Peleja da Prosa com verso (Ojuarismo)
A prosa, triste, cobrou ao poeta:
- Você se apaixonou pelo verso, principalmente o cordel, e esqueceu de mim.
Vive hoje amordaçado por rígidas regras de métrica, rima e oração. Perdeu sua espontânea liberdade.
É triste vê-lo debruçado, por longas horas, revisando arcaicas regras gramaticais, com nome impronunciáveis, quando eu lhe dou toda liberdade de escrever o que lhe der na telha.
Reflexivo, o poeta tentou justificar sua sede por novos saberes e dizeres. Defendeu o lirismo do verso, falou dos poetas clássicos, da beleza do cordel, das trovas, sonetos, sua melodia e até alcance popular. Mas também exaltou a prosa, os novos e vanguardista poetas. Argumentou sobre a necessidade de revisitar o antigo, para tentar, quem sabe, inaugurar um novo estilo.
O verso, bem incomodado com o rumo da prosa, versejou:
Prosa eu muito te respeito
Nunca te desacatei
Tenho estilo diferente
Eu nunca quis ser o rei
Não aceito desacato
Poetas não amarrei
O poeta é sempre livre
Para seguir seu caminho
E fazer suas escolhas
Escrever belo versinho
Ou prosa, se ele quiser
Recolha então seu espinho
Com triste manto da inveja
O ciúme lhe cegou
Eu só lhe peço respeito
O verso bem ponderou
Mas a prosa reflexiva
Ainda argumentou.
Verso, serei curta e grossa. O seu tempo já passou. Em vinte e dois, se inaugurou nova era. Desde então ninguém tem mais saco ou quer ficar folheando esses livretinhos, com infindáveis estrofes de estética duvidosa. Aceite que dói menos. Os tempos são outros, o mundo se virtualizou, viajamos nas nuvens.
O poeta pressentindo, que a peleja estava tomando um rumo perigoso, tentou interferir:
- Calma, calma meus amores, deixem-me falar.
A poesia está em tudo e pode bem se expressar, tanto em verso como em prosa e até no se calar. Tem poesia na música, na dança, nas artes plásticas, no afago de uma mãe, num beijo apaixonado, no sorriso de uma criança e no seu choro também. É só uma questão de sensibilidade e também de respeito pelas diferenças e pelo gosto do leitor. É ele quem manda e define suas preferências. Tem uns que gostam mais da prosa. Já outros, mais dos versos e também os que, como eu, gostam do verso e da prosa. E conclui prosaico:
- O que seria do vermelho, se todos gostassem só do verde e do amarelo.
Diante de tal argumento, prosa e verso entreolharam-se, ainda com certa desconfiança. Mas, aparentemente, aceitaram os argumentos do poeta. Porém, ainda assim, ponderou o verso magoado:
Tu falaste em 22
Foi um tempo complicado
O verso penou bastante
Parecia estava acabado
Mas não morreu meu irmão
Foi apenas golpeado
Leitores sempre terão
Para todo gosto e estilo
Logo o que hoje chama novo
Eu te digo bem tranquilo
Amanhã será bem velho
Vamos botar num asilo?
O verso foi eloquente e tocou fundo a prosa. Que diante do que ouviu disse envergonhada:
- Seu argumento me convenceu e peço desculpas pela minha arrogância. Que seja então o poeta livre, para se expressar como quiser, afinal, mais importante que a forma, é na verdade o conteúdo e como a mensagem toca o coração e a mente do leitor.
Nesse instante, no rosto do poeta, uma lágrima rolou. Ver seus dois amores em harmonia, encheu seu peito de júbilo. Pensei em falar alegria, mas rimando poderia reacender essa insensata disputa literária.
O verso satisfeito, com desfecho da peleja, poetisou satisfeito:
A poesia é bem maior
Quando se busca harmonia
Quem quer ser superior
Persegue só fantasia
Sufoca arte de verdade
Afugenta a maestria
A prosa finalizou, depois de um longo abraço no verso:
Arrogância na poesia, apequena o poeta. A limitação de estilos, pode lhe transformar num especialista engessado. Melhor é viajar livre. Criar o próprio estilo ou tentar ser bom no que quiser ser.
Obs: Minha insana tentativa de criar uma forma mesclada de poetisar sem amarras.