. Era matear, sofrer, se deitar com o mandatário e voltar para o galpão. Fugir, nem pensar. Tentar era morrer no cano da arma de um dos pelegos do chefão.
Feita a descrição do estancieiro, contada até se avizinhar daquí; vamos ao causo:
Passava o figurão com seu tropel de peões e agregados - todos paus mandados do rijo mandachuva - quando vê um taperaço à beira do caminho. Restos daquilo que já fora um casarão. Pousado em uma ruína de torre, estava um formoso casal de corujas, das que vivem nas solitudes.
À la moda dos casais dessa espécie de aves, uma acariciava com o bico as penas da outra, a ver piás apotranhados com xinoquinhas noviças e precisadas.
As corujitas trocavam afagos de bico com bico, como se com febre de beijos se esfogueassem num edílio. Até seus olhitos cerravam às trocas dos "beijos", ela como uma prendinha sonhando em ser princesa, ele em ser um macanudo no seu reino, com muitas torres de castelos para pousar.
O taita, arreliador mas muito supersticioso, dado a mil crendices, tinha nas corujas mui malos presságios, ligados ao libido em se dizer machaço. Achava ele que tais aves eram de mau agouro e roubariam seus arremedos ao arrebanhado de chinas: - "Um taita não ser trafugueiro no seu afogo! Só de pensar ando de marca quente, prefiro bater as botas do que voltar de orelha murcha." - Ala cuê! Mato os bichos, mas dou sustança às chinas. Nem pensar em ser pilungo que até égua velha dá coice!
Chamou seu peão-mor: - Que alcovitam aquelas almas-de-gato!? - perguntou o ricamente pilchado mandatário.
Se tu aceitar¹ a verdade de que tratam os nubentes emplumados, sem açoites, sem me pelenguear a natureza ou me fazer esticar os cambitos, eu te direi! Pois vosmicê não olvida que as corujas, os mochos e aparentados simbolizam o saber, e também poder. E eu, tu bem conhece, tenho as mesmas visões do meu falecido avô , o velho tapejara, - filho de Tupã - que também sabia a linguagem dos animais.
- Sem mais milongas, veja lá o que vai falar, não agüento carona dura, dou a ti palavra de honra de um guasca que não arreda pé, que venha a ser lá o que seja, não te tiro o couro em cepo de povoado. Por ora, veja, não carreo dalgum motivo - replica o figurão.
- Já que me preleva vossa palavra como pai-de-fogo, em resguardo de minha vida, te direi a verdade - disse o peonaço:
O dito cujo peão, alimentava em secreto, um tremedal de ódio pelo patrão: - "Aquele patrazana pimponado, que tinha o rei na barriga, gambeteou sua única e amada china, para potreá-la junto às mais de cento e tantas de seu harém particular; mas... num há-de esperar mui ancho, pero que lo recobro hay que virá mui malo !! É só dar tento ao alimal², como os guri faz co'as pandorga." Após essas elucubrações da alma que era mais gaúcha que a própria carcaça, disse:
- Essas judiciosas aves que ora namoriscam, num upa estarão noivando, - iniciou, ironizando, seu causo:
- A coruja noiva diz ao seu galanteador, como toda boa prenda, que só o vai aceitar por marido se ele lhe jurar de cruz no bico, que ela tão prendada coruja, entrará na posse de vinte povoados derrissados pela guerra, mais tantas aldeia em ruínas com seus cemitérios abandonados, muitos campanários de capelas e taperadas de mansões mui soturnas; como dote de casamento.
- Tenho na mirada do desejo passar estadias em cada vila de campo na solitude de apojado descanso - completa ela. Tenho planos até de uma estância, virada fantasma...
- O noivo antes de outra, lhe diz: - "É, quem ordenha, bebe o apojo".
- E que lhe responde o noivo? - pergunta o macanudo pimpão.
Ele diz: - "tenha paciência e me dê um pouquito de tempo, para que atine no que tu me pede* - já que o noivo-coruja está vendo, que vai andar de cambão e cangalha nas mãos de sua prenda...
O estancieiro que sempre se acha buenaço, intervém: - Que mais disse o alimal macho?
