Entrevista - MAHIRIRI OSSUKA (Literatura) - Moçambique
"Quem primeiro me falou do escritor moçambicano Mahiriri Ossuka foi o paulistaníssimo Paulinho Dhi Andrade. Curioso que sou, fui atrás de informações sobre ele. Em tempos de globalização via redes sociais, achei-o até com certa facilidade. Após uma apresentação e um convite iniciais, iniciamos um bate-papo mais formal (que reproduzo aqui).
Mahiriri Ossuka conhece o Brasil por meio da literatura e também por que já esteve aqui em 2014 (quando o Paulinho o conheceu). Aqui ele se mostra lúcido, objetivo e cristalino, como o Índico que banha as costas de sua Moz natal.
Descubra-o também:"
1) Quem é Mahiriri Ossuka?
Um caçador de factos que vive pelas matas do amanhecer e anoitecer intrínseco. Caminhante de pés descalços em causas de combate único de busca de histórias e verdades nuas. Por vezes me perco nas matas e demoro de voltar a civilização humana.
Até encontrar outros caçadores que buscam o sangue dos caçadores de liberdade. Com eles e elas sim, volto a civilização de poucos humanos.
2) Quanto anos têm, qual sua formação, o que faz, o que sonha fazer?
Normalmente não me identifico com alguma formação.
3) Quanto anos têm, o que faz, o que sonha fazer? (Por favor leve em conta que seu depoimento será lido por brasileiros que ainda não o conhecem...).
Tenho 31 anos. Trabalho como ativista para o fortalecimento da sociedade civil de causas moçambicanas e de temas de interesse global com impactos locais. Um dia sonho especializar-me várias áreas. Uma delas é a Antropologia Visual.
4) Já esteve no Brasil? Onde esteve? Quais os estados que visitou? Que impressões guardou da viagem?
Visitei o Brasil infelizmente por muito curto tempo. Belo Horizonte, Pirenópolis, Brasilia e São Paulo.
A particularidade primária que notei é o aconchego entre amigos e familiares. Toda gente é da mesma família. Senti um respeito de opiniões nos debates e uma vontade de apoio mútuo. Oxalá que não tenha sido uma impressão só daquele momento, porque quero ainda voltar.
5) E São Paulo? Que memórias guarda da estadia em S. Paulo?
Um bom momento de interagir com outros poetas e poetisas. Também fui acolhido muito bem por lá. Conheci um coração que secretamente contemplo a lembrança de um dia voltar a cruzar o olhar.
Boa gente.
6) Como foi estar com o escritor Paulinho Dhi Andrade?
Foi bom ter encontrado com o poeta Paulinho Dhi Andrade e também tive a honra da visita do Poeta Athadar (Odair) que chegou da Andrelândia.
Junto com o Poeta Cel Bentin fomos ao Sarau organizado pela Mariana Portela. Um momento para uma boa poesia e música acústica.
A visita à familiar Dauria, a convite da poetisa Valéria Brasil foi uma marca que nos acompanhou.
A família Ligia e Ismael Goes nos convidaram para muitas sessões de conversa onde interagimos com a grande poetisa Maria Claudina com a qual até agora interajo os nossos traços históricos.
Bons momentos.
7) Tem trabalhos publicados?
Já publiquei em 2 antologias e em blog e Facebook. 1 antologia foi em 2012, em Moçambique, Dançando Últimas Luas. A 2ª foi do Bar de Escritor em 2014 no Brasil, a Quinta Barnasiana.
No blog foi em ossuka.blogspot.com e no facebook.com/mahiriri.ossuka
8) Como considera a arte moçambicana feita nos dias de hoje?
É diversificada em geral. Mas infelizmente já sofreu bastante fusão com outras artes oriundas de outros países Africanos como a Kenia, Tanzânia, Mali e Nigéria. Porém, há outras expressões artísticas que procuram a seu grito manter-se como são o caso de algumas danças tradicionais. Mas mesmo assim, quem já conhece o conceito original destas expressões artísticas já sabe que há adaptações sofridas com a modernização. Isso me entristece porque o sentido de proteção ao que é original e indígena já ficou para traz e tendem os citadinos e citadinas a pejorar o que é nosso.
