De grão em grão [28]

O choro tem propriedades terapêuticas. Vale muito mais do que um desabafo verbal. Extravasa, aquieta, e até esclarece. Faz sair a ruindade que existe lá no fundo da gente.

É por isso que a pior tristeza é aquela em que não conseguimos chorar. Não sei se acontece com todo mundo, mas eu já passei por isso várias vezes. Dá um nó na garganta, um aperto no peito, falta até ar... mas o choro não vem. Fica entalado, afogado nas próprias lágrimas.

Sim, um choro não chorado é aquele que se afogou antes mesmo de sair pelas glândulas lacrimais. Desesperador. Deve até matar. Desconfio que os suicidas são pessoas que não conseguiram chorar.

Tem gente que tem vergonha de chorar em público. Será que pensa que é se expor, demonstrar fraqueza? Bobeira.

Conheço uma doida que tem necessidade diária de chorar. Ela vai guardando as tristezas e insatisfações ao longo do dia, reserva um momento para si mesma e deságua tranquilamente. Não pode ser perturbada nessa hora. É preciso cumprir o ritual até o fim, pois interrompê-lo piora a dor.

Também tem gente que adora chorar. Como dizem, chora até em comerciais de TV. Porque em filmes, é praxe. Quando alguém conta uma história ou um causo emocionante então, nem se fala. Suponho que essas pessoas também usam essa habilidade lacrimosa para conseguir o que querem... E tem muita gente que se convence ou cede diante de gente chorosa.

Já ouvi muito a expressão “chorou de lágrimas”, porque de fato, tem gente que choraminga sem soltar uma aguinha sequer.

Só sei que o choro de verdade, o choro triste e profundo, é de fato aliviador. Será que a lágrima pesa tanto assim? Porque quando a liberamos, nos sentimos tão leves... Acho que é porque a gente expulsa do corpo toda carga de tensão por meio desse líquido reversamente medicinal (porque o invés de ingeri-lo, excretamos).

Assim, em alguns casos, conforta muito mais dizer “chora, chora tudo” do que “não chora não”.

Hélio Fuchigami
Enviado por Hélio Fuchigami em 01/08/2014
Código do texto: T4905202
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