De volta ao Nordeste
Padre padim Padre Cícero
Eu vim aqui lhe pedir
Para alumiar meu caminho
Por onde eu possa seguir.
Minha mulher foi embora,
O fio me abandonou,
O meu cavalo morreu
E o meu dinheiro acabou.
Só me restou
A viola
Que inté às cordas
Quebrou.
Tu que é tão milagreiro
Tem dó desse beradeiro
Que inté a vida
Arruinou.
Eu não posso falar nada
Porque também fui feliz
Tinha uma mulher bonita
Um filho, um cavalo e uma viola afinada.
Nas festas de vaquejada
Onde eu tocava e cantava
O povo batia as palmas
Era uma festa sem fim.
Hoje só resta a saudade
Te peço por caridade
Que tenha pena de mim.
Sem dinheiro e sem emprego
E sem ter o que comer
Resolvi vir para Brasília
Tentando sobreviver.
Não consegui o emprego
No Governo ou no Senado.
Não consegui ser amigo
De um nobre deputado
Nem do homem do PT.
Graças a Deus
Que eu não fui
Senão tava lascado
Na operação Lava Jato
Eu já tava condenado.
Pensando em sobreviver
Resolvi vir pra Juazeiro
Pra fazer santo e vender.
Mas o santo era de barro
O padre não quis benzer
E sem benzer
Não vale nada.
Ainda me olhou zangado
Com os olhos arregalados
Cabra, você não sabe
Que vender santo é pecado
Pela lei da santa igreja
Tu pode ser condenado.
Eu não devia, mas vou te ajudar
Tu sobe aqui rua arriba
Quando chegar acolá
Tem uma porteira bem grande
E lá tu vai se arranjar.
Lá dá almoço, dá janta
Dá café da manhã
Eu perguntei: Onde é isso?
É na fazenda Duas Irmãs
Na lavoura de café
E tem regra, visse!
Tem que carpir 85
E eu fui lá só carpi 14 pé.
O feitor olhou pra mim
E disse: Eita cabra ruim
Não pagou nem o café.
Resolvi subir a serra do Araripe
Pra catar coco e piqui
Cheguei na serra, menino
Tinha uma fartura danada.
Tinha coco, macaúba, uva,
Pitanga e mangaba.
Acerola e açaí
Fruta-pão e abacaxi
Siriguela e goiaba
Laranja, lima, limão
Imbucajá e piqui
Enchi o bucho
E um saco.
Botei nas costas e desci
Mas na descida da serra
Escorreguei e caí.
Tudo que eu tinha no saco
Rolou de ladeira abaixo
Tudo que eu tinha
Eu perdi.
A minha avó me contava
Uma história engraçada
Que os cabras de lampião
Quando aqui chegava
Por ordem do meu padim
Até às armas guardavam.
A polícia via tudo
Não podia falar nada
Aqui quem manda é o padre
Todo mundo respeitava.
Padre Cícero um homem bom
Todo mundo ele ajudou
Foi prefeito de cidade
Que ele mesmo fundou.
Durante a missa das seis
Dava café, dava pão
Tudo por conta da prefeitura.
Inté Maria Bonita
A mulher do lampião
Com ele se confessou.
Quando a missa terminava
Ele e o beato Zé Bento
Se montava num jumento
Ia lá no acampamento
Para o bando abençoar.
Meu padim Frei Damião
Se tu também fizer assim
Como fez o meu padim
Tu também vai virar santo
E vai poder me ajudar.
Franchá Charuto