Cadê o Barato?

E assim o telefone desligou. Não sabem do Barato! Como não sabem?, indagou o pai, a mãe, porem, deu de ombros e não reiterou ou ratificou o próximo período verbalizado pelo conjugue, ele saiu com seus amigos, todos juntos. Apesar, não sabiam mesmo dele. A dona Barata olhou pela janela – se a esperança é realmente a última que morre é também a que mata as mães, ao menos das baratas: nada viu; minto: viu muitos iguais ao Barato; nem tão iguais, estavam, ainda, felizes e, de um lado para o outro, tontos de folia. O avô, que dissera antes do perigo desses carnavais, ele sim, reiterou: Ah!, não são nestes tempos como em sua essência! Não que na essência tínhamos um lugar melhor que o bueiro, mas ainda tínhamos cada qual o seu esgoto e suas particularidades. Não fora um brado retumbante; mas, dito isto, puseram-se todos à busca de Barato. Já tentaste, leitor, achar a tal agulha do palheiro? Pois é mais fácil, que nesse caso: a agulha fica parada, difere-se da massa que a cobre; Barato, entretanto, pode estar entre a massa cujo ele faz parte, e diferente da agulha, não dá pra meter a mão no meio dessa massa de qualquer forma: o perigo que encontra-se no palheiro é do espetar de uma única agulha; o que seria motivo de alegria – cessa-se a busca. Essa massa de foliões é de muitos baratos loucos e afiados, assim como o perdido – senão estão todos já perdidos. Mas, a procura iniciou-se – e se duas cabeça pensam melhor que uma; um bloco de foliões pensa menos que uma solitária barata de esgoto.

E a voz que destoou da marchinha: “Você viu um baratinho, assim, desse tamanho, com asinhas como as suas e anteninhas também como as suas, ele anda abaixadinho como aquele baratinho ali e, vez ou outra, voa meio tonto até a luz?” Quase, porem, lançou-se nova marchinha – aliás, tudo pode virar uma marchinha nesses tempos carnavalescos - a pergunta era fielmente, como tudo naquele bloco – e em todos os demais – reproduzida, barata a barata; a barato e baratos; bloco a bloco. Ninguém sabia, entretanto, quem era o Barato. Todavia, talvez, tivessem o visto: pela descrição que tiveram e pela situação que se encontravam; mas, era tão parecido com a massa. E se procurássemos nos hospitais? O avô ainda tinha os costumes dos perdidos de seu tempo. Sabe-se, porem, que lá não devamos ir, se vistos, será perigosíssimo. Sim, concordou o avô com o pai de Barato, mas o que não vale no carnaval, não é? Ele é jovem, tem espírito folião, o avô retorquiu, e pode estar por lá – o barato do hospital são todas as drogas que são servidas. Vamos, então, mas que não esteja: senão já sabe, por lá precisará ficar. Ó, Pai! Sabemos que já nos ensinou: Permita que seu filho se junte com os porcos, pai, que farelo ha de comer.

Segue o enredo: “Você viu um baratinho, assim, desse tamanho, com asinhas como as suas e anteninhas também como as suas, ele anda abaixadinho como aquele baratinho ali e, vez ou outra, voa meio tonto até a luz?” Não (!), acho que não (!); talvez, sim (!). Não é ele, ali? Não, não é. É parecido como esse! - Oh!, mãe desesperada. E agora, onde estarás Barato? Pois, quando o encontrar, dar-lhe-ei uma surra! Sim. Por que não pode ser de tamanha irresponsabilidade, não? Toda brincadeira limita-se no real. E quem afirma que tem-se brincadeira na folia? A realidade tem fronteiras? Talvez, não a mesma para todos, nem a todos os momentos. E segue-se à procura por aquele que na massa foi visto pela última vez. E a procura é dificílima: por cima de suas cascas, os foliões vestem abadás idênticos, pulam, gritam, dançam, se divertem uns como os outros. A sincronia é linda, de se ver. Imaginem uma passeata contra a corrupção com todo esse empenho e essa colaboração – Ah!, senhores feudais da planície central desta colônia tropical, cuidado que tudo isso pode um dia ser um ensaio – enquanto não passamos de gomas de mascar, e com orgulho bradado por milhões de foliões, seguimos a procura do Barato deste carnaval. E nisso tudo parecem, até mesmo, que brincam de boca de forno: pois, tem-se aquele que dita a regra em cima do grande palco, embutido por potentes caixas de som capazes de fazer-se entender a todos as ordens – sabe-se que quando crianças a brincadeira deixa aos pequenos cansados e expõe por vezes a perigosos desejos e devaneios do chefe, e podem exigir mais que diversão dos pequeno e inocentes vassalos.