- Pois olhe, escuta bem. Meu avô não só me ensinou a linguagem dos bichos, como me transmitiu que eles também entendem o que palreamos a solito ou em grupelhos. E, esse coruja macho que te escuta, te acompanha já faz tempo! No seu pio mais evidente, como fosse um vidente, vaticinou: - Gaúcho que se presa, não judia de prenda nem de china, quem é macho raciocina: o que é pior para um taita que se julga garanhão!? Pois escute, não é morrer nem pelear em cima de um cavalo gavião. Nem entrar em refregas, de sabre e facão. É voltar para a casa mocho, no lugar que tu mais presa; dos culhões um aleijão! E disse também que se um certo estancieiro que se julga mui taita, viver mais dois anos, vai dar tudo o que a coruja-prenda pediu.
O ricaço pimpão negaceou falar que ia matar Chico Peão, mas disse que "palavra era palavra de um taita que não arreda pé, não ia courear o peão" isso em frente de toda a peonada, pra mais de trinta.
Chico Peão (o líder dos peões) aquí, ironizou e preconizou o que planeava, colocando o vaticinio na voz das corujas.
- O pimponado patrãozaço, tirano e querendão, acreditava piamente na antiga superstição, ouviu uma vóz que dizia: que já estava a ficar aleijão e podia contar seus dias! Sentindo naquele lugar precioso, como uma orelha de flete murchar, e encolher barbaridade!
Desencadeou aloucado, taita arrancada pras macegas de guanchuma e capinzal, abrindo espinhaço no peito, tomado de um terror de jogar o pelego.
Bateu nele um pavor mui supersticioso e estava se borrando de medo, com os fundilhos da bombacha na mão, tentando reter o que não dava. Seu intestino roncava mais forte que em dia de tempestade de corisco e trovão. Sentia os bagos arder como pimenta malagueta.
-"Maldição das corujas, crias do capeta!"
A peonada cascou o bico numa gaitada só. O buenaço estava desmoralizado! Mais derrissado que taperada depois de uma refrega bastarda .
Era o que os chirus e outros guascas estavam a esperar: esse dia glorioso de vingança aos maus tratos e soberbia do tal patrão.
- Ala pucha che! En la justicia hay demora pero no hay falta. - emendaram uns fronteiriços...
- Barbaridade que cagaço! Desceu todo pela bombacha pilchada, encharcou as botas. A catinga ninguém aguentou. Nem o seu bagual que se empinou, corcoveou, relinchou e disparou teatino. Dizem que até virou cavalo alçado.
A peonada se debandou toda, cada um para um lado. Voltando a se reunir debaixo de um grande pinheiro araucária.
O líder, Chico Peão, mandou seus mais confiaveis chirus, bem armados, irem até a estância de Irajiba Leôncio Neves, e usar de todos os meios, para libertar as chinas, mas dando uma coça bem dada, de guasca e rebenque na tirana.
O chinaredo saiu como tufo de vespeiro direto para a porteira, correndo fazendo rabicho; aguardando o Chico peão, no povoado de uma rua só.
Lá era lotado um único brigadiano³ cujo posto era num antigo capitel estilo alemão. Era só um brigadiano era certo, mas valia por três, para trabalhar sozinho escolheram, de propósito, o mais taita. Um gigante, da cor de um tição. Cavalariano de primeira, montou no ginete e disparou. Logo voltaram em trinta. Camperearam até a estância.
- Quem não sei! Vou morrer sem saber, mas tocaram fogo na estância do tal Irajiba. Não sobrou nada que prestasse - afirmou Chico Peão.
Os brigadianos sairam, volteando a tropilha cavalariana, fazendo figuraça, eram mesmo taitas e conheciam o ofício, enveredaram para as bandas que Chico apontara. A intenção dos homens da lei era camperear, por caso de achar Irajiba, onde Cândido,"O Candão", praça do povado, era o ponteiro da empreitada, mesmo tendo alí um sargento, mas cedera a Candão o ponteio, visto o soldado ser o primeiro a tomar conhecimento dos fatos e portar o mandado de prisão.
As acusações contra Irajiba Leôncio Neves, começaram a chover: desde assassinato, mando de assassinato, grilhagem de terras do pobrerio de pequenas propriedades a quadrilhagem de roubo contra comboios e peonada tropilhando cavalares, muares, ovinos e vacuns e o cárcere privado das chinas e exploração sexual não consentida dessas mulheres.
