Entrevista de Ignacio Romanet com Noam Chomsky, Final
IR: Recentemente você esteve em Londres visitando Julio Assenge, o fundador de WikiLeaks, na Embaixada do Equador – eu tinha estado com ele uns dias antes. Por outro lado, Edward Snowden, com suas revelações, tem demonstrado a existência de todo um sistema de vigilância e desmascarado algumas ações dos Estados ou a sua potência hoje em matéria de vigilância e ocultação de informações. Isto é, por um lado WikiLeaks, por outro, “divulgadores de alertas”, como Snowden, com o uso da internet e das redes sociais, ultimamente nos têm ensinado muito em termos de informação. Você acha que esse novo tipo de jornalismo poderá se desenvolver num futuro próximo em termos de comunicação e de emancipação intelectual, a partir de uma tomada de consciência dos cidadãos?
NC: A resposta, como a maioria das perguntas, vai depender do que façam os cidadãos. Sem dúvida alguma, qualquer sistema de poder tende a impedir tudo o que for possível, dentro de suas possibilidades. Assenge está refugiado na Embaixada do Equador, em Londres, e a Grã-Bretanha paga muito caro para que ele não escape pela porta. Como se sabe, Assenge está em condições piores que as de um cárcere, porque num cárcere se pode ver a luz do dia, a menos que se esteja confinado. Mas ele, não. Snowden está na Rússia. Você sabe o que ocorreu com o voo de Evo Morales, quando voltava de Moscou para a Bolívia e os países europeus – França, Espanha e outros – interceptaram seu voo por ordem do Grande Amo em Washington... Uma coisa incrível! No final, o avião teve que aterrissar na Áustria. Imediatamente a polícia entrou no avião para certificar-se de que Snowden não estava escondido na cabine de comando. Estas são claramente violações de protocolos diplomáticos, mas que mostram duas coisas: primeiro a extrema dedicação do governo Obama no sentido de castigar Snowden; e, em segundo lugar, o quão servil é a Europa ao Grande Amo estadunidense. Um fenômeno muito interessante.
Obama vai mais longe. Ele tem castigado “divulgadores de alertas” muito mais que qualquer outro presidente. Existe uma lei nos EUA – a lei de espionagem que vigorou durante a Primeira Guerra Mundial. Ela tem sido usada por Obama para evitar publicações que informem a sociedade sobre os procedimentos de Assenge e Snowden. O governo vai se valer até do inexprimível para se proteger de seu “inimigo principal”. E o “inimigo principal” de qualquer governo é a sua própria população. Há muitas provas disto, o que se pode entender a partir daqui mesmo, da Argentina.
Da mesma maneira que as grandes empresas privadas vão tratar de proteger, dentro do possível, seu controle tirânico sobre qualquer aspecto da vida, para os “divulgadores de alertas” a luta por uma informação livre e transparente é uma coisa natural. Terão êxito? Bem, isto é como saber se a ditadura argentina poderia voltar ao poder. O que depende das pessoas. Se Snowden, Assenge e outros fazem o que fazem, o fazem na qualidade de cidadãos. Eles ajudam o público a descobrir como atuam seus próprios governos. Existe por acaso uma tarefa mais nobre para um cidadão livre? E, no entanto, eles são castigados severamente. Se os EUA pudessem trata-los com luvas (?), seria pior ainda. Muitos já padeceram deste castigo. Agora, se isto vai ter seguimento ou não, vai depender de como respondam os cidadãos.
(Esta é uma versão abreviada da entrevista de Ignacio Ramonet com Noam Chomsky realizada para a Televisão Pública Argentina, em Buenos Aires, no dia 13 de março deste ano de 2015 e difundida integralmente no sábado, 21 de março, pelo canal de TV Pública Argentina - www.tvpublica.com.ar).
Ignacio Ramonet é jornalista e sociólogo galego, especialista em geopolítica e estratégia internacional e diretor do Le Monde Diplomatique.
Noam Chomsky é linguista, filósofo e ativista político, professor de Linguística do MIT (Massachusetts Institute of Technology).
Rio, 12/04/2015
Tradução do espanhol por