A VOZ DA CAVERNA
As ordas de cavaleiros, assolaram tanto aquela aldeia que a reduziram a uma população de viúvas e crianças.
Nos idos da idade média, as aldeias normalmente eram pobres e exploradas pelos nobres e tiranos. Mas aquela, por causa de um dos habitantes haver tido um entrevero com o senhor feudal há mais de dez anos, suas mulheres e filhos sofriam de forma contumaz a vingança. Isto durou até que o tirano, em 1343 contraiu a peste negra e morreu de forma sofrida e tenebrosa.
Os ataques cessaram, mas as mulheres sem seus maridos, tinham que fazer todo o serviço a elas atinentes, até aqueles que eram extritamente masculinos. Como sendo, reconstruir casas, pocilgas e baias; ainda, buscar capim e alimentos tanto para os animais, como lenha, para seus fogões rudimentares.
Loreena de Gwinyfell, saia quase todos os dias com uma corda de couro - menos os chuvosos e de muita neve - para o bosque das cercanias à cata de gravetos e galhos secos. Em um desses dias, tendo que adentrar cada vez mais o bosque, pois na orla, os gravetos já rareavam pela busca de outras mulheres, encontrou uma caverna. Achou-a um tanto sinistra, dava-lhe a impressão de que alguém alí morasse, pois tinha pesadas portas, semi-abertas.
Foi dela se aproximando, com medo, mas sua curiosidade era maior que o pavor. De repente, teve a impressão de ter ouvido uma voz feminina. Bonita de se ouvir. A princípio em um canto tradicional tristonho, mas ao falar sua voz era um tanto quanto sibilante, estendendo os "s" assim: - "Sss" ; e, às vezes um pouco rouca. Isso a deixou com medo é claro. Mas lá bem ao fundo da caverna ecoou:
- Você é minha agraciada, pois veio até minha caverna que há séculos não passa viva alma por perto. Tenho sob minha guarda um fabuloso tesouro, que a mim de nada vale, pois tenho tudo o que preciso, vez que sou a "Sacerdotisa de Tryton" e tenho todo o poder. Transformo se quiser, rochas em ouro, pedrarias e pérolas finas.
- Calada, assustada, mas com vivo interesse na palavra "tesouro", continuou na escuta:
- Entre e apanhe todo o tesouro que quizer, mas não esqueça minhas palavras principais - "A PORTA EM BREVE FECHARÁ"!
A mulher, ouvindo a sacerdotisa da caverna, que era adoradora de serpentes, nem se importou com nada. Esqueceu o medo e adentrou bem fundo na caverna. À sua frente rebrilhou um imenso tesouro: com coroas, colares de ouro recobertos de pedras preciosas, braceletes, tiaras, cintos pendentes de esmeraldas, diamantes e rubis, que de tanto brilho e esplendor iluminavam a escura carverna. Loreena de Gwynifel, endoideceu, seu rosto queimava de satisfação, emoção e desejo de riqueza e poder. Pensava:
- Vou deixar de ser essa pobretona. Serei a mulher mais linda e rica de todo o reino. Me casarei com um príncipe, talvez um rei !... Serei poderosa e respeitada. Ninguém vai mais zombar de mim. Porei a ferros todos os que me afrontarem...
Loreena colocava o que podia, em seus grandes bolsos da saia longa, dobrava o avental e o fazia como uma trouxa, retirou sua touca e encheu o que pode, tentou arrastar um pesado baú mas não suportou o seu peso, endoidecia, estava febril ansiosa e descompassada, precisava pegar mais...mais...como fazer isso??
E a voz falou novamente, apanhe tudo o que puder mas, "NÃO ESQUEÇA O PRINCIPAL: A PORTA EM BREVE FECHARÁ"
E a mulher tirou até os calçados, para enchê-los com o tesouro, não satisfeita, foi chutando, jarras e terrinas de ouro e pedrrarias, para fora da caverna, como uma doida ensandecida, completamente tomada pela ganância e a luxúria da fortuna imediata. Despertou dentro de Loreena um monstro adormecido, insaciável de incontrolável desejo de poder.
Diz a voz: - "O TEMPO SE ESGOTOU A PORTA COMEÇARÁ A FECHAR, LEMBRO-TE MAIS UMA VEZ NÃO ESQUEÇAS DO PRINCIPAL"
- Diz Loreena de Gwinyfel: - Que se feche ora! Já saí com meu tesouro. Minha verdadeira fortuna...
E ria e dançava como uma criança grande. Saltitava e pulava.