Os tempos eram antigos, mas as leis, que hoje são antigas, na época eram fresquinhas, e as autoridades valiam o que recebiam.
O peão Galdêncio Oliveira, reencontra sua amada prenda, a Mariana Wenzel, que foi muito machucada, pela sua relutância em ceder, onde Irajiba lhe batia sem dó nem piedade. Mas orgulhosa, preservou sua dignidade!
O retorno dos soldados brigadianos, foi saudado pelo povaréu que veio vindo da região e se acumulando no povoadinho de Pedregulhos.
Candão atravessou Irajiba de bruços, no cavalo reserva levado pelos brigadianos, por cima do corpo voavam varejeiras, que já começavam a sentir o cheiro passado da morte.
Chico Peão pensou que foi troca de tiros. Mas não; Candão já foi explicando: - Não sou nenhum mestre-cura, mas garanto que foi jararaca, e o dotô, vai dizê donde qui a cobra picô!
O corpo foi levado para Ponte do Areal, onde a delegacia, recebia um legista. O diagnóstico de Candão era correto. Jararaca! E por ironia do destino a picada era no bago, que estava do tamanho de um porongo. Ironia, o garanhão agachado e se espremendo; a jararaca por detrás deu o bote. Irajiba, segundo Candão não deve ter visto a rodilha da bicha, requentando no sol, pensou ela que iam lhe sentar em cima e,
bau bau um garanhão todo pilchado e também borrado.
Todos ficaram vingados e a estância até hoje é um taperão fantasma!
EPÍLOGO
Passado um bom tempo Chico Peão estava com Antonina, sua prenda mui linda, a que tinha sido sequestrada por Irajiba, sentados perto de um fogo de chão mateando um amargo, quando ela disse:
- Tu não sabe até hoje quem atiçou fogo naquela estância caipora, né Chico!? Pois escute; fui eu.
O caiporento do... "não digo o nome", que foi pros quinto dos infernos, queria deitar comigo. Nunca deixei. Chutava, socava, o que mais fazia era ferrar os dentes. Apanhava. Levava tunda. Mas fazia o diabo ficar de pito aceso, vendo navio no Guaiba. Então de reiva ele bebia, até ficar na tiorga, boca aberta, babando com as canjicas de fora. Desse eu tava livre! Roncava que nem um porco de cangote grosso.
Quando o de cujus não voltou mais, e aconteceu o que aconteceu, o chinaredo foi embora; eu fiquei para trás. Seus chirus me ajudaram, peguei a pederneira do infeliz, trisquei ela no colchão de palha dele. Num repente cheirou a chamusco. Disparei na garupa de um chiru, e fui te encontrar lá em Pedregulhos. Não falei logo nada, para que não cismassem contigo. Já que o cusco (com perdão do alimal) tinha me levado de vosmicê e tu me esteva vingando. Fiz isso por amor a ti, meu Chico Peão!
Antonina ganhou mais um beijo para sua coleção.
- Tu não sabe até hoje quem atiçou fogo naquela estância caipora, né Chico!? Pois escute; fui eu.
O caiporento do... "não digo o nome", que foi pros quinto dos infernos, queria deitar comigo. Nunca deixei. Chutava, socava, o que mais fazia era ferrar os dentes. Apanhava. Levava tunda. Mas fazia o diabo ficar de pito aceso, vendo navio no Guaiba. Então de reiva ele bebia, até ficar na tiorga, boca aberta, babando com as canjicas de fora. Desse eu tava livre! Roncava que nem um porco de cangote grosso.
Quando o de cujus não voltou mais, e aconteceu o que aconteceu, o chinaredo foi embora; eu fiquei para trás. Seus chirus me ajudaram, peguei a pederneira do infeliz, trisquei ela no colchão de palha dele. Num repente cheirou a chamusco. Disparei na garupa de um chiru, e fui te encontrar lá em Pedregulhos. Não falei logo nada, para que não cismassem contigo. Já que o cusco (com perdão do alimal) tinha me levado de vosmicê e tu me esteva vingando. Fiz isso por amor a ti, meu Chico Peão!