Refrão: “Você viu um baratinho, assim, desse tamanho, com asinhas como as suas e anteninhas também como as suas, ele anda abaixadinho como aquele baratinho ali e, vez ou outra, voa meio tonto até a luz?” Não; sim; não, não, não se desespere! (pode-se estar mais perto da agulha que pensa). Ih!, como esta cheio isso aqui. Fez que não ouvisse o pai quando entraram no pronto-socorro. Mas, como avô sábio que se denominou do papel, disse:

_E esses foliões esquecem o barato da coisa. Fica agora esse monte de baratas tontas! Esse é o barato? Achou?, logo interrogou-o o pai, girando, girando os olhos e as antenas. Não, reponde impacientemente o patriarca, foi uma pergunta retórica e utilizei de uma figura de linguagem. Voltemos, leitores, à massa, à folia, à caçada da mãe.

_Ah!, estou tonta já. Não mais aguento procurar por esse inferno o meu filho. Antes mesmo de fechar a boca da consciência abriu a boca que lambuzava o melado:

_Mãe? E o menino não estava mal, tão pouco estava bem: estava mastigado, já sem açúcar e cuspido – é, pois, o destino do chiclete. Já para casa!, sem mais nem menos, por este grito carnavalesco, foi puxado pela antena - aquela que cada quão que sintonize-se no devido canal; mas que é verídico que os canais abertos nos é mais acessível e nos oferecem os sinais da massa não pode-se negar – isso é fato global. Não quis saber qual/quem era o Barato louco, como chamavam os companheiros pelo trajeto que fazia guiado pelo nó de sua antena a pata de sua mãe - e pode-se parecer pedagógico em demasia, mas foi muito mais ágil o voltar para casa sob a orientação materna. A esperança não morreu nem matou; saiu de cena e entrou aquela que já pedia a voz da coxia. A raiva, pois, é um sentimento de excesso de razão. Se bem trabalhado, age mais profundamente que qualquer conselho fraternal se não... Não quis saber onde estavam aquelas baratas tontas que saíram também à procura do Barato – não que não as importassem, mas já estavam calejadas de sandálias, pisões e drogas que derrubam os pequenos insetos com jatos aerossóis. Em casa, apenas rasgou a segunda folha do calendário e disse, já é hora de começar o dever de casa. Quando sairá no bloco dos organizados, menino?

Ah!, você apareceu, não é? O avô sempre preteriu essas perguntas retóricas, mas convenhamos que sejam as melhores armas duma discussão entre cúmplices, não do mesmo ato criminal: são do mesmo mel que lambuzaram. O que te tem na cabeça, moleque? Tenho o que todos têm. Ó sociedade alternativa que não convence: E todas as brigas por diversidade e originalidade? Só valem por noves meses? O filho que carregam durante o ano é abortado na folia ou para a folia? Foi só mais uma pergunta retórica para encerrar o assunto em mais uma casa de cidadãos de uma sociedade que luta por seu direito de março a dezembro; mas, como todo trabalhador, precisa de férias.

Rodrigo Davel, 18 de fevereiro de 2012

Davel
Enviado por Davel em 26/02/2012
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