O princípio do erro: um diálogo com a consciência.
- Mas o que leva ao erro? Ou melhor falando, o que é um erro?
- Ora, um erro é um resultado; Um resultado não programado ou não desejado, mas um resultado previsível.
- Previsível como?
- Vejamos: Um erro é um produto final, advindo de um conjunto de eventos. Se você conhece os eventos, então poderá prever o erro ou mesmo anulá-lo.
- Um conjunto de eventos?!... Mas existem erros que nascem apenas de uma causa isolada. Por exemplo, um criminoso pode tirar a vida de um inocente e esse erro só partiu do criminoso.
- Não dá para assegurar ou ter exatidão sobre isso. O próprio criminoso pode ser o conjunto de eventos. Ou até mesmo, o que é mais comum, a vítima pode fazer parte do conjunto de eventos, ora por estar no lugar errado e na hora errada, ora por ter sido uma vítima fácil diante das outras possíveis vítimas, etc. Se verificar bem, a vítima, de alguma forma, sempre contribui para o erro. As fatalidades são explicadas. Dessa forma, a parte “certa” é conivente com a parte errada, ou seja, participa também do conjunto de eventos.
- Mas isso não justifica! Quer dizer que não devemos sair mais de casa? Porque poderemos ser cúmplices do nosso próprio algoz? Isso é inadmissível!
- Se alguém resolve nunca mais sair de casa, participa indubitavelmente do conjunto de eventos que, por exemplo, poderiam levá-lo a um possível soterramento por causas diversas, ou uma investida de um ladrão, de um sequestrador, etc... Observe a vida numa savana: O predador sempre pega a presa mais fácil. Parta desse princípio. Eu ainda lhe digo: se você anda descalço em um campo cheio de pedras, todas as pedras são potencialmente perigosas para você, pois poderiam causar acidentes; mas é bom lembrar que a pedra que lhe arrancará a unha é a que estiver mais próxima de seu pé.
- Então você está insinuando que, se uma moça passa numa calçada com roupas sensuais e recebe uma cantada de um grupo de rapazes, essa cantada só aconteceu por causa de suas roupas?
- Esse fato, pode ser sim, um dos elementos do conjunto de eventos. Infelizmente é assim! é o princípio do erro. Imagine essa mesma moça vestida de freira. A cantada poderia até existir, mas numa possibilidade aquém da estatística. Vamos imaginar que o grupo de rapazes seja formado de pessoas altamente moralistas e com princípios religiosos muito fortes: a cantada voltada à moça sensual poderia até existir, mas novamente numa escala aquém da estatística. Tudo isso faz parte do conjunto de fatores que poderiam ou não construir o erro. Vamos fazer adiante algumas analogias: digamos que um mestre de fogos de artifício resolva transportar parte de uma encomenda a um comprador seu que está no outro lado da rua. No caminho logo adiante, bem próximo à rua, há um incêndio. Em sua opinião qual a atitude mais prudente para esse homem não participar do conjunto de eventos que levariam ao erro?
- Bem... Ele poderia retornar ou tomar outra via!
- Excelente dedução! Se ele retornasse ou tomasse outra via, ele não estaria mais participando dos eventos que, supostamente, levariam a uma tragédia; poderia até mesmo fazer parte de outros eventos, mas não daquele primeiro.
- Mas no caso da moça é diferente: ela não carrega culpa ao usar roupas sensuais. A impossibilidade de ela usar roupas provocantes é pura opressão ou resultado de um machismo idiota.
- É preciso ver isso com cautela: digamos que a moça tenha tido a intenção de usar, naquele dia, roupas sensuais. Esse é o princípio do propósito. Ou seja, uma ação que resultará numa reação. Se ela teve a intenção de usar roupas provocantes é porque ela quis ser notada. O seu propósito apenas não foi o esperado; desviou-se para uma escala além do desejável; mas isso não a isentou do conjunto dos eventos. O fabricante de fogos de artifício poderia até ousar em passar próximo ao fogo, por sua conta e risco, mas isso seria muito precipitado, melhor dizendo, ele não estaria fugindo do conjunto de eventos.
Finalizando o nosso diálogo, eu poderia lhe pedir para observar quaisquer circunstâncias na natureza; quaisquer eventos mensuráveis ou não. Veja que por trás de todos eles existe uma série de elementos que os criaram. Nada existe sem uma prévia causalidade; nada é fruto isolado sem haver por trás suas parcelas. Um erro é assim também. Um erro é um produto cuja origem se fez na fusão de duas forças antagônicas. Uma delas sucumbiu, anulou-se; a outra, devido ao fato da decrepitude de uma delas, apenas se enalteceu.