Antonina ganhou mais um beijo para sua coleção.
SE CONSEGUIRES LUTAR PELA
TUA VERDADE E JUSTIÇA.
MESMO SOZINHO, CONTRA TODOS,
ENTÃO ÉS VERDADEIRAMENTE UM HOMEM,
E A GLORIA É TUA.
NOTAS
TUA VERDADE E JUSTIÇA.
MESMO SOZINHO, CONTRA TODOS,
ENTÃO ÉS VERDADEIRAMENTE UM HOMEM,
E A GLORIA É TUA.
NOTAS
1. De acordo com estudos dos falares do Brasil, por todos os Estados, em cada um há determinantes elementos frásicos, características, sonoridade, supressões sílábicas, cadência de pronúncia, ou seja sotaques: conjunto de hábitos que caracterizam a pronúncia dos habitantes de um país, de uma região, de um meio. Seja ainda: um acento - tom ou inflexão de voz, característica dos naturais de certas regiões de um país. Neste caso, não se trata de erro de grafia, mas um propósito de registrar um tipo de falar. No Rio Grande do Sul, neste caso, eles, os gaúchos usam a segunda pessoa "tu" mas o verbo se o "s" por exemplo. Tu sabe, tu vai, tu sofre (demais outros registros vocais, que não cabem aquí neste propósito.)
2. Alimal, variante de animal, bem como muitas outras variações: ontonte, adv. anteontem, antes de ontem; ôra, interj. corruptela de fora. Usada para tovar fora ou adiante principalmente vacuns, "ora...ôra...ôra boi, boi!! Oropa, s. Europa - "Se aparecia algum gringo / Desses que vêm lá d'Oropa, / Que não é qualquer que topa." (Amaro Juvenal, Antonio Chimango, 21ª ed., P.A. Martins Livreiro-Editor, 1978, p. 37)
3. Brigadiano. Usado o termo aqui para designar o soldado ou pertencente à Brigada Militar do Rio Grande do Sul (BMRGS); somente o R.G.S. designa sua policia militar como Brigada, por forte tradicionalismo, como em tudo que versa as características maiores do Estado riograndense. Em todos os outros Estados membros da União a designação é Polícia Militar: São Paulo (PMESP) Bahia (PMBA) Paraná (PMPR); Minas Gerais (PMMG)... etc. Aliás, São Paulo, também por força de tradição de sua polícia que se chamava Força Pública do Estado de São Paulo, e participou de vários combates fora do próprio Estado,chegou no passado a ter artilharia pesada e aviões, relutou muito em ceder seu nome tradicional. Tanto que em seu hino, se manteve um refrão que fala: (...) "É a Força Pública"... (...) e há ainda quem tenha esperança que o antigo nome possa voltar ! ...
2. Alimal, variante de animal, bem como muitas outras variações: ontonte, adv. anteontem, antes de ontem; ôra, interj. corruptela de fora. Usada para tovar fora ou adiante principalmente vacuns, "ora...ôra...ôra boi, boi!! Oropa, s. Europa - "Se aparecia algum gringo / Desses que vêm lá d'Oropa, / Que não é qualquer que topa." (Amaro Juvenal, Antonio Chimango, 21ª ed., P.A. Martins Livreiro-Editor, 1978, p. 37)
3. Brigadiano. Usado o termo aqui para designar o soldado ou pertencente à Brigada Militar do Rio Grande do Sul (BMRGS); somente o R.G.S. designa sua policia militar como Brigada, por forte tradicionalismo, como em tudo que versa as características maiores do Estado riograndense. Em todos os outros Estados membros da União a designação é Polícia Militar: São Paulo (PMESP) Bahia (PMBA) Paraná (PMPR); Minas Gerais (PMMG)... etc. Aliás, São Paulo, também por força de tradição de sua polícia que se chamava Força Pública do Estado de São Paulo, e participou de vários combates fora do próprio Estado,chegou no passado a ter artilharia pesada e aviões, relutou muito em ceder seu nome tradicional. Tanto que em seu hino, se manteve um refrão que fala: (...) "É a Força Pública"... (...) e há ainda quem tenha esperança que o antigo nome possa voltar ! ...