AS DESVENTURAS DE ORGULHO E VAIDADE
Conta-se que Orgulho e Vaidade, duas frações da personalidade de cada ser, viviam se divertido com sua altivez às custas dos outros. Era comum medir as pessoas, de cima a baixo. Sempre se achavam os tais. Os outros... Ah! Os outros eram os outros.
Tinham preconceito disso, preconceito daquilo; gostavam de ostentar riqueza e conhecimentos que adquiriram em Sorbonne, Harvard, PUC ou outro expoente universitário que lhes desse alguma forma de status. Ah, status era a sua base de sustentação, tão sólida quanto um vapor d'água em ebulição. Empáfia! Nada além disso.
Orgulho e Vaidade são irmãos de outras excelentes qualidades, mas essas sobrepujavam todas elas visto serem mui salientes. Por quererem ser sempre melhores do que tudo nesse mundo, o Criador propôs-lhe fazerem uma viagem dentro de corpo si mesmas. Seria uma viagem muito instrutiva, pois viriam de onde provinha todo o suporte de vida para o ser, física e mentalmente. Eles não cabiam em si de contentamento.
No grande dia, viram-se trituradas primeiro pelos incisivos, dentes frontais, próprios para cortar os alimentos, seguidos dos pré e molares, ou mastigadores, mestres em triturar os alimentos. Até aí tudo bem, dava pra aguentar aquela nojeira do bolo alimentar que misturado à saliva começava o processo pré-digestivo. Um mal cheiro já se podia sentir. “Mas tudo bem!” O melhor ainda estaria por vir(?)”. A admissão ao estômago foi algo inusitado. Cair naquele lago de ácido clorídrico não estava em seus planos, não. Quis se apoiar nas paredes do estômago, mas não deu. Era de puro Sódio. Foi um ataque violento até deixar o bolo alimentar macio o suficiente para a próxima etapa.
Eca! Um banho de bílis, vinda do fígado foi tétrico demais. Nauseabundo! Se eles pudessem, teriam vomitado na hora. Do duodeno partiram para o intestino delgado. Ali ninguém merece. Era merda pura. Uma podridão sem tamanho. O intestino se comprimia de uma forma esquisita, dizem que é o movimento peristáltico, a fim de extrair dali todo o sustento, energia, o que fosse necessário para a sobrevivência do ser. Orgulho foi se valer, buscar apoio justo num vaso sanguíneo que o sugou junto às proteínas e carboidratos que naquele momento eram absorvidos e caiu na corrente sanguínea. “Eita coisa boa!”, pensava! “Coitada da mana Vaidade que ficou literalmente atolada na merda. Ainda bem que estou aqui no meu bem bom. Ai! O que é isso!”.
Eram os anticorpos que estavam eliminando os invasores e descartando-os através dos rins e destes para a bexiga para serem expurgados. Ao chegar na bexiga, vendo aquela relativamente enorme piscina de urina cristalina, se deliciou e achando ser a última bolacha do pacote.
Já Vaidade, após ser atacada pelas bactérias saprófilas e também nada tendo de bom a oferecer ao ser que se alimentava, seguiu destino ao cólon, deste ao reto e por fim foi expelida junto com o bolo fecal, mas fedida que nunca, ao mesmo tempo que Orgulho era também eliminado em micção para o mesmo vaso sanitário.
Então ao se encontrarem, tristes e envergonhadas, as duas se entreolharam, enquanto Vaidade dizia para Orgulho que o ouvia, em tudo consentindo:
“Disso tudo, tiramos uma grande lição. Do ponto de vista digestivo, o ser humano não tem motivo algum pra se orgulhar, visto que agora sei de onde ele retira tudo o que necessita para o seu sustento. Orgulho e Vaidade pra queeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeee!?!!!”
“Clanc! Fluuuuuuuuuuush!” Foi pressionado o botão de descarga.
Orgulho e vaidade – Dois males desnecessários.