E a porta como predisse a Sacerdotisa se fechou atrás da mulher com grande estrondo.
A mulher continuava a dançar freneticamente, como possuida de uma loucura. Contaminada por sua fortuna amealhada tão rapidamente e de ter sido ela a privilegiada. Continuava contemplando o tesouro com imensa satisfação.
Aos poucos, aquela febre qua a havia tomado, foi se esvanecendo lentamente e ela cai em si e se pergunta:
- Mas!... Onde esta Cylene minha pequena filha!?? Onde ela está!?
Procura ao seu redor, vira-se para um lado e para outro, gira a cabeça para cá, para lá, inicia uma corrida dando voltas cada vez maiores, entra na orla do bosque...
- Onde está você Cylene. Responda, gritava!!
Já estando tomada de um outro tipo de entorpecimento mental, outro desvario: o maternal. Que lhe apossou mais forte que qualquer outro sentimento anterior, este não era febril, era lívido, esvaia-lhe o sangue das veias e artérias, lhe roubava o ar dos pulmões. Paraliza seus pensamentos, ameaçava tolher seus movimentos como uma paralesia.
Esforça-se para não desfalecer. Não podia. Tinha que encontrar sua única amiguinha e companheira sua Cylene, sua adorada filhinha.
Não a encontrou de forma alguma, nem nos bosques, nem nas matas, nem na aldeia, onde tavez tivesse voltado. Recusava-se a pensar o pior. O inevitável pior de todos os insuperáveis fatos. Retorna ao local.
Sua filhinha havia entrado na caverna com ela, pois num relance tresloucado, de relance a vira com uma estatueta de ouro nas mãos, como se pensasse ser uma boneca talvez. Mas naquele instante, seu transtorno era tanto, que estava fora da realidade e as imagens corriam em vórtice em sua mente, tal a euforia desenfreada que comandava sua vontade.
Entrou em desvairado desespero. Esmurrou a porta da caverna tanto, até sangrar as mãos. Caiu em um choro compulsivo e incontrolável, muito mais que quando os cavaleiros de Sir Ulrick incendiaram sua casa, a aldeia e mataram seu marido. O presente sentimento era muito maior. Se é que se possa fazer algum paralelo entre todas as perdas que se amealham pela vida.
Mediante esse lampejo de visão, em que talvez vira Cylene...
Talvez?... Não. Foi certeza! A sacerdotisa proferiu as palavras, que eu podia apanhar tudo o que quizesse, mas: - 'NÃO ESQUECESSE O PRINCIPAL" - eu vira Cylene com a estatueta - sim, ela ficara trancada na caverna. Não há mais dúvida. Ela era o "PRINCIPAL", para minha vida.
Desesperada em últimas tentativas gritou desesperada a plenos pulmões para que a sacerdotisa tivesse-lhe piedade, para abrir-lhe a porta e liberar sua filhinha. Nenhuma resposta. Nenhum som ou ruído vinha do interior da caverna. Pensou em nunca mais sair da frente daquele amaldiçoado lugar. Morreria alí na espera de que a porta se abrisse.
Nisso, escutou forte tropel de cavalos. Pensou em ajuda chegando. Mas não, algo ruim iria lhe acontecer.
Eram assaltantes de estrada, reunidos em bando, que ao ver o tesouro amontoado à beira do caminho de escarpas pedregosas, apearam, ameaçaram-na de morte.
Rasgaram-lhe as roupas e pegaram todo o tesouro. Até a última pérola existente.
Bateram-lhe na cabeça durante o assalto deixando-a desacordada.
Ao recobrar os sentidos, olhou para os lados da caverna e somente viu uma elevação, coberta de gramas e flores esparsas. Nenhum sinal de que ali tivesse havido qualquer tipo de caverna. Então Loreena teve que admitir sua sina terrível. Havia perdido sua filhinha, para aquela maldita caverna para sempre.
Chorando, com o coração dilacerado e ferida, nada mais lhe restava fazer senão voltar para a aldeia. Foi apanhar seus calçados, pois estando descalça os salteadores não os viram jogados em uma moita de capim. Dentro deles restava um pouco de moedas de ouro e algumas pedrarias, que ela pobre e necessitada logo gastou nos pesados impostos que lhe auferiram por sua ausência e na alimentação muito cara do senhor feudal. Acabou-se logo seu pequeno quinhão.
A fortuna, como todo bem material é passageiro e logo se acaba, mas a tristeza e o desespero da perda de sua filha ficou até os últimos dias de sua vida.
