De grão em grão [47]
A gente deve escrever pra gente mesmo e não para os outros. Nossas palavras devem nos satisfazer primeiro para só então tentar provocar algum sentimento nos outros. O texto antes de mais nada é uma realização pessoal.
Inverter essa prioridade pode resultar em textos artificiais, comerciais ou meramente aduladores. Entretanto, reconheço que algumas vezes somos forçados a escrever sob encomenda.
À primeira vista, o texto centrado na realização pessoal pode parecer egoísta. Só que não. Escrever é produzir arte, é doar-se. E quanto mais baseado nessa realização pessoal, maior é a doação de corpo e alma, a dedicação total, livre de apegos ou receios desnecessários. É contentar-se com a humildade de satisfazer a si próprio.
Por outro lado, escrever em busca do reconhecimento do outro sim, além do egoísmo subjacente, tem incutida vaidade e possivelmente uma prepotência natural. O autor tem a clara necessidade de aplausos, holofotes, confete.
Neste último caso, a realização e felicidade do autor dependem mais do outro (do leitor) do que da sua obra. Confia mais em um feedback possivelmente forjado, forçado, baseado em interesses, do que em si mesmo e na sua produção.
Quem escreve, simplesmente produz, dá à luz o que lhe nasce nas profundezas da alma, é feliz, autêntico, satisfeito não só com sua obra, mas com a vida.