O CÃO COVARDE

Era uma vez um cãozinho que nasceu no inverno.

Ele vinha de uma família de cães de grande porte e seu pai era um caçador nato que não tinha medo de nada.

O cãozinho sempre ouviu do pai que um verdadeiro caçador não podia temer, que um filho dele não poderia ser covarde e que nunca, nunca mesmo, admitiria que um filho desistisse diante de um obstáculo. Ele seria grande, dizia o pai, e poderia pular os obstáculos, ser um herói cheio de coragem, como um dia o seu avô ensinara a ele e ele ensinava ao cãozinho.

O seu primeiro mês de vida se passou tranquilamente, ele brincava com seus seis irmãos, tomava seu leitinho, dormia boa parte do dia... Mas sempre teve medo. Por mais que comesse como todos os outros, o cãozinho cresceu muito pouco e seus pais começaram a se preocupar com a saúde dele. Um pouco depois de fazer dois meses ele começou a sentir umas dores pelo corpo, tossia e tinha febres, mas nunca se queixou. Seu pai não gostaria dele se tivesse medo de uma simples dor, então ele sorria e dizia que estava bem, não deixando a mamãe dele chamar o doutor coruja.

Quando enfim a mamãe conseguiu convencer o cãozinho de se consultar com o doutor, ele não teve boas noticias pra contar. O cãozinho estava fraco e havia pegado uma pneumonia com o frio... Precisaria ficar internado.

O pai do cão, não sabendo lidar com aquilo, acabou saindo numa caça muito maior do que aguentaria. Somente ele e outro caçador foram em busca de um urso e por muitos dias ninguém teve noticias dele.

Enquanto isso o cãozinho lutava no hospital. Passava por exames, tomava remédios, mas não conseguia melhorar. Ele era muito fraquinho e pequeno... Seu corpo estava cedendo a doença. Todos os dias durante a noite, ele chorava com medo do que aconteceria a ele. Chorava quando ninguém poderia ouvir, mas não se deixava entregar... Seu corpo e sua alma já queriam descansar.. Mas ele não poderia abandonar sua mãe sozinha. Tinha de ser o herói e lutar como seu pai.

Passou-se uma semana do dia em que o cãozinho fora internado e chegou um cão todo machucado no setor de emergência. Ele parecia assustado, parecia ter pressa.

A principio ninguém deu ouvidos a ele, ele estava com ferimentos graves e logo o levaram pra fazer os exames necessários.

Quando o doutor coruja foi atendê-lo e viu o sobrenome do cão, olhou-o assustado e tratou-o sem nada dizer. Quando enfim terminou de tratar o doutor olhou-o nos olhos e logo disse:

- Você pode andar?

-Sim doutor...eu preciso...

- Ver seu filho, eu sei. Ele está esperando pelo senhor há mais de uma semana

-Eu sei..eu... Eu não sabia o que fazer... Eu não posso perdê-lo.

- Seu egoísmo é seu maior defeito, cão de caça. Seu filho está lutando há dias, tentando ser forte e corajoso como você. Ele está sofrendo. Ele não precisa agora de um herói, ele precisa do pai dele.

O Cão assentiu. De cabeça baixa foi mancando até o leito do filho. Lá viu o cãozinho, mais magro que da ultima vez que o havia visto, respirando com ajuda de aparelhos. Quando viu o pai, os olhinhos dele brilharam e ele levantou o focinho, pra dar um beijo no cão de caça.

- Papai... Olha mamãe! Ele veio! – ele disse com um sorriso no rosto, mas logo uma crise de tosse o atingiu

-Hey campeão.. é claro que eu vim...

- O que aconteceu, papai? Você estava lutando com o homem mau e ele te deu trabalho pra vencer?

- Não filho – o pai se sentou na beira do leito colocando a pata em cima da patinha do filho – O papai hoje não acabou com o homem mau... Eu sabia que se tentasse, ele acabaria comigo, filho...E eu precisava estar aqui contigo... Por isso eu fugi

-Fugiu? Mas você nunca tem medo, papai!

- Eu tenho, meu filho... E sei que tem horas que não podemos mais suportar... Que nosso corpo não aguenta... Tem horas que precisamos descansar. As vezes o ato de maior coragem é desistir quando já não podemos... – O pai disse aquilo com lágrimas nos olhos.

A mãe se juntou a ele, e o filho enfim sorriu, aliviado...

-Eu estou com medo papai...

-Eu sei meu filho... Mas vai ficar tudo bem... Nós sabemos o quão guerreiro você foi...

-Eu não podia deixar a mamãe sozinha... – ele murmurou e tossiu, logo o pai lambeu o rosto dele, assentindo – Eu amo vocês...

Foi a ultima coisa que eles ouviram do cãozinho... E de fora do quarto o doutor coruja registrou o horário da morte do cãozinho... que esperara dias e dias, lutando contra seu medo, apenas para ter a aprovação do pai... Lutara como um caçador, mas nem sempre levar a caça pra casa quer dizer que você é o mais corajoso do grupo.

Isabella Cunha
Enviado por Isabella Cunha em 01/05/2013
Reeditado em 01/05/2013
Código do texto: T4269240
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