O CONTO DO GRANDE NADA
Na cidade perdida do Grande Nada havia uma represa feita pelos Velhos Homens sem Coração. Sua construção custou a Floresta Imaginária e todas as Árvores do Espírito Criativo foram arrancadas e atadas uma à outra por Cordas de Enganação e Ilusão. Represou-se o Mar da Alma e todos os seus afluentes, tanto aqueles que desaguavam no Rio da Felicidade (diga-se de passagem: tenros filetes da Água Pura do Amor) quanto as inumeráveis torrentes da Tristeza e da Solidão. Os homens sem coração, ao terminarem a obra, revelaram grande satisfação e foram anunciar ao povo de todo Grande Nada que os rios instáveis tinham sido dominados. Festejaram durante 21 anos naquele povoado sem Tempo, bebendo vinhos de Ignorância e comendo tortas de Disfarce. A Tempestade viera e dos céus gotas inflamáveis de Ódio e Desprezo encheram o rio e as cordas que seguravam a represa partiram-se. Houve uma inundação que matou quase todos os homens sem coração. Os rios furiosos varreram tudo. Restou tão somente uma pequena ilha batizada de Nadinha onde brotou a Flor Negra do Desespero que tem o perfume da Agonia e cujas pétalas formam um Punho Fechado. Os viajantes que passam pelo caminho do Solitário vindo dos Bosques da Falsidade podem contemplar a placa que Ninguém, único sobrevivente, entalhou na Pedra do Esquecimento: Vazio do Grande Nada.
(Do Livro “Suicídico”)
Diego Duarte,
Poeta solitário