ASSUMINDO-SE COMO EQUIPE

Éramos sete e fomos convocados para uma missão. Cada um de nós recebeu uma maleta que deveríamos abrir no momento oportuno. Uma complementaria a outra, em especial a de número sete que ficou com o Antônio Viana que assumimos ser o líder do grupo.

Saímos da sala da chefia e fomos ao vestiário nos prepararmos para realizar a missão a nós confiada. Um cartão com notas preliminares nos instruía que deveríamos vestir uniformes de combate e seguir para o hangar da firma, no Aeroporto Internacional de Onirópolis (ONR), pois teríamos uma missão especial em Boa Vista – RR e que, no momento apropriado, deveríamos abrir nossas maletas e seguir suas instruções.

Chegamos ao hangar às 22:00 em ponto, com meia hora de antecedência. Em nossas mentes, um turbilhão de pensamentos, tentando entender o que estaríamos a fazer nessa misteriosa aventura. Viana, René, Calixto, Luís Antônio, Fernando, Alex e eu, tagarelávamos mais que um bando de jandaias discutindo com periquitos diante de uma saca de sementes de girassol. Um Boeing 777 nos aguardava, pronto para ser conduzido à cabeceira da pista e decolar rumo a Boa Vista (BVB). A Equipe X, profundamente empolgada, adentra a bordo da aeronave.

Vapores se derramam pelas saídas de ar-condicionado acima de cada poltrona, proporcionando amena temperatura interior. Um cheirinho agradável emana do interior do avião, dando sinal de perfeita higienização. Procuramos pela tripulação e, como ninguém encontramos, deduzimos que seríamos a própria “crew”, ou seja, a equipe técnica que iria conduzir o possante 777.

Nosso líder, agora autodenominado Comandante Viana, vai à carlinga da nave e toma o lugar do piloto. Convoca Fernando para assumir o posto co-piloto.

_ Você já pilotou um 777, Nando?

_ Já, mas num simulador de voo e nunca derrubei um, mas fiz homéricas decolagens e pousos dignos de pódios.

_ Eu também! Meu simulador é de primeiríssima geração e nele, não há igual para mim.

Assim, após todos tomarem seus assentos, Viana conduz o gigantesco pássaro de aço na cabeceira da pista e, mesmo sem pedir autorização para a decolagem e nem mesmo pôr os "headsets" para intercomunicação com a Torre de Comando, dá força total nas turbinas e em poucos instantes, nosso avião surfa num invisível e compacto colchão de ar que se forma na pista, numa ascendente largada sem rumo ao espaço que singrávamos com adrenalina em alta. Por questão de segundos, um avião que pousava naquele momento, não se chocou com o nosso.

_ Qual a proa que seguiremos, meu comandante?

_ Sei não. Confere aí na carta de navegação!

_ Que carta, Comandante? Não há plano de voo aqui.

_ O quê? Não é possível! Estava certo de que você a pegaria antes de embarcarmos.

_ Comandante Viana! Isso é o que deveríamos ter feito antes de irmos ao hangar, na sala dos pilotos.

_ Puxa, cara! Que mancada! E como passaria por lá, se nem sabíamos que pilotaríamos esta máquina? Agora, lascou-se!

_ Só tem um jeito. Põe Boa Vista aí, no GPS e vamos seguir fielmente o seu traçado. Certamente, chegaremos lá. Qual é o código mesmo? "Cha" ver ... Ah... certo! BVB.

_ Pronto, BVB! Piloto automático ativado. Relaxando ... Enquanto você preenche o seu Sudoku, eu vou resolvendo aqui o meu Words With Friends.

E lá fomos nós, flutuando ao sabor dos ventos, uma ou outra correção da rota, ao sobrevoarmos os rádios-faróis. Um céu de brigadeiro. Não sei por que cargas d’água, o avião emproou em direção a Belém do Pará. De repente, caímos sem controle algum até mergulharmos nas águas da Baía de Guajará, como uma gaivota a pegar um peixe para emergir adiante, em seguida. Tentamos arremeter e pegar altitude, mas o winglet direito ficou avariado quando se chocou nas águas e tivemos que fazer um pouso de emergência numa praia deserta, logo adiante. Acionamos as rampas infláveis e deslizamos até tocarmos na areia úmida e gelada da praia deserta. Num instante, a praia ficou apinhada de curiosos, como um formigueiro assanhado.

