a Fuga
Ela já vinha fugindo há muito tempo, é verdade. Mas ultimamente sentia que cada passo que dava a trazia para mais perto daquilo de que tentava escapar. Era inquietante, mas inevitável.
O pior de tudo era não saber exatamente do que estava fugindo. A fuga havia se tornado um hábito. O seu modus operandi. Algo entranhado em sua pele. Algo que não podia evitar.
Ela sabia que lhe restava pouco tempo... não ia poder viver daquele jeito para sempre.
Com esse pensamento, ela entrou debaixo do chuveiro e deixou a água lavar sua tensão.
Um banho gelado sempre lhe acalmava. Mesmo que estivesse frio.
Não era o caso de hoje.
O calor e os seus pensamentos não lhe davam trégua e dessa vez o banho não estava ajudando muito.
Fechou a torneira e se enxugou displicentemente.
Não havia ninguém em casa, portanto não se importou em sair do banheiro nua e se sentar ainda com o cabelo molhado no sofá.
Acendeu um cigarro, mesmo que ainda se sentisse enjoada pela bebedeira da noite anterior.
Fumar nessas horas fazia sua cabeça girar. Mas talvez fosse justamente o que precisava.
talvez o mundo girando pusesse as coisas no lugar certo, ou pelo menos bagunçasse tudo de vez.
Queria uma vida sem complicações. Sem amarras, sem nada que lhe restringisse sua impulsividade.
Era por isso que fugia.
Fugia cegamente. Mesmo que de vez em quando tropeçasse em si mesma e em outros e terminasse com os joelhos sangrando.
O medo a fazia correr. E como o vento na beira da praia, ela corria.
Uma hora ia ter que parar... mas o que faria então? Já sem fôlego para dar um passo adiante e sem coragem de olhar para trás.
Adormeceu assim,
pensando no que ia fazer.
correr ainda parecia a melhor saída...
Por enquanto.