A ANTA NA POLÍTICA...
Era uma vez, na floresta, a bicharada andava exaltada, para não dizer “ouriçada”, com os acontecimentos que se sucediam. Era tanta rapinagem, violação aos códigos da boa convivência e, o Homem, cada vez mais impiedoso, avançava mata adentro fazendo estragos contundentes, as árvores estavam desaparecendo, os rios poluídos, cujas águas já não serviam para matar a sede, estavam secando, inapelavelmente. Era preciso fazer alguma coisa...
Assim pensavam os bichos mais inteligentes, dos quais, o Macaco. Porém, muitos eram ignorantes, bisonhos na inteligência, entre eles, a Anta.
Por sugestão do Macaco, foi marcada uma assembléia para deliberar sobre as providências a ser tomadas. Avisos da grande reunião foram espalhados em todos os quadrantes da floresta, dizendo da necessidade do estabelecimento de trégua total e absoluta na rapinagem, na matança indiscriminada; falava da necessidade da união ou todos morreriam.Nutria-se grande expectativa quanto ao que fazer para melhorar a vida na mata.
No dia aprazado, o comparecimento foi maciço. Até aqueles animais que viviam na água, como o hipopótamo, vieram dar uma espiada. O alvoroço era grande...
Todavia, era preciso colocar ordem nos trabalhos e, de imediato, o tigre tomou a dianteira e propôs que o macaco assumisse a direção dos trabalhos. Houve aceitação geral.
Então, o Macaco sacou de um imenso discurso que relacionava, item por item, a situação da floresta. Falou e comentou com ênfase e, complementou dizendo: “Um povo sem direção, uma nação largada ao léu da vida, está condenada a desaparecer junto com seus habitantes”, e propôs: “Vamos nos organizar, vamos eleger uma junta diretora, um corpo diplomático, enfim, os homens não têm presidentes? Ora, também podemos ter...”
E foi ovacionado pela multidão. Alguém gritou no meio dos bichos: “Eleição direta já!...”
Uma velha Macaca pediu a palavra e disse:
“Que realizemos a eleição direta, porém, vamos estabelecer as chapas, vamos dar tempo aos concorrentes para apresentarem planos de governo, vamos ser democráticos...”
A Onça então, aparteou, dizendo:
“Eu sou candidata, quero ser 'presidenta' da floresta...”.
Naquele momento surgiram vários nomes interessados, para presidente e vice. Três chapas foram montadas. O Macaco e a Raposa, candidatos a presidente e vice, numa delas. Na outra, a Onça e o Lobo guará. A Anta e o Javali, na terceira.
A partir do dia seguinte começariam os comícios, cuja realização se estenderia pelos próximos trinta dias.
Iniciada a campanha, no primeiro comício, já dava para perceber o nível cultural dos candidatos, em razão das barbaridades que eram ditas...
Num dos discursos inflamados, a Onça ao se referir à sua capacidade para administrar a floresta e querendo dizer que tinha memória fotográfica, afirmou: “Eu, além de tudo, tenho memória fotogênica!”.
A Anta, ao falar quanto aos dois candidatos que a haviam precedido no comício, disse:
“Ambos os dois candidatos que falaram...”. E, no meio do discurso, expressou-se assim: “Aliás, retipico, ao invés de retifico...”
Eram tamanhas as barbaridades ditas, que a turma dos bichos inteligentes se partia de tanto rir...
Entretanto, com o passar dos dias, os comícios foram se esvaziando... O 'público 'estava cansado de ouvir tantas besteiras. Promessas que não seriam cumpridas.
Certa feita, numa tarde, desabou violento temporal, que derrubou o “palanque” onde se realizaria o comício. Então, improvisaram um enorme tronco de velha árvore que havia nas imediações, para substituí-lo.
Após a fala do Macaco e da Raposa, a seguir, um a um, os bichos foram se mandando e, quando da fala da Anta, um único bicho estava na platéia. Um Lobo cinzento ali se encontrava e parecia nem estar ouvindo o discurso...
Mas a Anta dizia, toda séria, olhando para ele:
“Nunca na história desta floresta, se viu alguém tão interessado na solução da problemática dos bichos. Todos foram embora, só você ficou”. “Você é Companheiro!...” O Lobo respondeu:
“Não tô nem aí pra política, com o que vai acontecer com a floresta e com a bicharada! Só tô esperando o tronco da árvore que é minha toca...”.
Assim, chegou o dia da eleição. Desde cedo, grande agitação na mata. A movimentação era grande. O dia foi passando e, à tarde, após encerrado o pleito, começaram a contagem dos votos. De início o Macaco assumiu a dianteira, com imensa vantagem para os outros competidores. Mas, havia uma estranheza geral. Até então, não havia aparecido nenhum voto para a Anta, a equipe da apuração estava preocupada. Afinal, ao menos o voto dela e de seu companheiro de chapa teria que aparecer.
A apuração terminou e, no meio das cédulas eleitorais dos votos anulados, estava um voto que todos achavam que era da Anta, no qual estava escrito:
“Voto em mim...”
Nem o seu companheiro de chapa votou nela...
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Voltando à realidade dos homens, parece incrível, mas tivemos nas últimas eleições, em São Paulo, certa “candidata” que não teve nenhum voto, nem do marido e dos parentes. Deve ser a Anta na política.
Vá entender...