O construtor de muros
Na verdade, ele não era construtor de muros, mas de casas. Construiu casas inteiras, quando trabalhou sozinho, mas construiu, também, só algumas peças, quando trabalhou em equipe.
Só havia algo que ele nunca construiu, nem uma única vez em toda a sua vida: Muros.
Casas inteiras, sim. Quartos, salas, banheiros, calçadas, sim. Mas muros, não! Nem um sequer!
Por uma ironia da vida, o primeiro muro que ele construiu foi justamente em sua própria casa. Sua família e a de seu vizinho foram as primeiras a se mudar para aquele bairro e, por alguns anos, os seus poucos moradores. Eram mais que vizinhos; tornaram-se amigos.
Almoçavam juntos, pescavam bastante e se tinham em grande estima, irmãos. Não havia muro entre as suas casas e as crianças brincavam livremente nos dois quintais e nos campos ao redor. Que época boa! Porém, devido a uma discussão boba, ele decidiu que era hora de ter um pouco de privacidade e levantou um enorme muro, separando as propriedades.
Agora, cada vez que olhava para aquela parede fria, tentava se convencer que tinha sido melhor assim, mas, no fundo, jamais se acostumou com a nova "paisagem". Tinha saudades, mas as coisas nunca mais voltaram a ser como antes.
Anos depois, seu filho mais velho se casou e construiu uma casa nos fundos. No começo foi tudo bem, mas um dia ele brigou com a sua nora e, mais uma vez, decidiu construir um muro, bem no meio do quintal, separando as duas moradias, "só para evitar novas brigas".
Por fim, acabou brigando feio com a sua esposa e resolveu se separar, mas, como não tinha onde morar, começou a dividir o seu próprio lar, "em partes iguais". Foi então que uma terrível solidão invadiu a sua alma. E ele caiu de cama.
A esposa cuidou da sua saúde com tanto amor que as barreiras entre os dois logo se dissiparam. Ele estava tão fraco que não conseguiu retirar as divisórias que havia começado a colocar dentro de casa; teve que pagar alguém para fazer o serviço. Voltaram a ser um casal, mas o homem não sarou.
Incentivado pela esposa, pediu que a nora viesse visitá-lo e desculpou-se com a moça. Mandou que derrubassem aquele muro que a mantinha à distância. Voltaram a ser uma família unida. Sua saúde melhorou um pouco, mas ele ainda continuava muito doente.
Então, num grande esforço, com a ajuda da esposa, do filho e da nora, ele colocou uma escada sobre o primeiro muro que havia construído em sua vida, chamou seu vizinho, pediu-lhe perdão e, ambos, com a voz embargada de emoção, resolveram derrubar aquela muralha e, em seu lugar, plantar uma cerca-viva bem baixinha, para que eles e seus netos pudessem transitar e brincar livremente, como os seus filhos faziam no passado.
Quando todos os muros foram derrubados, o homem saiu da cama e voltou a viver.