Venenos
Não espero mais,
as batidas dela, na porta
pouco antes de amanhecer,
desde que parou de fazer sentido esperar.
Às vezes acho que estamos mortos
um para o outro.
Às vezes acordo e penso nela
no meio da madrugada,
depois de algum sonho incompreensível.
No entanto, não larguei meus antigos hábitos
e a cerveja
ou as noites que passam arrastadas
de melancolia
e fumaça,
encarando a tela do computador
em busca das minhas palavras.
Ah. Sinto mais falta das palavras do que dela
mas continuo na busca
que é o que me parece a única coisa útil
e digna
que eu poderia estar fazendo
com o meu tempo.
ainda assim já sinto o peso da derrota
se acumulando nos meus ombros
e endurecendo os meus dedos.
Não há mais paixão
para que eu me jogue no papel
Não há o tesão,
nem as noites em que eu passava mergulhado dentro dela
entre gemidos
e suspiros
em que ela me arrastava
e me puxava sempre mais para perto,
mais para dentro
como se ela precisasse me absorver
e me dissolver dentro de si mesma,
para depois me jogar para fora
como fumaça
depois da transa.
Talvez fosse um vício,
talvez fosse uma doença
o que me afetava,
de forma que quando eu não estava em sua cama,
estava escrevendo alguma coisa sobre ela.
ou simplesmente pensando,
e me perguntando
se ela me amava,
além da carne.
É uma pena que certas mentiras tenham um potencial tão grande
de encantar.
Talvez a ignorância seja o maior dos afrodisíacos...
mas enfim,
a verdade pode ser um remédio
amargo de se tomar,
e algumas paixões são venenos
que adoçam a boca
antes de matar.