ritornello
ritornello I (2009)
por onde andará ela? o que seus passos,
pisando a luz da lua,
por onde andará ela? o que seus traços,
mostrando a face nua,
farão neste momento? a quem sorrisos
seus lábios se abrirão,
nesta manhã de vento? a quem os guizos
alegres soarão...
com quem andará ela? no que fala,
nesta manhã de sono,
com quem andará ela? com que gala,
se vestirá de outono,
neste momento agora? em que pensará ela,
acaso me recorda,
neste momento agora? qual emoção singela
seu coração transborda,
voltado para mim? ou nem sequer suspiro
ela me envia ao vento,
lançado para mim? que nem respiro,
sem tê-la ao pensamento,
que rosto afaga? para quem nos braços
ela hoje se entrega,
e que memória apaga? porque tantos laços
rompeu nessa refrega,
quantos busquei reatar? nessa ilusão
de poder sua presença
a meu lado reter? e, enfim, ao coração,
mentir, só por descrença.
ritornello II
onde se encontra agora? quais são hoje os desejos
de minha meiga aurora?
onde se encontra agora? a quem suaves beijos
reparte nesta hora?
sobre que mar navega? a minha antiga estrela
a quem ora se entrega?
sobre que mar navega? qual juramento a bela
para o futuro lega?
terá outra paixão? qual rosto ela percorre
com os dedos de sua mão?
terá vaga emoção? por qual peito hoje escorre
o bater do coração?
a quem hoje ela afaga? em qual corpo flutua,
igual que mansa vaga?
a quem hoje ela afaga? com quem se encontra nua,
a troco de qual paga?
será que ainda recorda? só num piscar de olhos,
na hora em que se acorda,
o que viveu comigo? se para essa lembrança
ainda tem suspiro...?
terão qualquer valor, no fundo da memória,
os meus desejos vãos?
com quem ela concorda? ou, usando seus antolhos,
a ninguém mais aborda?
ai, tempo do perigo! de antanho sua esquivança,
em que meus sonhos giro...
e eu tinha tanto amor... na palidez inglória
do toque de suas mãos!...
ritornello III
aonde alfim irá? a que amplos lugares
seus passos seguirão?
o que ali achará? quais já profundos traços
lhe mostrará o espelho?
feliz se sentirá? e no final, quais braços
terão seu corpo velho...?
será que é rejeitada? quais constantes azares
seus olhos chorarão?
queria feliz fosse... por mais me abandonasse
os meus desejos são.
saber que está contente... alegraria minhalma
das penas que me dão
as ausências que trouxe... um certo grau de calma
teria no meu peito,
sabendo-a feliz... quem sabe me alegrasse
a morte do despeito.
mas que dúvidas tenho! será que teve filhos
e netos que a acalentem?
não sei do seu porvir... terá prosperidade
nesse lugar que more...?
teria morte tranquila? seus olhos a aguardar
por um lugar melhor?
ou sofreu atroz doença... já no final dos trilhos
de dores que a frequentem?
só sei de mim agora... com equanimidade
que ainda se demore
meu pensamento nela... no mais tolo esperar
do retornar do amor.