GERALDO AZEVEDO

Tremia eu mais que vara verde quando encontrei no camarim o Geraldinho Azevedo. Era a minha primeira entrevista batendo o centro na carreira de repórter e, não fosse a sua paciência e bom humor, teria eu emborcado a entrevista.

Foi assim, ele se preparava para passar o som no palco quando a platéia já adentrava para o show, quando gentilmente, no clima da afinação do som e no barulho da entrada das pessoas, puxou-me pelo braço, sentou-se no sofá, pegou o violão e ficou dedilhando uns acordes enquanto eu criava a coragem para largar as perguntas.

Enquanto me refazia do vexame, presenteei-lhe um exemplar dos livros "Raízes & Frutos" e "Canção de Terra" que eu havia publicado e um folder do meu show "Por um novo dia", que ele achou interessante a idéia com o desenho, as letras das minhas canções e a distribuição que eu fazia deste material para o público do meu espetáculo.

Sabia que ele estava dando corda na minha satisfação, ao mesmo tempo que parece que adivinhava meu acabrunhamento. O que? Geraldinho gostar do meu trabalho? Pô, era prá lá de grande e isso aliviou minha tensão, abrindo o papo que eu já me esgueirava solto feito teitei na inquirição. Pois é, peguei no tranco e mandei ver.

Geraldinho, calmo e receptivo com seu jeito doce de atender a quem chegasse, largou sua pernambucanidade desenrolando sua trajetória. Lá vai: nasceu em Petrolina e conheceu o mar em Recife aos dezoito anos de idade: eita açudão grande da gota! Era a primeira grande viagem dele, do sertão, passando pelo agreste e pela mata, chegando ao litoral que inspirou belíssimas páginas musicais, como "Coqueiros".

No meio da nossa risadagem com as espertíssimas colocações da linguagem nordestina, nossa despojada maneira de se expressar, disse-me ele poeticamente: "...foi a viagem do coração na Barcarola do São Francisco até o Atlântico".

Mais para diante, foi se dizendo um cigano e um bocado de coisa: ligado às misturadas da formação da gente brasileira, enraizando seu trabalho na cultura e na arte da gente simples desta nordestinada sofrência de vida que se reflete em sábias intuições da sabedoria popular.

Foi Eliana Pitman que fez a descoberta e carregou seu talento para o eixo Rio-São Paulo. Aí que ele ouviu muita zoada no pé do ouvido interferindo no trabalho de músico e no seu trabalho autoral.

Daí vieram Naná Vasconcelos, Nelson Angelo e o Franklin, com o Quarteto Livre que acompanhava Geraldo Vandré, até surgir a parceria da "Canção da Despedida", que, segundo ele, foi uma canção de amor que a repressão deu a maior mancada. Era uma fase braba, a censura e o AI-5 não deixavam que mostrasse sua arte, quando foi preso, torturado.

Disse-me, então: "...Na última prisão, podiam me matar; e se ficasse preso, queria compor; e se saísse queria ficar famoso".

Saindo da prisão, deixou a música de lado e foi ser assalariado de multinacional, até que chegou Alceu e retirou sua vida do marasmo salvando o desvio dele para a burocracia horrível da formalidade empregatícia, felizmente. E não fosse essa intervenção, jamais teríamos oportunidade de acompanhar a constatação do seu talento e perderíamos para sempre o seu nome. Coisas da injustiça. Mas, a coisa recomeçou prá valer.

O começo de tudo, para ele, é o "Quadrafônico" com Alceu: "o disco é o livro da música".

Vieram então os sucessos "Dia Branco", "Táxi Lunar", "Talvez seja real", "Chorando e cantando", "Dona da minha cabeça", "Moça Bonita" e uma penca de parceiros como Fausto Nilo, Morais Moreira, Renato Rocha, Zé Ramalho, Capinam, Alceu Valença, Geraldo Amaral, Marcus Vinicius.

Carlos Fernando, por exemplo, trouxe palavra à sua música e ele levou sua música à palavra dele.

Numa outra guinada mais autônoma e ousada, lançava o álbum "De outra maneira" e depois "Eterno Presente", "Raízes & Frutos" e todo material que a gente conhece de primeira qualidade.

Umas duas outras entrevistas consegui realizar, mas o que é mais bonito mesmo, é o show: uma interação belíssima e um clima lindo de cumplicidade entre o artista e o seu público. Aquela comunhão de vozes: a do artista e o da platéia.

Posso dizer verdadeiramente que quem não teve a oportunidade de presenciar um show do Geraldinho Azevedo, não sabe o que perdeu de tão mágico na incorporação de uma mesma unidade: o artista se entregando e a platéia no êxtase da entrega bebendo todo o brilho da verdadeira comunhão humana.

Por isso curto bastante e recomendo Geraldinho Azevedo, de Petrolina, de Pernambuco, do Nordeste, do Brasil e do Mundo.

©Luiz Alberto Machado. Direitos Reservados.

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LUIZ ALBERTO MACHADO
Enviado por LUIZ ALBERTO MACHADO em 29/08/2007
Código do texto: T629480
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