Bem
Maria me olhou, com os olhos injetados, como se a minha mera presença lhe incomodasse a ponto de perder a razão. Eu não soube o que lhe dizer, ou como reagir. Simplesmente juntei as minhas coisas e saí. Desci pelo elevador em silêncio e tomei o rumo do bar mais próximo. Isso por que eu não me sentia pronto pra qualquer tipo de interação social, seja com o cobrador do ônibus ou com minhas gatas ronronando aos meus pés em minha casa. O garçom, pelo menos não fazia perguntas que eu não saberia responder.
Maria parecia disposta a desafiar o meu silêncio, e por qualquer motivo fora da minha compreensão, ela apareceu na minha frente, dentro do bar, e me olhou como se eu fosse algum tipo de criminoso. Eu nunca consegui entender o que ela pensava quando ela estava com raiva de mim, e inclusive havia desistido de tentar entender. Nem de longe éramos um casal comum. Eu não era bem sucedido ou bem apessoado como os caras que ela costumava levar para cama. Mas ainda assim eu estava lá, sempre presente. E ela me tinha por perto, como se eu fosse algum tipo de droga pronta pra o consumo.
Do momento que eu acordava, até o momento que eu adormecia, eu a tinha no pensamento... Por bem ou por mal... E ela seguia me fodendo, fisicamente, espiritualmente, fatalmente, na cama e muito além dela. Transcendíamos tudo isso, eu sabia... Mesmo que nós gritássemos a cada gozo fora de controle, ou a cada briga sem sentido... Eu era parte dela e ela era parte minha.
Maria se sentou, enfim, bem ao meu lado e bebeu da minha cerveja sem dizer qualquer palavra. Encheu de novo o copo vazio e me olhou com um sorriso constrangido entre os lábios.
E assim eu senti finalmente, que ficaríamos bem.