Outra das razões dessa pejoração do que é nosso, tradicional e artístico é a potente globalização e forte inclinação para agradar o ocidente. É uma questão de classe e estatuto social partilhará entre acadêmicos, ricos e corruptos culturais. Uma putaquiparisse total!
9) Mas essa fusão com outras linguagens, expressões e culturas não seria o normal, já que toda arte acaba representando o dinamismo da sociedade no seu tempo e espaço?
Uma coisa é interação ou intercâmbios culturais. Outra é mesmo alteração de praticais tradicionais para acomodar novos padrões tidos como melhores apenas para agradar ou para fazer parte do ocidente. É isso é considerado como ascensão. Eu felizmente acredito nos ventos, nos embondeiros (baobab), nas danças que curam, e nas tatuagens que purificam. Aqui a expressão artística é uma impressão de recados dos nossos antepassados que comunicam-se connosco nos sonhos e nos batuques ou simplesmente nos cânticos dos pássaros raros. Por vezes em chuvas ou secas. Os outros procuram apagar o lado dos sanificados das nossas práticas para uma mera decoração.
10) Quais seus autores preferidos?
Meus autores preferidos são o povo das aldeias onde com eles aprendo as suas escritas em vidas reais. Publicações involuntárias de uma alegria em cima de problemas acusados pelo sistema é ciclicamente lançadas as culpas a este mesmo povo vítima de uma putaquiparisse do sistema.
Quis dizer: Meus autores preferidos são o povo das aldeias onde com eles aprendo as suas escritas em vidas reais. Publicações involuntárias de uma alegria em cima de problemas causados pelo sistema e ainda assim ciclicamente lançadas as culpas a este mesmo povo vítima de uma putaquiparisse de interesses econômico-políticos.
11) E o que falta para que pessoas como eu possam acessar as suas obras?
Um processo lento está em curso para edição da próxima obra. Pretendo que seja uma colectânea de contos e um romance.
Por enquanto de vez em quando público no blog ossuka.blogspot.com e no facebook/Mahiriri.ossuka para atualizar os amigos e as amigas que me acompanham.
Penso que em um ano já podemos falar daquelas duas obras.
12) Tem alguma pergunta que não fiz mas você gostaria que tivesse feito? Se tiver, por favor, formule-a e depois a responda, ok?
Não necessariamente irmão. Obrigado.
"Amantemente Distante" (Mahiriri Ossuka)
Refuto receber esse teu amor,
marcado por perseguições,
com máscaras lindas de flor,
inalando fingidas apreciações,
do meu ser,
do meu carácter,
do meu intelecto.
Refuto aceitar essa tua ira escondida,
nas entrelinhas do teu remorso,
oculto por via sombria e destemida,
e de amor se vê este percurso,
de teu prazer,
de teu entreter,
em sentir o tacto.
Recuso, desdenho toda ela,
a tua glória de memórias,
fundadas numa apenas tela,
encurtadas tantas histórias,
de um viver,
de um conhecer,
amor de facto.
Estrangulo o que sinto,
ainda que me tenhas prometido,
o que quer que ostento,
ter falta ou tenha antes perdido,
um amanhecer,
de bem querer,
sentir o olfato.
x.x.x.x.x.x.x.x.x.x.x.x.x.x.x.x.x.x.
"Diferentes igualmente" (Mahiriri Ossuka)
Pintarei um quadro do tempo
cujos segundos piscam ao século,
assim serão criadas as oportunidades
de mudança e continuidade,
aprendizagem e correctividade.
Pintarei um quadro do tempo
cuja orientação é para esquerda,
o sol levantará e deitará contrário
quem sabe se busque na história
o princípio da origem das coisas,
como se define “correcto” e “errado”.
Pintarei um quadro do tempo,
cujas partidas indeterminantes
rompem com patri e matri-ismos,
desconstroem práticas tradicionais,
que alimentam deturpadas culturas
de saber-se o que se sabe e não se aprende,
e de ser-se como se é, mas não se explica.
x.x.x.x.x.x.x.x.x.x.x.x.x.x.x.x.x.x.x.
mais informações sobre Mahiriri Ossuka:
http://ossuka.blogspot.com.br/
http://bardoescritor.blogspot.com.br/2014/02/entrevista-com-mahiriri-ossuka-primeiro.html