DEUS ESQUECEU DE MIM!
Dona Severina e Dona Maria, eram respectivamente mãe e filha. A primeira com 79 anos e a segunda com 62 anos. Ambas viúvas, tinham vivido um passado conflituoso, mas hoje viviam harmonizadas, encontraram a paz na condição de ovelhas de Deus, como crentes dentro de uma congregação religiosa no subúrbio no qual moravam. Conseguiram reunir as senhoras do Templo para implementarem ações beneméritas em eventos significativos. Neste ano resolveram promover uma Páscoa dinâmica com foco principal nas crianças, mas que levassem a mensagem do Evangelho aos pais que as acompanhavam.
Dessa forma conseguiram um salão amplo que podia acolher com tranquilidade, cerca de 500 pessoas. Foram ainda aos supermercados e mercearias da redondeza em busca de chocolates em forma de ovo para ser doados a cada criança presente. Conseguiram o seu intento com chocolates de todas as marcas e tamanhos.
No dia do evento, após a leitura de um texto do Evangelho, seguido da devida explicação e preleção, e associado ao motivo da Páscoa, chegou o momento da distribuição dos chocolates às crianças. Para organizar essa doação, foram colocados todos os ovos de chocolate sobre uma mesa larga, donde se observava cinco chocolates maiores e entre esses, existia um que era o maior de todos, quase três vezes mais do que aqueles que já eram grandes. Cada criança retirou de uma cestinha, um número de chamada para ir até a mesa e escolher o seu chocolate.
Dona Maria com voz bem cadenciada e firme, explicava:
- Meus filhos, chegou a hora de vocês irem até a mesa e escolherem, cada um, um chocolate. Existe o número exato de crianças e de chocolates. Vocês estão vendo chocolates de todos os tamanhos e entre todos cinco são os maiores, e tem um deles que parece um gigante de tão grande – disse de um jeito matreiro, que provocou riso em todos. Pois bem, continuou dona Maria, vocês podem escolher o chocolate que quiserem, de qualquer marca, cor ou tamanho, mas prestem bem atenção! Vocês devem escolher de acordo com a voz de Deus em seus corações, pois a criança que se comportou melhor e que é mais obediente a Deus, então Ele lhe dirá na sua consciência para pegar um dos maiores. Estamos todos entendidos?
Como todos sinalizavam que tinham entendidos, dona Severina começou a chamada, com sua voz um pouco mais grave e lenta, o que dava mais austeridade ao momento: numero 1... 2... 3..., a criança que havia pego o respectivo número se aproximava ao som das palmas e escolhia o seu chocolate. Parece que eles levaram à sério a orientação, pois venciam a tendência instintiva das crianças pelo egoísmo e escolhiam os chocolates menores.
Finalmente foi chamado o último número, 136, e se aproximou a última criança para pegar o último chocolate que restava sobre a mesa, o maior de todos. Era de se esperar que aquele pequeno negrinho de sete anos, cabelos encarapinhados, de nome Tomé, chegasse radiante para levar o grande prêmio da festa. Mas, surpreendentemente, ele chegava com passos vacilantes e o olhar embaçado por lágrimas. Dona Maria veio em seu auxílio e perguntou o que estava acontecendo. Tomé respondeu:
- É porque não tem o meu chocolate, tia, Deus esqueceu de mim!
- Mas seu chocolate está aí Tomé, é o último, é o seu!, respondeu a promotora da festa com ar de perplexidade. Mas Tomé voltou a contestar:
- Não senhora, este não é o meu. Deus disse em meu coração que eu deveria escolher um chocolate pequeno, pois eu não fui tão obediente com minha mãe.
Foi nesse momento que dona Maria e dona Severina entenderam o dilema de Tomé. Dessa vez foram os olhos de ambas que marejaram por trás dos óculos. Então coube a dona Maria com paciência esclarecer:
- Olha Tomé, este chocolate é seu e vou dizer por quê. Quando fomos à busca da doação dos chocolates, Deus colocou no coração de cada comerciante, quantos chocolates e de qual tamanho era preciso. Quando nós colocamos os chocolates na mesa, cumprindo a vontade de Deus, Ele sabia para quem se destinava cada um. Ele reservou o maior de todos para você e ainda fez um teste de honestidade do qual você foi aprovado de forma maravilhosa. Você seguiu a voz dEle dentro do seu coração, mesmo pensando que Ele havia esquecido você. Bendito sejas, Tomé, pois sabes reconhecer a voz de Deus e tens coragem para a cumprir. Vai meu filho, leva o chocolate que ele é seu!
Os olhos de Tomé brilhavam agora de felicidade, quando pegou o chocolate com as duas mãos e voltou para perto dos pais com um largo sorriso nos lábios, não tanto por ter ganhado um belo chocolate, mas porque não fora esquecido por Deus.
A maioria dos presentes agora era quem tinha lágrimas nos olhos e a grande lição ficou, não só para o pequeno Tomé e seus amiguinhos, mas principalmente a todos os adultos, cujos corações endurecidos pela luta da sobrevivência deixaram de ouvir a voz de Deus.