As ordas de cavaleiros, assolaram tanto aquela aldeia que a reduziram a uma população de viúvas e crianças.
Nos idos da idade média, as aldeias normalmente eram pobres e exploradas pelos nobres e tiranos. Mas aquela, por causa de um dos habitantes haver tido um entrevero com o senhor feudal há mais de dez anos, suas mulheres e filhos sofriam de forma contumaz a vingança. Isto durou até que o tirano, em 1343 contraiu a peste negra e morreu de forma sofrida e tenebrosa.
Os ataques cessaram, mas as mulheres sem seus maridos, tinham que fazer todo o serviço a elas atinentes, até aqueles que eram extritamente masculinos. Como sendo, reconstruir casas, pocilgas e baias; ainda, buscar capim e alimentos tanto para os animais, como lenha, para seus fogões rudimentares.
Loreena de Gwinyfell, saia quase todos os dias com uma corda de couro - menos os chuvosos e de muita neve - para o bosque das cercanias à cata de gravetos e galhos secos. Em um desses dias, tendo que adentrar cada vez mais o bosque, pois na orla, os gravetos já rareavam pela busca de outras mulheres, encontrou uma caverna. Achou-a um tanto sinistra, dava-lhe a impressão de que alguém alí morasse, pois tinha pesadas portas, semi-abertas.
Foi dela se aproximando, com medo, mas sua curiosidade era maior que o pavor. De repente, teve a impressão de ter ouvido uma voz feminina. Bonita de se ouvir. A princípio em um canto tradicional tristonho, mas ao falar sua voz era um tanto quanto sibilante, estendendo os "s" assim: - "Sss" ; e, às vezes um pouco rouca. Isso a deixou com medo é claro. Mas lá bem ao fundo da caverna ecoou:
- Você é minha agraciada, pois veio até minha caverna que há séculos não passa viva alma por perto. Tenho sob minha guarda um fabuloso tesouro, que a mim de nada vale, pois tenho tudo o que preciso, vez que sou a "Sacerdotisa de Tryton" e tenho todo o poder. Transformo se quiser, rochas em ouro, pedrarias e pérolas finas.
- Calada, assustada, mas com vivo interesse na palavra "tesouro", continuou na escuta:
- Entre e apanhe todo o tesouro que quizer, mas não esqueça minhas palavras principais - "A PORTA EM BREVE FECHARÁ"!
A mulher, ouvindo a sacerdotisa da caverna, que era adoradora de serpentes, nem se importou com nada. Esqueceu o medo e adentrou bem fundo na caverna. À sua frente rebrilhou um imenso tesouro: com coroas, colares de ouro recobertos de pedras preciosas, braceletes, tiaras, cintos pendentes de esmeraldas, diamantes e rubis, que de tanto brilho e esplendor iluminavam a escura carverna. Loreena de Gwynifel, endoideceu, seu rosto queimava de satisfação, emoção e desejo de riqueza e poder. Pensava:
- Vou deixar de ser essa pobretona. Serei a mulher mais linda e rica de todo o reino. Me casarei com um príncipe, talvez um rei !... Serei poderosa e respeitada. Ninguém vai mais zombar de mim. Porei a ferros todos os que me afrontarem...
Loreena colocava o que podia, em seus grandes bolsos da saia longa, dobrava o avental e o fazia como uma trouxa, retirou sua touca e encheu o que pode, tentou arrastar um pesado baú mas não suportou o seu peso, endoidecia, estava febril ansiosa e descompassada, precisava pegar mais...mais...como fazer isso??
E a voz falou novamente, apanhe tudo o que puder mas, "NÃO ESQUEÇA O PRINCIPAL: A PORTA EM BREVE FECHARÁ"
E a mulher tirou até os calçados, para enchê-los com o tesouro, não satisfeita, foi chutando, jarras e terrinas de ouro e pedrrarias, para fora da caverna, como uma doida ensandecida, completamente tomada pela ganância e a luxúria da fortuna imediata. Despertou dentro de Loreena um monstro adormecido, insaciável de incontrolável desejo de poder.
Diz a voz: - "O TEMPO SE ESGOTOU A PORTA COMEÇARÁ A FECHAR, LEMBRO-TE MAIS UMA VEZ NÃO ESQUEÇAS DO PRINCIPAL"
- Diz Loreena de Gwinyfel: - Que se feche ora! Já saí com meu tesouro. Minha verdadeira fortuna...
E ria e dançava como uma criança grande. Saltitava e pulava.