A madrugada começava lenta e calma. Uma aragem gelada soprava em nossa direção. Examinamo-nos uns aos outros. Nada de arranhão ou hematoma. Acabamos de presenciar um grande milagre e nem poderíamos duvidar. Nós éramos os protagonistas. Incrível! O localizador do celular indicava que estávamos numa praia da orla da sede do município de Pesadélia. Por estranha coincidência, nosso pesadelo começou justamente quando pusemos os pés nessa fatídica cidade. Será o Destinêncio?

Mais que depressa, passamos a avaliar os danos na aeronave, causados pelo sinistro. Por incrível que pareça, apenas alguns arranhões superficiais na fuselagem e a perda parcial do winglet direito. Teríamos como repará-lo porque, por coincidência, transportávamos um par desses winglets para suporte de manutenção no hangar de Boa Vista. O problema era como alçar voo nesse fim de mundo, sem aeródromo. O aeroporto mais próximo, distava uns 200 Km dali.

O prefeito de Pesadélia teve uma brilhante ideia que certamente resolveria nosso problema. A Avenida dos Sonhos Perdidos tem quatro pistas em ambos os sentidos e daria perfeitamente para o 777 decolar. Só teria que interditar a avenida, retirar os postes de sinalização e iluminação da pista central, nivelá-la. Em três dias, tudo seria resolvido. Problema equacionado, agora era a parte mais difícil e melindrosa para eles. Ligar para o proprietário da empresa e contar o ocorrido.

A essa altura do campeonato, o Dr. Od Kacio já tinha colocado um alerta geral de sequestro, busca e apreensão da aeronave e sua tripulação, pois não sabia de fato o que estava ocorrendo. Ofegante e suando às bicas, Antônio Viana liga para seu chefe.

_ Alô! Dr. Od Kacio? Aconteceu algo terrível, mas está tudo sob controle.

_ Alô! Viana? Mas que m… foi essa que vocês fizeram?

_ Calma, Doutor! Calma! Pra tudo se tem uma explicação e se dá um jeito. Nós recebemos os cartões de instrução e seguimos tudo conforme fomos orientados. Mas quando estávamos em pleno voo, houve um imprevisto e tivemos que fazer um pouso forçado, mas salvamos o avião. Vou mandar nossas coordenadas pelo aplicativo. Estamos aqui em Pesadélia e estamos preparando uma avenida bem larga para nos servir de pista pra decolagem e, em três dias, estaremos no destino. Apenas setenta e duas horas de atraso. O que importa é que teremos cumprido nossa missão.

_ Desgraçados! Vocês fizeram isso com ordem de quem, hein?

_ Oche, Doutor! Sob suas ordens!

_ Minhas ordens, coisa nenhuma! Não sabem ler? Ou não leram minhas instruções?

_ Lemos, sim, Doutor. Só ainda não encontramos o momento adequado para abrirmos nossas maletas. O mais fizemos tudo conforme manda o figurino.

_ Não, tonto! Não! Não e não! Vocês fizeram tudo errado! Do que eu chamei vocês mesmo ao lhes entregar os envelopes?

_ De equipe completa.

_ Então! O momento exato seria quando a equipe estivesse completa no hangar, então vocês abririam as maletas. Vocês não as abriram, pelo visto. Então, abra a sua aí e me diga o que tem nela, seu energúmeno!

_ Só um instante… Deixa eu ver aqui. Hum! Hum! Ai, ai, ai!

_ Viu agora o que deveria ou não deveria ter feito?

_ Estamos ferrados! Aqui diz: _ “Aguardar a tripulação que chegará em cinquenta minutos. A mesma entregará novos cartões com instruções”. _ Meu Pai Eterno! E agora?

_ Agora, é simples, rapazes! Vocês terão que arcar com as consequências. Vocês são habilitados para pilotar um 777? Têm pelo menos um brevê para operar um teco-teco?

_ (Engolindo seco) Não senhor. Apenas 120 horas de simulador de voo e só.

_ Quero-os todos amanhã, às 10:00 no meu escritório, aí perto, em Nova Pretória. Vão ter que explicar, bem explicadinho, todo esse imbróglio em que se meteram. E tenho dito! _ Bateu o telefone, desligando.

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Uma história extraída de um sonho/pesadelo que tive hoje cedo, pouco antes de despertar.

Alelos Esmeraldinus
Enviado por Alelos Esmeraldinus em 09/01/2019
Reeditado em 19/02/2021
Código do texto: T6546791
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