O julgamento do escritor

Ao que se percebe é questão recorrente entre novos escritores e entre aqueles que retomam a escrita após uma pausa, o tema do porquê da escrita. Para amadores e profissionais a escrita é algo que se lhes força, impulsiona, anima: é quase impossível não escrever.

Devo confessar que os invejo. Para mim é o contrário. É difícil escrever. Exige uma força de vontade que muitas vezes não tenho. E não é porque eu não goste de escrever, de meditar sobre assuntos relevantes ou de compartilhar ideias.

Posterguei a decisão de escrever enquanto tentava convencer a mim mesmo de que o motivo dessa procrastinação era o fato de eu não ser culto ou de não ter tempo e que era isso que dificultava a minha escrita. Na verdade, não era nada disso. Não escrevi até agora porque um escritor precisa ser um corajoso e, cheguei à conclusão, sou um covarde.

Aquele que fala, seja para uma pessoa, seja para uma plateia, embora se sujeite sempre a um julgamento, além de estar se direcionando a um público próximo a seu mundo ideológico, consegue sentir de imediato a resposta desse público, podendo orientar sua linha de raciocínio de forma que possa ser melhor compreendido. Seu corpo fala. Seu tom de voz fala. Igual oportunidade não tem o escritor e, por isso, devo reconhecer que seu desafio de transmitir seu mundo intelectual é ainda superior ao daquele que fala. Sem poder usar o tom de voz ou a postura, tendo apenas a palavra como meio, o escritor é aquele que expõe as entranhas de seus pensamentos ao julgamento público, colocando-se no banco de réus da corte social. Juízes de todas as espécies, justos e injustos, imparciais ou não, darão seu veredito acerca daquilo que se escreve. Alguns desses juízes entenderão a essência do argumento utilizado, outros – autodeclarados porta-vozes de uma verdade imutável – poderão distorcer por completo seu conteúdo e condenar aquele que a eles se submete, outros, ainda, utilizarão esse conteúdo dando-lhes uma interpretação conforme bem lhes convier, inclusive, para fundamentar ideologias dos quais o escritor não é adepto.

É esse medo de ser julgado que me trava. É esse medo de ser usado que me empalidece. É esse medo de ser distorcido que me amedronta. Entretanto, espero sinceramente que essa minha primeira tentativa de ludibriar minha covardia, seja um verdadeiro vestíbulo para o átrio dos corajosos.