E a porta como predisse a Sacerdotisa se fechou atrás da mulher com grande estrondo.
A mulher continuava a dançar freneticamente, como possuida de uma loucura. Contaminada por sua fortuna amealhada tão rapidamente e de ter sido ela a privilegiada. Continuava contemplando o tesouro com imensa satisfação.
Aos poucos, aquela febre qua a havia tomado, foi se esvanecendo lentamente e ela cai em si e se pergunta:
- Mas!... Onde esta Cylene minha pequena filha!?? Onde ela está!?
Procura ao seu redor, vira-se para um lado e para outro, gira a cabeça para cá, para lá, inicia uma corrida dando voltas cada vez maiores, entra na orla do bosque...
- Onde está você Cylene. Responda, gritava!!
Já estando tomada de um outro tipo de entorpecimento mental, outro desvario: o maternal. Que lhe apossou mais forte que qualquer outro sentimento anterior, este não era febril, era lívido, esvaia-lhe o sangue das veias e artérias, lhe roubava o ar dos pulmões. Paraliza seus pensamentos, ameaçava tolher seus movimentos como uma paralesia.
Esforça-se para não desfalecer. Não podia. Tinha que encontrar sua única amiguinha e companheira sua Cylene, sua adorada filhinha.
Não a encontrou de forma alguma, nem nos bosques, nem nas matas, nem na aldeia, onde tavez tivesse voltado. Recusava-se a pensar o pior. O inevitável pior de todos os insuperáveis fatos. Retorna ao local.
Sua filhinha havia entrado na caverna com ela, pois num relance tresloucado, de relance a vira com uma estatueta de ouro nas mãos, como se pensasse ser uma boneca talvez. Mas naquele instante, seu transtorno era tanto, que estava fora da realidade e as imagens corriam em vórtice em sua mente, tal a euforia desenfreada que comandava sua vontade.
Entrou em desvairado desespero. Esmurrou a porta da caverna tanto, até sangrar as mãos. Caiu em um choro compulsivo e incontrolável, muito mais que quando os cavaleiros de Sir Ulrick incendiaram sua casa, a aldeia e mataram seu marido. O presente sentimento era muito maior. Se é que se possa fazer algum paralelo entre todas as perdas que se amealham pela vida.
Mediante esse lampejo de visão, em que talvez vira Cylene...
Talvez?... Não. Foi certeza! A sacerdotisa proferiu as palavras, que eu podia apanhar tudo o que quizesse, mas: - 'NÃO ESQUECESSE O PRINCIPAL" - eu vira Cylene com a estatueta - sim, ela ficara trancada na caverna. Não há mais dúvida. Ela era o "PRINCIPAL", para minha vida.
Desesperada em últimas tentativas gritou desesperada a plenos pulmões para que a sacerdotisa tivesse-lhe piedade, para abrir-lhe a porta e liberar sua filhinha. Nenhuma resposta. Nenhum som ou ruído vinha do interior da caverna. Pensou em nunca mais sair da frente daquele amaldiçoado lugar. Morreria alí na espera de que a porta se abrisse.
Nisso, escutou forte tropel de cavalos. Pensou em ajuda chegando. Mas não, algo ruim iria lhe acontecer.
Eram assaltantes de estrada, reunidos em bando, que ao ver o tesouro amontoado à beira do caminho de escarpas pedregosas, apearam, ameaçaram-na de morte.
Rasgaram-lhe as roupas e pegaram todo o tesouro. Até a última pérola existente.
Bateram-lhe na cabeça durante o assalto deixando-a desacordada.
Ao recobrar os sentidos, olhou para os lados da caverna e somente viu uma elevação, coberta de gramas e flores esparsas. Nenhum sinal de que ali tivesse havido qualquer tipo de caverna. Então Loreena teve que admitir sua sina terrível. Havia perdido sua filhinha, para aquela maldita caverna para sempre.
Chorando, com o coração dilacerado e ferida, nada mais lhe restava fazer senão voltar para a aldeia. Foi apanhar seus calçados, pois estando descalça os salteadores não os viram jogados em uma moita de capim. Dentro deles restava um pouco de moedas de ouro e algumas pedrarias, que ela pobre e necessitada logo gastou nos pesados impostos que lhe auferiram por sua ausência e na alimentação muito cara do senhor feudal. Acabou-se logo seu pequeno quinhão.
A fortuna, como todo bem material é passageiro e logo se acaba, mas a tristeza e o desespero da perda de sua filha ficou até os últimos dias de sua vida.