Entrevista EF (Jornal "O GRITO") - MONTEIRO LOBATO, SP
O GRITO - Qual seria a função da poesia hoje? A poesia não seria o ópio do próprio poeta?
ESCOBAR FRANELAS - Ópio, e, acima de tudo, tempero. Tempero do mundo, pois alguns passam sem ela, mas àqueles que fruem dela, sentem melhor o sabor da vida.
OG - Você se confessou apaixonado pela poesia de Manuel Bandeira. Você não acha que a poesia hoje se ressente de grandes poetas?
EF - Não, hoje temos valores inquestionáveis que também já são pérolas históricas. Cito, por exemplo, o Aricy Curvello, poeta mineiro de excelente recorte e fatura, radicado no Espírito Santo. Temos também o Arnaldo Antunes, o Manoel de Barros. E excelentes tesouros emergentes, como o Fabrício Carpinejar, Tarso de Melo, Sérgio Vaz. O próprio editor deste jornal, Dailor Varela, é um poeta de quilate imensurável.
OG - Como você encara as vanguardas poéticas?
EF - Toda "vã-guarda" guarda no seu bojo um preconceito, para com a história, para com a estrutura já estabelecida e muitas vezes essencial. Mas amo-as de paixão. Também amo os museus, esse culto aos antepassados, que são o sul de uma vanguarda. E amo muito mais a idéia de um Museu da Vanguarda, que seria uma quase utopia minha: o passado e o futuro anelados e encaixotados, justapostos.
OG - Qual a sua mais insistente fonte de inspiração?
EF - O homem, essa "arquitetura nunca acabada".
OG - Já pensou em deixar de escrever poesia?
EF - Não ousaria. Seria uma tentativa vã. Eu faria poesia sendo um chef de cozinha, um marceneiro, um motorista de caminhão, um médico ou jogador de futebol. Aliás, acho até que minha pior poesia é a que escrevo. Quem me garante que como pai, por exemplo, não sou um poeta mais completo, denso e melhor acabado?
OG - O que é viver em São Paulo e ser poeta?
EF - Em Sampa vive-se um tempo diferente de Monteiro Lobato(Nota da entrevista: a cidade do entrevistador), por exemplo. Amo estar e curtir essa Paulicéia de várias cabeças, traços e perfis; mas amo mais a idéia de viver intensamente o lugar onde estou, independente da geografia.
OG - Para você existe o poeta maior e o poeta menor?
EF - Só se for o poeta jogador de basquete e o poeta anão.
OG - O que significa, para você, publicar um livro?
EF - Antes, um aparte: sempre é bom lembrar que poeta não é aquele que publica um livro de poesia. Poeta é quem faz da experiência diária uma poesia.
OG - Chico, Caetano, Gil e Milton são grandes poetas, mas há um certo preconceito dos literatos com a poesia existente na MPB. Como você encara isso?
EF - Pura inveja. Inveja dos olhos verdes do Chico, da riqueza vocabular do Gil, da voz do Milton e do confronto urdido pelo Caê. O problema é que poesia "poesia" só é comestível com os olhos. E a "poesia deles" é também aprazível aos ouvidos. Portanto, mais fácil de ser consumida, ainda mais com a riqueza instrumental.
OG - Como se "faz" um poeta? Tem alguma fórmula?
EF - Se poesia não se faz(ela está no ar, basta "pescá-la"), então, definitivamente, não temos como "criar" um poeta. Mas podemos induzir alguém a pelo menos "pescar" no ar.
OG - Que faz sua cabeça na poesia(brasileira e estrangeira)?
EF - Muitos, Vários, Diversos, Tudos, Todos(e alguns Nenhuns).
OG - O poeta será sempre um eterno marginal?
EF - Coletar poesia no ar é uma fruição tão individual e complexa que ouso pensar que - assim como catar pérolas - poetizar é sim, ficar à margem do Grande Rio.
OG - Ler boa poesia é preciso? Por quê?
EF - Vou insistir num jargão literário: VIVER BOA POESIA É PRECISO. Navegar também é preciso.
*(entrevista concedida a Dailor Varela, editor do Jornal "O Grito"(Monteiro Lobato, SP), nº 10, Agosto/2007, p. 3)